quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Opinião do dia – Fernando Henrique Cardoso

Quando o Executivo não tem apoio da sociedade também não tem do Congresso. No caso atual, nem quero personalizar muito, a estrutura do nosso sistema político é tão antiquada que ela precisa mudar. Se você não mudar essa estrutura não há líder que aguente. Tem que haver mudança da estrutura de comando no Brasil. Não estou falando de impeachment, nada disso. Porque também mudar a pessoa não resolve. Tem que mudar mais coisas do que a pessoa.
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Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República, em palestra, O Globo, 22 de outubro de 2015

Oposição pede impeachment de Dilma por atos de 2015

Débora Álvares, Ranier Bragon – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Suspeito de esconder contas bancárias na Suíça e acusado de envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), recebeu na manhã desta quarta-feira (21) o novo pedido de impeachment contra Dilma Rousseff. Assinada pelo ex-petista Hélio Bucudo e pelo jurista Miguel Reale Jr., a peça é chancelada pela oposição e tem entre os argumentos justamente os desvios na estatal.

Como informou o Painel, o novo pedido de impeachment contempla também decretos assinados pelo governo em 2015 que aumentaram em R$ 800 milhões as despesas do Executivo sem autorização do Congresso.

Os novos argumentos são uma forma de tentar provar que Dilma continuou a cometer neste ano irregularidades fiscais que levaram o TCU (Tribunal de Contas da União) a reprovar as contas de 2014 da presidente.

Mais uma vez, o presidente da Câmara abriu seu gabinete para 12 deputados do DEM, PSDB, PPS e SD para uma espécie de cerimônia de entrega dos documentos. Também estiveram presentes integrantes do Movimento Brasil Livre.

"O PT notabilizou-se por ter dois ex-presidentes presos. A marca dele é a corrupção e o governo também tem esta marca", afirmou o líder do PSDB, Carlos Sampaio (SP), que não compareceu à coletiva convocada. Na terça (20) a oposição fez um tímido pedido de afastamento de Cunha da Presidência da Casa.

Ao receber o pedido de impeachment de Dilma, o peemedebista afirmou que vai "processá-lo da forma mais célere possível" e que fará um "exame com total isenção".

O rito previsto para um possível processo de impeachment está suspenso devido a liminares do Supremo Tribunal Federal. Mas Cunha recorreu e mantém, de todo modo, o poder de decidir sozinho se arquiva ou dá sequência ao pedido.

Caso opte pela segunda opção, como a oposição quer, é instalada uma comissão especial para dar um parecer ao plenário. Dilma é afastada caso pelo menos 342 dos 512 deputados (Cunha não vota neste caso) decidam abrir o processo de impeachment.

Mesmo após virem à tona documentos que ligam o nome de Cunha a contas secretas no exterior, líderes das principais bancadas de oposição e do governo continuam, nos bastidores, a dar suporte político para que o peemedebista permaneça no cargo.

O pedido
Ao apresentar os fatos para o pedido de impeachment de Dilma, os juristas Hélio Bicudo e Miguel Reale Jr. mencionam as apurações do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que, segundo eles, "tem apurado inúmeras fraudes, verdadeiros estelionatos, encetados para garantir a reeleição" de Dilma.

A peça também trata das conclusões do TCU (Tribunal de Contas da União) que, conforme o texto, "assinalou flagrantes violações à Lei de Responsabilidade Fiscal".

"Houve uma maquiagem deliberadamente orientada a passar para a nação (e também aos investidores internacionais) a sensação de que o Brasil estaria economicamente saudável e, portanto, teria condições de manter os programas em favor das classes mais vulneráveis".

Em seguida, os juristas se voltam à Operação Lava Jato que, para eles, "realizou verdadeira devassa em todos os negócios feitos pela Petrobras". Eles mencionam as delações de Paulo Roberto Costa e Alberto Yousseff e falam que "a promissora estatal, atualmente, encontra-se completamente descapitalizada e desacreditada, inclusive internacionalmente".

"Existe a tese de que nada haveria contra a Presidente da República. No entanto, os escândalos que se sucedem, de há muito, passam próximos a ela, não sendo possível falar em mera coincidência, ou falta de sorte. A Presidente da República faz parte desse plano de poder. E os Poderes constituídos precisam nos termos da Constituição Federal, agir", completam os juristas na peça do impeachment.

Ao longo do documento, falam ainda da proximidade de Dilma com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem fazem inúmeras referências sobre interferências no governo e possível envolvimento nos ilícitos investigados na Operação Lava Jato.

O texto também questiona o fato de Edinho Silva, ministro da Secretaria de Comunicação Social de Dilma, ser mantido no governo apesar de ser acusado na Lava Jato por ter recebido propina quando tesoureiro da campanha da petista.

Conforme a peça, o governo Dilma é responsável por "sérias lesões ao orçamento, seja pela edição de decretos não numerados abrindo crédito suplementar, sem autorização do Congresso Nacional; seja pela prática das chamadas pedalas fiscais, com inequívoca maquiagem das contas públicas".

Governo prevê sobrevida de Cunha na chefia da Câmara

Marina Dias, Gustavo Uribe – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O Palácio do Planalto e a cúpula do PMDB decidiram interromper as negociações sobre a possível sucessão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), após avaliarem que ele deve permanecer no cargo pelo menos até o fim deste ano.

Integrantes do governo e caciques do PMDB acreditam que Cunha ainda tem apoio na Casa, e poderá recorrer a manobras regimentais para adiar o processo contra ele na Comissão de Ética da Câmara.

Suspeito de esconder contas bancárias na Suíça e acusado de envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras, o peemedebista foi alvo de representação do PSOL e da Rede, que pedem a cassação de seu mandado.

Mesmo com o agravamento das denúncias, a ordem no Planalto era aguardar a definição da cúpula do PMDB sobre o nome que poderia substituir Cunha e apoiar a eventual candidatura aliada para a presidência da Câmara.

Mas o receio de se indispor ainda mais com o peemedebista, que trocou acusações com Dilma no início da semana, fez com que o governo suspendesse as negociações.

Nesta quarta (21), Cunha recebeu um novo pedido de abertura de processo de impeachment contra Dilma e tem repetido que, apesar de o STF (Supremo Tribunal Federal) ter interrompido o rito proposto por ele para tramitar os processos na Casa, deferir ou não os pedidos ainda é uma decisão sua.

Cunha também conta com o apoio dos líderes dos dois principais partidos de oposição, o PSDB e o DEM, que consideram que, enquanto estiver no cargo, ele mantém a legitimidade para tocar o dia a dia do Legislativo. Publicamente, os dois partidos defendem que Cunha se afaste da presidência da Câmara, mas nos bastidores continuam lhe dando suporte político.

A preocupação do Planalto e de setores governistas do PMDB é que um debate sobre a sucessão na presidência da Câmara neste momento possa enterrar a tentativa de acordo de trégua do governo com Cunha e prejudicar as votações no Congresso.

Para evitar que ele tenha controle do processo de sucessão, a cúpula do PMDB pretende levar a definição de um nome para substituir Cunha à Executiva Nacional do partido, que deve se reunir somente no ano que vem.

O líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), era visto pelo Planalto como uma alternativa a Cunha na presidência da Casa, mas seu nome foi esvaziado pelos próprios colegas de partido, que não se sentiram representados pelas indicações de Picciani na reforma ministerial.

O Planalto também teme uma nova derrota na disputa pela sucessão da Câmara.

Em fevereiro, quando Cunha foi eleito presidente da Casa, o governo apoiou a candidatura de Arlindo Chinaglia (PT-SP). A derrota na eleição da Câmara é vista como o início da crise política que acomete o governo.

Colaboraram Ranier Bragon e Débora Álvares, de Brasília

Cunha busca fôlego com novo pedido de impeachment de Dilma

• Presidente da Câmara recebe novo pedido contra Dilma e planeja usar possibilidade de abrir ação em busca por sobrevida política

Igor Gadelha - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A oposição apresentou ontem um novo pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff que tem como acusação central a prática irregular de pedaladas fiscais neste ano. O efeito imediato da nova peça, porém, não está no âmbito jurídico, mas sim no político. A nova investida da oposição pode conferir um novo fôlego ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a quem caberá analisar o pedido.

Ao incluir a acusação de que o governo "pedalou" (fez manobras contábeis) também em 2015, a oposição tenta evitar duas contestações jurídicas: a de que os pedidos anteriores, que se baseavam em irregularidades nas contas de 2014, não poderiam ser aditados, e a de que o presidente da República não pode ser responsabilizado por crimes cometidos anteriores ao seu atual mandato.
O novo texto inclui decretos assinados pelo Executivo em 2015 que aumentam as despesas do Executivo sem autorização do Congresso Nacional.

Mas é na esfera da política que o novo pedido ganhou força. Alvo de uma denúncia e de um inquérito no Supremo Tribunal Federal, Cunha tenta ganhar sobrevida política, já que passa a ter em suas mãos um requerimento válido para barganhar com o governo e a oposição. Isso porque cabe a ele aceitar ou rejeitar o pedido.

Envolvido em acusações de que possui contas secretas na Suíça, por meio das quais teria recebido propina de contratos com a Petrobrás, e patrimônio não declarado no exterior de cerca de R$ 61 milhões, o peemedebista poderá usar o requerimento como moeda de troca de apoio do governo para tentar evitar sua cassação por quebra de decoro parlamentar.

'Isenção'. Carregando a petição e três grandes pastas de anexos em um carrinho de ferro, líderes do DEM, PSDB, PPS e Solidariedade entregaram o novo pedido ao presidente da Câmara. O peemedebista prometeu analisá-lo com "toda isenção" e processá-lo "dentro da normalidade e legalidade". Cunha afirmou que não há prazo para anunciar se vai deferir ou não o pedido. A expectativa da oposição, contudo, é de que a resposta seja anunciada até o fim de novembro.

O novo pedido de afastamento da presidente foi apresentado pela oposição após liminares concedidas pelo STF proibindo o rito de tramitação de processos de impeachment de Dilma, estabelecidos por Cunha ao responder questão de ordem da oposição, e aditamentos a requerimentos de afastamentos já apresentados. A previsão inicial era de que o novo pedido fosse protocolado na sexta-feira passada. A inclusão dos decretos que aumentaram as despesas do governo, contudo, provocou o adiamento.

Líderes da oposição se mostraram confiantes de que o presidente da Câmara vai deferir o pedido. Embora tenham reiterado anteontem o conteúdo de nota em que pedem o afastamento do peemedebista do cargo, oposicionistas avaliaram que Cunha tem toda a legitimidade para analisar o requerimento, mesmo envolvido em denúncias de corrupção. Para o líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), o peemedebista possui "legitimidade e prerrogativas" para analisar o requerimento, enquanto não renunciar ou se licenciar do cargo.

Governo. Depois de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter buscado uma aproximação com Cunha na semana passada, os articuladores do Palácio do Planalto têm recomendado cautela aos deputados da base aliada no trato com o presidente da Câmara.

Apesar de recentes embates entre Cunha e a presidente Dilma Rousseff, a orientação é para que ele não seja fustigado em demasia pelos governistas.

O temor é de uma reação imediata dele em favor da abertura do pedido de impeachment.

Reservadamente, o governo avalia que a principal batalha do presidente da Câmara se dá na esfera jurídica, por conta das decisões do Supremo, e que ele não conseguirá permanecer por muito tempo no cargo.

Manobra de Renan dá prazo para gestão Dilma

• Presidente do Senado concede 45 dias para defesa do governo, o que deve jogar para 2016 a análise das contas na Comissão Mista de Orçamento

Erich Decat e Isabela Bonfim - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Após idas e vindas em torno dos procedimentos que deverão ser adotados na avaliação do parecer do Tribunal de Contas da União (TCU), que rejeitou as contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff, o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), decidiu manter sua ideia inicial e dar prazo extra de 45 dias para a apresentação da defesa do governo na Comissão Mista de Orçamento (CMO).

A manobra de Renan, antecipada na terça-feira pelo portal www.estadao.com.br, deve jogar para março de 2016 as discussões em torno da chamadas pedaladas fiscais - atrasos deliberados no repasse de recursos do Tesouro Nacional aos bancos públicos para pagamento de benefícios sociais.

Além desse prazo para o “contraditório”, segundo o regimento interno da CMO, o parecer do TCU deve demorar mais 77 dias em tramitação. O senador Acir Gurgacz (PDT-RO) será o relator na CMO.

Na avaliação de alguns senadores, a manobra de Renan, realizada com apoio de integrantes da bancada do PMDB, tem como objetivo manter o governo “em suas mãos” pelos próximos meses, já que ele passa a ter total controle sobre o calendário de votação do parecer do TCU. Após passar pela CMO, caberá a Renan distribuir a decisão do colegiado para votação no Senado e na Câmara. Integrantes da assessoria técnica do Congresso informam que o regimento interno não estabelece prazo para essa distribuição.

Delação. Senadores governistas lembram que a iniciativa de Renan em conceder o prazo extra foi tomada menos de uma semana após o vazamento da delação do lobista Fernando Falcão Soares, o Fernando Baiano, apontado como operador de propinas do PMDB. Além de Renan, Baiano também citou como beneficiários do esquema de desvios na Petrobrás Jader Barbalho (PMDB-AP) e o líder do governo Delcídio Amaral (PT-MS). Todos negam envolvimento. Os três estiveram reunidos na terça-feira à noite com a presidente da CMO, Rose de Freitas (PMDB-ES), no gabinete de Renan. A senadora foi contra a manobra.

A posição irredutível de Rose contrariou Barbalho que, segundo relatos, teria gritado e batido na mesa, com um jornal em mãos. “Não estamos discutindo num Jardim de Infância”, disse o senador, segundo um dos presentes. Procurada, Rose limitou-se a declarar que “lamentava a grosseira”. Na mesma noite, o ministro Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo) ligou para Renan para dizer que também era contra o prazo extra. O líder do governo no Congresso, José Pimentel (PT-CE), também foi contra. Na avaliação de ambos, o governo teria votos para derrubar o parecer do TCU na CMO, sem necessidade de mais prazo.

Delcídio Amaral considerou que não havia garantia de desfecho favorável ao governo com a atual composição da comissão. Diante disso, a cúpula do Senado preferiu manter a ideia do prazo extra. Com isso, as discussões na comissão só serão encerradas em 2016, quando a composição deve ser renovada.

Despacho. Após chegar a um consenso, Renan Calheiros preparou um despacho previsto para ser divulgado hoje no Diário Oficial do Senado. Nele, o peemedebista ressalta que o tramite da CMO não prevê a apresentação do contraditório, o que poderia acarretar na judicialização do processo.

CPI da Petrobrás aprova texto que livra Dilma e Lula

CPI da Petrobrás aprova relatório que poupa políticos

• Relator da comissão, o deputado Luiz Sérgio (PT-RJ), manteve críticas à Operação Lava Jato e ao expediente das delações premiadas

Daiene Cardoso e Daniel Carvalho - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Por 17 a favor, nove contra e uma abstenção, o parecer final do relator Luiz Sérgio (PT-RJ) foi aprovado pela CPI da Petrobrás. A votação se estendeu pela madrugada e nenhum dos quatro destaques propostos para alterar o texto foi aprovado.

Luiz Sérgio apresentou uma nova versão de seu criticado relatório. Pedidos genéricos foram excluídos do texto e mais de 70 personagens que já haviam sido nominalmente citados na primeira versão foram acatados. No final da noite, o petista acolheu o pedido de indiciamento de empresários da família Schahin e surpreendeu ao aceitar a inclusão do ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. Luiz Sérgio manteve em seu relatório críticas à operação Lava Jato e ao expediente das delações premiadas.

Apesar ter continuado a poupar políticos, o relator incluiu a contragosto empreiteiros, doleiros, carregadores de mala, funcionários e ex-funcionários da Petrobrás que haviam sido listados pelos sub-relatores como alvos de indiciamento. Todos eles, na verdade, já são investigados e alguns até condenados na Operação Lava Jato.

O último destaque, apresentado pelo PSDB, pedia ao Ministério Público "especial atenção à responsabilização penal dos agentes políticos hierarquicamente superiores e com poder de comando em relação ao projeto Gasene sustentando-se a teoria do Domínio do Fato". Os tucanos queriam a investigação dos ex-presidentes da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli e Graça Foster, além da presidente Dilma Rousseff. Para Graça, havia um pedido de abertura de inquérito.

Insatisfeitos com o parecer apresentado pelo relator, representantes de PSOL, PSDB e PMDB apresentaram votos em separado incluindo políticos na lista de sugestões de indiciamento e de instauração de inquéritos civil e criminal. Contrariando o relator petista, os tucanos incluíram a presidente Dilma Rousseff , o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no rol de investigados por suposto envolvimento no esquema de corrupção da estatal.

Os pareceres paralelos sequer foram à votação e foram anexados ao trabalho apenas como manifestações contrárias à posição do relator. O presidente da comissão rejeitou uma questão de ordem propondo a votação dos relatórios paralelos, não dando outra opção de relatório aos membros da CPI. Com exceção do PSDB, PSOL e do DEM, as bancadas foram orientadas a votar à favor do relatório. "Estamos sendo induzidos a votar nesse relatório", protestou a deputada Eliziane Gama (Rede-MA).

O relatório do petista foi fortemente criticado pela oposição e pelo PMDB, que chamaram o parecer de "fracasso" e concluíram que havia corrupção sistêmica na Petrobras, ponto que foi negado pelo petista no documento final. Também atacaram a tentativa do relatório de "desqualificar" as delações premiadas e disseram que a lei da delação precisa ser "louvada". "O Mensalão e o Petrolão têm o mesmo DNA", afirmou o tucano Bruno Covas (SP), defendendo o voto em separado.

"Esse relatório, senhor relator, é pífio, subestima a capacidade de raciocínio do povo brasileiro", emendou a deputada Eliziane. A parlamentar, que também criticou a contratação da consultoria Kroll, avisou que entrará com representação à Procuradoria Geral da República pedindo que a Casa seja ressarcida do R$ 1 milhão que desembolsou com a empresa para rastrear contas no exterior.

Durante a sessão noturna, os membros da CPI fizeram um balanço dos trabalhos da comissão. Alguns reclamaram do encerramento dos trabalhos sem o aprofundamento nas investigações, mas apontaram contribuições da comissão, em especial o depoimento do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), onde ele negou ter contas no exterior. "A mentira tem perna curta e as pessoas acabam tropeçando em seus próprios erros", comentou o tucano Delegado Waldir (GO).

Coube ao deputado Valmir Prascidelli (PT-SP) sair em defesa do relatório, defender a regulamentação das regras da delação premiada e dizer que o escândalo de corrupção na Petrobrás pode ser o maior da história, mas porque desta vez foi investigado. O petista destacou que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso admitiu que havia corrupção na estatal durante seu governo. "Ou ele compactuava com aquela corrupção, ou ele se beneficiava da corrupção, ou protegia alguém", disse. "Isso sim é prevaricar, isso sim é jogar para debaixo do tapete", emendou.

O vice-presidente da comissão, Antonio Imbassahy (PSDB-BA), reagiu e disse que o relatório deixava a digital do PT no "Petrolão". "Essa organização criminosa foi instalada na Petrobrás sob o comando do Palácio do Planalto, a partir do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e mantida e ampliada no governo Dilma Rousseff. Foi uma corrupção verdadeiramente institucionalizada", rebateu.

Pareceres alternativos. Em seu voto paralelo, o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) propôs o indiciamento de Cunha por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa. O deputado solicitava também que a CPI encaminhasse para Mesa Diretora, plenário e Conselho de Ética da Câmara o pedido de cassação do mandato do peemedebista.

Já o PSDB pediu a instauração de inquérito policial contra a presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro Edinho Silva e os ex-ministros José Dirceu, Antonio Palocci, Guido Mantega, Gilberto Carvalho e Ideli Salvatti. Todos eles, com exceção de Dilma, também são alvo de pedido de instauração de inquérito civil.

Os tucanos queriam que os autos fossem encaminhados à Mesa Diretora em forma de denúncia de crime de responsabilidade contra Dilma, o que embasaria pedidos de impeachment. A oposição também solicitou que os autos fossem levados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) como provas nas ações investigatórias em torno da campanha presidencial de 2014. "Isso dá robustez à proposta de impedimento da presidente Dilma na medida em que, flagrantemente, ela cometeu crime de responsabilidade", disse Imbassahy ao Broadcast Político.

O PSDB pede ainda a instauração de inquéritos policial e civil, o aprofundamento na coleta de provas e o processamento de 54 políticos, entre os quais Cunha e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Os pedidos não têm qualquer efeito prático, pois os parlamentares já são investigados.

Os deputados do PSDB sugeriu ainda representação no Conselho de Ética da Câmara por conduta incompatível ou atentatória ao decoro parlamentar contra 20 deputados, entre os quais, Cunha. O mesmo procedimento foi sugerido contra 11 senadores, incluindo Renan Calheiros.

Tucanos citados na Operação Lava Jato ficaram de fora do voto em separado do PSDB. Imbassahy alegou que o Ministério Público pediu o arquivamento do inquérito que investigava o senador Antonio Anastasia (MG) e que o senador Aloysio Nunes Ferreira (SP) foi excluído da Lava Jato e é investigado por supostamente ter se beneficiado de caixa dois.

Pelo PMDB, o deputado Carlos Marum (PMDB-MS) também apresentou voto paralelo pedindo que o relatório admitisse que houve corrupção institucionalizada. O peemedebista sugere que sejam mencionados todos os políticos com mandato acusados nos depoimentos e nas acareações da CPI e que seja revogado o Regime Diferenciado de Contratações na Petrobrás.

Oposição entrega novo pedido de impeachment

Por Fabio Murakawa, Raphael Di Cunto e Maíra Magro - Valor Econômico

BRASÍLIA - Lideres da oposição entregaram ontem um novo pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O texto, assinado pelos juristas Hélio Bicudo e Miguel Reale Jr., trouxe como novidades supostas "pedaladas ficais" cometidas pela presidente Dilma Rousseff neste ano e também a emissão de decretos assinados por ela em 2015 para aumentar os gastos do governo sem autorização do Congresso.

O documento cita também a corrupção na Petrobras, escândalo que envolve também o presidente da Câmara - acusado pelo Ministério Público Federal de manter contas secretas na Suíça com dinheiro desviado da estatal.

A defesa de Dilma acusou a oposição de tentar uma "manobra processual" ao protocolar o pedido. Para a defesa, o pedido "ofende" as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que barraram o rito definido por Cunha para tramitação dos processos que pedem a destituição da presidente.

Com os fatos acrescentados ao novo pedido, a oposição tenta anular o argumento governista de que a presidente não pode ser cassada por supostos crimes de responsabilidade cometidos em seu mandato anterior - ela assumiu o segundo mandato em janeiro. O pedido anterior contemplava supostas "pedaladas fiscais" (manobras contábeis para melhorar as contas do governo) de 2014.

No ato da entrega, Cunha prometeu examinar o pedido "da forma mais célere possível" e "com total isenção". Mais tarde, disse a jornalistas em uma conturbada entrevista coletiva que não tem prazo para analisar o novo pedido.

Cunha afirmou também que "a pedalada já está virando uma motocicleta". Mas disse não ter "condições de responder" se essa "motocicleta" é razão suficiente para cassar o mandato da presidente.

Enquanto o presidente da Cãmara falava, manifestantes pró-impeachment gritavam "fora, Dilma", duelando com outros, que pediam "fora, Cunha". A entrevista acabou sendo interrompida.

Mais cedo, ao lado de representantes de movimentos pró-impeachment e da filha de Hélio Bicudo, Maria Lúcia, os líderes opositores aproveitaram para lançar o slogan "Natal Sem Dilma", deixando claro o objetivo de tirar a presidente do cargo antes do final do ano.

Os primeiros a falar em "Natal sem Dilma" foram os deputados do Arthur Maia (SD-BA, líder do partido) e Paulinho da Força (SD-SP, presidente da legenda). "Dilma não esta sendo cassada pelo caos econômico que criou no país, mas pelo crime de responsabilidade que cometeu. Já estão comprovadas pedaladas fiscais neste ano", disse Maia. "Vamos criar a corrente do Natal sem Dilma."

O líder da oposição no Congresso, Pauderney Avelino (DEM-AM), afirmou por sua vez que "Cunha não tem como rejeitar esse novo pedido". Segundo ele, o documento traz "quatro decretos sem número editados por Dilma com R$ 820 milhões em créditos abertos sem autorização do Congresso".

O líder do PSDB, Carlos Sampaio (SP), presente à entrega, não compareceu à entrevista coletiva.

Maria Lúcia Bicudo, por sua vez, citou o ex-presidente da Câmara Ulysses Guimarães (1916-1992) para justificar a pressão dos movimentos pró-impeachment pelo afastamento de uma presidente eleita pelo voto. "A praça pública é maior do que a urna", afirmou.

O líder do governo, José Guimarães (PT-CE), criticou a oposição, que, segundo ele, "está ausente do debate econômico do país" e não tem propostas. E sugeriu um "Natal com CPMF", em resposta ao slogan opositor "Natal sem Dilma". Referia-se a um projeto defendido pelo governo como parte do ajuste fiscal, que é a volta da taxa sobre transações financeiras.

Opositor declarado do imposto, Cunha foi questionado sobre o que seria mais plausível neste momento: um "Natal sem Dilma" ou um "Natal com CPMF".

"Eu posso lhe dizer que Natal com CPMF não vai ter, porque não há tempo hábil. Nem se o governo tivesse votos [para aprovar a CPMF] não tem tempo hábil [para votar o projeto até o final do ano]", disse. Sobre o "Natal sem Dilma", afirmou: "Não tenho condições de responder".

Defesa de Dilma não quer Gilmar em ação de cassação

• Atual relatora, a ministra Maria Thereza foi quem sugeriu a mudança

Por Carolina Brígido – O Globo

BRASÍLIA – Em ofício enviado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a defesa da presidente Dilma Rousseff defendeu que a relatoria da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime), que tramita na corte, contra a chapa Dilma-Temer, continue nas mãos da ministra Maria Thereza de Assis Moura. Os advogados não concordam com a sugestão da própria relatora de passar a condução do caso para o ministro Gilmar Mendes. A ministra, que é vista como uma aliada pelo Palácio do Planalto, votou pelo arquivamento do caso, por falta de provas. Como ela foi derrotada no julgamento, sugeriu que o processo passasse a ser relatado por Gilmar.

Na semana passada, o presidente do TSE, ministro Dias Toffoli, determinou que todas as partes interessadas no processo fossem ouvidas antes que ele definisse a relatoria do caso. Foram intimadas as defesas de Dilma e Temer; do PSDB, que é o autor da ação; do PT e do PMDB. Toffoli disse que tomará a decisão nos próximos dias. O ministro vai levar em consideração os pareceres dos partidos, mas sua decisão não dependerá dessas posições.

A eventual designação de Gilmar para a relatoria do processo significaria uma derrota para o governo federal. O ministro tem defendido com fervor a necessidade de investigação dos supostos ilícitos cometidos na campanha de Dilma. Ele também tem criticado a gestão da presidente. Ao fim do julgamento que decidiu reabrir a ação, no dia 6, ele reforçou sua posição. Disse que há indícios “robustos” de que houve irregularidades na campanha petista.

A ação de impugnação de mandato eletivo foi reaberta no dia 6. O processo tinha sido arquivado em março por decisão da relatora. Diante da análise de um recurso do PSDB, o processo foi desarquivado. Cinco integrantes do tribunal votaram pela reabertura da ação. Apenas a relatora e Luciana Lóssio queriam que o caso continuasse encerrado.

No mês passado, o ministro Luiz Fux sugeriu que as quatro ações que tramitam hoje no tribunal pedindo a cassação dos mandatos de Dilma e Temer sejam processadas em conjunto, para evitar que o TSE tome decisões diferentes sobre um mesmo assunto. Nesse caso, haveria apenas um relator para as ações. O assunto chegou a ser debatido na semana passada, mas não se chegou a uma conclusão. Toffoli informou que ele definiria o nome do relator dos processos em breve.

No documento enviado ao TSE, a defesa de Dilma argumentou que esse não era o momento para definir a tramitação conjunta das ações. Segundo os advogados, não está clara a conexão entre todos os casos. Além disso, a defesa argumentou que a relatoria só pode ser deslocada para o ministro vencedor no julgamento de mérito. Gilmar, no caso, teve a posição vencedora em um recurso do PSDB para reabrir a ação. O mérito do processo, portanto, não foi discutido em plenário. Por isso, Maria Thereza deveria continuar na relatoria do processo.

“A negativa de seguimento da ação de impugnação de mandato eletivo, por não vislumbrar presente os elementos necessários para o prosseguimento da ação, não implica em julgamento de mérito, motivo pelo qual não há que se cogitar deslocamento ou substituição de relatoria”, diz o texto, assinado pelos advogados Flávio Caetano e Arnaldo Versiani.

Durante o julgamento, Maria Thereza explicou que votou pelo arquivamento da ação porque o PSDB deveria ter apresentado fatos concretos contra a presidente no momento em que ajuizou o processo. Ela rebateu os argumentos de que haveria indícios de irregularidade no pagamento, por parte da campanha, a empresas supostamente fantasmas. A ministra lembrou que essas suspeitas foram levantadas depois que o processo já estava no TSE.

Fernando Henrique diz que ‘mudar a pessoa não resolve’ a crise política

• Ex-presidente voltou a afirmar que o país precisa alterar sistema político

Por Silvia Amorim – O Globo

SÃO PAULO – No dia em que um novo pedido de impeachment foi apresentado na Câmara, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que substituir a presidente Dilma Rousseff não é a solução para a crise política brasileira. FH fez a declaração durante uma palestra em São Paulo para executivos do setor de tecnologia.

— Quando o Executivo não tem apoio da sociedade também não tem do Congresso. No caso atual, nem quero personalizar muito, a estrutura do nosso sistema político é tão antiquada que ela precisa mudar. Se você não mudar essa estrutura não há líder que aguente. Tem que haver mudança da estrutura de comando no Brasil. Não estou falando de impeachment, nada disso. Porque também mudar a pessoa não resolve. Tem que mudar mais coisas do que a pessoa — afirmou o tucano nesta quinta-feira.

O ex-presidente voltou a defender que a solução da crise passa por mudanças no funcionamento dos partidos e na interação entre as instituições e a sociedade. Ele também reiterou que o país passa por uma crise de lideranças.

— Todo mundo sabe que a partir da crise fiscal medidas precisam ser tomadas. Mas não há legitimidade para tomar. Não é uma questão técnica. Mesmo que um ministro da Fazenda tenha competência, o Congresso não faz porque sente que não há um consenso nacional nessa direção. Como se sai desse impasse? Sem liderança não sai.

Nesta quarta-feira, líderes da oposição entregaram ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha, um novo pedido de impeachment contra a presidente Dilma. O documento, elaborado pelos juristas Helio Bicudo e Miguel Reale Jr., com apoio de movimentos anti-Dilma, pedem o afastamento da presidente por causa das pedaladas fiscais em 2014 e 2015.

FH também defendeu que não há “golpe” em curso no país e que o Brasil tem que comemorar a superação de um período em que, a qualquer sinal de dificuldades, se discutiam nomes de generais passa assumir o comando.

— Hoje estamos discutindo nomes de juízes. Não vamos dar golpe em ninguém. A decisão vai ser dos juízes.

Sobre a crise fiscal, Fernando Henrique disse que o déficit é um “buraco” cujo tamanho é desconhecido.

— Não sabemos hoje o tamanho do déficit, do buraco que vamos ter que saltar para ir adiante.

BC indica que inflação só voltará a 4,5% em 2017

• Apesar da crise, Dilma diz que reduzir Bolsa Familia á atentar contra o povo

Meta de inflação adiada

• BC mantém taxa de juros em 14,25% ao ano

• BC mantém juros e indica que objetivo de limitar preços a 4,5% ao ano fica para 2017

Por Gabriela Valente e João Sorima Neto 

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Com a economia em forte recessão, um quadro fiscal deteriorado e inflação em alta, o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve, por unanimidade, os juros básicos em 14,25% ao ano e indicou, em comunicado, que não pretende mais atingir o centro da meta, de 4,5%, no fim de 2016, mas em “horizonte relevante”. Segundo analistas, isso significa, na prática, adiar esse objetivo para 2017. A decisão era esperada pelo mercado financeiro, já que subir ainda mais os juros poderia levar o país a uma recessão mais forte e agravar o quadro fiscal. E economistas já esperam que a inflação termine este ano perto de 10%.

“O Comitê entende que a manutenção desse patamar da taxa básica de juros, por período suficientemente prolongado, é necessária para a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante da política monetária. O Copom ressalta que a política monetária se manterá vigilante para a consecução desse objetivo”, diz o BC, no comunicado.

— Esse horizonte relevante é um período de dois anos. É esse o horizonte médio da política monetária. Às vezes pode ser um pouquinho a mais ou a menos, mas o que importa é que o Banco Central quis dizer que teremos inflação na meta no segundo semestre de 2017— explicou o ex-diretor do BC, Carlos Thadeu de Freitas, que avalia a decisão de mudar o discurso como acertada e necessária.

O economista-chefe do Modal, Alexandre de Azara, avaliava que o BC só admitiria que a inflação convergiria para a meta em 2017 em dezembro:

— Considerando que um “horizonte relevante” normalmente é um prazo de 18 meses, a expectativa do BC é que a inflação retorne ao centro da meta apenas entre março e junho de 2017.

Situação de dominância fiscal
Em comunicado aos clientes, o Banco Fator destaca que a volta da expressão “vigilante” para o comunicado, que estava presente na ata da última reunião, mantém espaço para alta da Selic, ainda que esse não seja o caminho mais provável.

A principal barreira para elevar os juros e conter a inflação é a crise econômica. A expectativa dos analistas é que a economia encolha 3% neste ano e que a recessão continue em 2016 com indústria em grave crise e consumo em forte retração.

Também pesam a incerteza política, a perda do grau de investimento e, principalmente, a falta de uma definição sobre o que acontecerá com as contas públicas. Alguns analistas consideram que a economia já vive uma situação de dominância fiscal, que ocorre quando o Banco Central fica sem condições de executar a política monetária, pois qualquer elevação de juros teria impacto muito negativo no déficit e na dívida pública, contribuindo para piorar as expectativas.

Tudo isso afeta o dólar: quanto mais ele sobe, mais combustível a inflação recebe.

— A deterioração do quadro político e a barbeiragem de mandar um orçamento deficitário para o Congresso influenciaram o câmbio. Isso já tem efeito na inflação, como na alta do preço do pãozinho, por exemplo — analisou o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, que ressalta que ninguém esperava um desempenho tão ruim das contas públicas: — A herança da dupla Mantega-Augustin é mais desastrosa de que se poderia imaginar.

Submerso em incertezas econômicas, o Banco Central resolveu manter-se parado à espera de uma solução. A avaliação do governo é que, por mais que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) esteja em 9,49% nos últimos 12 meses, o pior já passou. Daqui pra frente, o índice oficial deve ficar mais comportado. Além disso, juros mais altos não afetariam o principal problema deste ano: o aumento de tarifas públicas. A energia deve ter alta de cerca de 50%. Essa demanda não é contida com juros mais altos.

Para fazer com que a inflação chegasse à meta de 4,5% no fim do ano que vem, o BC teria de dar um choque de juros e fazer com que a taxa básica (Selic) fosse a 18%, na visão de Maílson. Ele mesmo alerta que isso seria um erro. E que o ideal seria admitir que a promessa é utópica.

— Nenhum Banco Central daria um choque de juros para fazer convergir a inflação a ferro e fogo num curto tempo num cenário como esse.

BC de ´mãos amarradas’
É consenso entre os analistas e dentro do próprio governo que todo o andamento da economia e a recuperação dependem de uma definição do quadro fiscal. Ou seja, é preciso colocar as contas públicas em ordem. Para isso, é preciso aguardar que as medidas fiscais — como a recriação da CPMF — sejam aprovado pelo Congresso Nacional.

— O Banco Central tem de aguardar as negociações do Congresso sobre o cenário fiscal. O que ele poderia fazer? Introduzir uma retração maior na economia não seria uma política adequada — avalia Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro Nacional e economista-chefe do Banco Safra. — O que a gente precisa hoje na economia não é mais de juros. É de política fiscal.

Para Luis Otávio Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil, o BC está “de mãos amarradas”.

— Não adianta elevar ou baixar os juros, enquanto não tiver um horizonte na política fiscal. Atualmente, o BC está de mãos amarradas, por isso a decisão de manter a Selic no atual patamar num horizonte mais prolongado.

Com o resultado da reunião, Tatiana Pinheiro, economista do Santander, avalia que o mercado deve rever a aposta num aumento da taxa no início do próximo ano, como indicava até agora o comportamento dos juros futuros. Para Tatiana, a Selic deve permanecer no patamar atual até o fim do ano e recuar a 11,5% até dezembro de 2016:

— O Copom decidiu manter a Selic em 14,25%, o que deve se estender por um período prolongado, contando com o enfraquecimento da atividade econômica para mitigar as pressões inflacionárias. O BC também conta com o efeito defasado das últimas elevações dos juros.

Maior taxa de juros real
O Brasil continua sendo o país com a maior taxa de juro real entre 40 nações, segundo levantamento do economista Jason Vieira, da Infinity Asset Management em parceria com o site Money You. Descontada a inflação projetada para os próximos 12 meses, o juro real no Brasil é de 7,43%, seguido de Rússia (2,87%) e China, com taxa de 2,55%.

— Somente um corte de cinco pontos percentuais retira o país da atual posição — disse Vieira.

O economista explica que o Brasil aparece com taxa muito mais elevada do que os países que ocupam as primeiras colocações no ranking porque houve um movimento recente de queda de juros em boa parte dessas nações. De acordo com o levantamento do economista, 30% dos países incluídos no ranking promoveram cortes nos juros recentemente e nenhum elevou a taxa.

Taxa de desemprego é a maior para setembro desde 2009

• No período de um ano, a taxa de desocupação aumentou 2,7 pontos porcentuais, um recorde, enquanto o rendimento médio real dos trabalhadores encolheu 4,3%

• A pesquisa abrange as regiões metropolitanas de Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre

Idiana Tomazelli - O Estado de S. Paulo

RIO - A taxa de desemprego apurada nas seis principais regiões metropolitanas do Brasil ficou em 7,6% em setembro, estável ante agosto, segundo dados sem ajuste sazonal divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Trata-se da maior taxa para o mês desde 2009, quando ficou em 7,7%. Considerando todos os meses, o resultado é idêntico ao observado em agosto deste ano (7,6%).

Em setembro do ano passado, a taxa de desocupação estava em 4,9%. O avanço de 2,7 pontos porcentuais em base anual é o mais intenso já registrado na série da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), que tem dados desde março de 2003 neste confronto.

O resultado do mês passado, no entanto, ficou dentro do intervalo das estimativas dos analistas ouvidos pelo AE Projeções, serviço da Agência Estado, que esperavam taxa entre 7,40% e 8,10%, e abaixo da mediana de 7,80%.

O rendimento médio real dos trabalhadores, por sua vez, registrou queda de 0,8% em setembro ante agosto. Já na comparação com o mesmo mês de 2014, houve recuo de 4,3%, a oitava retração nesse confronto e a maior para o mês desde 2003. Nas seis principais regiões metropolitanas do País, as pessoas ocupadas recebem em média R$ 2.179,80.

Filas por emprego. O número de pessoas que estão atrás de emprego no País continuou a crescer em setembro, seja porque foram demitidas ou porque passaram a procurar uma vaga nos últimos 12 meses. Em setembro, a população desocupada cresceu 56,6% ante igual mês de 2014, a maior também desde o início da série da PME, em 2003.

Isso significa que 670 mil pessoas engrossaram as filas à procura de trabalho nessas regiões no último ano - praticamente um terço dos 1,853 milhão de pessoas que estão desempregadas atualmente nas seis áreas investigadas: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife e Salvador.

Parte dessas pessoas seguiu tal caminho porque foi demitida no período. Segundo o IBGE, a população ocupada encolheu 1,8% em setembro ante igual mês do ano passado, repetindo a queda recorde já verificada em agosto ante agosto de 2014. Ou seja, 420 mil pessoas perderam o emprego nos últimos 12 meses.

Com essa combinação, a população economicamente ativa avançou 1,0% em setembro contra setembro de 2014, resultado de 250 mil pessoas que ingressaram ou retornaram ao mercado de trabalho - neste caso, abandonando a inatividade.

Oposição faz novo pedido de impeachment

Sem citar as acusações contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, líderes da oposição entregaram a ele ontem novo pedido de impeachment da presidente Dilma. No Senado, o governo ganhou 45 dias para apresentar defesa sobre as “pedaladas fiscais”.

Oposição entrega novo pedido de impeachment, mas poupa Cunha

• Justificativa para mais um requerimento é que ‘pedaladas’ se repetiram este ano

Evandro Éboli, Júnia Gama - O Globo

-BRASÍLIA- Sem mencionar as acusações de corrupção contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), os líderes da oposição entregaram ontem ao peemedebista novo pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Cunha os recebeu em seu gabinete e disse que vai apreciar o pedido com celeridade, mas respeitando a Constituição e com isenção. Integrantes de movimentos de rua que defendem o afastamento da presidente também compareceram. O pedido, de 64 páginas, foi entregue em três caixas de documentos, com anexos.

Nos discursos, os opositores defenderam o impeachment, mas não fizeram qualquer crítica a Cunha, que deverá ser alvo de processo no Conselho de Ética. No gabinete de Cunha, a filha do jurista e ex-petista Hélio Bicudo (um dos idealizadores do pedido), Maria Lúcia Bicudo, defendeu a volta dos manifestantes às ruas. O líder do PSDB, Carlos Sampaio (SP), também no gabinete, fez duras críticas a Dilma e ao PT
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— A corrupção é a marca deste governo — disse Sampaio.

Cunha não marcou data para responder ao pedido entregue ontem.

Conselho de Ética pode atrasar análise 
Ao final do dia, os deputados da oposição decidiram fazer uma “reflexão” sobre a viabilidade do processo de impeachment. Cunha disse aos líderes oposicionistas que decidirá até 15 de novembro sobre o pedido protocolado ontem. Mas os deputados acreditam que o tempo da decisão de Cunha será pautado pela sua situação no Conselho de Ética.

As apostas são de que, antes de fevereiro, nada conclusivo sairá do colegiado, onde o peemedebista trabalhará para prorrogar o máximo possível qualquer decisão. Ele é acusado de receber propina do esquema investigado pela Operação Lava-Jato. O Ministério Público da Suíça já enviou documentos comprovando que Cunha tem contas não declaradas no exterior.

Entre muitos oposicionistas a sensação é de cansaço em relação à novela do impeachment, e de alerta pela necessidade de começar a desvincular suas agendas da tocada por Cunha. Os líderes oposicionistas dizem que é preciso estabelecer uma “nova fase”:

— A interpretação do Supremo jogou nas mãos do presidente da Câmara a decisão exclusiva sobre o impeachment. E o tempo do presidente da Câmara não será o tempo das oposições. Se isso não avançar, temos que ter agendas alternativas para o Brasil — afirmou o líder do DEM, Mendonça Filho (PE).

— Não podemos perder a rotina das oposições para esperar o tempo do Eduardo Cunha decidir. Temos que nos posicionar sobre a DRU, bloquear a CPMF. Não podemos ser monotemáticos sobre o impeachment durante todo o ano — disse o líder da Minoria, Bruno Araújo (PE).

Um dos coordenadores do Movimento Brasil Livre, Kim Kataguiri, acompanhou a entrega da petição e discursou. Ele também não citou as denúncias contra Cunha, mas disse que as próximas manifestações de rua vão incluir atos contra a saída do presidente da Câmara.

— Defendemos a saída do Eduardo Cunha. Só que ele é a única pessoa no mundo que pode dar sequência ao impeachment da Dilma.

O novo pedido é assinado por quatro juristas: Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior, Janaína Paschoal e Flávio Costa. O documento inclui as chamadas “pedaladas fiscais”, que, segundo o Ministério Público no TCU, teriam se repetido em 2015. O tribunal rejeitou as contas de Dilma de 2014 por conta dessa prática contábil.

“O Brasil está mergulhado em profunda crise. Muito embora o governo federal insista que se trata de crise exclusivamente econômica, na verdade, a crise é política e, sobretudo, moral”, diz a petição dos juristas.

O documento diz ainda que, na esteira do mensalão, foi deflagrada a Operação Lava-Jato, “que em cada uma de suas várias fases colhe pessoas próximas à presidente, desconstruindo a aura de profissional competente e ilibada, criada por marqueteiros bem pagos”.

Governo: Oposição é 'música de uma nota só' 
 Doze deputados de PSDB, DEM, PPS, Solidariedade e até um do PMDB — Darcísio Perondi (RS) — acompanharam a entrega da petição.

O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), reagiu à iniciativa da oposição. Disse que o impeachment é página virada e que a oposição toca uma “música de uma nota só”. Ele perguntou aos jornalistas se já não estavam “de saco cheio” com o tema.

— Será que a oposição não pode virar de página. Esse assunto é página virada. Não há ambiente político para essa pauta. A oposição não faz outra coisa. Não discute o país. Está completamente fora do eixo — disse Guimarães: — É sempre essa mesma música, no mesmo tom, a mesma nota. Vocês não estão de saco cheio? Infográfico: as ameaças ao futuro do governo Dilma

Dilma pode perder apoio da base, diz MST

Por Cristiane Agostine – Valor Econômico

SÃO PAULO - No mesmo dia em que um novo pedido de impeachment da presidente foi protocolado na Câmara, o líder do MST, João Pedro Stédile, afirmou ontem que Dilma Rousseff poderá perder sua base social se mantiver a política econômica. Para Stédile, o ajuste fiscal implementado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, agravou as crises política e econômica e dificulta o apoio dos trabalhadores à gestão.

O líder do MST reforçou a pressão feita por movimentos sociais, por petistas e pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por mudanças nos rumos da economia. "O governo, sob o comando do Levy, erra no diagnóstico ao reduzir o tema da crise econômica a um problema no Orçamento da União. O Orçamento é só uma consequência da crise. Todas as medidas que o governo tomou para equilibrar Orçamento não resolveram a crise. Ao contrário: agravaram", afirmou Stédile aoValor, depois de participar de um debate sobre desigualdade promovido pela Fundação Perseu Abramo, na PUC-SP.

Stédile afirmou que pretende cobrar pessoalmente a presidente durante uma feira promovida pelo MST em São Paulo. Dilma estuda ir amanhã ao evento dos sem-terra. Se Dilma confirmar a visita à feira, será o terceiro encontro com movimentos sociais em São Paulo em uma semana. A presidente busca o apoio das entidades populares para tentar barrar a articulação do impeachment.

Depois de criticar cortes em áreas como educação, saúde e habitação, Stédile disse que essas medidas afetam diretamente a vida dos trabalhadores. "Se a Dilma continuar com essa política burra do ajuste fiscal e com essa interpretação da crise como um problema de Orçamento, vai perder cada vez mais a base social que a elegeu. É problema para a estabilidade do governo", afirmou. "O governo só faz gol contra e ninguém torce para time que faz gol contra. Não pode pedir para que apoie essas burrices".

O dirigente do MST afirmou que é preciso pressionar por mudanças, mas disse que os movimentos populares lutarão para impedir tentativas de impeachment. "Quem tem razão é o povo e o povo precisa criticar, dizer que o governo está errado. Mas o povo é sábio, não quer impeachment. Quer melhoria de vida", disse. "De que adianta mudar o governo? Não é solução para crise. Precisamos de medidas concretas, que ajudem a tirar a economia da crise".

O MST, afirmou Stédile, defenderá a presidente apesar das críticas à política econômica. "Nós fazemos a defesa do governo Dilma por uma questão democrática. Ela foi eleita por 54 milhões de brasileiros, pela maioria, e tem o direito e legitimidade de cumprir seu mandato constitucional", disse.

Na mesma linha crítica ao ajuste fiscal, o líder do MTST, Guilherme Boulos, comparou a política econômica do governo Dilma com o neoliberalismo dos anos 90, que "joga conta da crise no colo dos trabalhadores". Em vídeo divulgado ontem, o representante dos sem-teto afirmou ainda que o governo adotou a mesma política econômica que desde 2008 "está levando a Europa para o abismo", com desemprego e índices altos de exclusão social. Boulos defendeu que a população vá às ruas para criar uma nova forma de fazer política, fora do Parlamento e do governo.(Colaborou Andrea Jubé, de Brasília)

PSB faz programa de TV sem lideranças

Por Andrea Jubé – Valor Econômico

BRASÍLIA - No programa partidário que vai ao ar hoje, em cadeia nacional de rádio e televisão, o PSB endurece as críticas ao governo federal. Afirma que o Brasil, embora potencialmente rico, está em crise porque o governo é "incompetente" e "não faz a sua parte". Em conversa com a imprensa para apresentar o filme, o presidente da sigla, Carlos Siqueira, disse que a situação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é "insustentável". Completou que não há razões "legais ou políticas" para o impeachment e que o PSB pretende eleger mais prefeitos nas capitais e nas grandes cidades, onde está 80% do eleitorado.

O vice-governador paulista Márcio França pode ser o candidato da sigla à Prefeitura de São Paulo, caso o PSB não feche aliança com o PSDB de Geraldo Alckmin, de acordo com o dirigente.

Em São Paulo, França disse ao Valor que uma eventual pré-candidatura à Prefeitura de São Paulo em 2016 "não é provável". França afirmou que transferiu seu título eleitoral de São Vicente para São Paulo a pedido de Siqueira, para a hipótese de o PSB lançar candidato próprio em 2016, alinhado com o governador Geraldo Alckmin.

No Rio de Janeiro, o PSB vai lançar o nome do senador Romário para a Prefeitura da capital. O ex-jogador trouxe para a sigla o técnico Joel Santana, que disputará uma vaga de vereador.

Em Belo Horizonte, o prefeito Márcio Lacerda lançará um nome para sua sucessão, que mantém reservado. O vice-presidente do PSB Beto Albuquerque estuda candidatar-se à Prefeitura de Porto Alegre. O prefeito de Recife, Geraldo Júlio, vai disputar a reeleição.

O programa partidário inova pela ausência de dirigentes, lideranças e quadros do PSB. Carlos Siqueira diz que muitas pessoas não assistem aos programas partidários para fugir das falas dos políticos e a sigla quis valorizar mais a política que seus quadros.

Com dez minutos de duração, diz que após 13 anos governando o país, o PT ainda não tem um plano para o país, não avançou em infraestrutura, não criou uma política industrial e não fez reformas estruturais.

Segundo o partido, o governo errou na política energética, que provocou o aumento de 50% na conta de luz. Aponta os juros nas alturas, o aumento do desemprego e o fechamento de um milhão de vagas com carteira assinada. Provoca: "isto é um governo de esquerda?"

Como bandeira, o PSB prega o "novo federalismo" e defende uma "divisão mais justa de tributos", com "menos dinheiro no ralo do governo" e mais recursos aos Estados e aos municípios, onde vivem os cidadãos.

Ao final, o locutor lembra que o PSB é responsável pela Lei da Transparência, que permite a ampla fiscalização dos órgãos públicos e reprime a corrupção. O programa termina com a marca do ex-presidente da sigla Eduardo Campos, morto há um ano. "Não vamos desistir do Brasil". (colaborou Cristiane Agostine, de São Paulo)

'Mudar a pessoa não resolve', diz Fernando Henrique

Por Fernando Taquari - Valor Econômico

SÃO PAULO - Na contramão do PSDB no Congresso, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso voltou a se posicionar ontem contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Em palestra para empresários, na capital paulista, o tucano enfatizou que o Brasil, assim como outros países, carece de uma "nova estrutura de comando" e que simplesmente trocar a presidente não será a alternativa adequada.

"A estrutura montada é tão antiquada que ela [Dilma] precisou mudar [a equipe]. Tem quer haver mudança na estrutura de comando, e não estou falando de impeachment. Mudar a pessoa não resolve", disse o tucano, que em nenhum momento em sua fala citou nominalmente a presidente petista.

No diagnóstico de FHC, o país passa por uma crise de legitimidade frente à fragmentação de legendas que perderam os valores do passado. "Os partidos hoje se organizam para obter um pedaço do orçamento", acrescentou.

O ex-presidente, no entanto, afirmou que o Brasil passa por um momento de avanço institucional ao ressaltar que, mesmo diante do quadro de paralisia na economia e desmoralização generalizada do sistema político, o país não vai vivenciar um golpe de Estado, como ocorreu em 1964. "Se fosse há 20 ou 30 anos, estaríamos discutindo os nomes dos generais. Hoje, o discutimos os nomes dos juízes", disse o tucano em referência aos magistrados que conduzem investigações contra políticos.

"Houve um avanço institucional. Não vai dar golpe. O que se discute é qual vai ser o resultado da decisão. Pode-se discutir se gosta ou não, mas houve um avanço", reiterou.

Maduro ameaça adversários

Medidas desesperadas

• A poucas semanas de pleito legislativo, Maduro aumenta controle de preços e faz ameaças

Marina Gonçalves – O Globo

CARACAS - Sob risco de derrota na eleição, o presidente Maduro ampliou controle de preços na Venezuela e disse à oposição que, se perder, iniciará nova fase na “revolução bolivariana”. A queda do PIB prevista para este ano na Venezuela é de 10%, segundo cálculos do Fundo Monetário Internacional (FMI). A inflação deve ficar em 159,1%, de acordo com as projeções mais otimistas, e pode subir a 204,1% no ano seguinte — mesmo que o presidente Nicolás Maduro fale em 85%. O desemprego, por sua vez, deve alcançar 14%, mais do que o dobro do país latino-americano em segundo lugar, a Colômbia, com 8,9%. E a poucas semanas das eleições legislativas “mais difíceis para o chavismo”, como já reconheceu o presidente, a solução encontrada foi endurecer ainda mais o discurso contra a oposição e a política de controle de preços, incrementar as sanções aos especuladores e aumentar salários, numa última tentativa de recuperar os votos perdidos. Em seu programa semanal de rádio e televisão, na terça-feira, o presidente ainda convocou seus partidários a ganhar as eleições “seja como for”.

— O pior que que pode acontecer a esses ricões é ganharem as eleições, porque começaria uma nova etapa da revolução bolivariana — disse em tom ameaçador, referindo-se à oposição, continuando com a retórica de “guerra econômica” que acusa os adversários de travarem contra seu governo. — A revolução não vai se entregar jamais. Vamos ganhar como for, com guerra econômica, com guerra elétrica. Vamos ganhar com a paz e com o povo, como sempre. Vamos apertar a lei de preços justos. Estamos elevando as penas de prisão porque a lei tem que voltar a ser implacável em tempos de guerra econômica.

No discurso na TV estatal, Maduro advertiu que as sanções afetarão os que violam o controle cambial e fixam preços tomando como referência o dólar paralelo — 125 vezes mais caro que a menor taxa oficial. As últimas pesquisas, que dão vitória clara à oposição em dezembro, já haviam acelerado outras medidas. Desde a semana passada, o presidente subiu o salário mínimo e anunciou também aumentos de 30% para as Forças Armadas e o funcionalismo público, além de liberar 110 mil novas pensões a idosos.

Segundo analistas, efeito será inverso
Para Víctor Álvarez, pesquisador do Centro Internacional Miranda e ministro de Indústria e Mineração no governo de Hugo Chávez, o aumento de salários, no entanto, não compensa a perda do poder de compra dos venezuelanos nos últimos anos. E pode ter um efeito inverso, agravando ainda mais a situação econômica.

— Isso sem dúvida terá um reflexo nas eleições e trará um custo político que foi reconhecido explicitamente pelo próprio presidente. Hoje há uma situação em que se reconhece o cansaço e a fadiga das bases sociais que tradicionalmente apoiaram a revolução bolivariana. É um desgaste inevitável após 16 anos no poder — explica ao GLOBO. — São medidas clássicas tomadas perto do processo eleitoral, que costumam ser usadas como válvula de escape para a população cada vez mais descontente. Mas seu efeito atual é contraproducente, já que aumenta os gastos públicos sem um aumento equivalente na produção de bens e serviços.

Analistas advertem, ainda, que é justamente o controle de preços e do sistema cambial o causador das distorções na economia, já que desestimulam a produção nacional. De fato, não é de hoje que o governo tenta baixar a inflação estabelecendo controle de preços. Até agora, no entanto, o resultado foi um desabastecimento generalizado de produtos básicos, filas enormes nos supermercados e aumento do mercado negro — que torna mais rentável a revenda ou o contrabando de produtos sob intervenção.

Para o vice-presidente do Conselho Nacional de Comércios e Serviços (Consecomercio), Alfonso Riera, as sanções por si só também não resolvem a queda de produção, já que é justamente o controle do câmbio que impede que se realizem novos negócios.

— Para corrigir esta situação, é fundamental construir uma interdependência entre o setor público e o setor privado — disse à Rádio União. — Se não permitem que o comerciante tenha estoques dos produtos, se ele não pode vender e tomam medidas que aumentam os custos e as despesas, torna-se impraticável gerar negócios no país.

Álvarez alerta que a inflação real será em torno de 180%, fazendo com que o país caia do quarto para o oitavo lugar dentre as economias da região.

— Por ser maior, a inflação anula o aumento do salário. Nominalmente os trabalhadores estão ganhando mais dinheiro, mas realmente podem comprar menos bens. E aos problemas de inflação, se somam os de escassez. É praticamente uma proeza conseguir comprar os produtos da cesta básica venezuelana.

Governo manda prender magnata
E em meio à crise, ontem deputados do governista PSUV pediram a abertura de uma investigação contra o maior magnata de alimentos do país, que estaria supostamente “conspirando contra o governo”. Três dias antes, o próprio Maduro acusou o empresario Lorenzo Mendoza, do conglomerado de alimentos Polar, de liderar uma “guerra econômica contra a Venezuela”, a fim de entregar o controle do país para o FMI. O secretário-executivo da coalizão Mesa da Unidade Democrática , Jesús Torrealba, afirmou que a denúncia tem “objetivo eleitoreiro”.

José Roberto de Toledo - ‘Brazilian standoff’

- O Estado de S. Paulo

Enquanto De Volta para o Futuro dominava as redes sociais ontem, dia em que seu herói chegaria a um futuro idealizado, mas jamais concretizado, outro filme icônico era reencenado por políticos brasileiros. À diferença do clássico adolescente de Robert Zemeckis, em Cães de aluguel não há final feliz.

Na última cena, o diretor Quentin Tarantino reproduz um dos clichês do bangue- bangue à italiana, quando três personagens apontam suas armas uns para os outros. Todos são ao mesmo tempo alvo e atirador. O impasse é explicitado por um dos anti-heróis do filme: “Joe, se você matar aquele homem você morre em seguida”.

Ao contrário do duelo tradicional, no chamado Mexican standoff, ninguém quer atirar primeiro. Se há só dois oponentes, o gatilho mais rápido tenta matar o rival antes que ele possa disparar. Quando há três segurando armas, o segundo a usá-la é quem tem a vantagem. Se Fulano atira em Sicrano, ele é morto por Beltrano – que é quem tem mais chances de sobreviver ao tiroteio. Para tanto, Beltrano também tem que torcer para sua vítima, Fulano, matar Sicrano antes que este tenha tido tempo de atirar.

O impasse não tem solução, pois tanto avançar quanto retroceder pode ser fatal para qualquer dos envolvidos. É o que acontece entre governo, oposição e Eduardo Cunha. Bravatas à parte, ninguém quer atirar primeiro para não ser abatido em seguida.

Cunha tem Dilma Rousseff na mira. Mas se deflagrar o processo de impeachment da presidente, nem oposição nem governo precisarão mais dele. Ato contínuo, a denúncia contra Cunha avançaria na Comissão de Ética, e o presidente da Câmara acabaria cassado. Por sua vez, se o governo der ordem para acelerar a cassação de Cunha, este aceitaria o pedido de impeachment, e a oposição terminaria o serviço. Já a oposição não pode avançar sobre Cunha porque ele enterraria o pedido de impeachment junto com ele.

A menos que um dos três atores tenha vocação suicida, é improvável que escapem desse Brazilian standoff em que se meteram. Neste cenário de impasse persistente, nem a oposição consegue rejeitar as contas de Dilma nem o governo consegue aprovar a CPMF. Não tem reforço para a tese do impeachment, nem sinalização de que o ajuste fiscal vai passar integralmente.

Enquanto isso, os artistas ficam trocando acusações e impropérios em um diálogo para manter a plateia entretida. Mas essa parte do roteiro é um clichê repetido à exaustão. Não leva a lugar algum, não muda coisa nenhuma. É encheção de linguiça.

Os únicos que podem quebrar o Brazilian standoff são atores externos. Isso pode acontecer se o Supremo Tribunal Federal iniciar um processo contra Cunha e sinalizar que vai condená-lo. Ou se diante da inércia do Congresso e do governo, uma segunda agência de classificação de risco retirar o grau de investimento do Brasil, precipitando nova fuga de capitais e alta do dólar.

Seja como for, mesmo que o standoff entre governo, Cunha e oposição termine em tiroteio generalizado, não há perspectiva de solução para o impasse maior, que propiciou essa situação. Não há saída para a crise política brasileira sem uma reforma na estrutura partidária que reverta a pulverização do Congresso.

Enquanto o presidente, seja ele quem for, continuar tendo que catar votos no varejão da Câmara, cada vez mais dependente de uma base movediça e franciscana, não há risco de a política brasileira deixar de ser uma versão requentada de um western spaghetti. É o sistema político que produz Eduardos Cunha, não é Eduardo Cunha quem produziu esse sistema político.

ALERTA DE “SPOILER”: NÃO LEIA A FRASE SEGUINTE SE PRETENDE VER O FILME. EM CÃES DE ALUGUEL, TODOS OS ENVOLVIDOS NO STANDOFF MORREM NO FINAL. O ÚNICO SOBREVIVENTE SE ESCONDEU DO CONFLITO. PELO VISTO, O FILME É MUITO POPULAR EM BRASÍLIA E ARREDORES.

Luiz Carlos Azedo - O crime quase perfeito

• A discussão sobre a legalidade das “doações eleitorais” fará parte dogrand finale dessa história policial nos tribunais. Não haveria “petrolão”, porém, se não houvesse um “centro único”

- Correio Braziliense

Para os escritores de romances policiais noir não existe crime perfeito. Todos deixam um rastro e têm uma motivação. É aí que o detetive durão entra em cena. Com seus problemas e defeitos, ele consegue chegar lá. Primeiro, segue os rastros deixados pelos bandidos; e começa a desvendar o crime quando descobre a sua motivação. Ao mesmo tempo, enfrenta desafetos e administra seu drama pessoal. Segue as pistas às vezes por puro instinto. Assim se constrói a trama da boa estória policial.

A Operação Lava-Jato é uma grande história policial, que deixa no chinelo muitos romances noir de sucesso, porque é uma trama que envolve doleiros, lobistas, executivos de uma grande petroleira estatal, os donos das maiores empreiteiras do país e políticos, muitos políticos – num país latino-americano que faz parte do rol das potências emergentes. Nada disso, porém, é ficção. Seus principais protagonistas já estão em cana, mas falta achar o chefão.

Não existe um detetive cana-dura, mas uma equipe de delegados, agentes e peritos da Polícia Federal, reconhecidamente eficiente, e um grupo de procuradores abnegados, que seguem o dinheiro saqueado da Petrobras por um esquema de “acumulação primitiva” de grandes empresas de engenharia, que atuavam como se ainda estivéssemos no tempo das companhias das Índias. O nosso herói noir é o juiz Sérgio Moro, titular da Vara Federal de Curitiba.

Como nos folhetins dos tabloides policiais norte-americanos da década de 1950, desde o ano passado a Operação Lava Jato é o assunto mais quente dos telejornais. Cada dia que passa, a história revela detalhes da atuação de seus protagonistas, mas nunca se chega ao poderoso chefão. Ele permanece oculto, atua nas sombras para embaralhar o processo, obstruir as investigações, proteger aqueles que podem revelar sua verdadeira participação na trama.

O escândalo da Petrobras era um crime quase perfeito, não fossem o rastro e a motivação. O rastro é o dinheiro, cujo percurso está sendo monitorado pelos órgãos de controle do sistema financeiro. Foi graças à movimentação do dinheiro que o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque foi preso. Ele tentou transferir o dinheiro para Mônaco e foi pego. Também foi por causa da movimentação do dinheiro que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), caiu em desgraça. Negou a existência de contas na Suíça e elas apareceram.

Contas na Suíça eram o refúgio mais seguro para o dinheiro sujo. Não são mais faz tempo. Para quem não se recorda, o escândalo do propinoduto no Rio de Janeiro, durante o governo Anthony Garotinho, eclodiu porque as autoridades daquele país informaram ao Ministério Público brasileiro a existência de contas suspeitas de fiscais da Receita fluminense. Um banco havia comprado o outro e, na auditoria, separou o dinheiro podre, que foi abatido dos ativos. O fato foi informado ao Ministério Público da Suíça.

A lavagem de dinheiro
Podemos tecer considerações sobre o cluster formado em torno da Petrobras para desviar dinheiro da empresa, cujo caso mais espantoso, sem dúvida, é a criação da Sete Brasil, a empresa contratada para fornecer as sondas do pré-sal. Também podemos teorizar sobre o modelo da “nova matriz econômica”, no qual houve uma fusão de interesses entre velhas oligarquias e a nova plutocracia brasileira para saquear o nosso “capitalismo de Estado”, que entrou em colapso.

Mas o que nos interessa aqui é o caso policial. Os atores da trama que estão presos foram flagrados porque obtiveram algum proveito pessoal nas transações. Esse é o rastro. Mas a grande motivação para a montagem do esquema foi política: a perpetuação no poder do núcleo hegemônico do sistema de alianças que comanda o país.

Com base na experiência do “mensalão”, o dinheiro desviado da Petrobras e de outras empresas e órgãos do governo para o chamado “núcleo político” da “organização criminosa”, para usar a nomenclatura do Ministério Público, foi “esquentado” por meio de doações eleitorais. O que pôs tudo a perder foram os pedágios pagos pelo caminho aos seus operadores (voltamos ao rastro) e os “pixulecos” em benefício dos agentes politicos, o que acabou por “deslegitimar” sua motivação principal: o financiamento de campanha eleitoral.

A discussão sobre a legalidade das “doações eleitorais” fará parte do grand finale dessa história policial nos tribunais. Não haveria “petrolão”, porém, se não houvesse um “centro único” no comando de suas operações, que passava pelos governos Lula e Dilma. Do ponto de vista institucional, a identificação desse centro e o seu desmantelamento é que dirá se a Operação Lava Jato foi bem-sucedida na sua plenitude ou não.

Bernardo Mello Franco - Um bode no Orçamento

- Folha de S. Paulo

Num passado não muito remoto, o PSDB apostou nas críticas ao Bolsa Família, principal vitrine social dos governos do PT. Em 2006, o então senador Arthur Virgílio definiu o programa como uma "esmola eleitoreira". Em 2011, seu colega Alvaro Dias declarou que ele "não tira ninguém da miséria" e ainda "estimula a preguiça".

Com o tempo, os tucanos perceberam que o discurso elitista tirava votos. Passaram, então, a elogiar o programa. Em campanha ao Planalto, José Serra prometeu criar o 13º do Bolsa Família. Aécio Neves disse que reajustaria o benefício básico para US$ 1,25 por dia. Se tivesse vencido a eleição, estaria com uma bomba no colo. Pelo dólar de ontem, precisaria desembolsar R$ 147,75 por família. Hoje o valor mínimo está em R$ 77.

Nesta semana, o relator do Orçamento de 2015, Ricardo Barros (PP-PR), lançou uma ideia que empolgaria o velho PSDB. Ele sugeriu um corte de R$ 10 bilhões no Bolsa Família, o equivalente a 35% da verba do programa. "Precisamos ser racionais, e não agir com emoção", justificou.

Apesar do apelo, a proposta gerou uma reação emocionada do Planalto. A presidente Dilma Rousseff afirmou que "cortar o Bolsa Família significa atentar contra 50 milhões de brasileiros". "Não podemos permitir que isso aconteça", acrescentou ela.

A eventual mutilação do programa, cuja eficácia é reconhecida pela ONU, seria mortal para a presidente e para o futuro do projeto petista. Afinal, manter o Bolsa Família é uma das últimas promessas de campanha que Dilma ainda não descumpriu.

Por outro lado, o efeito do corte sobre os mais pobres seria tão dramático que a chance de o Congresso aprová-lo parece próxima de zero. Como o relator do Orçamento é um dos vice-líderes do governo, não seria exagero imaginar que a ideia seja um típico caso de "bode na sala". Em nome de retirá-lo, o Planalto ganharia um novo argumento para convencer os parlamentares a aceitarem o que Dilma mais quer: recriar a CPMF.

Maria Cristina Fernandes - A república sem Eduardo Cunha

• A chantagem virou método e a desfaçatez, o rito

- Valor Econômico

A permanência por tempo indeterminado do presidente da Câmara dos deputados no cargo prorroga a chantagem como método e a desfaçatez como rito da política.

É uma prorrogação de muitos gols para o modo de fazer política que o deputado Eduardo Cunha, com o beneplácito do governo, tornou regra no Legislativo. Um dos principais artilheiros está instalado na Comissão de Constituição e Justiça, a mais importante da Câmara.

Nenhum projeto começa a tramitar sem que a comissão diga se o que está lá rima com a Constituição. Cinco de seus ex-presidentes se tornariam ministros da Justiça (Agamenon Magalhães, Milton Campos, Célio Borja, Nelson Jobim e Aloysio Nunes Ferreira). Seus descaminhos mais recentes contribuíram para que o Judiciário se assenhorasse da cota do Legislativo no concerto dos poderes.

No início da legislatura, o presidente da Câmara negociou o Conselho de Ética mas não abriu mão da CCJ, o que revela confiança tanto na impunidade quanto na tramitação legislativa como fonte de seu poder.

Instalou na comissão um dileto aliado, Arthur Lira. Deputado de segundo mandato, Lira coabita o Congresso e o PP alagoano com o pai, o senador Benedito, que impediu a volta de Heloisa Helena (Psol) a Brasília numa eleição em que teve mais votos até que o ex-governador Teotônio Vilela (PSDB), seu aliado.

Arthur e Benedito Lira fazem dobradinha também na operação Lava-Jato. Em relatório encaminhado ao ministro do Supremo, Teori Zavascki, no mês passado, a Polícia Federal identifica a dupla como substituta do deputado José Janene, morto em 2010, na coordenação do esquema de propinas da Petrobras.

Depois da primeira tentativa de votação dos vetos presidenciais, a família Lira levou a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), autarquia subordinada ao Ministério das Cidades e responsável pela implantação do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) em quatro capitais (Belo Horizonte, Recife, Fortaleza, Maceió e Natal).

A nova barricada é a admissibilidade da DRU. O projeto prorroga e aumenta de 20% para 30% o volume a ser desvinculado das receitas da União. Se a CCJ continuar a barrá-la, a licença para remanejar esses recursos, que termina em dezembro e depende de quórum constitucional, não terá como ser renovada.

A negociação da DRU entrou no intricado mercado de porteiras fechadas. Além da presidência da CBTU, a família de aliados de Eduardo Cunha também gostaria de nomear o conselho diretor da autarquia, hoje nas mãos do ministro Gilberto Kassab (PSD).

A rede de prepostos do presidente da Câmara em postos-chave evidencia um ajuste fiscal que, a exemplo do resto da república, também está ancorado na Lava-Jato. Outra das medidas com a qual o ministério da Fazenda conta para diminuir o rombo do Orçamento, a repatriação de capitais, está nas mãos de mais uma estrela da tropa de choque de Eduardo Cunha.

No auge do seu poder como o senhor do impeachment, o deputado exigiu que o governo transferisse o projeto do Senado para a Câmara. O governo cedeu e o presidente da Câmara entregou o projeto para o deputado Manoel Jr. Depois de ser descartado na reforma ministerial para a pasta da Saúde, o parlamentar do PMDB paraibano concluiu o substitutivo ao projeto com alívio às multas e porteira escancarada para que condenados em segunda instância possam participar da repatriação. Como os bancos são os avalistas da idoneidade da transação, já se previa ontem que nenhum deles se arriscará a entrar na operação se as regras forem aquelas estabelecidas pelo aliado de Cunha.

A trinca de serviços prestados à nação esta semana pela legislatura presidida por Eduardo Cunha se completa com a Comissão Mista do Orçamento. O PP, partido que colabora com mais filiados para a lista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, também tem a relatoria do Orçamento. Seu titular, o deputado Ricardo Barros, foi eleito por 114.396 eleitores, a maioria dos quais de Maringá (PR), cidade que administrou e é o berço natal do juiz Sérgio Moro, mas legisla para o que denomina de 'mercado'.

O ajuste fiscal virou uma obsessão nacional, mas o relator do Orçamento, sem mandato da entidade da qual se oferece como porta-voz, assim explicou suas motivações para o corte do Bolsa Família: "Minha preocupação é apresentar um orçamento em que o mercado acredite". Tivesse de fato o mandato de investidores, o relator não teria rifado a CPMF de suas projeções para o Orçamento.

Para continuar a comandar os prepostos que instalou nos postos-chave da Câmara e não cair nas mãos do conterrâneo de Ricardo Barros, Eduardo Cunha tem se valido do cargo para não dar início ao processo de sua cassação no Conselho de Ética. Toda representação feita na Casa deve ser numerada pela mesa diretora. Só assim passa a tramitar. Pois a representação de 46 parlamentares de sete partidos protocolada há uma semana no conselho até hoje não foi oficialmente registrada pela presidência da Câmara. O regimento prevê que a Casa o faça em até três sessões ordinárias. Pois o presidente da Câmara tem optado por sessões extraordinárias para congelar o prazo de sua degola.

O processo de cassação é longo e, dificilmente, Eduardo Cunha, a julgar pelos últimos processos que tramitaram no conselho, seria cassado este ano. Já corre na Casa, no entanto, a possibilidade de uma representação no Ministério Público contra o presidente da Câmara por obstrução ao processo que pode vir a resultar em sua cassação.

É pequena a chance de um processo como este prosperar com a mesma diligência impressa pelo ministro Teori Zavascki às liminares contra o rito do impeachment. Mas o 'Natal sem Dilma' colocou a criatividade na ordem do dia. Foi num 15 de novembro de dois anos atrás que o ministro Joaquim Barbosa resolveu homenagear o Brasil com a prisão dos 16 primeiros réus do mensalão. Uma república sem Eduardo Cunha é mais do que uma efeméride. Seria como a primeira parcela do 13º para uma nação que ainda tem muitas contas a acertar.