domingo, 31 de janeiro de 2016

Elio Gaspari: A lâmina do STF e os réus da Lava Jato

- O Globo

Má notícia para quem torce contra a Lava Jato. A faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio concluiu uma pesquisa sobre o desempenho do Ministério Público em suas causas junto ao Supremo Tribunal Federal e concluiu: "Nos processos da Operação Lava Jato, que tanta atenção têm recebido recentemente, o Supremo dificilmente reverteria uma decisão desfavorável aos réus emitida pelo TRF-4. Em 2013, as chances de isso ocorrer eram de 1%".

Essa é a taxa de reversão pelo STF de decisões vindas do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que cobre Curitiba, em processos abertos pelo MP. Quem conhece o STF arrisca dizer que, de 2013 até hoje, essas chances encolheram. Nunca se deve esquecer de que, em setembro, a ministra Carmen Lúcia assume a presidência da corte.

Assinada pelos professores Joaquim Falcão, Alexandre de Moraes e Ivar Hartmann, a pesquisa da FGV levou um ano para ser concluída. Isolou 40,6 mil processos originados pelo Ministério Público Federal e pelos estaduais que tramitaram entre 1988 e 2013, fechando o foco no desfecho das ações.

A pesquisa mostra um Ministério Público mais atuante, com taxas de sucesso superiores à da média das outras partes. O campeão é o MP de Santa Catarina. Ganha em 38% dos casos e perde apenas em 1,8%. Nos grandes números, a lanterna ficou com o MP do Maranhão, com 4,5% de sucessos e 12,7% de derrotas. (Essas percentagens não somam 100% porque se referem a universos diferentes.)

Reapareceu 'Silvinho', um personagem do mensalão
A defesa do comissário José Dirceu soltou uma informação de aparência banal: quem nomeou Renato Duque para uma diretoria da Petrobras não foi ele, mas Silvio Pereira, o "Silvinho", secretário-geral do PT até 2005. No seu depoimento na sexta-feira, Dirceu limitou-se a dizer que não indicou Duque, sem citar "Silvinho".

"Silvinho" não era um petista qualquer. A primeira sede do partido, em Osasco, funcionou nos fundos da lanchonete Cebolinha, de sua família. Em 2003, ele coordenava a distribuição de cargos para o partido, com a ajuda de 130 cadernos e blocos. É plausível que o nome de Duque tenha passado por "Silvinho".

Nessa época, o PT ajudava a manutenção de alguns de seus quadros do novo governo. Nada a ver com a máquina distributivista do mensalão, cuidava-se apenas do Executivo. Uma pessoa que viu um dos cadernos de "Silvinho" chamou-o de "gibi".

Em 2005, quando a palavra "mensalão" entrou no léxico nacional, Silvio Pereira formou com José Dirceu e o tesoureiro Delúbio Soares a trindade do poder petista acusado de corrupção. Ele submergiu, mas meses depois a empresa de engenharia GDK, fornecedora da Petrobras, reconheceu ter dado a "Silvinho" um jipe Land Rover. (Ele devolveu o carro, quanto à GDK, conseguiu 19 novos contratos com a Petrobras e reapareceu dez anos depois na Lava Jato.)

"Silvinho" deixou o partido e em 2008 fez um acordo com a Procuradoria-Geral da República, aceitando cumprir 750 horas de serviços comunitários. José Dirceu e Delúbio não fizeram acordo, um tomou uma sentença de sete anos e o outro, de seis.

Paga a conta, "Silvinho" voltou para Osasco, fez um curso de gastronomia e voltou ao restaurante da família, o Tia Lela, localizado em frente à prefeitura.

Apesar de Silvinho ter dito que "há cem Marcos Valérios atrás do Marcos Valério", as investigações do mensalão deram pouca importância à conexão Petrobras e sua rede de fornecedores. Veio a Lava Jato e deu no que deu. É possível que o Ministério Público se interesse em ouvir de novo Marcos Valério. O sinal dado pela defesa de José Dirceu sugere que talvez valha a pena conversar com Silvio Pereira.

Um jabuti à solta
Realizou-se na manhã de terça (26) uma reunião na Casa Civil. Diretores da Agência Nacional de Saúde Suplementar receberam ordens para retomar as análises e estudos no sentido de liberar os reajustes dos planos de saúde individuais.

Se essa velha aspiração de amigos do palácio for em frente, acertará o bolso de 10 milhões de pessoas.

Fazer isso numa hora em que há gente perdendo o emprego e o plano de saúde da empresa é, no mínimo, uma covardia.

Vale tudo
Na busca de uma blindagem que a proteja da deposição, a doutora Dilma liberou sua tropa para atacar a área cultural do governo, que de certa maneira era respeitada.

O perigo da orla
Apartamento de político em lugar visível, sobretudo quando fica de frente para o mar, tem mau-olhado. Talvez Lula não soubesse disso quando se enamorou do tríplex em Guarujá, onde achou boa ideia instalar um elevador interno.

Juscelino Kubitschek comeu o pão que o Tinhoso amassou porque comprou um apartamento na avenida Vieira Souto.

Carlos Lacerda, por muito menos, pois construiu um novo andar no seu, na praia do Flamengo, para instalar a biblioteca. Com a obra, seu edifício ficou com a mesma altura do prédio vizinho, mas não adiantou muito.

Tancredo Neves e Magalhães Pinto, chefes de partidos rivais, foram para o edifício Rio das Velhas na avenida Atlântica. Os adversários, o que significa dizer, todo mundo, chamavam-no de "São Dimas", o bom ladrão crucificado no Calvário.

(A pedido de sua mulher, Magalhães conseguiu que o Rio das Velhas mudasse de nome.)

Israel
O governo israelense resignou-se e já entendeu que Dani Dayan não terá o beneplácito do Itamaraty para assumir a embaixada no Brasil.

A doutora Dilma está sendo gentil. Depois de ele ter dito que o governo israelense devia reagir ao silêncio brasileiro "segurando o touro pelos chifres", a indicação devia ser simplesmente recusada.

É nisso que dá preencher embaixadas no exterior olhando para arranjos de política interna. Dayan é um empresário, militante de causas radicais em seu país.

Dakota
Para quem gosta de ler bobagens, está na rede o livro "Life at the Dakota" (A Vida no Dakota - O endereço mais esquisito de Nova York").

Conta a história do edifício onde foi filmado "O Bebê de Rosemary" e em cuja entrada morreu o morador John Lennon. Nele habitaram pelo menos dois fantasmas, os elevadores andavam sozinhos e objetos moviam-se por conta própria. Para piorar, um de seus moradores foi o ator Boris Karloff, o grande vampiro de filmes de terror.

Erguido em 1884 na banda errada da cidade numa época em que morar em edifício era coisa de gente sem classe, em 1960 todo o prédio foi comprado por US$ 4,6 milhões, vindo junto um terreno adjacente que valeu US$ 2 milhões. Um avaliador contratado por um banco estimou que os terrenos valiam US$ 3,8 milhões. Quanto ao prédio, zero. Nessa época, a atriz Lauren Bacall comprou seu apartamento de três salas e três quartos por US$ 48 mil. Ele foi vendido em julho passado por US$ 23,5 milhões.
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