quinta-feira, 17 de março de 2016

Diálogos mostram tentativa de controle da Justiça, diz juiz

• Sérgio Moro remeteu conteúdo que investiga ex-presidente ao STF após petista ter sido nomeado novo ministro

Ricardo Brandt, Julia Affonso e Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo

O juiz federal Sérgio Moro, que conduz a Lava Jato na 1.ªinstânciada Justiça, remeteu o conteúdo referente ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na operação para o Supremo Tribunal Federal após ele ter sido nomeado ministro da Casa Civil ontem. “A interceptação (telefônica) foi interrompida”, diz o juiz sobre o monitoramento telefônico (grampo) do petista. Segundo o magistrado, o conteúdo das interceptações mostra que Lula tentou influenciar o Ministério Público e o Judiciário. “Observo que, em alguns diálogos, fala-se, aparentemente, em tentar influenciar ou obter auxílio de autoridades do Ministério Público ou da Magistratura em favor do ex-presidente”, afirma Moro.

Ele pondera, no entanto, que “não há nenhum indício nos diálogos ou fora deles de que estes citados teriam de fato procedido de forma inapropriada e, em alguns casos, nem sequer há informação se a intenção em influenciar ou obter intervenção chegou a ser efetivada”. Um dos casos citados envolve uma ministra do STF. “Há, aparentemente, referência à obtenção de alguma influência de caráter desconhecido junto à exma. ministra Rosa Weber do Supremo Tribunal Federal, provavelmente para obtenção de decisão favorável ao ex-presidente na ACO 2822, mas a eminente magistrada, além de conhecida por sua extrema honradez e retidão, denegou os pleitos da defesa do ex-presidente.” “É até importante você falar com a Dilma. Eu acho que eles fizeram antecipar um pedido nosso que está na Suprema Corte, que está na mão da Rosa Weber”, diz Lula, em conversa com Jaques Wagner. “Entendi”, responde ele. “Eles estão tentando antecipar. Como eles ficaram com medo que a Rosa fosse dar, eles estão tentando antecipar tudo isso, porque ela poderia tirar isso da Lava Jato. O Moro fez o espetáculo para comprometer a Suprema Corte”, prossegue Lula. Em outro ponto do mesmo diálogo, Lula diz: “Você viu, querido, ela está falando dessa reunião. Ô, Wagner, eu queria que você viesse agora, falar com ela, já que ela está aí, falar o negócio da Rosa Weber. Está na mão dela para decidir. Se homem não tem saco, quem sabe uma mulher corajosa possa...”“Combinado, valeu, querido”, diz Wagner.

‘Intervenção’. Há citação ao presidente do STF, Ricardo Lewandowski. “De igual forma, há diálogo que sugere tentativa de se obter alguma intervenção do Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski contra imaginária prisão do ex-presidente, mas sequer o interlocutor logrou obter do referido magistrado qualquer acesso nesse sentido. Igualmente, a referência ao recém nomeado Ministro da Justiça Eugênio Aragão (‘parece nosso amigo’) está acompanhada de reclamação de que este não teria prestado qualquer auxílio.” Moro destaca que fez essas referências apenas “para deixar claro que as aparentes declarações pelos interlocutores em obter auxílio ou influenciar membro do Ministério Público ou da Magistratura não significa que esses últimos tenham qualquer participação nos ilícitos, o contrário transparecendo dos diálogos. Isso, contudo, não torna menos reprovável a intenção ou as tentativas de solicitação”.

O juiz levantou sigilo sobre os áudios. “Apesar de existirem diálogos do ex-presidente com autoridades com foro privilegiado, somente o terminal utilizado pelo ex-presidente foi interceptado e jamais os das autoridades com foro privilegiado, colhidos fortuitamente.” Ele remeteu a parte referente a Lula ao STF. “Diante da notícia divulgada na presente data de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria aceito convite para ocupar o cargo de ministro da Casa Civil, deve o feito, com os conexos, ser remetido, após a posse, aparentemente marcada para a próxima terça-feira, quando efetivamente adquire o foro privilegiado, ao Egrégio Supremo Tribunal Federal.”

Moro registra que Lula sabia ou desconfiava que era monitorado. “Pelo teor dos diálogos degravados, constata-se que o ex-presidente já sabia ou pelo menos desconfiava de que estaria sendo interceptado pela Polícia Federal, comprometendo a espontaneidade e a credibilidade de diversos dos diálogos.” O juiz registra que “alguns diálogos sugerem que tinha conhecimento antecipado das buscas efetivadas em 4 de mar- çode2016”. Nesse dia, o ex-presidente foi alvo da Operação Aletheia e levado coercitivamente para depor. Sua casa e a dos filhos passaram por buscas. /

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