quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Luiz Carlos Azedo: O dever de casa

• Quando se procura uma explicação para as razões pelas quais os empresários temem investir e os consumidores evitam gastar, a resposta é óbvia: falta de confiança

- Correio Braziliense

Um velho jargão político diz que o sujeito que entra numa reunião sem saber a ordem do dia dela sairá derrotado, a não ser que de fato concorde com quem convocou o encontro. É mais ou menos o que vai acontecer hoje no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social: os 90 integrantes, todos nomeados pela presidente Dilma Rousseff, não sabem o que vão discutir. Desconfia-se que o governo quer convencê-los de que o problema do ajuste fiscal será resolvido se apoiarem a volta da CPMF, o antigo imposto do cheque, que o Planalto quer aprovar no Congresso neste começo do ano, goela abaixo da sociedade.

Por ironia, essa intenção da presidente Dilma Rousseff põe em debate uma questão crucial para o futuro do país. É possível sair da crise com gastos excessivos, impostos demais e um governo obeso, perdulário e moribundo? Há muitas razões para a crise de confiança que inibe tanto os investimentos como o consumo, mas essa é a questão central, para onde quer que se olhe, seja para a situação dos hospitais, o zika vírus e a epidemia de microcefalia ou para a Operação Lava-Jato e a volatilização da exploração do pré-sal. O cenário é um só: obesidade, excesso de gastos e agonia nos órgãos e serviços oficiais.

O Conselhão deveria indagar: como cortar gastos e impostos e diminuir o papel do governo na economia? Nove entre 10 empresários que participam da reunião apoiariam essa discussão. Acontece que a presidente Dilma Rousseff trafega na contramão, haja vista o deficit fiscal de R$ 170 bilhões de 2015. E pretende anunciar linhas de crédito em torno de R$ 50 bilhões por meio de bancos públicos para setores como construção civil, exportador, bens de capital e micro e pequenas empresas. A maioria dos analistas acredita que o problema é outro: falta de demanda.

Quando se procura uma explicação para as razões pelas quais os empresários temem investir e os consumidores evitam gastar, a resposta é óbvia: falta de confiança. Ninguém sabe o que vai acontecer com o país. Naturalmente, o fracasso econômico do governo Dilma, o mais intervencionista no mercado desde Geisel, a crise ética desnudada pela Operação Lava-Jato e a desestruturação da base do governo no Congresso explicam essa desconfiança. O problema é que não dá para esperar 2018, quando termina o mandato de Dilma, para voltar a investir ou comprar.

É mais provável até que isso aconteça, mas será uma travessia no deserto. Gregos e baianos concordam que é preciso fazer alguma coisa. A oposição tentará apear Dilma do poder por meio do impeachment, mas sonha com uma decisão da Justiça Eleitoral que casse seu mandato e convoque novas eleições. Os governistas, que acusam a oposição de golpista, porém, também não estão satisfeitos com a situação. O PT, o PDT e o PCdoB propõem a radicalização do modelo de capitalismo de Estado, aumentando ainda mais o seu peso na economia, seja pela arrecadação tributária, seja pelo fomento de atividades econômicas. O PMDB e demais partidos da coalizão governista resistem à aprovação da CPMF e outros impostos, mas também não querem cortar na própria carne. Enquanto o governo não se entende, a inflação sobe e o desemprego aumenta.

Um bom exercício para o Conselhão seria avaliar a qualidade dos gastos feitos pelo governo nas mais diversas áreas. Na execução de obras e contratação de serviços, os malfeitos estão todos os dias nos jornais. Mas o descalabro maior é registrado na execução das políticas públicas, na saúde, na educação, na segurança pública, nos transportes. Quem sabe o Conselhão não cobra do governo um mapa da relação entre o custo das atividades-meio e o dos serviços efetivamente prestados à população. Esse é o busílis.

Ricos e funcionários
Voltando ao tema da nova legislação sobre financiamento de campanha abordado na coluna intitulada Caixa dois e pé no barro, as regras para financiamento privado da campanha eleitoral limitam as doações de pessoas físicas a 10% da renda bruta auferida no ano anterior, de acordo com a declaração do Imposto de Renda. Esse percentual não se aplica aos candidatos, que poderão usar todo o patrimônio para financiar a sua própria eleição. Na legislação anterior, isso era limitado a 50%.

Esse modelo favorece os candidatos ricos, com grande volume de bens e rendas declarados no IR. Como os servidores públicos comissionados não estão impedidos de fazer doações e têm interesse em manter os respectivos cargos de confiança, serão os principais doadores dos candidatos governistas. Donos de empresas prestadoras de serviços também não estão impedidos de fazer doações legais, desde que tenham declarado os dividendos recebidos das respectivas empresas.

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