quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Campanhas são penosas sem doação de empresas – Editorial / Valor Econômico

As eleições municipais deste ano serão as primeiras e possivelmente as últimas a não contar com a permissão legal de doação das empresas. Perto da bonança anterior, o meio milhão de candidatos a vereador e prefeito vivem em situação de penúria, atenuada por R$ 881 milhões de reais despejados pelo Fundo Partidário (até 8 de setembro). Há uma articulação entre os partidos no Congresso para que tudo volte ao que era antes. Sem as empresas no jogo eleitoral houve 34% de doações suspeitas, segundo o Tribunal de Contas da União. O caixa dois, recursos não declarados que abastecem campanhas, poderão ser punidos com mais rigor, em uma manobra multipartidária no Congresso cujo objetivo de fato é anistiar dinheiro indevido rastreado pela Operação Lava-Jato.

Seria de esperar que os partidos coletassem com atividades próprias recursos suficientes para os testes nas urnas, mas no Brasil a atividade eleitoral é também estatizada. Com exceção do PT, o único partido ideológico que tem a preocupação de se financiar com atividades regulares, a maior parte dos outros 27 com representação no Congresso simplesmente aguarda os recursos que lhe serão repassados dos contribuintes. O fundo partidário provém de dotação orçamentária da União, e pelo menos 5% de suas verbas são divididas igualmente entre as legendas, o que por si só torna atrativo montar uma sigla de aluguel e ir buscar o dinheiro.

Sem as verbas das pessoas jurídicas, que estão inquietas com a extensão e a eficiência da Operação Lava-Jato, e com o sumiço dos grandes contribuintes de campanhas, as maiores construtoras, as verbas do fundo partidário se revelaram claramente insuficientes. Paradoxalmente, o número de candidatos por vaga disputada aumentou, pelos incentivos que a proibição de contribuição empresarial deram. Há vantagem competitiva dos candidatos com maior patrimônio pessoal, dos veteranos das máquinas partidárias, de quem se destacou fora de atividades políticas, como artistas, radialistas, jogadores de futebol ou de grupos religiosos, como os evangélicos.

Como a tradição dos partidos não é a de garimpar meios junto a potenciais participantes, a disposição dos eleitores em doá-los também não encontra qualquer amparo nos "serviços prestados" pelos partidos. Seu prestígio, e o da política em geral, que já era baixo, sofreu mais um rude golpe com as investigações da Lava-Jato. No primeiro levantamento feito pelo Tribunal Superior Eleitoral, em 5 de setembro, 47,6%, ou quase metade, dos recursos para bancar campanhas eram dos próprios candidatos. No caso dos vereadores, a cifra subia a 54,6%. Do total disponível, 18,2% vinham dos partidos e 33,3% de pessoas físicas. Dos 144 milhões de eleitores que vão às urnas em 5.568 municípios, os doadores somavam em agosto 114.526 brasileiros - com 38.985 suspeitos de contribuição irregular.

A maior parte das legendas têm quase nada a oferecer fora a despolitização que tem servido como ração episódica a seus eleitores. Esses, por seu lado, pouco esperam deles. Parte significativa dos 1.627 municípios criados após a Constituição de 1988 tem verbas para pagar os gastos do prefeito, da Câmara municipal e pouco mais. No geral, 70% dos municípios dependem de verbas dos fundos de participação (repasses estaduais e federais) para suprir 80% de seus gastos. E 60% deles estão perto de estourar o teto de despesas de pessoal fixado pela lei. De 2005 a 2015, o número de funcionários municipais cresceu 34%.

Como parte dos recursos fáceis e garantidos desapareceu, o sistema eleitoral se inclinou para o lado da máquina partidária ou de outsiders. Legendas minoritárias, que defendem programas, conseguem até avançar diante das adversidades, porque esse sempre foi o meio no qual se moveram - caso do Psol em Porto Alegre, e da Rede. Há lógica em que, se a proibição de doação de empresas se mantiver, partidos passem a defender a lista fechada, como o faz o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Se não haverá mais dinheiro para o bazar geral de candidaturas, o recurso escasso vai para quem o partido mandar.

A proposta é péssima e só responde ao fato de não haver mais como bancar partidos de papel. Doações pela internet, que nutrem as campanhas modernas, arrecadaram no país até o fim de agosto 0,1% do total. Para a maioria dos cidadãos, os candidatos não valem um tostão.

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