domingo, 27 de novembro de 2016

Adeus ao senhor da ilha

• Morte de Fidel Castro, aos 90 anos, abre especulações sobre o futuro político de Cuba, que comandou por 47 anos, e deflagra luto e celebração no país e no exílio. Obama diz que a História deverá julgá-lo; já Trump o chama de ditador brutal

A morte de Fidel Castro provocou reações entre o luto e a celebração para cubanos que moram na ilha e em Miami. E abriu especulações sobre o futuro de Cuba sem o líder da revolução que comandou e o manteve por quase meio século à frente do país. Doente e afastado da política desde 2006, foi cremado ontem. Líder autoritário ou um simples tirano para uns, lenda revolucionária para outros, era considerado o último sobrevivente da Guerra Fria. O presidente dos EUA, Barack Obama, que liderou a aproximação com Cuba, disse que a História deverá julgar o enorme impacto de sua personalidade. Já o eleito, Donald Trump, o chamou de ditador brutal.

À espera do julgamento da história

• Morte de Fidel, aos 90, abre especulações sobre o futuro de Cuba sem o líder da revolução

Marina Gonçalves - O Globo

RIO E HAVANA - Era pouco antes da meianoite de sexta-feira quando o presidente Raúl Castro apareceu na televisão de surpresa para dar a notícia que a maioria dos cubanos sabia que, mais cedo ou mais tarde, viria. Foram menos de dois minutos de um discurso seco, até a imagem de Raúl ser cortada quando as palavras começaram a falhar. Aos poucos, a notícia da morte de Fidel Castro, líder da Revolução Cubana, foi calando a festa e o barulho permanente em Havana. A polícia fechou o acesso à Praça da Revolução, na capital, e o governo decretou nove dias de luto oficial. O jornal “Granma”, órgão oficial do Partido Comunista de Cuba (PCC), demorou quase cinco horas para atualizar sua primeira página com a notícia que rapidamente se espalhou pelo mundo — depois de tantos boatos, desta vez era verdade.

Fidel morreu aos 90 anos, exatamente 60 depois de ter zarpado do México no iate Granma com 81 homens para derrotar a ditadura de Fulgencio Batista. Doente e afastado da política desde 2006, até as primeiras horas de ontem, ninguém sabia as circunstâncias de sua morte, apenas a vontade do líder de ser cremado. Suas cinzas percorrerão 13 das 15 províncias da ilha em uma caravana de cerca de mil quilômetros, que se estenderá por quatro dias e terminará com seu sepultamento, daqui a uma semana, na cidade de Santiago de Cuba, a 960 km de Havana.

O comandante já não mandava, pelo menos não diretamente. Foi seu irmão, Raúl, o grande responsável pelas mudanças recentes no país, após a histórica reaproximação com os Estados Unidos, em 2014. Mas sua presença pairava de um extremo a outro da ilha, após mais de meio século de um governo controverso — amado por uns e odiado por outros. Em abril, após longo período ausente, reapareceu durante a sessão final do Congresso do Partido Comunista e, em um rápido discurso, falou sobre a própria morte:

— Em breve vou completar 90 anos, eu nunca teria pensado em tal ideia e nunca foi fruto de esforço. Talvez seja a última vez que falo nesta sala. A hora chega a todos, mas ficam as ideias dos comunistas cubanos, como prova de que neste planeta, se trabalharmos com fervor e dignidade, podemos produzir os bens materiais e culturais que os seres humanos necessitam. Devemos lutar sem trégua para obtê-los.

Em 13 de agosto, no seu último aniversário, apareceu em um teatro em uma das homenagens que recebeu. Foi a última vez que Fidel foi visto em público.

— Perder Fidel é como perder um pai, o guia, o farol desta revolução — disse Michel Rodríguez, padeiro de 42 anos, que soube da notícia pela rádio, em Havana.

Nas ruas da capital, ontem, o clima era de uma “tranquilidade assombrosa”, conta a engenheira aposentada Zoe Alvarez de Castillo. O comércio funcionava normalmente, assim como os transportes públicos.

— Foi um comunicado rápido, interrompido quando Raúl quase começou a chorar. Mas não vejo tanta comoção nas ruas. Imagino que nos próximos dias haja grandes filas na Praça da Revolução, onde as pessoas irão se despedir.

Em Miami, cidade refúgio de cubanos que deixaram a ilha por divergências políticas, no entanto, muitos foram às ruas para celebrar.

— Não é um sentimento que eu compartilho porque nunca comemoraria a morte de alguém. Mas celebro o fim do símbolo maior da ditadura — contou, por telefone, Elizardo Sanchéz, presidente da Comissão Cubana de Direitos Humanos e Reconciliação Nacional. — Ele disse que seria absolvido pela história e eu penso justamente o contrário. Fidel Castro era uma pessoa autoritária, que se aproveitou da inocência do povo para se manter no poder por mais de 50 anos. Ele não era aquele avozinho amoroso do imaginário das pessoas.

Jorge Duany, diretor do Instituto de Investigações Cubanas da Universidade Internacional da Flórida (FIU), acredita que a morte do líder cubano irá fortalecer o grupo político de Raúl, mais pragmático e aberto a mudanças.

— A diferença entre as duas facções dentro do governo é que Fidel era um politico mais ideológico e ortodoxo. Sua morte dará mais espaço para o grupo encabeçado por Raúl, responsável pelas reformas recentes, principalmente no setor econômico, que mudaram bastante o panorama da ilha — disse ao GLOBO. — No campo dos direitos humanos, no entanto, o governo de Raúl não deu sinal de interesse de mudanças, e também não cedeu às pressões internas.

Marlene Azor Hernández, socióloga cubana autora do livro “Discursos da resistência” não acredita, por sua vez, que a morte de Fidel gere grandes transformações.

— Fidel era um governante retirado que já não tinha capacidade de decisão por causa da idade avançada. Não acho que algo mude radicalmente. Ele era a desculpa para não haver mudanças, mas não um obstáculo real — explicou. — Mais do que tudo, sua morte é um evento simbólico. Em nível internacional, a repercussão sobre sua figura será um pouco mais benevolente do que internamente, por tudo que Fidel simbolizou no século XX.

Para Sanchéz, haverá um esforço de manter um castrismo sem Fidel, o que deve causar tensões dentro da sociedade cubana:

— Tenho um otimismo moderado em relação ao futuro. Haverá muita pressão da comunidade cubana e internacional.

Um comentário:

Fernando Carvalho disse...

SEMPER FIDELIS

Fidel Castro morreu. Um homem que figurará num lugar de destaque no Panteão dos Heróis da Humanidade. Liderou o povo cubano na construção de uma sociedade que para muitos era uma espécie de formigueiro humano onde as pessoas não podem se esforçar para possuir mansões, carros de luxo, frequentar restaurantes finos, beber bons e caros vinhos, possuir caneta Mont Blanc, e relógios Rolex.
Mas em compensação Cuba é uma sociedade que pode se orgulhar de não possuir crianças abandonadas nas ruas como no Brasil. As pessoas podem andar nas ruas sem medo de ser assaltadas. Um país que exporta médicos e boa medicina. Um país em que todos são iguais e não como no Brasil onde o povo é dividido em favelados e ricos. E os favelados contemplados com caveirões e helicópteros à prova de balas.
Viva Fidel Castro !!!