quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Opinião do dia: Dora Kramer

O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, ardoroso defensor da manutenção do mandato da presidente, fundamenta assim sua posição: “O poder se ganha disputando eleição”. Refere-se, evidentemente, a regimes democráticos.

Democracia esta que prevê – no caso brasileiro, com clareza constitucional meridiana – a perda de poder para os que, uma vez ganhas as eleições, não governam dentro dos preceitos legais indispensáveis ao exercício da função.

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Dora Kramer, jornalista, ‘Ligações tenebrosas’, O Estado de S. Paulo, 16/12/2015.

PF faz busca na casa de Cunha; ação mira PMDB e agrava crise

Ação da PF mira Cunha e ministros do PMDB

• Sete autoridades com foro privilegiado estão entre os alvos da Operação Catilinárias, que cumpriu mandados de busca e apreensão

Andreza Matais, Beatriz Bulla e Julia Affonso - O Estado de S. Paulo

A Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão nesta terça-feira, 15, em Brasília e outros sete Estados que tinham como alvos políticos do PMDB, entre eles o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), e os ministros Celso Pansera (Ciência e Tecnologia) e Henrique Eduardo Alves (Turismo). A ação, que fez parte da Operação Lava Jato, foi solicitada pela Procuradoria-Geral da República e PF e autorizada pelo Supremo Tribunal Federal.

Como resultado imediato, a turbulência política e a relação entre os Poderes ficaram ainda mais crispadas e incertas em Brasília, com acusações de direcionamento da operação para atingir – ou excluir – peças centrais na continuidade dos processos de impeachment da presidente Dilma Rousseff e de cassação de Eduardo Cunha. Apesar de a Procuradoria ter pedido busca e apreensão de dados relativos ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o Supremo não autorizou.

Renan, com apoio do Planalto, pleiteia que o Senado dê a palavra final no rito do impeachment. O senador, no entanto, também teve aliados atingidos pela operação desta terça-feira, denominada Catilinárias. O principal deles foi Sérgio Machado, ex-diretor da Transpetro, subsidiária da Petrobrás. Poucas horas após a PF ter realizado as buscas na casa de Cunha, que teve até celulares apreendidos, o Conselho de Ética deu prosseguimento ao pedido de cassação do presidente da Câmara.

Autoridades. Sete autoridades com prerrogativa de foro privilegiado – três deputados, dois senadores e dois ministros –, que só podem ser investigadas perante o STF, estavam entre os alvos da mais recente fase da Operação Lava Jato, batizada de Catilinárias.

A ação é decorrente das investigações da Lava Jato, que corre na Justiça Federal no Paraná e no Supremo, em Brasília, e apura esquema de corrupção na Petrobrás e em outras áreas do governo. Não houve prisões.

A PGR é autora dos pedidos contra Cunha e Renan (este foi negado). A PF solicitou os mandados relativos aos demais envolvidos.

Cunha foi o principal alvo da operação. Ele é foco de um novo inquérito no STF no qual é suspeito de usar o cargo para tirar proveito pessoal – como ganhar valores indevidos com a barganha através da apresentação de requerimentos e emendas a medidas provisórias – e obstruir as investigações da Operação Lava Jato. Se confirmadas, as suspeitas podem gerar o afastamento de Cunha do cargo.

A PF fez buscas em imóveis de Fábio Cleto, ex-vice-presidente da Caixa; do prefeito de Nova Iguaçu, Nelson Bornier (PMDB-RJ), e de Altair Alves Pinto. Os três são aliados de Cunha. Altair é citado na Lava Jato como emissário de propinas para o presidente da Câmara. Nas investigações, os aliados do peemedebista – o que inclui os dois ministros alvo da operação – são suspeitos de auxiliar Cunha em manobras realizadas no Congresso.

Outros políticos. Também tiveram seus endereços vasculhados os senadores Edison Lobão (PMDB-MA), ex-ministro de Minas e Energia, e Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), ex-titular da Integração Nacional. E ainda os deputados federais Aníbal Gomes (PMDB-CE) e Áureo Lídio (SD-RJ).

Foram ainda cumpridos mandados contra o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado e o ex-vice-governador de Alagoas José Wanderley Neto (PMDB), ambos apadrinhados de Renan Calheiros, além da sede do PMDB em Alagoas, presidido pelo senador. As buscas próximas a Renan não tiveram relação com as apurações relacionadas a Cunha.

Endereços de assessores supostamente ligados ao deputado Eduardo da Fonte (PP-PE) e ao senador Fernando Collor (PTB-AL) também foram tiveram buscas ontem.

Cunha, agora, é alvo de três inquéritos no Supremo. Ele foi denunciado por corrupção e lavagem de dinheiro pela PGR, acusado de receber propina de US$ 5 milhões do esquema de corrupção na Petrobrás, e investigado pelos mesmos crimes por manter contas secretas na Suíça. O terceiro inquérito, sobre o suposto uso do cargo para atrapalhar investigações, está oculto e veio à tona ontem.

Os agentes federais estiveram na residência oficial do presidente da Câmara em Brasília, na casa do parlamentar, no Rio, e na sede da empresa C3 Produções Artísticas e Jornalísticas, também na capital fluminense. Três celulares do presidente da Câmara foram apreendidos. Todos os ambientes da residência foram vasculhados, inclusive guarda-roupas e gavetas. Cunha acompanhou a ação, uma regra da PF.

Batismo. O nome dado à ação é referência a uma série de quatro discursos do cônsul romano Cícero contra o senador Catilina, um militar da Roma Antiga que teria comandado uma operação para dissolver o Senado e tomar o poder em meados do século 63 A.C.

Teori nega pedido que tinha Renan como alvo

• Ministro do STF recusa solicitação da Procuradoria-Geral da República para o cumprimento de mandados em endereços do presidente do Senado

Andreza Matais, Wal Souza e Lauriberto Braga - O Estado de S. Paulo

O ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava Jato no Supremo, não atendeu ao pedido da Procuradoria-Geral da República para o cumprimento de mandados de busca e apreensão na residência oficial do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), nesta terça-feira, 15. As apurações sobre Renan estão ligadas a um esquema que teria sido desenvolvido dentro da Transpetro.

Teori, porém, autorizou que fossem realizadas ações na sede do PMDB em Alagoas e em endereço de José Wanderley Neto, tesoureiro do partido no Estado e cotado para ser o candidato de Renan na eleição para a prefeitura de Maceió em 2016. Neto é ex-vice-governador do Estado.

Ao chegar na sede do partido os investigadores vistoriaram salas e analisaram documentos que foram recolhidos. Foi preciso quebrar uma parede a marretadas para retirada de um cofre e acionar um chaveiro que arrombou o compartimento onde estavam documentos contábeis.

O secretário-geral do PMDB em Alagoas, Carlos Ricardo Nascimento Santa Ritta, que acompanhou os investigadores na sede do diretório, disse que foram levados do local documentos públicos. “O senador Renan Calheiros autorizou a investigação e recomendou que déssemos toda assistência a Polícia Federal, até porque aqui não temos nada a esconder.” A PF não se pronunciou sobre o que foi recolhido na casa de Wanderley Neto.

A Polícia Federal também fez busca a apreensão na casa do ex-senador e ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado e no gabinete em Brasília e na casa em Fortaleza do deputado federal Aníbal Gomes (PMDB), ambos ligados a Renan. Foram apreendidos documentos, aparelhos celulares e computadores de Machado e Gomes.

Conforme a PF, os investigados são suspeitos de crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa entre outros.

Os agentes tiveram que quebrar uma porta de vidro para entrar na casa de Machado. Da casa de Aníbal Gomes os agentes levaram caixas de documentos e celulares. Do gabinete do deputado em Brasília foram levados computadores.

STF nega pedido da PF de busca e apreensão na casa de viúva de Eduardo Campos, em Recife

• Endereços do empresário Aldo Guedes, que foi sócio de Campos, em Pernambuco, foram alvo de busca e apreensão pela Operação Catilinárias, deflagrada nesta terça

Daniel Carvalho e Andreza Matais - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) negou pedido da Polícia Federal para fazer busca e apreensão na casa de Renata Campos, viúva do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, morto em acidente aéreo em meio à campanha eleitoral de 2014. Endereços do empresário Aldo Guedes, que foi sócio de Campos, em Pernambuco, foram alvo de busca e apreensão pela Operação Catilinárias, deflagrada nesta terça-feira, 15.

Os mandados foram cumpridos na loja Grillo Presentes, na Imbiribeira, Zona Sul do Recife, que pertence ao empresário, e na Agropecuária Nossa Senhora do Nazaré Ltda, situada na Fazenda Esperança, em Brejão, agreste pernambucano. Eduardo Campos era sócio de Guedes nesta Agropecuária, onde a PF apreendeu hoje documentos. Na loja, foram encontrados R$ 170 mil em espécie.

Em outubro, o ex-presidente da Camargo Corrêa e delator da Lava Jato, Dalton dos Santos Avancini, afirmou aos investigadores da operação ter-se encontrado em 2010 com o ex-sócio de Eduardo Campos. Avancini e Aldo Guedes teriam se encontrado no shopping Iguatemi, em São Paulo, para acertar o suposto pagamento de propina de R$ 20 milhões da empreiteira para abastecer o caixa 2 da campanha à reeleição do então governador de Pernambuco.

Presidente do PSB diz que ação da PF é 'normal' e não deve interferir na decisão sobre impeachment

• Entre os alvos da Operação Catilinárias estão o senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), o ex-sócio do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB) Aldo Guedes e uma prima de Campos, Patrícia Guedes Álvaro

Igor Gadelha - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, avaliou nesta terça-feira, 15, como "normal" a Operação Catilinárias. A ação é desdobramento da Lava Jato e cumpriu 53 mandados de busca e apreensão, entre eles contra o senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), o ex-sócio do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB) Aldo Guedes e uma prima de Campos, Patrícia Guedes Álvaro. Para Siqueira, a operação não deve influenciar na decisão de posicionamento do partido em relação ao impeachment da presidente Dilma Rousseff.

"Não houve pessoas novas, já eram situações conhecidas. Foi uma operação normal de apuração de denúncias", afirmou. De acordo com o dirigente partidário, a legenda não faz pré-julgamento contra seus membros e prefere acreditar na inocência alegada pelos suspeitos. Siqueira discordou da tese de alguns deputados do PMDB de que a operação foi articulada pelo governo para atingir opositores. "Não sei (se tem dedo do Planalto). Tem uma tonelada de gente do governo alvo da operação", disse.

Siqueira comunicou que decidiu cancelar a reunião da Executiva Nacional prevista para esta quinta-feira, 17, em razão do julgamento do rito do impeachment pelo Supremo Tribunal Federal (STF) previsto para quarta-feira, 16, e, principalmente, pela indefinição sobre o recesso parlamentar de fim de ano. Segundo ele, se os parlamentares não forem convocados em dezembro e janeiro, o partido deverá "demorar mais um pouco" para decidir que posicionamento vai adotar oficialmente sobre o impeachment de Dilma.

Atualmente, Siqueira lembra que o partido está dividido sobre o assunto. "Deputados dizem que a maioria na Câmara é favorável (ao impeachment), enquanto os senadores têm posição justamente contrária, e os governadores são mais moderados", explicou. O presidente nacional do PSB disse já ter um posicionamento pessoal sobre o assunto, mas prefere não revelar, para não influenciar a opinião dos demais membros da executiva nacional.

Recesso. O pessebista ressaltou que o partido é a favor da suspensão do recesso de fim de ano. "Se houver parada, que seja apenas nas semanas das festas", defendeu. Na avaliação dele, se os parlamentares não trabalharem em dezembro e janeiro, a crise política e econômica vai piorar. "Não dá para ficar com essa luta política dos dois principais partidos (PT e PMDB) para se manter no poder enquanto o País afunda", criticou.

PF fecha cerco a PMDB e Cunha, acusado de coagir testemunhas

• Presidente da Câmara tem casas vasculhadas; dois ministros são alvo

• Operação Catilinárias foi realizada pela Lava-Jato no dia em que o Conselho de Ética avançou na apuração sobre o deputado e na véspera de o Supremo decidir sobre o rito do impeachment da presidente Dilma

Na véspera da discussão sobre o processo de impeachment da presidente Dilma no Supremo, nova fase da LavaJato vasculhou casas e escritórios do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e de outros políticos do PMDB, inclusive ligados ao presidente do Senado, Renan Calheiros, e dois ministros (Celso Pansera e Henrique Eduardo Alves). As ações foram autorizadas pelo STF, que abriu um terceiro inquérito sobre Cunha, desta vez por suspeita de usar o cargo em benefício próprio, para atrapalhar as investigações contra ele. No mesmo dia, e depois de sete adiamentos, o Conselho de Ética decidiu, por 11 votos a 9, prosseguir com o processo por quebra de decoro contra Cunha. O deputado falou em revanchismo do governo e atacou o PT. A Operação Catilinárias cumpriu 53 mandados de busca e apreensão contra 17 suspeitos.

No coração do PMDB

• Ação da PF mira partido e Cunha, que, acusado de coagir testemunha, teve casa vasculhada
O Globo

Na véspera de o Supremo Tribunal Federal (STF) analisar o rito de impeachment da presidente Dilma Rousseff, a operação Catilinárias, da Polícia Federal, realizada em sete estados e no Distrito Federal, teve como alvo principal o PMDB, partido protagonista no processo. Desde o início da manhã de ontem, foram cumpridos 53 mandados de busca e apreensão. Na lista dos locais, a residência oficial do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, em Brasília, sua casa e escritório, ambos no Rio, e diversos endereços de aliados. O STF negou o pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para buscas diretamente relacionadas ao presidente do Senado, Renan Calheiros. Mas nomes ligados ao parlamentar, como o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado e o senador Edison Lobão (PMDB-MA) tiveram endereços vasculhados em investigações que incluem Renan.

Dois ministros em foco
O Planalto avaliou que o novo capítulo da LavaJato tumultua ainda mais o ambiente político em Brasília, num momento já crítico. Entre os alvos, também estavam dois atuais ministros de Dilma, ambos do PMDB: Henrique Eduardo Alves (RN), do Turismo, e Celso Pansera (RJ), de Ciência e Tecnologia.

Os detalhes das investigações não foram divulgados, mas Cunha e aliados seus são investigados pelas suspeitas de tentativas de achaque, coação de testemunhas e a negociação de medidas provisórias, dizem fontes da investigação.

Na mesma manhã em que a PF realizou a operação, o Conselho de Ética da Câmara, de forma surpreendentemente tranquila, decidiu pela admissibilidade do processo de cassação do presidente da Casa, Eduardo Cunha. Foram 11 votos a 9.

No início da tarde, veio a reação de Cunha. Ele classificou a operação da PF como “revanchismo”. Disse “estranhar” que a operação tenha ocorrido no dia da reunião do conselho e na véspera de o STF definir as regras do impeachment.

O presidente do Senado, Renan Calheiros, começou o dia “com a alma em paz”, rezando uma missa natalina no Salão Negro. Depois, defendeu-se, sem atacar o governo:

— Nunca consenti, e nem consentiria, e nem permiti, nem permitiria, que alguém, em qualquer circunstância, qualquer lugar, falasse por mim.

Além das buscas nos endereços de Cunha, também foram alvo da operação nomes ligados ao deputado como o ex-vice-presidente de Fundos de Governo e Loterias da Caixa Fábio Cleto; o prefeito de Nova Iguaçu, Nelson Bornier; o doleiro Lúcio Funaro e a chefe de gabinete do parlamentar, Denise Santos.

Na casa de Cunha, na Barra da Tijuca, no Rio, os policiais encontraram um táxi registrado em nome de Altair Alves Pinto, apontado pelo lobista Fernando Baiano, delator na Lava-Jato, como intermediário da propina destinada ao presidente da Câmara.

Com o capítulo de ontem, já são pelo menos 66 políticos envolvidos na Lava-Jato, segundo levantamento feito pelo GLOBO. E uma frase dita ontem em Curitiba por Fernando Baiano resume o que está por vir:

— A cada dia é uma surpresa. E tem tanta coisa ainda para acontecer.

Operação é ‘revanchismo’ do PT, que ‘assaltou’ o país, diz Cunha

• Peemedebista relaciona ‘operação contra PMDB’ ao impeachment

- O Globo

-BRASÍLIA- Principal alvo da Operação LavaJato ontem, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), adotou a estratégia de se defender atacando. Apesar de ter dito que não está “nem um pouco preocupado” com os mandados de busca e apreensão cumpridos pela PF em seus imóveis do Rio e de Brasília, ele acusou o governo de “revanchismo” e disse considerar “muito estranho” que a operação tenha ocorrido no dia da sessão do Conselho de Ética e às vésperas de o Supremo Tribunal Federal (STF) se pronunciar sobre o rito do impeachment. Cunha também criticou o fato de políticos do PT não terem sido alvo da operação:

— Isso tudo causa muita estranheza a todos nós, de repente assistir a uma operação no dia do Conselho de Ética, às vésperas da decisão do processo de impeachment, uma operação concentrada no PMDB. A gente sabe que o PT é o responsável pelo assalto que aconteceu no Brasil e na Petrobras, todo dia tem a roubalheira do PT sendo fotografada e, de repente, fazem uma operação com o PMDB. Tem alguma coisa estranha no ar — atacou o presidente da Câmara.

Cunha, no entanto, disse ser “natural” que haja retaliação do governo contra ele, já que é o maior desafeto do Planalto, sobretudo depois que acolheu o parecer de impeachment da presidente Dilma Rousseff elaborado pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal:

— Eu sou o desafeto do governo, todos sabem disso, e agora mais ainda, na medida em que dei curso ao processo de impeachment. Nada mais natural do que o governo agora buscar o seu revanchismo.

Durante toda a manhã de ontem, circulou um boato no Salão Verde da Câmara de que Cunha poderia renunciar. Ele negou com veemência essa possibilidade:

— Não tem a menor hipótese. De jeito nenhum — disse, acrescentando: — Minha consciência está tranquila, eu sou absolutamente inocente.

O peemedebista voltou a defender que o PMDB saia do governo “o mais rápido possível”:

— Acho que o PMDB tem que decidir rapidamente a saída desse governo, o mais rápido que ele puder.

Ao classificar a operação como ato de “revanchismo”, Cunha acusou o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, de participar de reuniões secretas em Curitiba, onde está a força-tarefa da Lava-Jato:

— O que foi fazer o ministro José Eduardo Cardozo em Curitiba para ter reuniões lá no meio da madrugada? São coisas muito estranhas que acontecem neste governo.
Cunha reforçou que acorda “às 6h da manhã” e que sua porta “estaria aberta” para os investigadores. E voltou a dizer que foi escolhido para ser investigado.

— Eu fui escolhido para ser investigado, todos sabem disso – afirmou.

Cunha também tentou atacar a PF e o Ministério Público Federal:

— É sinal que eles não têm prova, têm que colher alguma — disse, sobre a ida de agentes aos seus imóveis.

No Rio, o prefeito de Nova Iguaçu, Nelson Bornier (PMDB), aliado de Cunha, disse que não é citado nas investigações e nos depoimentos da Lava-Jato. Ela nega qualquer envolvimento em irregularidades investigadas pela operação.

Reação à operação da PF mostra PMDB rachado

• Enquanto Cunha acusa o governo, senador diz que lei foi cumprida

O Globo

-BRASÍLIA- O PMDB se dividiu ontem ao reagir à Operação Catilinárias. Enquanto o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), tentou passar a ideia de que a ação da Polícia Federal foi um ataque direto do governo ao partido, caciques da legenda, a começar pela ala do Senado, evitaram o confronto. Será neste clima de divisão interna que a Executiva nacional do partido se reúne hoje para tentar barrar novas filiações que tenham o intuito de fortalecer o bloco na Câmara apoiado pelo Palácio do Planalto, que deseja a volta de Leonardo Picciani (PMDB-RJ) à liderança da bancada na Casa.

A diferença de tom adotado foi clara, especialmente entre Cunha e o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB), indicado pela bancada do Senado. O presidente da Câmara chegou a dizer que o “PT é o responsável pelo assalto que aconteceu no Brasil e na Petrobras”. Em entrevista, Cunha disse achar estranho uma operação contra o PMDB. Chegou a dizer: “Fazem uma operação com o PMDB. Tem alguma coisa estranha no ar”. Horas depois, Braga refutou: — Eu acho que tudo foi feito na legalidade, com decisão do Supremo a respeito do tema. Portanto, faz-se cumprir a lei.

Braço-direito do vice-presidente Michel Temer, o ex-ministro Eliseu Padilha preferiu defender seu partido e alfinetar o PT:

— É um processo que já está em andamento. Não vejo nada demais. O PMDB existe nas 27 unidades da Federação do Brasil. Temos alguns nomes que por enquanto estão sendo só investigados. Não tem ninguém preso.

A reunião da Executiva marcada para a amanhã de hoje foi articulada pelo entorno de Temer e convocada às pressas. Apesar da pressão de parte do partido pelo rompimento imediato com o governo Dilma, a Executiva não deverá decidir antecipar a convenção partidária marcada para março. Os entusiastas do rompimento têm pedido a Temer que convoque a convenção para a última semana deste mês. Assim, 2016 começaria com o PMDB rompido com Dilma.

Acusado por Cunha de interferir nas operações da PF e de ter ido a Curitiba para isso, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, respondeu com ironia.
— Posso afirmar em alto e bom som: o presidente da Câmara pode ficar absolutamente tranquilo que eu não fui a Curitiba esconder bens, nem tentar ocultar bens que tenho no exterior ou conta, porque não os tenho.

Lula e Renan se encontram
Para a cúpula do PMDB, não está claro que efeito a ação da PF terá. Segundo fontes, Temer se mostrou cauteloso e comentou que “quem é inocente, vai apresentar sua defesa, e quem não é será devidamente investigado”. Peemedebistas avaliaram que o partido dificilmente terá posição unificada. A Executiva decidiu não divulgar nota.

O ex-presidente Lula, que estará em Brasília hoje e amanhã, pretende se encontrar com Renan. Interlocutores de Renan garantem que o PMDB do Senado manterá sua linha de alinhamento ao Planalto, porque não confia em Temer.

Oposição tenta evitar que ação de impeachment seja afetada

• Preocupação é dissociar movimento para afastar a presidente de aliança com peemedebistas

- O Globo

-BRASÍLIA- Líderes da oposição tentaram ontem dissociar o apoio ao impeachment de uma aliança com o PMDB. Nas reuniões após a Operação Catilinárias, os tucanos defenderam o afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o mais rapidamente possível e se mostraram divididos sobre a eventual participação num governo liderado pelo vice-presidente Michel Temer, presidente do PMDB:

— Nossa posição é muito clara. Queremos a continuidade do processo de afastamento de Cunha e os dois votos do PSDB hoje no Conselho foram decisivos para admissibilidade da denúncia contra ele. O PSDB também é a favor do impeachment. Quanto à discussão de apoio a um governo Michel Temer, isso se dará em outro momento. Podemos ajudar de várias formas. Não cogito participar do governo — disse o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), ao ser questionado se os tucanos não estão constrangidos por apoiar o impeachment ao lado do PMDB.

O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) disse que sua posição, independentemente do envolvimento do PMDB nos desvios apurados na Operação Lava-Jato, é contrária a qualquer apoio a Temer.

— Dilma e Temer representam o mesmo governo eleito em 2014. Na democracia quem perde faz oposição. É dever. Temer não é mudança é continuidade de um sistema promíscuo. Participou dele como presidente do maior partido e deu a ele sustentação política. Se Temer assumir continuarei na oposição — disse Dias.

O presidente do DEM, senador José Agripino Maia (RN), também disse ser necessário separar o PMDB do processo de impeachment e de um governo de transição chefiado por Temer.

— Temer seria mais do que um peemedebista no governo. Seria intérprete de uma transição pluripartidária e de salvação nacional.

Para o Planalto, relação com partido aliado ficará mais tensa

• Dois ministros peemedebistas foram alvos de mandados de busca

- O Globo

-BRASÍLIA- No Palácio do Planalto, desde cedo, a avaliação ontem era que a Operação Catilinárias deverá aumentar a instabilidade política e, portanto, terá impacto negativo, no momento em que o governo tenta diminuir o nível de tensão política. Além de Cunha, também foram alvos de mandados de busca e apreensão dois ministros da presidente Dilma Rousseff : Celso Pansera (Ciência e Tecnologia) e Henrique Eduardo Alves (Turismo), justamente dois dos ministros peemedebistas ligados à bancada da Câmara.

Uma pessoa próxima a Dilma explicou que a operação era ruim para o governo, porque “atinge no coração” o partido que é o principal aliado e com o qual a presidente trava uma disputa.

— Essa operação atinge o PMDB no coração, aumentando a instabilidade do governo. Eleva o grau de tensão — disse a fonte.

Em nota, a Secretaria de Imprensa da Presidência da República disse que “o governo espera que todos os fatos investigados na nova fase da Operação Lava-Jato, envolvendo ministros de Estado e outras autoridades sejam esclarecidos o mais breve possível, e que a verdade se estabeleça”. O desdobramento da operação foi analisado em almoço entre o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, e os ministros da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini e da Justiça, Eduardo Cardozo.

Apesar da avaliação de que a nova fase da Lava-Jato “não é boa para ninguém”, assessores da presidente mostravam-se aliviados com o fato de as investigações tirarem o PT do foco da corrupção e jogarem luzes sobre o PMDB, que é a alternativa de poder a Dilma, em caso de impeachment.

— Por que tirar a Dilma e entregar para o grupo do Cunha? — indagou um integrante do Planalto, referindo-se ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha.

O governo tenta evitar, no entanto, que esse episódio contamine a já conflituosa relação com o PMDB. O mantra no Palácio do Planalto ontem era que Dilma continua trabalhando para manter os ministros peemedebistas no governo e continua querendo o retorno do deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ) à liderança do partido.

Sobre a acusação de Cunha, de que o governo e o Ministério Público estariam atuando juntos contra ele de forma revanchista, auxiliares de Dilma afirmaram que Cunha, ao contrário do ex-líder do governo no Senado Delcídio Amaral (PT-MS), não foi preso. E, em segundo lugar, se a ofensiva fosse contra Cunha, os ministros Pansera e Alves não teriam sido alvo da mesma operação.

— Foi o mesmo Teori que decidiu sobre Delcídio e sobre Cunha — disse um auxiliar.

Mobilização da Câmara
Com a operação, participantes da reunião de líderes da Câmara com o ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, entenderam que a situação é grave e decidiram procurar a oposição para tentar dar ares de normalidade ao Legislativo. Os deputados Jovair Arantes (PTB-GO) e Affonso Mota (PDT-RS) ficaram responsáveis por procurar oposicionistas para mobilizar a Câmara a votar as matérias ainda pendentes, antes de o ano legislativo se encerrar.

— Com essa operação de hoje na casa do Cunha nos aproximamos de uma crise institucional. É a Polícia Federal em uma das casas do Legislativo. Temos que buscar um denominador comum para buscar um mínimo de normalidade institucional — disse um participante da reunião.

No encontro no Palácio do Planalto, Berzoni pediu que os aliados se empenhem para que haja quorum nas sessões do Congresso.

— Temos que votar algumas coisas. Não é possível a gente entrar em recesso e largar essa confusão para trás. A oposição também tem interesse nisso. Vamos fazer uma força-tarefa para votar — disse Jovair Arantes.

Irritado com ação da PF, Renan dá sinal de que pode abandonar Dilma

Renan reage com irritação à ação da Polícia Federal

Daniela Lima, Mariana Haubert – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Com nomes ligados a si atingidos diretamente na nova fase da Operação Lava Jato, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), demonstrou irritação, o que preocupa o governo. Até aqui, o peemedebista era um dos principais e últimos aliados poderosos do Planalto na tentativa de impedir a abertura do processo de impeachment contra Dilma Rousseff.

Pessoas próximas ao peemedebista dizem que ele ainda calcula qual será o próximo passo, mas relatam que, logo após a ação deflagrada pela Polícia Federal nesta terça (15), Renan começou a dar sinais de que pode abandonar a base de sustentação do Palácio do Planalto.

Em conversas privadas, o presidente do Senado sinalizou que haverá recesso parlamentar, pelo menos até meados de janeiro. Ele avalia ser preciso "baixar a temperatura" política. O governo defende que é preciso terminar o mais rapidamente possível as discussões sobre o processo de impeachment. Por isso, a tendência pró-recesso de Renan foi lida no Planalto como uma advertência.
A operação desta terça-feira também gerou incômodo na cúpula do PMDB, partido que reúne nesta quarta-feira (16) sua Executiva, já que a maior parte dos atingidos pertence à sigla. Na reunião, estará em discussão as filiaçõesque o ex-líder do PMDB na Câmara Leonardo Picciani tem realizado para tentar recuperar a liderança.

A cúpula partidária quer vetar estas filiações para barrar a iniciativa do deputado carioca, que tem o apoio do governo e foi substituído por Leonardo Quintão (MG) com apoio do presidente da legenda, o vice Michel Temer (SP).

Segundo peemedebistas, caso a estratégia de Picciani dê sinais de sucesso, a Executiva pode até discutir uma antecipação da convenção da legenda, marcada para março, para votar um rompimento com o governo.

Por enquanto, a orientação do vice-presidente Temer é ter cautela. Ele defende não discutir agora um rompimento oficial e quer esperar o cenário clarear.

A investida da PF foi vista pelo entorno de Renan como um cerco ao senador e à campanha de seu filho ao governo de Alagoas em 2014 –o escritório regional do PMDB no Estado foi alvo de batida policial. Houve um pedido para que a residência do presidente do Senado também fosse alvo de uma revista, mas o ministro Teori Zavascki barrou.

Pessoas próximas ao peemedebista relataram que Sérgio Machado, ex-diretor da Transpetro ligado a Renan, teria sido acordado por agentes da PF com uma lanterna no rosto quando a operação foi deflagrada. Renan teria considerado a ação abusiva.

Diversas fases do impeachment podem ser diretamente afetadas por decisões de Renan. Por isso, um possível distanciamento do Planalto é visto com apreensão pelo governo e expectativa por alas que trabalham para encurtar a gestão da petista.

Se romper com Dilma, avaliam parlamentares, Renan afundaria o governo petista de vez.

Questionado, Renan se limitou a dizer que vinha colaborando com as investigações sempre que solicitado.

Governo avalia que nova fase da Lava Jato 'agrava instabilidade política'

Marina Dias, Flávia Foreque e Valdo Cruz - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Integrantes do governo Dilma Rousseff avaliaram que o cumprimento nesta terça-feira (15) de mandados de busca e apreensão na residência oficial do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e dos ministros Celso Pansera (Ciência e Tecnologia) e Henrique Eduardo Alves (Turismo), ambos do PMDB, aumenta ainda mais instabilidade política no país.

Diante do envolvimento de nomes de ministros na nova fase da Operação Lava Jato, o governo diz que "espera que todos os fatos" relacionados a eles "sejam esclarecidos o mais breve possível e que a verdade se estabeleça".

A orientação dentro do governo é de cautela. Por isto, nota do Palácio do Planalto afirma ainda que "todos os investigados" têm o direito de "apresentar suas defesas, dentro do processo do contraditório". Finaliza dizendo que o governo espera que "este processo fortaleça as instituições brasileiras".

Nos bastidores, porém, a nova fase da Operação Lava Jato, que atingiu em cheio o PMDB, partido do vice-presidente Michel Temer e maior sigla da base aliada ao governo, preocupa.

Ministros admitem que a Lava Jato se tornou fato "imponderável" para o governo e que a presidente Dilma e sua equipe têm dificuldade para se blindar dos efeitos das investigações.

A avaliação é a de que, além de lidar com a crise política e econômica, o Planalto vai enfrentar agora o acirramento da disputa com o PMDB e será ainda mais fustigado por Cunha, que, apesar de ser alvo de busca e apreensão, permanece como presidente da Câmara dos Deputados.

Relação tensa
Planalto e PMDB seguem em uma relação tensa desde o início do segundo mandato de Dilma e, para integrantes do governo, o quadro político se agrava ainda mais com a legenda no alvo da Polícia Federal.

Além de Cunha, Pansera e Henrique Alves, Fábio Cleto, aliado do presidente da Câmara que ocupava uma das vice-presidências da Caixa Econômica Federal até a semana passada, também foi alvo de busca, em São Paulo. Ele é um dos principais operadores de Cunha e foi demitido por Dilma em uma espécie de "exemplo" para aliados que ainda têm cargo no governo mas mantém posição dúbia quanto ao impeachment da presidente.

Houve buscas também na diretoria-geral da Câmara, órgão responsável por fechar contratos e ordenar despesas.

A ação da PF ainda atinge o deputado Aníbal Gomes (PMDB-CE), apontado como interlocutor do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), nos desvios da Petrobras, do senador e ex-ministro Edison Lobão (PMDB-MA), que é investigado no Supremo Tribunal Federal pela Lava Jato, e Sergio Machado, ex-presidente da Transpetro.

A operação da PF também deve impactar no ritmo de trabalho da Câmara.

Assessores do Planalto ponderam ainda que a ação também pode ter na mira aliados do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), com quem o governo mantém diálogo diante da tramitação do processo de impeachment no Legislativo. A ação da PF, na manhã de hoje, atinge o deputado federal Aníbal Gomes(PMDB-CE), apontado como interlocutor de Calheiros.

Logo cedo, segundo a Folha apurou, Dilma foi informada da operação pelo ministro José Eduardo Cardozo (Justiça). A petista viajou para uma agenda em Congonhas (MG) e retorna à capital no início da tarde.

'Catilinárias' agrava crise com PMDB

Por Raymundo Costa, Andrea Jubé e Bruno Peres – Valor Econômico

BRASÍLIA - À exceção do vice-presidente, Michel Temer, a Operação Catilinárias atingiu os principais líderes do PMDB e pode agravar a instabilidade política no Congresso. No Palácio do Planalto e no PT, a preocupação maior é em relação ao presidente do Senado, Renan Calheiros, que acenava com apoio à presidente Dilma Rousseff em sua luta contra o impeachment.

O governo avalia que teve prejuízos com a ação da Polícia Federal contra o PMDB, onde o entendimento é de que se tratou de uma ação contra o partido. O nome da operação é uma referência evidente ao impeachment de Dilma - as "Catilinárias" são os famosos discursos do cônsul romano Cícero contra o senador Catilina, que tentava um golpe para derrubar a República romana.

A cúpula pemedebista acredita em um complô para atingir o partido - e indiretamente o vice Michel Temer - coordenado pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Entrar na casa do deputado Eduardo Cunha, em Brasília, foi visto mais como um efeito de demonstração. Dificilmente ele ainda teria algo que o comprometesse na residência oficial. O mesmo vale para Renan Calheiros. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu acesso à casa do senador, mas não foi atendido pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no STF. Ele autorizou, porém, busca no diretório do PMDB em Alagoas, presidido por Renan.
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Na avaliação governista, o ambiente político ficou mais instável no Senado, onde, além de Renan, foram atingidos pela Catilinárias os senadores Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE) e Edison Lobão (PMDB-MA), dois possíveis aliados de Dilma na luta contra o impeachment. O PT receia uma "retaliação" do PMDB.

Dois outros aliados próximos do presidente do Senado também viraram alvo da operação: o deputado Anibal Gomes (AL) e o ex-senador e ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, que ocupava o cargo por indicação de Renan.
O PMDB avaliou ontem a oportunidade de divulgar uma nota oficial. Desistiu depois que Temer foi contra - ele teria de se manifestar institucionalmente e com isso temia desagradar o partido.

PMDB acredita em orquestração contra o partido
À exceção do vice-presidente Michel Temer, a Operação Catilinária atingiu os principais líderes do PMDB e pode agravar a instabilidade política no Congresso, segundo reconhecem o PT e o Palácio do Planalto. A preocupação maior é em relação ao presidente do Senado, Renan Calheiros (AL), que acenava com apoio à presidente Dilma Rousseff em sua luta contra o impeachment. O governo avalia que também teve prejuízos com a ação da Polícia Federal contra o PMDB.

No PMDB o entendimento corrente é de que se tratou de uma ação contra o partido. A começar pelo nome da operação da Polícia Federal para cumprir os mandados de busca e apreensão. Batizada de Catilinárias, faz referência a quatro discursos proferidos pelo cônsul romano Cícero contra o senador Catilina, que tentava um golpe para derrubar a República romana. Para os pemedebistas ficou evidente à referência ao pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

A cúpula pemedebista desconfia de uma armação para atingir o partido e, por tabela, seu presidente, o vice Michel Temer, candidato a suceder a presidente nos próximos três anos, se Dilma for impedida pelo Congresso. O PMDB alinhava uma série de coincidências para justificar sua apreensão e dúvida.

Desencadeada num dia 15, número do PMDB na cédula eleitoral, a Operação Catilinária ocorre dias depois de uma viagem do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a Curitiba, centro nervoso da Operação Lava-Jato. Entre os dirigentes pemedebistas não há dúvidas de que Cardozo está articulado com o procurador-geral Rodrigo Janot. A citação do discurso de Cícero teria carimbado a operação como um troco à abertura do processo de impeachment na Câmara.

Entrar na casa do deputado Eduardo Cunha, presidente da Câmara, em Brasília, foi visto mais como um efeito de demonstração. Dificilmente Cunha teria algo na residência oficial. Haveria alguma justificativa no Rio, mesmo assim é incompreensível que o Ministério Público continue procurando provas contra quem já denunciou. O mesmo serve para Renan Calheiros. Janot pediu para entrar na casa do senador por Alagoas, mas não foi atendido pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato.

Outra coincidência relacionada pelo PMDB: há menos de uma semana o Palácio do Planalto ordenou a demissão de um vice-presidente da Caixa Econômica Federal, Fábio Cleto, indicado para o cargo pelo presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha. Agora, na sequência, também ele foi atingido pela Operação Catilinárias da PF.

O que mais preocupa o Palácio do Planalto e o PT é o cerco montado em relação ao presidente do Senado, Renan Calheiros, que saiu em defesa da tese do governo em relação ao processo de impeachment e ajudava a destravar as votações mais importantes para o Palácio do Planalto. Na avaliação governista, o ambiente político ficou mais instável no Senado, onde, além de Renan, foram atingidos pela Catilinárias também os senadores Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE) e Edison Lobão (PMDB-MA), dois possíveis aliados de Dilma na luta contra o impeachment do mandato. O receio do PT é o PMDB "retaliar", segundo um dirigente da sigla.

No Palácio do Planalto, o ministro Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) reuniu líderes aliados para tentar garantir as votações prioritárias para o governo no Congresso. O novo líder do PMDB, Leonardo Quintão (MG) participou do encontro sobre protestos do líder do PT, Sibá Machado (PT-AC), em demonstração de desconfiança em relação ao novo líder aliado.

Muito embora o ministro Zavascki tenha negado os pedidos de busca e apreensão na residência do presidente do Senado, ele autorizou o mandado para o diretório regional do PMDB de Alagoas, presidido por Renan. Além disso, dois outros aliados próximos de Renan também viraram alvo da operação: o deputado Anibal Gomes (CE) e o ex-senador e ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, que ocupava este cargo por indicação de Renan. Ainda na segunda-feira Renan tentava cooptar o governador de Tocantins, Marcelo Miranda, às manobras anti-impeachment.

Com o fraco movimento nas manifestações convocadas para o último domingo, o governo e o PT pretendiam avançar convocando uma manifestação maior para hoje, especialmente em Brasília, e na articulação para reconduzir o deputado Leonardo Picciani ao cargo de líder do PMDB na Câmara. Mas a Operação Catilinárias também abalou outros eventuais aliados, como o ministro da Ciência e Tecnologia, Celso Pansera, e até Henrique Eduardo Alves, do Turismo, muito ligado ao vice Temer.

Os dirigentes do PMDB compartilham da ideia de que ninguém põe freios nas decisões da Lava-Jato tomadas em Curitiba. Mas neste caso específico veem o dedo de Janot dando troco no partido mais envolvido nas articulações pró impeachment.

O PMDB avaliou a oportunidade de divulgar uma nota oficial. Desistiu depois que o vice Michel Temer se posicionou contrariamente. As respostas foram individuais. Hoje, a Executiva Nacional do PMDB se reúne em Brasília para discutir a filiação de um deputado do PR ao partido, estimulada pelo Planalto para mudar a relação de forças da bancada e permitir a recondução de Leonardo Picciani a líder.

Um grupo defende a antecipação da convocação da convenção partidária, prevista para março, a fim de acelerar o desembarque do PMDB do governo. Isso pode até ocorrer, mas não era provável até a noite de ontem: o PMDB não quer ampliar o jato de luz que a Operação Catilinárias lançou sobre o partido ao longo do dia de ontem. O Planalto agora deve atuar no sentido de tentar amenizar os danos no seu principal aliado, um partido que até ontem se mostrava dividido em relação ao pedido de impeachment, mas majoritariamente favorável à saída do governo

‘A estrutura da Petrobrás era do PT’, diz amigo de Lula

• Interrogado na Polícia Federal, José Carlos Bumlai - preso na Lava Jato desde 24 de novembro - afirmou que 'grande parte dos nomes' para a estatal era indicada pelo partido

Por Fausto Macedo, Ricardo Brandt e Julia Affonso – O Estado de S. Paulo

Entre tantas revelações que fez durante seu interrogatório na Polícia Federal na segunda-feira, 14, uma em especial do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Lula, chamou a atenção dos investigadores. Ele afirmou que ‘a estrutura da Petrobrás era do Partido dos Trabalhadores’.

O delegado Filipe Hille Pace, da PF, insistiu para que Bumlai explicasse melhor sua afirmação. Ele disse. “Sabia que o partido indicava grande parte dos nomes para ocupação de cargos essenciais.”

A Operação Lava Jato, até aqui, trabalhava com informações de que a influência do PT na Petrobrás teria ficado restrita à Diretoria de Serviços – com a nomeação do engenheiro Renato Duque, suposta indicação do ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu (Casa Civil/Governo Lula), ambos capturados por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro. Outras unidades estratégicas da estatal, durante o reinado da corrupção e dos desvios (2004/2014), foram administradas por outras agremiações políticas – PP dominou a Diretoria de Abastecimento e o PMDB controlou a Internacional, aponta a Lava Jato.

A Operação Passe Livre, desdobramento da Lava Jato, foi deflagrada em 24 de novembro e colocou na cadeia o amigo de Lula. Amigo de churrascos e boa prosa durante longos anos.

Num primeiro depoimento, na sexta-feira, 11, José Carlos Bumlai negou tudo. Disse que os R$ 12 milhões que tomou emprestado no Banco Schahin, em outubro de 2004, cobriram dívidas suas. Negou taxativamente que o dinheiro tivesse sido repassado para o PT.

Na segunda-feira, 14, mudou a versão. Abriu o jogo. Disse que o real destinatário dos R$ 12 milhões era mesmo o PT. Incluiu em seu relato o poder do PT na Petrobrás entregue ao esquema de cartel e propinas. Acrescentou que ‘sabia que havia indicação por parte de outros partidos da base governista.’

TSE nega recurso de Dilma contra decisão de investigar campanha

- Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Sem discussão, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) negou na noite desta terça-feira (15) um recurso da presidente Dilma Rousseff contra decisão do ministro Gilmar Mendes de enviar para Polícia Federal e Ministério Público Federal pedido de investigação de eventuais crimes que possam ter ocorrido na campanha à reeleição.

A defesa de Dilma argumentava que a prestação de contas da petista e do vice-presidente, Michel Temer, foi aprovada com ressalvas e, portanto, não haveria mais justificativas para que o caso fosse reaberto pelo ministro.

Os recursos apresentados por Dilma são os chamados "embargos de declaração", que contestam omissões, contradições ou obscuridades no acórdão (documento que resume as decisões tomadas durante o julgamento), mas foram rejeitados por unanimidade. Não houve debate na sessão.

A partir da manifestação de Gilmar Mendes, a Polícia Federal abriu um inquérito para investigar suspeitas de ilegalidades na campanha.

A presidente nega irregularidades em sua campanha presidencial. O PT também já informou ter recebido apenas doações legais durante a campanha.

Segundo informações somadas pelos técnicos do TSE, empresas sob suspeita de participar do esquema de corrupção da Petrobras doaram R$ 172 milhões ao PT entre 2010 e 2014.

Mendes aponta que parte desses valores suspeitos foram transferidos para a contabilidade da campanha de Dilma.

Tramitam atualmente no TSE quatro ações que questionam a prestação de contas da campanha petista à Presidência, todas movidas pelo oposicionista PSDB.

STF começa a definir impeachment

Por Maíra Magro – Valor Econômico

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) começa a julgar hoje a ação que definirá o rito do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso. O resultado será decisivo para o destino do governo. Embora a corte tenha anunciado que se limitará a discutir aspectos formais para o impedimento, as regras terão influência direta no jogo político do Legislativo.

Os ministros discutirão uma arguição por descumprimento de preceito fundamental (ADPF) proposta pelo PCdoB para questionar diversos pontos da Lei do Impeachment (Lei 1.079/1950). A sigla pede que o STF declare quais trechos estão ou não de acordo com a Constituição.

A ação pede a anulação de todos os atos realizados pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), referentes ao impeachment. Na semana passada, a pedido do PCdoB, o ministro Edson Fachin, relator do caso no STF, determinou a suspensão do procedimento no Congresso até o julgamento desta tarde.

Os ministros terão que esclarecer uma série de aspectos da Lei do Impeachment. Um deles é se há ou não garantia de defesa prévia de Dilma antes da decisão do presidente da Câmara de acolher o pedido de impedimento, formulado pelos juristas Miguel Reale Jr., Hélio Bicudo e Janaína Paschoal.

O STF também discutirá como deve ser formada a comissão especial responsável por analisar o pedido de impeachment. O PCdoB argumenta que a comissão deve ser formada por representantes de cada partido, e não dos blocos partidários.

A forma de escolha dos membros da comissão deve gerar polêmica. Os ministros terão que esclarecer se a votação tem que ser fechada ou aberta. Cunha determinou que a eleição dos integrantes da comissão fosse por voto fechado, o que é questionado pelo PCdoB e pelo governo. Fachin suspendeu o andamento do impeachment apontando que não há previsão legal para a votação fechada. Se os ministros entenderem que a votação deve ser aberta, estarão diante de um impasse: teriam que anular uma escolha já feita pelo Legislativo, o que veem com cautela.

Outro ponto crucial será a definição do papel do Senado no processo de impeachment. A lei prevê o afastamento do presidente por 180 dias a partir da instauração do processo no Senado, em uma etapa anterior ao impedimento.

Enquanto Cunha defende que, após a abertura do impeachment na Câmara, a instauração do processo no Senado é automática, o PCdoB argumenta que o Senado tem autonomia na decisão de instaurar ou não o procedimento. Dilma, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviaram informações ao STF defendendo essa mesma tese.

A ação sustenta ainda que a decisão do Senado de instaurar o processo de impeachment tem que ser tomada pela Mesa Diretora e confirmada por dois terços do plenário. Os ministros deverão esclarecer se o quórum será esse.

O PCdoB defende também que o presidente da Câmara deve ser declarado suspeito para atuar no processo de impeachment por conflito de interesses. Ao abrir o processo, diz a legenda, Cunha estaria atuando em retaliação ao governo, por responder a processo de cassação no Conselho de Ética com aval do PT.

Ontem, o ministro Fachin entregou seu voto, em mãos, a dez ministros do STF - só o ministro Marco Aurélio Mello se recusou a receber, pois é contra a discussão de casos fora do plenário. O documento, de 100 páginas, sugere um rito para o procedimento de impeachment. Fachin disse aos colegas que estava aberto a discussões. A intenção do ministro é acelerar o julgamento e buscar um consenso, evitando, por exemplo, um pedido de vista. Mesmo assim, o debate deve ser longo.

O julgamento começará com um relatório em que Fachin apresentará o caso. Depois, cada parte envolvida terá 15 minutos para apresentar seu ponto de vista: o PCdoB, o Senado, a Câmara, a Advocacia-Geral da União e a Procuradoria-Geral da República. Em seguida, falarão partidos e entidades que entraram no processo como parte interessada: PT, PSDB, PSOL, DEM, Rede, PP e Solidariedade, além da União Nacional dos Estudantes (UNE). A fala de todos eles deve tomar uma hora do julgamento.

Concluída essa fase, Fachin deve ler as 100 páginas de seu voto. Depois, os demais ministros começam a votar. O Palácio do Planalto estima que o julgamento deve terminar amanhã. Ontem, líderes de oposição estiveram no gabinete de Fachin para defender o prosseguimento do impeachment.

Desaprovação do governo atinge marca de 70% em pesquisa de opinião

Por Bruno Peres, Lucas Marchesini e Raymundo Costa - Valor Econômico

BRASÍLIA - Às vésperas da decisão sobre o rito a ser seguido pela Câmara na análise do processo de impeachment, pesquisa do Ibope feita sob encomenda da Confederação Nacional da Indústria (CNI) revela um novo recorde negativo na aprovação da presidente Dilma Rousseff: 70% da população avalia seu governo como ruim ou péssimo. A aprovação da presidente se mantem estável há três meses, com viés de baixa: apenas 9% avaliam que o restante do governo Dilma será bom ou ótimo.

Assim, 20% dos que responderam a pesquisa consideraram o governo da presidente Dilma regular em dezembro, frente a 21% em setembro. A desaprovação pessoal da presidente foi de 82%, enquanto a aprovação foi de 14%. A confiança na presidente Dilma também oscilou negativamente um ponto (leia quadro ao lado).

A estabilização em torno dos 9% indica que a presidente pode realmente ter chegado ao fundo do poço, mas todos os demais números da pesquisa indicam que a popularidade da presidente é prisioneira da crise política e econômica: enquanto perdurar a crise, mais difícil será para Dilma sair da situação em que se encontra hoje.

As políticas e ações de combate ao desemprego registram aumento de 83% para 87% no percentual de reprovação. As rejeições à política tributária (91% ante 89%) e ao combate à inflação (85% ante 83%) oscilaram para cima em dezembro, mas dentro da margem de erro, de dois pontos percentuais. Essas áreas são aprovadas, respectivamente, por 12%, 7% e 12%, com oscilações também dentro da margem de erro. Outras medições feitas pela CNI mostram que é baixa a confiança do consumidor assim como é baixa a confiança do empresariado, ao que se soma, agora, a detecção dos primeiros sinais da recessão sobre a opinião pública. Combinados, dificultam a recuperação de Dilma.

A sensação de desgoverno é refletida em um inédito salto de nove pontos (de 65% para 74%) na desaprovação às políticas de meio ambiente, provavelmente causada pelo rompimento de uma barragem da Samarco em Mariana (MG). O meio ambiente era uma das áreas mais bem avaliadas, com 21% de aprovação em dezembro.

A combinação das crises política e econômica sobre o humor da população pode ser desenhada pelas notícias mais lembradas pela população: Impeachment de Dilma (50%), Operação Lava-Jato/Corrupção na Petrobras (13%), corrupção no governo (7%), manifestações contra a corrupção (5%) e a aceitação do pedido de impeachment pelo presidente da Câmara (4%), deputado Eduardo Cunha.

O processo de cassação de Cunha, no qual aposta o governo para equilibrar o noticiário em relação ao impeachment de Dilma, é apenas a décima notícia mais lembrada. No agregado, o impeachment da presidente Dilma é a novela política de maior audiência, noticia citada por 51% dos entrevistados.

Apesar de ter aumentado suas aparições públicas e discursos, num esforço de propaganda oficial, a presidente entra no processo de impeachment, se o Supremo não impedir a Câmara de continuar a análise do pedido, com um novo recorde negativo de 70% de reprovação popular, segundo a CNI.

A falta de popularidade não é motivo para impedimento, mas certamente alguma recuperação nos índices seriam bem-vindos no Palácio do Planalto durante o processo de discussão sobre a abertura do processo na Câmara. O problema é que as previsões indicam um aprofundamento da recessão e a ampliação do desemprego no primeiro trimestre de 2016, período crítico da discussão do impeachment.

A abertura do processo de impeachment, entretanto, não teve impacto direto na popularidade da presidente Dilma, segundo avaliou o gerente de pesquisa CNI, Renato da Fonseca. "São temas tratados já há algum tempo, a crise política e econômica. Já estamos convivendo com ela desde o início do ano", disse.

A pesquisa foi realizada entre 4 e 7 de dezembro e tem abrangência nacional. Foram realizadas 2.002 entrevistas em 143 municípios. A margem de erro é de 2 pontos percentuais.

Merval Pereira: Os limites da lei

- O Globo

“Até onde vocês vão?”, perguntou um deputado a um procurador da Operação Lava-Jato, quase como o admoestando. O procurador respondeu na bucha: “Vamos até onde vocês foram”. Os fatos de ontem, e de dias anteriores, estão mostrando que não há limites, a não ser os da lei, para a ação do Ministério Público e da Polícia Federal. Foi o ministro Teori Zavascki, o relator no Supremo do caso, quem autorizou as buscas e apreensões na casa de deputados, senadores, ministros e outros menos votados, mas o ministro deixou de fora o presidente do Senado, Renan Calheiros, não se sabe exatamente por quê.

Mesmo assim, pessoas ligadíssimas a Calheiros, como o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, também foram alvo das ações da Polícia Federal ontem. A reação geral foi dizer que a ação nas casas e no escritório de Eduardo Cunha já não teria efeito, pois ele tivera tempo de esconder o que porventura denunciasse suas atividades ilícitas.

Mas, além do exemplo do empresário Marcelo Odebrecht — que, preso depois de quase um ano de Operação Lava-Jato, ainda tinha anotações em notebooks e celulares —, O GLOBO revela que os policiais encontraram na casa de Cunha um táxi de propriedade de Altair Alves Pinto, apontado pelo delator Fernando Baiano como intermediário da propina destinada ao deputado no esquema de corrupção envolvendo a Petrobras. Cunha diz que usa o táxi para “serviços gerais”, dando ares de verdade à delação de Baiano.

Dessa vez a operação policial pegou especialmente o PMDB, sem distinção de alas: ministros do PMDB governista; Eduardo Cunha, o inimigo preferido; e apaniguados do presidente do Senado, que estava do lado de Dilma, mas pode mudar de ideia a qualquer momento se sentir cheiro de queimado.

A abrangência das ações reflete o ambiente político difícil que se vive em Brasília, a sensação de que todo mundo pode ser o alvo da vez, de que todos estão envolvidos em algum tipo de corrupção.

Especificamente nesse caso, os danos são generalizados. Se a presidente Dilma pode ter ficado satisfeita com a ação contra Eduardo Cunha — e ele está convencido de que, por trás da decisão, está a mão do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que esteve em missão secreta em Curitiba semana passada —, seus ministros, da parte do PMDB que ainda está com o governo, foram atingidos. Dessa vez não há o que grupos políticos possam comemorar.

O presidente da Câmara, que sofreria mais tarde uma derrota no Conselho de Ética por placar apertado, deve estar buscando maneira de retaliar o governo, mas está cada vez mais isolado, não tem muito mais por onde agir. Tem agora que tentar escapar de um destino que parece marcado.

Cunha deve estar rezando para que o recesso chegue, mas deve lembrar-se de que a Operação Lava-Jato não tem recesso. Vivemos no país uma situação paradoxal. Enquanto algumas das instituições da República funcionam muito bem, dando garantia à democracia — como a Polícia Federal, o Ministério Público, os tribunais superiores, cada vez mais juízes de primeira instância, a exemplo de Sérgio Moro, a imprensa livre —, outras funcionam muito mal, como o Congresso e o Executivo, envolvidos em ações de corrupção que parecem não ter fim.

O Congresso hoje não tem nenhum respeito da sociedade, e, cada vez que uma ação como essa acontece, mais o descrédito na política se acentua.

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Piada
O que era dito como piada acabou acontecendo na realidade, como farsa, é verdade, mas com ares de seriedade. O senador Fernando Collor de Mello subiu ao púlpito do Senado para falar sobre “a possibilidade de um direito readquirido”. Isso mesmo. Perguntou, sem nenhum sinal de deboche, o expresidente impichado: se o Supremo Tribunal Federal na reunião de hoje resolver mexer no rito do processo de impeachment, “não seria o caso de se rever aquela decisão de 1992 e reconhecer, pelos novos fatos, pelas novas interpretações e pelo novo rito processual, um vício de origem naquele processo de 1992?”.

Era só o que faltava.

Jorge Bastos Moreno: Só sobraram as emas do Jaburu

- O Globo

A Operação Catilinárias dizima politicamente o PMDB, numa ação jamais vista na História, nem mesmo na ditadura que tirou do Parlamento, em tempos distintos, três líderes da legenda: Martins Rodrigues, Mário Covas e Alencar Furtado.

Claro que a cúpula do partido está negando essa carnificina, que atinge indistintamente o PMDB dissidente e o governista — do arqui-inimigo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, ao último bastião peemedebista de Dilma no Senado, o presidente da Casa, Renan Calheiros.

Escaparam da chacina apenas o vice-presidente Michel Temer e as emas do Palácio do Jaburu. Por isso, há uma inquietude dentro da legenda. E a reunião da Executiva de hoje poderá ser determinante para a antecipação da convenção nacional, que vai decidir o futuro da relação com o governo. Aprovada a antecipação dessa convenção, danou-se: é sinal de que o partido vai mesmo romper com a Dilma.

À tese conspiratória de que o governo tem dedo dentro da Lava-Jato, levantada primeiramente por Lula, ao suspeitar do ministro da Justiça, há um contra-argumento: ao contrário do seu antecessor, que era uma centopeia, o governo Dilma tem apenas duas pernas: o PT e o PMDB. Atingidas as duas legendas, o governo fica agora numa cadeira de rodas, à mercê, na política, do processo de impeachment, e, na economia, dos 0,7% do superávit exigidos pelo ministro Joaquim Levy para continuar no cargo.

Novas emoções estão por vir. Os amigos de Renan, que acham que ele foi apenas bordejado pela Lava-Jato, não têm dúvidas de que ele será o próximo alvo. Para manter a isonomia, fontes do próprio governo admitem que um ministro palaciano estaria na fila. O curioso, nesse caso, é que o dito cujo, que até o momento não passa de vítima de especulações, já está aceitando a carapuça e, em ato de desespero, acusa o colega Cardozo de estar por trás desses boatos e tem xingado os blogueiros que começam também a tratar do caso.

Lauro Jardim: Temer e PMDB veem dedo do governo

• Até Michel Temer, sabidamente avesso a teorias conspiratórias, avaliou em conversas que a ação foi um cerco ao partido. Aliás, Temer é uma espécie de sujeito oculto de toda a Operação PMDB

- O Globo

A nova fase da Lava-Jato foi batizada de Catilinárias pela PF. Mas poderia ser chamada de Operação PMDB. O partido acordou ontem perplexo — e assim passou o resto do dia. A turma peemedebista esperava, sim, uma ação pesada sobre Eduardo Cunha. Uma pancada em Cunha estava precificada.

Mas uma ação com essa abrangência não passava pela cabeça de ninguém do partido.

Seus dirigentes desenvolveram, ao longo do dia, diversas teorias conspiratórias para tentar explicar as razões ocultas da PF. Todas apontavam para uma trama do governo Dilma. Por exemplo: “O que teria feito o governo a sacrificar dois ministros e botá-los na roda?”, perguntava um dirigente peemedebista, certo, como todos os seus pares, de que havia dedo do Palácio do Planalto no desmonte de ontem.

“Por que atingir Renan Calheiros, que tem sido até aqui leal ao governo?”, questionava outra liderança do PMDB. Renan, ressalte-se, não foi atingido diretamente, mas foi cercado: três pessoas próximas a ele foram alvo da Catilinárias. A chance de convencer um peemedebista de que o governo não se mexeu para botar o partido na fogueira é igual a zero.

Até Michel Temer, sabidamente avesso a teorias conspiratórias, avaliou, em conversas com alguns interlocutores, que a ação foi um cerco ao partido. Aliás, Temer é uma espécie de sujeito oculto de toda a Operação PMDB.

No momento em que bota a cabeça para fora como o provável sucessor de uma Dilma pós-impeachment, seu partido entra da pior maneira possível no centro do palco.

E vêm as perguntas óbvias: só faltou Temer nas buscas da PF? Ou só sobrou ele? E sobrou por quanto tempo? São dúvidas que nublam os planos mais imediatos do vice-presidente e embaralham mais um pouco o xadrez do impeachment.

Dora Kramer: Ligações tenebrosas

- O Estado de S. Paulo

A mais recente desventura do deputado Eduardo Cunha era de certa forma esperada. Em algum momento, a Polícia Federal e o Ministério Público precisariam ir atrás de provas para sustentar as denúncias contra o presidente da Câmara.
O inesperado, nessa nova fase da Lava Jato que atingiu outros personagens, apresentou-se na forma de um tiro de canhão dado no coração do PMDB. Cunha vinha sendo tratado oficialmente como um caso à parte.

A inclusão de gente como Edison Lobão, Henrique Eduardo Alves e Sérgio Machado no rol de alvos da mais consistente ação de combate à corrupção empreendida pela PF e a Procuradoria-Geral da República, instala o partido no meio do lodaçal que assola o País e põe em xeque os caciques. Dez dos 17 alvos da operação de ontem ligados ao PMDB.

Para citar apenas os notórios: Lobão remete ao ex-presidente e senador José Sarney, o ministro Henrique Eduardo ao vice-presidente Michel Temer e o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado ao presidente do Senado, Renan Calheiros. Todos eles estão ligados ao primeiro escalão pemedebista.

Portanto, não há como o partido ignorar a gravidade da situação e muito menos dizer que não tem nada com isso. A versão de que se trata de uma retaliação resultante de um acerto entre o Palácio do Planalto e o procurador Rodrigo Janot não resiste à lógica, à força dos fatos nem à lisura dos atos.

A lógica indica que se o governo tivesse poder de fazer acordos, os faria em favor dos seus e o senador Delcídio Amaral, interlocutor frequente de Dilma e Lula, dois ex-tesoureiros do PT e um ex-ministro da Casa Civil não estariam presos. Os fatos falam por eles mesmos e os atos são legalmente consistentes, feitos com respaldo do Supremo Tribunal Federal.

A cantilena da vingança repete a tentativa do governo de dizer que a aceitação do processo de impeachment foi um ato de retaliação de Eduardo Cunha. Ambos os lados se acusam de tentativas de “desviar o foco” quando, o ponto onde se concentra a luz, não se desvia de nenhum dos dois.

Afora isso, digamos que petistas e governistas não têm razões para comemorar porque entre os atingidos o único adversário assumido do Planalto é Eduardo Cunha. Os demais são ou foram integrantes da equipe de Dilma Rousseff.

Filme triste. A tropa de choque de Eduardo Cunha no Conselho de Ética conseguiu adiar a aprovação da abertura do processo por quebra de decoro por sete sessões e 62 dias. O presidente da Câmara, é fato, ganhou tempo, mas este foi o único benefício obtido por ele.

Nesse meio tempo, sua situação legal se complicou de maneira irremediável e sua condição política se deteriorou de forma contundente interna e externamente. Assumiu o cargo há menos de um ano com o alegado propósito de restaurar a “dignidade e a independência” da Câmara e não fez uma coisa nem outra.

Ao contrário. Cometeu a indignidade de tentar obstruir os trabalhos do conselho e, com isso, subordinou a soberania da instituição aos seus interesses pessoais.

Não só. O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, ardoroso defensor da manutenção do mandato da presidente, fundamenta assim sua posição: “O poder se ganha disputando eleição”. Refere-se, evidentemente, a regimes democráticos.

Democracia esta que prevê – no caso brasileiro, com clareza constitucional meridiana – a perda de poder para os que, uma vez ganhas as eleições, não governam dentro dos preceitos legais indispensáveis ao exercício da função.

Rosângela Bittar: Melhor prender a respiração

• Há um filtro na PGR, de critério obscuro e subjetivo

- Valor Econômico

O país amanhece esta quarta-feira à espera de uma definição do seu destino por um instrumento da disfunção: o Supremo Tribunal Federal, numa mistura de atribuições, usurpou a do Parlamento e decidiu produzir, em uma semana, uma legislação geral sobre o impeachment, a pretexto de atualizar e readaptar o seu rito. O STF, hoje, é um partido, dividido como todos, tendo sua maior parte integrada por governistas do atual grupo que domina o poder Executivo.

Muitos já se acostumaram com sua forma de atuar, bem como com as estranhas campanhas feitas por alguns de seus membros para serem nomeados, com a contratação de assessoria e aparato eleitoral para propagar seu nome e isenção, mesmo que o engajamento político anterior tenha sido absolutamente partidário.

Assim, não há surpresa no modelo e na decisão que vier a ser tomada hoje, inclusive a possibilidade da não intervenção no Congresso, realmente é possível. Há quem diga, até, que o ministro Edson Fachin entregou ontem a norma que elaborou sobre o rito do impeachment aos colegas, contando com a possibilidade de vazamento para o STF ter uma medida das reações. Parece um pouco demais, mas nada, na política, hoje, é demais.

A estranheza bateu com a disposição do ministro que suspendeu as decisões da Câmara de fazer uma norma em apenas uma semana para arbitrar questões de vida ou morte entre os poderes da República. Ingrediente que veio contaminar um cenário já radicalmente poluído em todos os seus ângulos, a começar da Presidência da República.

Suspeitas de que, por ter sido presidente do Conselho Diretor da Petrobras e candidata em uma campanha financiada em parte com dinheiro de propina das empreiteiras, cujo tesoureiro, já citado nas denúncias, é seu ministro da Comunicação e porta-voz, podem não deixar a presidente Dilma Rousseff passar incólume pela devastação. No momento, com toda a carga negativa da mega operação de combate à corrupção trazendo nuvens a seu governo, onde abriga quatro ministros (Comunicação, Educação, Ciência e Tecnologia e Turismo) citados nas delações dos pagadores de campanha eleitoral, a presidente está no foco de um processo de impeachment por outro crime, o de responsabilidade, por atos de incompetência e ilegalidade na administração pública.

O ex-presidente Lula já estava no redemoinho, e enroscou-se mais, vendo o cerco das investigações chegar à sua casa, ao seu Instituto e ao centro de suas relações pessoais, onde estão seus amigos diletos. Aos poucos, vai deixando de socorrer a presidente que escolheu para sucedê-lo e a quem pretendia suceder daqui a três anos.

Os dois partidos de sustentação do governo federal nos últimos 13 anos, o PT e o PMDB, estão comprometidos estruturalmente. Alguns dos partidos aliados também entraram nas investigações e estão incluídos nas denúncias feitas por aqueles mesmos que pagam propina. O PT vem caindo na malha desde o mensalão, membros da cúpula partidária continuaram a tombar na nova operação, e o PMDB foi colhido, como partido, em todas as suas facções, durante o ataque de ontem, denominado de forma insultante "Catilinárias", em que a polícia federal, ou o ministério público, ou ambos, resolveram tomar partido e chamar a todos de golpistas.

Os presidentes da Câmara e do Senado, o primeiro já denunciado e o segundo escapando mas com seus apadrinhados no foco da investigação, estão sem condições de exercer o seu papel institucional.

A esse estado geral de desídia soma-se um governo paralisado. Os ministros alvo da busca e apreensão de ontem estiveram até agora sentados na mesa oval da Presidência, em reunião de apoio a Dilma, como estarão amanhã, se não forem demitidos (os do PT citados não saíram) nas próximas reuniões ministeriais.

Há líder do governo e dos partidos denunciados presos, governadores aliados, defensores ferrenhos do status quo, também citados com todo o seu grupo no canal de propinas da Petrobras.

Quem vive do governo federal, como governadores e prefeitos de capitais, além de movimentos organizados, são instados a pagar a conta e assumir a defesa do indefensável. Os ministros do Planejamento e da Fazenda se bombardeiam, e o da Fazenda, fiador da recuperação econômica de um país levado ao abismo pela incompetência, ameaça sair a cada semana, porque não tem apoio, mas não sai. Deve saber da piada que corre mundo, de que plastificou sua carta de demissão, mas não é com ele.

Uma definição do ex-deputado petista e sociólogo Paulo Delgado retrata bem o que se descortina no Planalto: "O zêlo da Dilma para preservar o mandato é maior do que para exercê-lo".

Um governo que só se movimentou nos últimos dois meses para se manter no cargo, em campanha pelo Brasil para entregar benefícios, e ainda assim teve queda de popularidade em pesquisa divulgada ontem. Se a presidente tivesse feito ao longo do ano a metade da mobilização que fez agora, seus súditos teriam a impressão de que governou.

E ainda se exige do Congresso que esqueça os maus tratos, concentre-se e vote as medidas de interesse do Executivo. Pedir isso ao Judiciário amigo ainda dá para entender, mas ao Congresso? O poder que mais trabalhou em 2015?

É impossível aos juristas de qualquer tendência prever o que poderá sair hoje do STF. Os partidos já descobriram a manha e vão modificando sucessivamente as ações até que caiam no sorteio com um relator amigável, que vai alimentar-lhe os sonhos. Do STF nomeado pelo PT esperam misericórdia.

Existe alguém em condições de governar os brasileiros? E quem comandará o processo de expiação dos pecados? Ah!! Há um filtro gigantesco na Procuradoria Geral da República, até agora não explicado, ainda cheio de critérios obscuros e distantes do eixo, à mercê da subjetividade.

Quem se habilita?

Luiz Carlos Azedo: Virada de vante

• Cunha sai ferido de morte da operação de ontem, mas resiste aos apelos — inclusive de Temer — para que renuncie ao cargo de presidente da Câmara

- Correio Braziliense

Com as operações de busca e apreensão realizadas pela Polícia Federal em mais uma fase da Operação Lava-Jato, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, atirou no presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ); nos ministros de Ciência e Tecnologia, Celso Pansera, e do Turismo, Henrique Eduardo Alves; no senador Edison Lobão (PMDB-MA); no deputado Aníbal Gomes (PMDB-CE); no ex-senador Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro; e no prefeito de Nova Iguaçu (RJ), Nélson Burnier, caciques peemedebistas, e acertou também no vice-presidente Michel Temer — politicamente falando, é claro.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), escapou de levar um balaço no peito graças ao ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, que rejeitou o pedido de busca e apreensão em sua residência solicitado pelo Ministério Público. Mas sai arranhado em razão da operação realizada na sede do diretório do PMDB de Alagoas, em Maceió, além de fato de que alguns dos investigados serem pessoas muito próximas a ele. Por pouco, uma bala perdida não acerta o ex-presidente José Sarney.

A operação comandada por Janot, que tem nome de almirante, foi como a virada de vante de uma canhoneira, que atirava a bombordo e agora dispara pra boreste. Desviou o foco da opinião pública da cúpula do PT e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estão sob a mira dos procuradores e do juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, para os caciques do PMDB, que são investigados com autorização do ministro Teori, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal. A busca e apreensão nos escritórios do senador Fernando Bezerra (PSB-PE) também serviu como tiro de advertência ao clã Arraes, em Pernambuco.

A Polícia Federal fez buscas e apreensões nos estados do Pará, de Alagoas, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e Rio Grande do Norte, além de Brasília. A residência oficial do presidente da Câmara e a Diretoria-Geral da Casa também receberam a visita dos agentes federais. A PF esteve ainda na sede do PMDB em Maceió. Batizada de Catilinárias, a operação foi realizada no dia em que o Conselho de Ética se reuniu para votar a admissibilidade do pedido de cassação de Eduardo Cunha, que foi aprovado, e às vésperas da sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) que definirá o rito de tramitação do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Recado
O nome da operação foi um recado político para Cunha, pois faz referência um dos quatro discursos proferidos pelo cônsul romano Cícero contra o senador Catilina, que tentava um golpe para derrubar a República romana: “Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda há de zombar de nós essa tua loucura? A que extremos se há de precipitar a tua audácia sem freio? (...)”

Considerando o contexto político e o restante do texto, pode ser também um recado para o vice-presidente Michel Temer: “(...) Nem a guarda do Palatino, nem a ronda noturna da cidade, nem os temores do povo, nem a afluência de todos os homens de bem, nem este local tão bem protegido para a reunião do Senado, nem o olhar e o aspecto destes senadores, nada disto conseguiu te perturbar? Não sentes que os teus planos estão à vista de todos? Não vês que a tua conspiração a têm já dominada todos estes que a conhecem? Quem, de entre nós, pensas tu que ignora o que fizeste na noite passada e na precedente, em que local estiveste, a quem convocaste, que deliberações foram as tuas?”

Cunha sai ferido de morte da operação de ontem, mas resiste aos apelos — inclusive de Temer — para que renuncie ao cargo de presidente da Câmara. Para a oposição, tornou-se um obstáculo ao impeachment, embora, ironicamente, seja o seu principal protagonista. De certa forma, os fatos de ontem favorecem o Palácio do Planalto e o Ministério Público, que pleiteiam a anulação da eleição da comissão especial encarregada de apreciar a admissibilidade do pedido de impeachment apresentado pelos juristas Miguel Reale Júnior, Hélio Bicudo e Janaína Paschoal e pela oposição.

O relator do impeachment no STF, ministro Luiz Edson Fachin, ontem distribuiu seu voto aos colegas. Com 100 páginas, foi mantido em sigilo. Nem todos os ministros aceitaram a oferta antecipada do texto, como foi o caso de Marco Aurélio Mello, que prefere tomar conhecimento de seu conteúdo durante a leitura na Corte. A operação de ontem serviu como uma espécie de limpeza de terreno para o STF estabelecer o rito do impeachment com a cúpula do Congresso de joelhos.

No Palácio do Planalto, houve vibração com a operação, apesar do boato de que um dos ministros da Casa seria alvo de busca e apreensão da Lava-Jato, o que deixou o ministro da Comunicação Social, Edinho Silva, de orelha em pé. A pesquisa de Ibope divulgada ontem, porém, foi um banho de água fria: a maneira de governar de Dilma Rousseff continua amplamente desaprovada: 82%. Somente 14% têm uma avaliação positiva da forma como a presidente administra o país. A confiança em Dilma também é baixa: 18%. Outros 78% não confiam na presidente.