domingo, 31 de julho de 2016

Passeio olímpico - Míriam Leitão

- O Globo

Na tarde de sexta-feira, ouviam-se gritos na Vila Olímpica. Eram os atletas da Nova Zelândia em sua cerimônia de chegada. Em uma das ruas, uma delegação com roupa verde e amarela se reunia para ouvir instruções. Eram os atletas da África do Sul. Já era possível escutar os mais diversos idiomas sendo falados pelas ruas do bairro que tanta polêmica provocou nos últimos dias.

No domingo, todas as delegações estarão na Vila e será o ensaio geral, em sigilo, da cerimônia de abertura. No dia mesmo da abertura, 700 ônibus sairão da Vila Olímpica com os atletas para o Maracanã. Quase 50 mil militares, policiais e integrantes da Força Nacional patrulham a cidade, que normalmente conta apenas com 7.000 policiais. Todos os números são grandiosos. Com o noticiário ocupado pelas falhas, gafes e medos, fica empanado o brilho do que está dando certo.

O prefeito Eduardo Paes diz que o orçamento da festa ficou mais baixo do que o inicialmente previsto e que, dos R$ 39 bilhões, apenas R$ 7 bilhões foram gastos com obras exclusivas do evento, o resto foi investido em legado para a cidade:

— Assumimos 17 compromissos olímpicos e cumprimos 27. Houve várias melhorias como a Transoeste, o Porto Maravilha, o VLT, os piscinões da Praça da Bandeira que não eram compromissos. O que gastamos para fazer arenas dos jogos, que não seriam feitas se não fosse a Olimpíada, foram R$ 732 milhões, e o que eu gastei no mesmo período em saúde e educação no período foram R$ 65 bilhões.

O prefeito vai recitando os números, e mostrando as obras, enquanto andamos por algumas horas pelo parque e pelas ruas do Rio na sexta-feira. Tudo pronto nas enormes arenas dos jogos. Havia trabalhadores dando os últimos retoques de decoração, o cabeamento feito para as transmissões, voluntários e militares circulando, os atletas chegando e os últimos teste de estresse elétrico nos locais das disputas.

Paes defende a tese de que foi feito tanto nos últimos anos que nem houve tempo para se entender a dimensão do legado da Olimpíada. Mas o que não foi feito é uma enorme decepção, como a limpeza da Baía de Guanabara, um dos compromissos do governo do estado, ou da Lagoa de Jacarepaguá, onde quase nada aconteceu.

— Não acredito quando dizem que não há legado. Como não há? Na Zona Oeste havia, em 2011, 5% do esgoto tratado, hoje há 55%, e em Deodoro está chegando a 100%. Tiramos o lixão de Gramacho, quatro anos antes. Mas acabou não se aproveitando a oportunidade para resolver uma angústia de todos nós sobre a Baía de Guanabara. O fato de você não ter um legado não significa que você não tenha todos os legados. Em mobilidade, são 150 km de BRTs; 28 km de VLT; 18 km de metrô; 16 km de túnel. A Transolímpica era a Linha Azul do plano original do governo Lacerda, a Transcarioca era a Linha Marrom, a Transoeste era a Linha Verde. Demorou cinco décadas para fazer a Linha Vermelha e a Linha Amarela. E fizemos outras três linhas em sete anos. Como não há legado?

A Transolímpica está pronta, mas só será aberta ao público no dia 22 de agosto. Com ela, encurta-se a menos da metade o tempo entre Barra e Deodoro. Ao atravessá-la é possível ver o Maciço da Pedra Branca, por um ângulo que não era visto antes. O Centro do Rio teve uma mudança visível. A retirada da Perimetral deu maior visibilidade aos prédios históricos e um túnel liga agora a Rodoviária ao Santos Dumont. O Museu do Amanhã já é um sucesso com pouco tempo de funcionamento.

Quem circula pelo Rio constata o legado que a Olimpíada já deixou. Há o medo de que as enormes arenas dos jogos virem elefantes brancos. O prefeito garante que não. Uma parte será desmontada já com uso previsto. A enorme piscina para as disputas de natação virará oito piscinas em escolas. Uma das arenas será escola, outra, local de treinamento de atletas e uma terceira, centro de convenções.

A Olimpíada começa na próxima sexta-feira, no pior momento do humor nacional. O país vive recessão, crise política, impeachment e denúncias de corrupção. Quem anda pelo Parque Olímpico acaba contaminado pela esperança de que, apesar de todos os problemas, o Rio consiga fazer uma bela festa.

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