terça-feira, 22 de novembro de 2016

Educação ainda é grande barreira à mobilidade social – Editorial/Valor Econômico

No momento em que o governo discute um limite para os gastos públicos, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulga novos dados que ajudam compor o quadro das dificuldades na área de educação. O suplemento "Mobilidade Sócio-ocupacional da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios" (Pnad 2014), realizado em convênio com o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDS), mostra a influência da formação dos pais no progresso educacional e profissional dos filhos e a necessidade de se implementar políticas públicas adequadas para compensar essas forças ainda hoje determinantes da desigualdade.

Houve algum progresso nos últimos anos, que ajudou a reduzir a desigualdade. Segundo o IBGE, 47,4% das pessoas com mais de 25 anos atingiram um nível de instrução superior ao do pai e 51,4% ao da mãe. Mas os dados também revelam que persistem as dificuldades de progredir nos estudos para aqueles que nascem em famílias menos instruídas. Entre aqueles cujos pais não tinham instrução, 63,6% se mantiveram no mesmo nível ou conseguiram apenas começar o ensino fundamental, sem chegar à conclusão. Apenas 4% dos filhos de pais analfabetos completaram o ensino superior, o equivalente a um milhão de pessoas. Já dos que têm pais com ensino superior, 69,1% completaram o curso universitário.

Em geral, quanto maior a instrução, maior o rendimento do trabalho do pai, e o filho entra no mercado de trabalho mais tarde. Quanto mais precária a situação profissional dos pais, mais as crianças precisam contribuir para o orçamento da família. A maioria dos filhos de agricultores, 59,6%, começou a trabalhar antes dos 13 anos, geralmente na mesma atividade do pai, e tem menos tempo para estudar. Por outro lado, 37% dos profissionais de ciências e artes entram no mesmo ramo dos pais depois dos 20 anos e podem estudar mais. Da população pesquisada, 73,9% começaram a trabalhar até os 17 anos; sendo que um terço começou ainda criança, com menos de 13 anos.

Também o desempenho profissional está firmemente ligado à escolaridade e à origem familiar. Ao chegar ao mercado de trabalho, os filhos dos analfabetos ganhavam menos da metade daqueles que têm ensino superior, assim como seus pais. A pesquisa do IBGE dá uma dimensão à evidência de que renda e escolaridade estão relacionados. Dos filhos de pais sem escolaridade, 74,9% ganhavam no máximo dois salários mínimos. O filho de um analfabeto com curso superior ganhará quase um terço daquele cujo pai tem faculdade.

Foi a primeira vez, desde 1996, que o IBGE analisou a evolução social entre gerações familiares. As informações não podem ser comparadas porque tiveram metodologia diferentes. Mas as conclusões eram semelhantes. Há 20 anos, cerca de 70% do desempenho escolar era explicado pela instrução dos pais. Estudo do levantamento feito em 1996 pelos pesquisadores Mauricio Cortez Reis e Lauro Ramos, publicado na Revista Brasileira de Economia da Fundação Getúlio Vargas em 2011, afirma que a "estrutura educacional da família parece ter um papel importante nesse processo de transmissão da desigualdade de rendimentos entre gerações. Trabalhadores cujos pais ou mães alcançaram níveis mais altos de educação tendem a apresentar não apenas mais anos de estudo em média, como também os retornos à escolaridade são maiores do que para aqueles cujos pais ou mães adquiriram poucos anos de escolaridade". Já naquela época se concluía também que "a média dos rendimentos do trabalho seria um pouco maior se todos os trabalhadores possuíssem os mesmos retornos à escolaridade que aqueles com mães mais escolarizadas, enquanto a desigualdade de rendimentos diminuiria ligeiramente".

As pesquisas indicam que a escolarização avançou nos últimos 22 anos. Em 1992, apenas 18,4% dos ocupados tinham 11 anos ou mais de estudo. Em 2014, ano da pesquisa do IBGE, a parcela subiu para 50,2%. No início dos anos 90, a fatia daqueles com 7 a 14 anos que não estudavam era de 16%, taxa que caiu para 4% em 2000 e para menos de 2% em 2014. No entanto, ainda é forte a influência do ambiente em que nascem e da escolaridade e do progresso profissional dos pais no futuro das crianças. Melhorar a qualidade e a quantidade do ensino oferecido é necessário para contrabalançar essa influência de modo a diminuir a desigualdade, assim como desenvolver programas que incluam a família no esforço de aprimorar a educação das crianças e jovens.

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