segunda-feira, 18 de abril de 2016

Nova onda de instabilidade deve marcar saída de Dilma – Editorial / Valor Econômico

A aceitação do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff pela Câmara dos Deputados deve por fim à era de governos petistas e abrir um período de grande instabilidade política. Michel Temer assumirá a Presidência com um baixo cacife, alta impopularidade e a ameaça de destituição pelo Tribunal Superior Eleitoral. A ingovernável base governista bandeou-se quase inteira para o lado do PMDB, que terá agora de contentar um caminhão de interesses fisiológicos - os próprios e os dos aliados. Câmara dos Deputados e Senado poderão em breve ter novos comandos: Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Renan Calheiros (PMDB-AL) logo terão de acertar suas pesadas contas com a Justiça.

Sem o desastre econômico que provocou, a presidente Dilma não teria chance de ser afastada do poder. Depois de arruinar a economia, tornou-se incapaz de governar e de obter qualquer coisa relevante no Congresso, por suas ideias e seu estilo. A impopularidade de Dilma nutriu a rebeldia dos partidos aliados, incomodados com a maior recessão em quase um século - um feito notável da presidente.

Dilma distanciou-se do modelo bem-sucedido do primeiro mandato de Lula para adotar o ultrapassado figurino econômico dos anos 70, o do Estado intervencionista, criador dos negócios. Sem ter como custear bilhões de reais em subsídios e desonerações, fez uma gestão temerária das finanças públicas. A nova matriz econômica, que de fato era velha, destruiu a economia: provocou um rombo nas contas públicas, fez a inflação disparar, afundou a indústria e corroeu os ganhos sociais obtidos com mérito e esforço no passado.

As "pedaladas fiscais" tornaram-se o símbolo de tudo o que deu errado e o pretexto para o pedido de impeachment. O pano de fundo foi o escândalo da Petrobras, um dos maiores da história, no qual o PT teve destaque em meio à a maior rede de corrupção até hoje desvendada pela Justiça. Vários partidos se aliaram às maiores empreiteiras do país para receber propinas a partir de obras públicas superfaturadas.

Dilma mostrou-se incapaz de recuperar a economia. Nunca reconheceu ter cometido os erros decorrentes da "nova matriz". A guinada em direção à austeridade, com Joaquim Levy, deu-lhe algum lento, mas teve vida breve porque nunca foi autêntica. Pior: Dilma inclinou-se para reeditar os truques que não deram certo, com risco de agravar a crise.

A gestão política de Dilma foi outra calamidade. Operou em 2014 para afastar simultaneamente o PMDB e a turma de Lula do governo, colhendo Eduardo Cunha no comando da Câmara, um passo retrospectivamente fatal. Os aprendizes de feiticeiro do núcleo palaciano ajudaram a cavar o fosso entre o Planalto e o Congresso. O temperamento de Dilma, avesso à negociação política e mais inclinado a dar ordens do que a ouvir conselhos e pontos de vista contrários, foi ingrediente vital da receita que levou seu governo a um beco sem saída.

Michel Temer, do qual não se ouviu argumentos discordantes até o início do segundo mandato, só desperta alguma esperança porque a continuidade do governo Dilma não traz nenhuma. O principal problema do país é fiscal e governos pemedebistas são gastadores. Federação de interesses, o partido nunca teve o menor apreço pelo equilíbrio fiscal. Agora atrairá parceiros com atitudes semelhantes.

Uma das mais cruéis ironias da história é que os deputados que votaram as irresponsáveis pautas bombas, inclusive o PSDB, deram passo decisivo para derrubar Dilma por ela não ter respeitado regras de responsabilidade fiscal. A outra é que "delinquentes" como Cunha, na linguagem do Procurador da República, encabeçaram seu afastamento do poder.

Temer terá de coordenar interesses menores, dispersos por partidos anódinos, para tentar tirar o país de grave crise política e econômica. Contemporizar, como fez a vida inteira, pode ser uma virtude, mas é pouco diante do que a situação requer. Ele terá de dar um choque de expectativas, com medidas que comecem a preparar a economia para dias melhores. Não tem muito tempo e as circunstâncias exigem que não tenha ambições políticas maiores.

De substantivo, nada se sabe sobre o que pensa ou o que quer de fato realizar. Não parte de uma posição de força e terá de ganhar apoio político ao longo de um caminho acidentado, com aliados que já traíram um governo.

O futuro é mesmo imprevisível.

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