domingo, 23 de outubro de 2016

Economista liberal vira conselheira do socialista Freixo

• Ex-secretária de Eduardo Paes, Eduarda La Rocque foi convencida pelos filhos de 22 e 16 anos a ajudar candidato do PSOL no Rio

Clarissa Thomé - O Estado de S. Paulo

RIO - Economista de linha ortodoxa formada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio), um dos centros do pensamento liberal no Brasil, a ex-secretária municipal de Fazenda do Rio Eduarda La Rocque, de 47 anos, virou uma das principais conselheiras de programa de governo do candidato do PSOL à prefeitura do Rio, Marcelo Freixo. Ex-integrante da equipe de Eduardo Paes (PMDB) em seu primeiro mandato, ela integra a equipe de economistas que adapta o projeto do PSOL à lei orçamentária.

A expectativa é de que a participação de Eduarda na elaboração do programa de governo de Freixo tenha o mesmo efeito da nomeação de Henrique Meirelles para o Banco Central no primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – a meta é acalmar o mercado. “Espero que sim. Estou aqui para isso. Para fazer um governo responsável e de inclusão social”, afirma Eduarda, em entrevista ao Estado.

A aproximação da liberal Eduarda com o socialista Freixo ocorreu por iniciativa da própria economista. Convencida pelos filhos, de 22 e 16 anos, ela procurou o candidato oferecendo ajuda, perto da votação do primeiro turno. “Neste País, o dilema ético versus não ético é mais importante do que o esquerda versus direita. A conversa com Freixo foi muito boa. Ele é pragmático, bem menos dogmático do que eu acreditava”, revela a economista.

Eduarda diz que há pouco espaço para divergências políticas na administração municipal. “Não tem muita firula: tem de cumprir a lei orçamentária, ser o mais eficiente possível. Nisso há um alinhamento total entre direita e esquerda. Na administração municipal não tem de discutir política macroeconômica”, diz.

O Estado apurou que esse ponto é visto como importante no PSOL. O município não emite moeda nem fixa taxa de juros, pontos de divergência entre liberais e socialistas, e a disposição de tratar o dinheiro público com parcimônia é vista como ponto positivo.

A economista diz que conhece bem as “gorduras da prefeitura” do Rio, com sobreposição de secretarias e de políticas públicas. Entre os pontos defendidos pelo grupo de profissionais está a redução no número de secretarias, de 26 para 16, e o aumento da receita sem mexer nos impostos.

“Há um fatiamento de poder absurdo para acomodar os aliados. Dois partidos diferentes disputando o mesmo espaço e as políticas públicas não chegam à ponta”, afirma, ao justificar o corte de secretarias. “Priorizar os gastos não cabe a mim. Vou gerar informação qualificada para a decisão de cúpula, que é dele (do candidato). Vamos maximizar receitas, diminuir despesas, abrir espaço no orçamento”, afirma.

Eduarda está na equipe coordenada pela economista Laura Carvalho, professora da Universidade de São Paulo (USP), que reúne ainda profissionais ligados à PUC e ao Instituto Pereira Passos. “Pessoas de todas as correntes de pensamento”, resume Eduarda.

Carta-compromisso. Esse grupo ajuda a preparar a carta-compromisso que Freixo apresenta amanhã. O documento faz parte da estratégia da campanha para desfazer a imagem de radical de esquerda. Ele deve se comprometer a ter secretariado técnico, sem indicações partidárias, ter austeridade com as contas públicas e manter diálogo aberto com os governos estadual e federal.

A economista começou a carreira em uma área que causa calafrios na esquerda, o mercado financeiro. Seu primeiro emprego foi no banco BBM. Criou um bem sucedido sistema de gestão de riscos, que deu origem à empresa Risk Control, a qual não é mais ligada. Em 2008, atuou na elaboração do plano econômico de Fernando Gabeira, candidato do PV derrotado por Paes. Assumiu a Secretaria de Fazenda.

Segundo a economista, ela e Freixo não negociaram secretaria. O acordo prevê apenas a participação de Eduarda na elaboração da estratégia de gestão e na equipe de transição, caso o candidato seja eleito.

Negociação. Sob sua gestão com Paes, o Rio obteve inédito empréstimo de US$ 1 bilhão no Banco Mundial, o que permitiu reequilibrar as contas da prefeitura, pela redução dos juros pagos pelo município à União. No fim de 2011, as agências internacionais de risco Moody’s e Fisch elevaram as notas do grau de investimento do município. Basearam-se na redução da dívida, que era de 99% das receitas anuais da cidade em 2005, e passou para 65% em 2010.

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