quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Presidente do STF rebate Renan e crise de Poderes se agrava

• Michel Temer marca reunião para tentar conciliação, mas Cármen Lúcia alega não ter espaço em sua agenda; presidente do Senado mantém tom das críticas

A presidente do STF, Cármen Lúcia, reagiu às declarações do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDBAL), contra o juiz de Brasília Vallisney de Souza Oliveira, o que agravou a crise entre os representantes dos três Poderes deflagrada na sexta-feira após a PF prender quatro agentes da Polícia Legislativa. “Onde um juiz for destratado, eu também sou”, disse Cármen Lúcia menos de 24 horas após Renan chamar o juiz da 10.ª Vara Federal, que autorizou a ação no Senado, de “juizeco”. Na ocasião, o senador também criticou o ministro Alexandre de Moraes (Justiça), que apontou “excessos” na atuação dos policiais legislativos. O presidente Michel Temer tentou articular uma reunião, hoje, no Planalto, com Renan, Cármen e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). A presidente do STF, no entanto, recusou o convite alegando agenda comprometida. Renan manteve o tom das críticas.

Ministra reage a Renan e agrava crise entre poderes

• Cármen Lúcia, presidente do Supremo, rebate ataques do presidente do Senado a juiz que autorizou prisão de policiais legislativos; presidente da Câmara endossa críticas

Ricardo Brito, Isabela Bonfim, Julia Lindner e Isadora Peron – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, reagiu ontem às declara- ções feitas na véspera pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), contra um juiz de primeira instância. A bordoada agravou a crise entre os representantes dos três Poderes deflagrada na sexta-feira passada, quando a Polícia Federal prendeu quatro agentes da Polícia Legislativa. “Onde um juiz for destratado, eu também sou”, disse Cármen Lúcia, em sessão do Conselho Nacional de Justiça pela manhã.

A declaração de Cármen Lúcia ocorreu menos de 24 horas após Renan chamar o juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10.ª Vara Federal de Brasília, que autorizou a ação no Senado, de “juizeco”. Na mesma ocasião, o peemedebista fez críticas duras ao ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, a quem chamou de “chefete de polícia”.

Numa tentativa de contornar a crise, o presidente Michel Temer tentou articular uma reunião para hoje no Palácio do Planalto com Renan, Cármen Lúcia e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). A presidente do STF, no entanto, recusou o convite alegando agenda comprometida. A preocupação do governo é que o embate com Renan possa atrapalhar a votação da agenda econômica no Senado, em especial a PEC do Teto.

Renan também voltou a alfinetar Moraes ao ironizar eventual presença do titular da Justi- ça no encontro articulado por Temer. “Ministro da Justiça? Ele representa qual Poder?”, questionou Renan. “Teria muita dificuldade de participar de qualquer encontro com o ministro da Justiça que protagonizou um espetáculo contra o Legislativo”, completou.

Inadmissível’. Pela manhã, Cármen exigiu respeito dos demais Poderes da República ao Judiciário e disse não ser “admissível que qualquer juiz seja diminuído ou desmoralizado fora dos autos”. “Todas as vezes que um juiz é agredido, eu e cada um de nós juízes é agredido. E não há a menor necessidade de, numa convivência democrática livre e harmônica, haver qualquer tipo de questionamento que não seja nos estreitos limites da constitucionalidade e da legalidade”, afirmou.

Cármen Lúcia destacou ainda que possíveis erros jurisdicionais ou administrativos devem ser questionados “nos meios recursais próprios”.

No fim do dia, após receber em seu gabinete o prefeito eleito de São Paulo, João Doria (PSDB), Renan manteve o tom das críticas, mesmo depois de conversar com Temer e aliados – esses últimos o aconselharam a diminuir a intensidade das reclamações. Ele cutucou a presidente do STF e novamente o ministro da Justiça, embora tenha elogiado a iniciativa de Temer de marcar a reunião.

Renan afirmou que Cármen Lúcia deveria ter feito uma reprimenda diante do fato de um juiz de primeira instância ter determinado uma ordem contra a Casa que comanda. E não retirou as queixas a Vallisney de Souza Oliveira. “Enquanto o juiz de primeiro grau usurpar a prerrogativa do STF, não dá para chamá-lo no aumentativo”, respondeu ele, quando questionado se teria exagerado nos comentários sobre o magistrado.

A queixa de Renan se deveu ao fato de ele considerar que a operação no Senado não poderia ter sido autorizada por um juiz de primeira instância, apenas pelo STF. O peemedebista afirmou ontem que a Advocacia-Geral do Senado iria ao STF questionar a ação, mas o processo ainda não foi protocolado.

Câmara. Renan teve o apoio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com quem se reuniu no início da tarde.

Maia endossou a tese do presidente do Senado segundo a qual o juiz de primeira instância se equivocou ao autorizar a operação no Legislativo e ainda elogiou Renan, que anunciara anteriormente que iria recorrer ao STF contestando a operação.

O presidente da Câmara também disse que o ministro da Justiça errou ao comentar a atua- ção da polícia do Senado. No dia da operação, Moraes – filiado ao PSDB – afirmou que os policiais legislativos “extrapolaram” as suas funções.

“A palavra do ministro de discutir o mérito, se a Polícia Legislativa foi além as suas atribui- ções, acho que isso não caberia a ele. Essa é uma avaliação que o ministro não deveria ter feito”, afirmou Maia.

Embora apoie a iniciativa de Renan de ir ao Supremo, Maia disse que a Câmara não vai endossar institucionalmente a representação. Deputados da base e da oposição chegaram a defender que a Casa deveria entrar como amicus curie da ação, isto é, como parte interessada do processo, para demonstrar que essa também é uma posição dos deputados. Mas, apesar da cobrança dos parlamentares por uma reação firme à ação da PF, conforme café da manhã oferecido por Maia a líderes partidários, o apoio dele a Renan será apenas “verbal”

A preocupação dos deputados é que eventuais “excessos” da PF e do Poder Judiciário também afetem a Casa e, por isso, seria necessária uma posição mais dura também por parte dos deputados. /

Nenhum comentário: