quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Gilmar e Janot entram em atrito

Procurador-geral da República, Rodrigo Janot nega que MP tenha vazado informações contra o ministro do Supremo Dias Toffoli; a acusação fora feita pelo ministro Gilmar Mendes, que falou em “abuso de autoridade”

Referência a ministro do STF causa atrito entre Gilmar e Janot

• Procurador-geral nega que MPF tenha sido responsável por vazamento de acordo de delação

Jailton de Carvalho e Carolina Brígido - O Globo

-BRASÍLIA- A divulgação de suposta proposta de delação do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro citando o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), provocou ontem um confronto verbal entre o ministro Gilmar Mendes e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Em entrevista à tarde, Gilmar Mendes acusou o Ministério Público de ter vazado trechos do pré-acordo de delação de Pinheiro na Operação LavaJato com o objetivo de constranger Toffoli, e cobrou a punição dos responsáveis. Segundo a revista “Veja” desta semana, em um dos anexos do pré-acordo de colaboração, o presidente da OAS teria citado Toffoli.


Em resposta, Janot negou a existência do anexo mencionado pela revista e disse que não houve nas tratativas com Pinheiro referência a Toffoli ou qualquer outro ministro do STF. O procurador-geral ainda classificou de “estelionato delacional” o vazamento de acusações que disse serem inexistentes contra o ministro. Para o procurador, as críticas exacerbadas ao Ministério Público são uma cortina de fumaça para obscurecer a Lava-Jato, uma situação parecida com o movimento que tentou desvirtuar a Operação Mãos Limpas na Itália.

A divulgação das supostas acusações a Toffoli levou Janot a pôr fim nas negociações entre o Ministério Público e Pinheiro, como revelou O GLOBO na segunda-feira. Gilmar acusou procuradores de mirarem em Toffoli.

— No caso do Toffoli, é evidente. Ele deu duas decisões, uma do fatiamento, outra do Paulo Bernardo. É natural que queiram acertar (o ministro). Houve manifestações críticas dos procuradores. Isso já mostra atitude deletéria. Autoridade não reage com o fígado, não reage com informações à sua disposição. Quem faz isso está abusando da autoridade — afirmou Gilmar.

Para ele, o país vive um momento de abuso de autoridade também por parte da Polícia Federal. A notícia da delação prejudica a imagem do STF, disse Gilmar, e foi tramada por pessoas que têm interesse em enfraquecer o papel do tribunal.

— Você não combate o crime cometendo crime. Ninguém pode se entusiasmar, se achar o ó do borogodó, porque vocês (jornalistas) dão atenção a eles. Cada um vai ter o seu tamanho no final da história. Então, um pouco mais de modéstia. Calcem as sandálias da humildade. O país é muito maior do que essas figuras eventuais e cada qual assume sua responsabilidade. De vez em quando se tem esse tipo de situação. Depois, esses falsos heróis vão encher o cemitério. A vida continua. Mas vocês (jornalistas) se entusiasmam com eles. Vocês são adictos, um tipo de dependentes de notícia. Assim como alguém depende de drogas, vocês são dependentes de notícias.

Depois, num discurso no Conselho Nacional do Ministério Público, Janot não citou o nome de Gilmar Mendes, mas rebateu cada uma das acusações e repetiu até palavras usadas por ele.

— Reafirmo que não houve, nas negociações de colaboração dessa empreiteira, nenhuma referência, nenhum anexo, nenhum fato enviado ao Ministério Público que envolvesse essa alta autoridade do Judiciário (Toffoli). Na minha humilde opinião, trata-se de um quase estelionato delacional em que inventa-se um fato, divulga-se o fato para que haja pressão ao Ministério Público para aceitar, desta ou daquela maneira, eventual acordo de colaboração — afirmou Janot. — Não é possível que estejamos todos envolvidos nessa conspiração para o mal. Nessa conspiração que tem levado pessoas ao cemitério.

Janot afirmou que decidiu encerrar as negociações com a OAS não porque houve vazamento de informação, mas sim por quebra de confiança. Segundo ele, não poderia haver vazamento de informação de anexo inexistente.

— Nenhum fato ou nenhum anexo, encaminhando ou insinuando a participação de um alto magistrado chegou, por qualquer forma, ao Ministério Público. Se você não tem a informação, não tem o acesso, você vaza o quê? Você vaza o nada, aquilo que você não tem. Não vaza.

O ministro Luiz Fux, do STF, minimizou o conteúdo da delação divulgada pela “Veja”:

— O conteúdo da delação não compromete nem o ministro Dias Toffoli, nem o STF.

Toffoli não quis comentar. O presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, também silenciou sobre o assunto. Gilmar criticou ainda uma das dez medidas propostas pelo Ministério Público contra a corrupção: a que permite que provas colhidas de forma ilícita sejam usadas em investigações, depois que ponderados os interesses em jogo. O ministro disse que quem faz uma proposta dessa sofre de “cretinismo”.

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