segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Uma promessa do governo que precisa ser cumprida – Editorial / Valor Econômico

Um sinal animador foi dado pelo governo na semana passada. No relatório de avaliação fiscal do quarto bimestre, a equipe econômica assegurou que não vai usar a receita que será obtida com a regularização dos ativos de brasileiros mantidos de forma ilegal no exterior para custear novas despesas. A promessa, que está escrita no documento, é que os recursos serão "direcionados ao fortalecimento do resultado primário do setor público consolidado não financeiro".

Se a promessa for cumprida e se a arrecadação com esse expediente for da dimensão estimada por algumas consultorias e instituições financeiras (que chegam a prever um valor acima de R$ 50 bilhões), o déficit primário nas contas da União neste ano poderá ser bem menor do que os R$ 170,5 bilhões previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

É importante observar que parte significativa dessa receita já foi utilizada. O governo decidiu incorporar, em sua programação financeira deste ano, R$ 6,2 bilhões da expectativa de receita que terá com a chamada "repatriação de ativos no exterior". Fez isso para compensar a frustração da arrecadação de outros tributos federais e evitar um contingenciamento das despesas orçamentárias neste mês.

O dinheiro da "repatriação", embora ainda não tenha ingressado nos cofres do Tesouro, permitiu ao governo aumentar a sua previsão para as despesas obrigatórias em R$ 541,1 milhões. Dos R$ 6,2 bilhões, ele separou apenas R$ 1,18 bilhão para "a recomposição da reserva financeira voltada à absorção de riscos fiscais".

O governo Temer nunca explicitou em sua programação financeira a receita total que espera obter com a "repatriação dos ativos". Esta foi uma boa iniciativa, pois ela é inteiramente imprevisível. A área econômica alegava que usaria a arrecadação para compensar a perda com a renegociação das dívidas dos Estados, nos termos do projeto de lei complementar 257. Com a renegociação, os Estados pagarão menos juros e amortizações de seus débitos à União e, desta forma, farão um resultado primário pior do que aquele que estava previsto inicialmente na LDO. Não foi o que aconteceu até agora.

A promessa de que o dinheiro da "repatriação" não será utilizado para novas despesas, portanto, é apenas para a receita que ultrapassar o montante de R$ 6,2 bilhões que já foi alocado no Orçamento. O que foi feito até agora parece indicar que alguns críticos têm razão, quando dizem que o governo do presidente Michel Temer resiste a cortar gasto. Não há notícias, realmente, de que algum ministro da Esplanada dos Ministérios esteja reclamando por falta de recursos.

Se as consultorias e instituições financeiras que projetam uma forte receita com a "repatriação" estiverem corretas, e uma enxurrada de recursos ingressar nos cofres do Tesouro até o fim de outubro, a ala política do governo poderá ficar tentada a propor ao presidente Temer algumas iniciativas nos moldes daquelas que foram realizadas em passado não muito distante. Esse é o temor que precisa ser desfeito, pois tentativas de "aquecer" a economia com gastos públicos levaram o país ao descalabro em que se encontra atualmente.

O melhor caminho é usar os recursos para reduzir o astronômico déficit primário projetado para este ano e diminuir a atual pressão sobre a poupança privada. Se isso ocorrer, o governo estará ajudando a criar as condições necessárias para a redução da taxa básica de juros (Selic), que é essencial para a retomada da economia. A queda da Selic não poderá acontecer, já indicou o Banco Central, se não houver sinais claros de avanços na implementação de medidas de ajuste fiscal. Uma gastança agora com os recursos da "repatriação" seria um sinal na direção contrária.

Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgados na sexta-feira, mostram que de janeiro a agosto deste ano, foram fechados 651.288 postos de trabalho, o pior resultado desde 2002. Em 12 meses, são 1,656 milhão de vagas perdidas. O desemprego, infelizmente, continua aumentando, penalizando as famílias brasileiras. É urgente portanto, que o governo consiga aprovar e executar medidas que permitam reequilibrar suas contas e colocar o pais, de novo, da trilha do crescimento.

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