sábado, 20 de junho de 2015

Opinião do dia – Roberto Freire

Subalterno ao governo do PT nos tempos de Lula, quando funcionou como uma mera correia de transmissão dos interesses do Planalto, o Poder Legislativo vem recuperando sua altivez e a autonomia que havia perdido nos últimos anos. É o que temos observado desde a última legislatura e, de forma inequívoca, neste segundo mandato de Dilma Rousseff, a quem o Parlamento já deu sucessivos exemplos de que não é mais submisso.

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Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS, em artigo ‘O Parlamento reage’. Brasília, 19 de junho de 2015.

Lava-Jato chega no topo das empreiteiras

• Presidentes da Odebrecht e da Andrade Gutierrez são presos pela PF

• Procuradores dizem ter provas de que executivos das duas maiores construtoras do país sabiam do esquema de propina em troca de contratos. Pagamentos, em contas secretas no exterior, são estimados em R$ 720 milhões

A Lava-Jato prendeu ontem os presidentes da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, e da Andrade Gutierrez, Otávio Azevedo, as duas maiores construtoras do país. Outros dez executivos também foram presos e levados para Curitiba, na 14a fase da operação, batizada de Erga Omnes, termo em latim usado para dizer que a lei vale para todos. Eles são suspeitos de envolvimento no pagamento de R$ 720 milhões em propina em troca de contratos, não só com a Petrobras. Para os procuradores, que grampearam e-mails e dizem ter provas de pagamentos em contas secretas na Suíça, os acusados sabiam do esquema de corrupção. Informações de delatores, entre eles o ex-presidente da Camargo Corrêa Dalton Avancini, também embasaram as prisões. O juiz Sérgio Moro determinou o bloqueio de até R$ 20 milhões de cada executivo. As empresas negam as acusações.

Lava-Jato chega às gigantes

• PF prende presidentes da Odebrecht e da Andrade Gutierrez e diz que eles "sabiam de tudo"

Germano Oliveira, Thais Skodowski e Cleide Carvalho – O Globo

CURITIBA e SÃO PAULO- Os presidentes das duas maiores construtoras do Brasil, a Odebrecht e a Andrade Gutierrez, foram presos ontem na 14a fase da Operação Lava-Jato. Marcelo Bahia Odebrecht e Otávio Marques Azevedo, ao lado de outros oito executivos das duas empresas, tiveram prisão decretada pelo juiz Sérgio Moro, da 13? Vara Federal de Curitiba. Ao atingir duas gigantes com atuação mundial, a Lava-Jato alcança o topo do cartel que, segundo as investigações, atuou para controlar obras públicas no país nos últimos anos. Juntas, no momento, elas são responsáveis pela execução de 101 contratos distribuídos entre governo federal e estados.

O procurador Carlos Fernando dos Santos Lima e o delegado Igor Romário de Paula, membros da força-tarefa da Lava-Jato, afirmaram que o esquema de corrupção envolvendo as duas empreiteiras era muito mais sofisticado que o das demais empresas investigadas pela Polícia Federal, baseado em pagamentos feitos em contas secretas no exterior. Eles disseram ainda que os dois presidentes das construtoras tinham conhecimento do esquema e participaram das negociações do cartel de empreiteiras que fraudava as licitações na Petrobras.

Para isso, juntaram depoimentos de ao menos três delatores, grampearam e-mails nos quais executivos tratam de sobrepreço e da escolha de empresas para tocar obras públicas e identificaram pagamentos feitos por meio empresas offshores (registradas no exterior) em paraísos fiscais.

Pela primeira vez, foram vinculados diretamente às fraudes na Petrobras, como operadores de propina, os nomes da doleira Nelma Kodama, que tem forte atuação no ABC paulista, e de Leonardo Meirelles, que se apresenta como sócio da Labogen, laboratório usado para remessas milionárias para países asiáticos e que chegou a fechar convênio com o Ministério da Saúde, desfeito após a divulgação do escândalo. Dinheiro movimentado por ambos é agora atribuído a propinas vinculadas às duas empreiteiras, mesmo que o caminho dos recursos ainda não tenha sido decifrado.

Bloqueio de contas e investimentos
Marcelo Odebrecht e Otávio Azevedo tiveram prisão preventiva decretada por tempo indeterminado. Moro considerou inviável que o esquema criminoso, que perdura desde 2004 e envolve propinas milionárias, fosse desconhecido pelos dois. Segundo estimativas da investigação, Odebrecht e Andrade Gutierrez pagaram pelo menos R$ 710 milhões em propinas — R$ 510 milhões e R$ 210 milhões, respectivamente.

Para Moro, o fato de as duas empresas não terem aberto investigações internas, mesmo com a notoriedade das denúncias, é outro indicativo do envolvimento de seus presidentes. No despacho, Moro determinou o bloqueio de contas e investimentos bancários de valores de até R$ 20 milhões das contas de cada um dos dez executivos.

A atuação da Odebrecht e da Andrade Gutierrez e de seus executivos no cartel que dividia obras da Petrobras vinha sendo denunciada à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal desde o início dos depoimentos por vários dos delatores da Lava-Jato, mas faltavam as provas. As duas foram citadas pelo doleiro Alberto Youssef, pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, pelo ex-gerente da estatal Pedro Barusco Filho e por empresários como Augusto Mendonça Filho, do Grupo Setal, e Júlio Camargo, que atuava como operador.

O procurador Carlos Fernando Lima afirmou que agora há provas e indícios inclusive da participação de seus presidentes:

— Os presidentes das empresas sabiam de tudo. Apareceram indícios concretos comprovando que eles tiveram contato ou participações diretas em atos que levaram à formação de cartel.

Entre as provas de envolvimento dos presidentes das duas empresas estão e-mails endereçados às empreiteiras envolvidas na investigação da Petrobras, nos quais eram agendadas reuniões dos participantes do cartel ou era comentado o sobrepreço existente em determinada obra. Um dos e-mails envolve a Braskem, empresa na qual Petrobras e Odebrecht são sócias.

Na mensagem, de 2011, um ex-executivo da Brasken fala sobre a existência de sobrepreço entre US$ 20 mil e US$ 25 mil por dia num contrato de operação de sondas. O doleiro Alberto Youssef disse que a Braskem pagava US$ 5 milhões a ele e a Paulo Roberto Costa, em contas no exterior.

"Não só há prova oral da existência do cartel e da fixação prévia das licitações entre as empreiteiras, com a participação da Odebrecht e da Andrade Gutierrez, mas igualmente prova documental consistente nessas tabelas, regulamentos e mensagens eletrônicas" afirmou Moro.

Além dos dois presidentes, tiveram prisão preventiva decretada Rogério Santos de Araújo e Márcio Farias da Silva, executivos da Odebrecht; César Ramos Rocha, Elton Negrão de Azevedo Júnior e Paulo Roberto Dalmazzo, da Andrade Gutierrez; e o empresário da Hayley do Brasil, João Antonio Bernardi Filho, suspeito de internalizar dinheiro de propina paga no exterior a Renato Duque, diretor de Serviços da Petrobras. Outros quatro foram alvo de prisão temporária: Alexandrino de Salles Ramos de Alencar, executivo da Odebrecht, Antonio Pedro Campelo de Souza e Flávio Lúcio Magalhães, da Andrade Gutierrez, além de Christina Maria da Silva Jorge, que sucedeu Bernardi Filho como sócia da Hayley do Brasil.

Segundo o juiz Moro, pelas provas colhidas até agora, a Odebrecht pagaria propina "de maneira geral de forma mais sofisticada do que as demais empreiteiras, especialmente mediante depósitos em contas secretas no exterior" em bancos da Suíça, Mônaco e Panamá.

Repasses eram feitos por operadores
Ele lembrou que já foram bloqueados 20 milhões de euros em contas secretas do ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, em Mônaco, além dos valores em contas de Paulo Roberto Costa (US$ 23 milhões) e Pedro Barusco Filho (US$ 97 milhões). As contas em nome de Nestor Cerveró estavam zeradas.

A Odebrecht fazia os repasses por meio do operador Bernardo Freiburghaus. Também foi encontrado depósito de US$ 300 mil, numa conta da offshore Canyon View Assets, controlada por Barusco, no qual consta expresso o nome da Odebrecht como responsável pela transação.

A Andrade Gutierrez teria utilizado como operadores dois investigados já presos pela Lava-Jato: Fernando Soares, o Fernando Baiano, e Mário Goes. A PF identificou triangulação de depósitos entre a Zagope Angola, antigo nome da Andrade Gutierrez Europa, e uma conta usada por Goes para mandar dinheiro a Barusco. A conta de Barusco teria recebido US$ 5,887 milhões.

"Trata-se de prova significativa do envolvimento da empreiteira no crime de corrupção dos dirigentes da Petrobras, já que não há causa econômica lícita para a transferência entre a Phad e a Backspin" afirmou Moro.

Todos devem ser submetidos a exames de corpo de delito. Os depoimentos dos que estão em prisão temporária devem começar a ser colhidos neste fim de semana. A14a fase cumpriu ainda 38 mandados de busca e apreensão em SP, Rio de Janeiro, Minas e Rio Grande do Sul.

Executivo que viajou com Lula às custas de empreiteira é preso

• Diretor da Odebrecht, Alexandrino Alencar foi mencionado por delatores

Cristina Tardáguila, Letícia Fernandes e Silvia Amorim – O Globo

RIO E SÃO PAULO- Um dos presos ontem na 14a fase da Operação Lava-Jato é Alexandrino Alencar, diretor de Relações Internacionais da Odebrecht, que levou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em viagens, pagas pela construtora, para Cuba, República Dominicana e Estados Unidos, em janeiro de 2013. Oficialmente, não havia relação com atividades da empresa nesses países.

A viagem foi revelada pelo GLOBO em abril. Dezoito dias depois, a revista "Época" publicou que o Ministério Público Federal (MPF) havia aberto uma investigação preliminar para apurar a suspeita de que Lula possa ter feito tráfico de influência para beneficiar negócios da empreiteira no exterior.

No último dia 12, O Globo mostrou que o Ministério das Relações Exteriores havia deflagrado uma ação para evitar que documentos oficiais que citassem Lula e Odebrecht fossem repassados à imprensa por meio da Lei de Acesso à Informação. Na terça-feira, o ministério tornou público documentos feitos entre 2003 e 2010.

Alencar já havia sido convidado por Lula para acompanhá-lo em comitiva do governo brasileiro à África, em 2011, quando ele já não era mais presidente. Naquele ano, o pedido causou constrangimento ao Itamaraty, porque o diretor não trabalhava no governo nem tinha relação direta com atividades do ex-presidente.

Também em 2011, a Odebrecht pagou para que Lula viajasse à Venezuela, também na companhia de Alencar, segundo a revista "Época". O executivo foi um dos principais interlocutores para viabilizar a construção do estádio Itaquerão, antigo sonho de Lula, segundo o livro de memórias do ex-presidente do Corinthians Andrés Sanchez.

AG também pagou viagens de Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já esteve em, pelo menos, oito países desde que deixou a Presidência em viagens bancadas pelas empreiteiras Odebrecht e Andrade Gutierrez. A primeira foi, de longe, a que mais levou Lula ao exterior.

Lula teve viagens pagas pela Odebrecht a Angola, Venezuela, Panamá, Guiné Equatorial, Cuba, República Dominicana e Gana. Na época em que aconteceram as visitas, a empreiteira tinha interesse em obras nesses locais. Na maioria delas, Lula viajou acompanhado de Alexandrino Alencar, que foi citado por delatores na Operação Lava-Jato como o operador de propina pela Odebrecht.

O doleiro Alberto Youssef disse que marcava encontros com Alencar por telefone. O número do diretor da Odebrecht consta da lista de ligações realizadas ou recebidas por um dos aparelhos de Youssef, conforme relatório sigiloso da empresa Black Berry, enviado aos investigadores da Lava-Jato e localizado pelo GLOBO. Alencar e a Odebrecht negam as acusações.

Os eventos de Lula nas viagens foram, em geral, palestras para empresários e políticos. A Procuradoria Geral da República investiga desde o início deste ano se o ex-presidente praticou o crime de tráfico de influência. Suspeita-se que o pano de fundo de algumas dessas visitas ao exterior tenha sido ajudar as empreiteiras em negócios com governos africanos e latino-americanos. Elas receberam financiamentos do BNDES para esses projetos fora do Brasil. Lula fez, ao menos, uma visita ao continente africano custeada pela Andrade Gutierrez. Em 2012, uma viagem do ex-presidente à Etiópia coincidiu com o anúncio do financiamento de cerca de US$ 1 bilhão para a empreiteira construir quase 500 quilômetros de ferrovias no país.

Mas é no campo das doações eleitorais que a empresa se destaca mais do que a concorrente Odebrecht. Ela ofereceu quantia muito superior à campanha da presidente Dilma Rousseff no ano passado: R$ 21 milhões. A Odebrecht doou R$ 7 milhões. A candidatura do adversário de Dilma Aécio Neves (PSDB) recebeu R$ 13 milhões da Andrade Gutierrez e R$ 5 milhões da Odebrecht.

O Instituto Lula nega que ele atue como lobista das empreiteiras e que seja alvo de investigação formal por tráfico de influência. Sobre as viagens, explica que o ex-presidente é convidado por várias empresas para fazer palestras e é praxe que elas paguem os custos das viagens, que são divulgadas pelo instituto.

Lula critica 'inércia' do governo e diz que será próximo alvo do juiz Moro

Lula diz a aliados que será próximo alvo do juiz Moro

Catia Seabra, Bela Megale, Valdo Cruz, Andréia Sadi e Natuza Nery – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO e BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse a aliados que a prisão dos presidentes da Odebrecht e da Andrade Guiterrez é uma demonstração de que ele será o próximo alvo da operação Lava Jato. Lula também reclamou nesta sexta-feira (19) do que chamou de inércia da presidente Dilma Rousseff para contenção dos danos causados pela investigação.

Ainda segundo seus interlocutores, Lula se queixa da atuação do ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, que teria convencido Dilma a minimizar o impacto político da operação.

Nas conversas, ele se mostra preocupado pelo fato de não ter foro privilegiado, podendo ser chamado a depor a qualquer momento. Por isso, expressa insatisfação que o caso ainda esteja sob condução do juiz Sérgio Moro.

Para petistas, os desdobramentos podem afetar o caixa do partido e por em xeque a prestação de contas da campanha da presidente. A detenção de Marcelo Odebrecht e Otávio Azevedo colocou a cúpula do PT em "estado de alerta" e preocupa o Palácio do Planalto pelos efeitos negativos na economia.

Para assessores do ministro Joaquim Levy (Fazenda), o "ritmo da economia, que já está fraco, ficará mais lento".

No entanto, a estratégia adotada pelo partido e pelo governo foi a de afirmar que, dada influência das duas empreiteiras, a investigação atingirá as demais siglas, incluindo o PSDB.

Nessa linha, um ministro citou o nome da operação "Erga Omnes" (expressão em latim que significa "para todos") para afirmar que não só o PT será afetado.

Durante a campanha presidencial de 2014, segundo esses interlocutores do governo, ambos executivos fizeram chegar reservadamente ao Planalto a sua intenção de votar na oposição.

Nesta sexta, Lula manteve sua agenda: um almoço com o ministro da Educação, Renato Janine, e o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, além do secretário municipal de Educação, Gabriel Chalita. Segundo participantes, ele exibia bom humor.
Apesar do argumento de que outros partidos serão afetados, a tensão é maior entre petistas. Desde o fim de 2014, a informação, que circulava no meio empresarial e político, era de que Marcelo Odebrecht não "cairia sozinho" caso fosse preso.

A empresa sempre negou ameaças. Entre executivos e políticos, contudo, as supostas ameaças eram vistas como um recado ao PT dada a proximidade entre a Odebrecht e Lula –a empresa patrocinou viagens do ex-presidente ao exterior, para tentar fomentar negócios na África e América Latina.

Um dos presos é Alexandrino Alencar, diretor da Odebrecht que acompanhava Lula nessas viagens patrocinadas pela empreiteira. Integrantes dizem que "querem pegar Lula". Lula também se encontrou com executivos da Odebrecht no exterior.

Planalto e PT avaliam que cerco a partido está se fechando

Tânia Monteiro, Talita Fernandes e Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

• Prisão preocupa porque Dilma e Lula mantêm relação estreita com empreiteiro

BRASÍLIA - A prisão dos empresários das empreiteiras Odebrecht e Andrade Gutierrez trouxe preocupação ao Palácio do Planalto. Apesar da intenção dos assessores palacianos em manter a presidente Dilma Rousseff totalmente afastada das polêmicas provocadas pela Operação Lava Jato e das consequências dela, o sentimento é que todo este processo acaba por desestabilizar o governo, que já se encontra sob ataques de vários setores e sofrendo com baixa popularidade.

A preocupação não é só pelo governo Dilma, mas também pelo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que consideram ser o alvo atual da Lava Jato. Só que, mirando em Lula, não há como não respingar em Dilma. O presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, foi visto muitas vezes no Planalto, durante o governo Lula e em inúmeras viagens do ex-presidente a África.

Também acompanhou o presidente a Cuba, onde a empresa está à frente da construção do Porto de Mariel.

Desde 2011, Dilma se reuniu pelo menos cinco vezes oficialmente, com Marcelo Odebrecht. O último encontro foi há menos de um mês, no 26 de maio, no hotel Intercontinental, na Cidade do México.

Marcelo Odebrecht, que era a figura central do evento, teve deferência especial por estar coordenando o encontro empresarial que Dilma prestigiou. Ontem, antes de embarcar para cumprir agenda em Camaçari, na Bahia, a presidente Dilma recebeu o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, no Palácio da Alvorada. Cardozo foi informar à presidente sobre a nova etapa da operação. Na volta da Bahia, nova reunião de avaliação da operação com Cardozo.

Proximidade. Marcelo Odebrecht sempre foi próximo dos petistas. Nos bastidores, auxiliares de Dilma e dirigentes do PT dizem que Cardozo perdeu o controle sobre as investigações da Lava Jato, da Polícia Federal. Em conversas reservadas, até mesmo petistas afirmam que a oposição fará de tudo para "pegar" o ex-presidente Lula.

A avaliação no PT é a de que o cerco está se fechando e que a crise política vai piorar. Mas, mesmo sabendo dos incômodos que a prisão dos empreiteiros pode trazer para o governo, assessores da presidente afirmam que não haverá problema em relação às doações de campanha. Justificam que os responsáveis das duas empresas declaram voto explicito aos adversários da petista no ano passado. Marcelo Odebrecht teria anunciado voto ao tucano Aécio Neves, e Otávio Azevedo, da Andrade Gutierrez, a Marina Silva, do PSB.

Luiz Inácio falou: 'Dilma e eu estamos no volume morto. O PT está abaixo do volume morto'

Num encontro com religiosos no Instituto Lula, em SP, o ex-presidente criticou duramente a presidente Dilma e fez um diagnóstico: "Dilma está no volume morto, o PT está abaixo do volume morto, e eu estou no volume morto", disse ele, relatam Tatiana Farah e Julianna Granjeia. Para Lula, a segunda gestão de Dilma parece "um governo de mudos". E não poupou a equipe dela: "Aquele gabinete (presidencial) é uma desgraça. Não entra ninguém para dar notícia boa". Os religiosos criticaram o governo, Lula e o PT, cobrando uma aproximação com os pobres.

Criador e criatura em choque

• Em encontro com religiosos, Lula faz duras críticas a Dilma e a sua gestão: "Parece um governo de mudos"

Tatiana Farah e Julianna Granjeia – O Globo

-SÃO PAULO- Como se estivesse em um confessionário, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu o coração a um seleto grupo de padres e dirigentes de entidades religiosas no auditório de seu instituto, anteontem, em São Paulo. Em tom de desabafo, criticou duramente a presidente Dilma Rousseff e creditou ao governo dela, sobretudo no segundo mandato, a crise vivida pelos petistas. Para Lula, a taxa de aprovação da companheira está no "volume morto" numa referência à situação hídrica paulista, e, com o silêncio do Planalto, o "governo parece um governo de mudos" O ex-presidente admitiu ainda que é "um sacrifício" convencer sua sucessora a viajar pelo país e defender sua gestão.

— Dilma está no volume morto, o PT está abaixo do volume morto, e eu estou no volume morto. Todos estão numa situação muito ruim. E olha que o PT ainda é o melhor partido. Estamos perdendo para nós mesmos — disse Lula.

Para ilustrar a profundidade do poço em que se meteu o PT, Lula citou uma pesquisa interna do partido, que revela que a crise se instalou no coração da legenda, o ABC Paulista. Muito rouco, o ex-presidente dizia coisas como "o momento não está bom" e "o momento é difícil"

— Acabamos de fazer uma pesquisa em Santo André e São Bernardo, e a nossa rejeição chega a 75%. Entreguei a pesquisa para Dilma, em que nós só temos 7% de bom e ótimo — disse Lula aos religiosos.

Ele afirmou ter dito à presidente: "Isso não é para você desanimar, não. Isso é para você saber que a gente tem de mudar, que a gente pode se recuperar. E entre o PT, entre eu e você, quem tem mais capacidade de se recuperar é o governo, porque tem iniciativa, tem recurso, tem uma máquina poderosa para poder falar, executar, inaugurar".

Na mesa, os mais de 30 participantes do encontro, entre eles o bispo dom Pedro Luiz Stringhini, não deram trégua ao ex-presidente. Sobraram críticas para o PT, o governo, o próprio Lula e seu pupilo, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. Os religiosos defenderam que o partido volte à antiga liturgia e se aproxime mais dos trabalhadores.

Lula concordou com a tese, dizendo que os petistas trocaram a discussão da política pela do mandato.

A reunião faz parte da estratégia do partido de tentar se reaproximar de sua base social. O interlocutor da ala religiosa é o ex-ministro Gilberto Carvalho, mencionado diversas vezes por Lula, em seu discurso de mais de 50 minutos, para exemplificar como o governo Dilma perdeu o contato com os movimentos sociais. Lula cobrou da presidente, e tem feito isso em outras reuniões reservadas, uma agenda positiva e mais exposição pública. Para o petista, Dilma deixou o governo mais distante dos mais pobres.

— Na falta de dinheiro, tem de entrar a política. Nestes últimos cinco anos, fizemos muito menos atividade política com o povo do que fizemos no outro período — disse ele, citando as conferências nacionais com grupos sociais:

— Isso acabou, Gilberto!

Lula reclamou que Dilma tem dificuldade de ouvir até mesmo os conselhos dados por ele:

— Gilberto sabe do sacrifício que é a gente pedir para a companheira Dilma viajar e falar. Porque na hora que a gente abraça, pega na mão, é outra coisa. Política é isso, o olhar no olho, o passar a mão na cabeça, o beijo.

Nesse ponto da conversa, o ex-presidente fez questão de ressaltar: falar com a população não é "agendar para falar na televisão"

Durante a reunião, Gilberto Carvalho, que saiu do núcleo central do governo Dilma depois de muitas críticas à atuação da equipe da presidente, concordava com Lula, completava frases e assentia com a cabeça enquanto o ex-presidente subia o tom:

— Aquele gabinete (presidencial) é uma desgraça. Não entra ninguém para dar notícia boa. Os caras só entram para pedir alguma coisa. E como a maioria que vai lá é gente grã-fina... Só entrou hanseniano porque eu tava no governo, só entrou catador de papel porque eu tava no governo — disse Lula, que completou:

— Essa coisa se perdeu.

Lula revelou o que tem conversado com Dilma nos encontros privados. Os dois têm feito reuniões em São Paulo, e a presidente só as informa na agenda oficial depois que são realizadas. Ele disse que fala para a presidente que a hora é de " ir para a rua, viajar por este país, botar o pé na estrada". Diz ainda que os petistas não podem temer as vaias. Uma das armas para recuperar a combalida gestão, segundo ele, é investir na execução do Plano Nacional de Educação. O problema seria, de acordo com ele mesmo, que o próprio PT desconhece o conteúdo do plano.

"Os ministros têm de falar"
O petista, que não falou com os padres sobre uma possível candidatura à Presidência em 2018, mas não esconde que pode concorrer ao terceiro mandato, disparou fortemente contra os ministros, sobretudo os do PT.

— Os ministros têm de falar. Parece um governo de mudos. Os ministros que viajam são os que não são do PT. Kassab já visitou 23 estados, não sei quem já visitou 40 estados — exagerou.

O ministro das Cidades, Gilberto Kassab, preside o PSD e quer recriar o Partido Liberal. Foi citado mais uma vez, para criticar o desânimo dos líderes petistas:

— Aí não dá. Kassab já tá criando outro partido, e a gente não tá defendendo nem o da gente!

Lula disse que também tem chamado a atenção do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, dizendo que ele deveria fazer mais discursos públicos.

— Pelo amor de Deus, Aloizio, você é um tremendo orador — disse ele, que emendou, arrancando risos dos religiosos: — É certo que é pouco simpático.

O ex-presidente ressaltou ainda que "inaugura-se (obra do) Minha Casa Minha Vida todos os dias" mas que os políticos locais não destacam o papel do governo nas obras.

Para criticar o empenho de Dilma na aprovação do ajuste fiscal, Lula afirmou:

— Falar é uma arma sagrada. Estamos há seis meses discutindo ajuste. Ajuste não é programa de governo. Em vez de falar de ajuste... Depois de ajuste vem o quê? — criticou Lula, apontando que é preciso "fazer as pessoas acreditarem que o que vem pela frente é muito bom". Segundo o petista, "agora parece que acabou o (assunto) do ajuste".

A vaca tossiu
Lula disse que o governo não dá boas notícias ao país.

— Nós tivemos as eleições no dia 26 de outubro. De lá pra cá, Gilberto, nós temos que dizer para vocês, porque vocês são companheiros, depois de nossa vitória, qual é a notícia boa que nós demos para este país? Essa pergunta eu fiz para a companheira Dilma no dia 16 de março, na casa dela.

Segundo Lula, nesse encontro estavam os ministros Mercadante, Jacques Wagner (Defesa) e Miguel Rossetto (Secretaria Geral da Presidência), além de Rui Falcão, presidente nacional do PT.

—Eu fiz essa pergunta para Dilma: "Companheira, você lembra qual foi a última notícia boa que demos ao Brasil?". E ela não lembrava. Como nenhum ministro lembrava. Como eu tinha estado com seis senadores, e eles não lembravam. Como eu tinha estado com 16 deputados federais, e eles não lembravam. Como eu estive com a CUT, e ninguém lembrava.

Para os religiosos — que foram recebidos no Instituto Lula com café, refrigerantes, sanduíches e docinhos como brigadeiro e olho de sogra —, Lula continuou a "confissão" elencando as más notícias dadas pelo governo:

— Primeiro: inflação. Segundo: aumento da conta de água, que dobrou. Terceiro: aumento da conta de luz, que para algumas pessoas triplicou. Quarto: aumento da gasolina, do diesel, au mento do dólar, aumento das denúncias de corrupção da Lava-Jato, aquela confusão desgraçada que nós fizemos com o Fies (Financiamento Estudantil), que era uma coisa tranquila e que foram mexer e virou uma desgraceira que não tem precedente. E o anúncio do que ia mexer na pensão, na aposentadoria dos trabalhadores.

Nesse momento, Lula resgatou as promessas não cumpridas por Dilma durante a última campanha eleitoral.

— Tem uma frase da companheira Dilma que é sagrada: "Eu não mexo no direito dos trabalhadores nem que a vaca tussa" E mexeu. Tem outra frase, Gilberto, que é marcante, que é a frase que diz o seguinte: "Eu não vou fazer ajuste, ajuste é coisa de tucano". E fez. E os tucanos sabiamente colocaram Dilma falando isso (no programa de TV do partido) e dizendo que ela mente. Era uma coisa muito forte. E fiquei muito preocupado.

O ex-presidente ainda disse aos religiosos — entre eles o padre Julio Lancelotti, dirigentes de pastorais católicas e um pastor evangélico — não acreditar na existência do mensalão.

— Não acredito que tenha havido mensalão. Não acredito. Pode ter havido qualquer outra coisa, mas eu duvido que tenha havido compra de voto — disse ele, mencionando que o ex-deputado Luizinho, do PT de Santo André, não poderia ter voto comprado no mensalão porque era, na época do escândalo, em 2005, líder do governo.

Lula repetiu a crítica que tem feito desde o início do ano nas reuniões do partido: a de que os petistas saíram derrotados do caso do mensalão porque trataram do caso "juridicamente", quando a discussão, segundo ele, é política. Os petistas têm se desdobrado para defender, desta vez, o ex-tesoureiro João Vaccari Neto, acusado de integrar o esquema descoberto pela Operação Lava-Jato, numa mudança em relação à postura adotada sobre o ex-tesoureiro Delúbio Soares.

Durante as investigações do mensalão, a direção do PT expulsou Delúbio, que só voltou a ser defendido pelos principais nomes da legenda quando começou o julgamento no Supremo.

— Nós começamos a quebrar a cara ao tratar do mensalão juridicamente. Então, cada um contratou um advogado. Advogado muito sabido, esperto, famoso, desfilando por aí, falando que a gente ia ganhar na Justiça. E a imprensa condenando. Todo dia tinha uma sentença. Quando chegou o dia do julgamento, o pessoal já estava condenado — disse Lula.

Para ele, o atual momento vivido pelo PT é ainda mais dramático. Ele diz que há um "mau humor na sociedade". E que até o ministro do STF Ricardo Lewandowski, "que votou contra (o mensalão)" sofreu ofensas.

Hoje, segundo Lula, quem é hostilizado na rua são os próprios petistas.

— Jamais vi o ódio que está na sociedade. Família brigando dentro de família, companheiro do PT que não pode entrar em restaurante...

Moro vê 'risco' em plano de concessões de Dilma

Fábio Fabrini, Julia Affonso, Fausto Macedo e Ricardo Brandt - O Estado de S. Paulo

• Ao permitir que empresas alvo da Lava Jato participem de licitações, governo dá chance de 'reiteração de práticas corruptas', afirma juiz federal

Na decisão em que decretou a prisão preventiva de executivos da Odebrecht e da Andrade Gutierrez, o juiz federal Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato, afirma que obras públicas em curso e o novo plano de concessões lançado pela presidente Dilma Rousseff no dia 9, podem ser uma nova fonte de corrupção para as empreiteiras. Ao justificar as prisões, o magistrado sustentou que, como o governo não impediu as empresas de celebrarem contratos públicos fora da Petrobrás, principal foco da Lava Jato, há risco de "reiteração das práticas corruptas".

"As empreiteiras não foram proibidas de contratar com outras entidades da administração pública direta ou indireta e, mesmo em relação ao recente programa de concessões lançado pelo governo federal, agentes do Poder Executivo afirmaram publicamente que elas poderão dele participar, gerando risco de reiteração das práticas corruptas, ainda que em outro âmbito", argumentou Moro.

O plano de concessões lançado por Dilma prevê investimentos de R$ 198 milhões em infraestrutura nos próximos anos. A ideia é ceder à iniciativa privada a administração de portos, aeroportos, rodovias e ferrovias pelo País.

Embora as empresas investigadas sejam alvo de processos administrativos - que podem resultar em declaração de inidoneidade e, em consequência, proibição de contratar com o governo -, o ministro Valdir Simão, da Controladoria-Geral da União (CGU), afirmou não haver, por ora, nenhum entrave para que elas participem de concorrências do pacote de concessões. "Somente após a conclusão do processo de responsabilização e sendo punidas é que elas seriam impedidas", afirmou o ministro.

Leniência. Moro lembra que a Odebrecht e a Andrade Gutierrez são as duas maiores construtoras do País e, diante disso, é "até razoável, no contexto, discutir a sobrevivência das empresas através de mecanismos de leniência, para preservar a economia e empregos". Os acordos de leniência, negociados pela CGU, permitem que empresas envolvidas em corrupção continuem contratando com o governo, em troca de ressarcimento ao erário pelas perdas que causaram, pagamento de multas e colaboração com as investigações.

No caso das duas empreiteiras, contudo, o juiz argumenta que não houve o reconhecimento de responsabilidades nem indenização dos prejuízos. "Sem isso, o que se tem é o estímulo à reiteração das práticas corruptas, colocando as empresas acima da lei", escreveu.

FHC pede que governo seja investigado

A essa altura é muito difícil tapar o sol com a peneira, diz FHC sobre Lava Jato

Luciana Nunes Leal - O Estado de S. Paulo

• Ex-presidente comentou sobre nova etapa da operação que levou à prisão os presidentes da Odebrecht e da Andrade Gutierrez, maiores empreiteiras do País

RIO - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso comentou as investigações da operação Lava Jato, que teve sua 14ª fase deflagrada nesta sexta-feira, 19, com as prisões dos presidentes da Odebrecht e da Andrade Gutierres, as maiores empreiteiras do País. O tucano defendeu as investigações, aproveitou para alfinetar os partidos da base aliada do governo envolvidos no esquema e disse que "a essa altura é muito difícil tapar o sol com a peneira".

"É um momento complexo, porque afeta as empresas. Mas não se trata só que as empresas fizeram isso ou aquilo. São os governos que não só concordaram, mas participaram, ou pelo menos os partidos que sustentavam os governos participaram do mesmo esquema. Isso tem que ser analisado com mais vigor. Os empresários estão na cadeia. E os outros? Espero que as instituições continuem funcionando, não quero me antecipar a julgamentos. A esta altura é muito difícil tapar o sol com a peneira", afirmou o ex-presidente após participar de almoço da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro.

Economia. Durante o evento, Fernando Henrique não poupou críticas à condução da economia pelo governo Dilma. Ele criticou o apelo do governo federal atualmente em torno do pacote de concessões para obras de infraestrutura. "Não adianta novo projeto de infraestrutura se não tem organização, competência, liderança para mostrar qual é o rumo", afirmou.

Ele apontou ainda o que considera erros da política econômica dos governos petistas, que segundo ele apostou no estímulo ao crédito fácil. Fernando Henrique afirmou, no entanto, que tem expectativa de uma união de forças para a recuperação econômica e política do país.

O ex-presidente também falou sobre as contas do governo Dilma Rousseff. Ele disse que, se o Tribunal de Contas da União (TCU) rejeitar as contas do governo Dilma, "será um fato grave". "Cobrar explicações diretamente ao presidente da República é uma coisa inédita. Não sou especialista, mas pelo que dizem há motivos para a rejeição ou pelo menos (aprovação) com fortes ressalvas, por abuso da Lei de Responsabilidade Fiscal".

Sobre o fato de o ex-secretário do Tesouro Arno Agustin ter assumido responsabilidade pelas manobras, FHC respondeu: "É mais grave ainda. Ele pode reconhecer o que quiser, a responsabilidade não é dele. Ninguém toma essa decisão em nível do secretário".

Dilma pode ser responsabilizada apesar de ex-secretário assumir culpa de ‘pedaladas’, diz ministro do TCU

• Arno Augustin assumiu ser o responsável pela prática em documento assinado no final do ano passado

Vinicius Sassine – O Globo

BRASÍLIA — A presidente Dilma Rousseff poderá ser responsabilizada pelas chamadas "pedaladas" fiscais mesmo com a existência de uma nota técnica em que o então secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, assume ser o responsável pela prática. É o que afirmou ao GLOBO o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes, relator das contas de 2014 de Dilma.

— As contas não são do Arno, são da presidente Dilma. O fato de um gestor fazer não significa que ela não possa ser responsabilizada — disse Nardes.

Na análise das contas presidenciais, o foco é Dilma, e não o ex-secretário do Tesouro, segundo o ministro:

— Não são os atos de Arno que estamos analisando, são as contas da presidente. Se um assessor dela tomou uma medida em nome do governo, a responsabilidade é dela.

Reportagem do jornal "Valor Econômico" publicada nesta sexta-feira revelou a existência de uma nota técnica assinada por Arno em 30 de dezembro de 2014 em que o então secretário diz ser dele a responsabilidade por fazer a liberação e a transferência de recursos pelo Tesouro. Em 5 de janeiro, quando assumiu o Ministério da Fazenda, Joaquim Levy anunciou o economista Marcelo Saintive no lugar de Arno.

A nota técnica foi redigida pela Coordenação Geral de Programação Financeira (Cofin) e pela Subsecretaria de Política Fiscal (Supof) e assinada por Arno. No documento, ele reitera que "cumpre à Supof e à Cofin procederem na operacionalização da liberação/transferência desses recursos, posteriormente à autorização de liberação pelo secretário do Tesouro Nacional".

As "pedaladas" consistiram num represamento de repasses de recursos a bancos oficiais, como forma de melhorar artificialmente as contas públicas. Os bancos precisaram arcar com o pagamento de benefícios como o seguro-desemprego e o Bolsa Família.

Em abril, uma votação do TCU concluiu que as "pedaladas" infringiram a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), por terem se configurado, na visão dos ministros, como empréstimos. Dezessete autoridades econômicas foram chamadas a se explicar, entre elas Arno. Na última quarta-feira, o ministro Nardes deu 30 dias para Dilma se explicar sobre 13 indícios de irregularidades, entre eles as "pedaladas", e adiou o julgamento do parecer das contas, o que foi aprovado pelo plenário. A presidente corre o risco de ter as contas rejeitadas.

— Poderia já ter proposto a rejeição, mas acatei a ideia de abrir ao contraditório — disse Nardes ao GLOBO.

Ainda segundo o ministro, a nota técnica de Arno em nada interfere em dois apontamentos de irregularidades, relacionados ao contingenciamento de despesas. Um decreto presidencial de novembro de 2014 desbloqueou R$ 10 bilhões para os ministérios gastarem, num momento em que deveria haver um contingenciamento de R$ 28,5 bilhões. Esse fato aparece como um dos 13 indícios de irregularidades. O decreto foi usado para influenciar a aprovação pelo Congresso da alteração da meta de superávit primário, o que também foi motivo de questionamento à presidente.

– Caberia a ela fazer (o contingenciamento) e ela não fez. É uma competência privativa da presidente. Isso desatendeu a Constituição Federal e a LRF – afirmou o ministro do TCU.

Na avaliação de outros ministros do TCU inclinados a votar pela rejeição das contas de Dilma, o documento assinado por Arno não retira a responsabilidade da presidente por supostas irregularidades nas contas, em especial por conta do decreto presidencial que desbloqueou os R$ 10 bilhões. O fato mostra uma responsabilidade e uma omissão diretas de Dilma, conforme esses ministros, para quem a macro-gestão do governo planeja atos econômicos como as "pedaladas".

PF pede ao STJ inquérito para investigar Pimentel por lavagem

• Caso tem como base a Operação Acrônimo, sobre empresário ligado ao petista

Jailton de Carvalho – O Globo

-BRASÍLIA- A Polícia Federal pediu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) abertura de inquérito para apurar o suposto envolvimento do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), com lavagem de dinheiro. Caberá ao ministro Herman Benjamin, relator do caso, decidir se acolhe ou não o pedido da PF, que tem como base a Operação Acrônimo, que investiga suposta lavagem de dinheiro do empresário Benedito de Oliveira, o Bené. O empresário atuou na campanha eleitoral que resultou na vitória de Pimentel, ano passado.

Entre os investigados na operação também estão a mulher do governador, a jornalista Carolina Oliveira Pimentel. A jornalista tinha a empresa Oli Comunição e Imagens no mesmo endereço da PP & Participações Patrimoniais, de Oliveira. Segundo a polícia, o empresário usou várias empresas, algumas de fachada, para camuflar a movimentação de dinheiro de origem não declarada.

Oliveira e auxiliares foram detidos com R$ 113 mil em espécie, depois de participarem da campanha de Pimentel ano passado. Eles foram presos em Brasília, quando retornavam à cidade num avião que está em nome de empresa de Oliveira. Como não explicaram a origem do dinheiro, a PF abriu inquérito para apurar a origem dos recursos.

Educação. Governo corta 47% dos investimentos previstos para as federais

Victor Vieira - O Estado de S. Paulo

  • Obras e compras de materiais vão perder R$ 1,2 bilhão dos R$ 2,59 bilhões reservados para as 63 instituições de ensino neste ano

SÃO PAULO - O Ministério da Educação (MEC) cortou em 47% os investimentos nas 63 universidades federais do País em 2015. Esses recursos são usados em obras, além da compra de computadores e móveis, por exemplo. A medida faz parte do ajuste de contas feito pelo governo federal desde o início do ano. Segundo gestores de universidades ouvidos pelo Estado, a redução será de cerca de R$ 1,2 bilhão.

No Orçamento de 2015, a previsão era de R$ 2,59 bilhões para investimentos, segundo cálculos dos gestores. Agora, o limite para gastos nessa categoria é de R$ 1,34 bilhão. A assessoria de imprensa do MEC disse que o limite das despesas de investimento neste ano seria 73% do que foi reservado pelo governo para gastos (empenhado) em 2014, mas não detalhou cifras.

O secretário de Educação Superior da pasta, Jesualdo Farias, confirmou o corte de 47% ao Estado. “Vamos trabalhar, primeiro, para que todas as obras que estão sendo realizadas sejam concluídas”, disse. “E com a perspectiva de adiar novas obras, de forma que não comprometa cursos que estão em funcionamento.”

Segundo Farias, serão feitas nas próximas semanas reuniões com cada um dos dirigentes das instituições para definir prioridades. “O orçamento de 2015 não vai poder cobrir todas as demandas. Vamos programar uma parte para este ano e outra para 2016”, explicou. No ano passado, segundo balanço do MEC, havia 456 obras em execução nas federais.

Soraya Smaili, reitora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e outros dirigentes da instituição publicaram nesta quinta-feira, 18, uma carta de protesto contra os cortes, classificados como “violentos”. A perda de recursos para investimentos na Unifesp será de aproximadamente R$ 25 milhões.

Segundo Soraya, o corte pode comprometer a reforma da biblioteca e dos laboratórios da instituição, a construção do câmpus na zona leste e a compra de equipamentos para o segundo prédio do Hospital São Paulo, já em fase final de construção, mas com um ritmo mais lento. Também podem ser prejudicadas as obras em prédios dos câmpus de Diadema e de Osasco, esperadas há mais de cinco anos.

A Unifesp aumentou em 825% o total de alunos entre 2004 e 2014, mas foi alvo de críticas por criar novas vagas e faculdades sob condições precárias. “Ao fazermos as reformas em passo mais lento, adiamos a consolidação dessa expansão”, criticou Soraya. “E também a continuidade da expansão.”

Segundo Jesualdo Farias, secretário do MEC, serão priorizadas as federais em maior dificuldade. “A expansão vai continuar, mas no ritmo que o orçamento permite”, disse. A partir de julho, acrescentou, os repasses de dinheiro para investimentos serão normalizados.

Incerteza. O decano de Planejamento e Orçamento da Universidade de Brasília (UnB), César Augusto Silva, também lamentou a perda de recursos, estimada em R$ 31 milhões na instituição. “O grande problema é que ficamos até o meio do ano sem saber o que seria cortado”, reclamou.

De acordo com ele, devem ficar prejudicadas as obras do novo prédio da Faculdade de Medicina e a restauração do Instituto Central de Ciências, conhecido como Minhocão, principal prédio do câmpus.

A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) informou, em nota, que o montante de investimentos da instituição para este ano não foi definido. Como foram contratados antes do corte de verbas, os editais em andamento serão mantidos. Novos projetos, afirmou a reitoria, devem ter a licitação concluída apenas em 2016.

O MEC afirmou ainda, também em nota, que “priorizou as despesas de custeio das universidades”. Segundo a pasta, o limite de empenho para 2015 ficará 4% maior quando comparado com os valores empenhados no ano passado. Acrescentou ainda que o orçamento das 63 federais saltou de R$ 8,6 bilhões, no ano passado, para R$ 9,5 bilhões neste ano.

Entre a inflação e o desemprego

• Alta do IPCA-15, retração econômica e corte de vagas dificultam decisão do BC sobre juros

Marcello Corrêa – O Globo

Indicadores econômicos divulgados ontem surpreenderam negativamente e deixaram clara a situação limite em que se encontra a economia do país: a inflação aumentou, a atividade econômica encolheu, e as empresas demitiram mais — tudo isso numa intensidade maior do que previam governo e analistas. O cenário mostra bem quão complicada é a tarefa do Banco Central (BC). Precisa aumentar os juros e segurar preços que não param de subir, mas não pode ignorar a desaceleração da atividade econômica, que já chegou ao ponto de engolir milhares de empregos. Assim, crescem as dúvidas sobre os rumos dos juros nos próximos meses.

Há quem acredite que a taxa básica, a Selic, hoje em 13,75% ao ano, será elevada a mais de 14,5%. Um dos fatores que mais preocupa os economistas é a combinação entre inflação alta e ritmo fraco da economia. Segundo o IBGE, o IPCA-15 de junho — espécie de prévia da inflação oficial, medida pelo IPCA — chegou a quase 1%. Ao mesmo tempo, o IBC-Br, conhecido como o "PIB do BC" caiu 0,84% em abril, sinal de que o segundo trimestre deve ser de PIB fraco. Para completar o cenário, o Ministério do Trabalho informou que o Brasil fechou 115.599 vagas formais em maio.

— O dilema é estarmos nesse momento de recessão e ao mesmo tempo o BC ter de subir juros. Mas, se não elevar, o custo pode ser maior no futuro — avalia Marcel Balassiano, economista da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), que espera que a Selic chegue a 14,5% em setembro.

Para economista, "mal maior é o desemprego"
José Márcio Camargo, economista da Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-Rio, acredita que o Copom possa ir além. Já o banco ABC Brasil, em relatório, prevê um cenário menos apertado, com a Selic subindo até 14,25% em julho e parando por aí.

— Nossa previsão é de alta de até 14,5%, mas se a inflação continuar acelerando, o BC não vai conseguir parar em setembro — afirma Camargo.

Júlio Miragaya, vice-presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), acredita que subir juros não é a solução ideal para combater a inflação, mas não indica uma alternativa para conter os preços. Para ele, o que mais preocupa no cenário atual é a piora no mercado de trabalho.

— A inflação é um mal menor. A expectativa é que a taxa do segundo semestre anualizada fique em 5,4%, próxima da meta. O mal maior vai ser o desemprego — avalia Miragaya.

Economia dá sinais de piora e enfrenta processo de ‘estagflação’

Ricardo Leopoldo – O Estado de S. Paulo

• Segundo economistas, o IPCA neste ano pode ficar perto de 9% e o PIB deverá cair até 2%; dados de inflação, emprego e atividade econômica reforçam expectativas ruins

SÃO PAULO - Está mais profunda a estagflação do Brasil. Indicadores econômicos divulgados hoje e ontem mostram que a inflação sobe com rapidez enquanto o nível de atividade mergulha numa grave recessão. "O IPCA neste ano pode ficar perto de 9% e o PIB deverá cair 1,5%", comentou José Márcio Camargo, professor da PUC-RJ e economista-chefe da Opus Gestão de Recursos. "O quadro de estagflação já existe desde o ano passado, mas agora ingressa num estágio ainda mais grave", comentou.

"A inflação neste ano deverá subir 9% e o Produto Interno Bruto terá forte queda, entre 1,5% e 2%", disse Monica de Bolle, pesquisadora do instituto Peterson de economia internacional em Washington.

O Banco Central divulgou logo cedo que o IBC-Br de abril caiu 0,84% ante março, acima de 0,50% que era a mediana das previsões apurada pelo AE Projeções, serviço da Agência Estado. O BC fez revisões para o indicador nos últimos meses. Em fevereiro, a alta de 0,59% subiu mais um pouco, para 0,70%, na margem. Mas em março, a contração de 1,07% passou para uma queda de 1,51% na mesma base de comparação. O indicador caiu 1,3% em abril no acumulado em 12 meses.

Logo depois, o IBGE informou que o IPCA-15 de junho subiu 0,99%, a maior elevação para o mês desde 1996, quando aumentou 1,11%. O indicador atingiu uma alta de 8,80% no acumulado em 12 meses, marca mais expressiva desde dezembro de 2003, quando chegou a 9,86%. No primeiro semestre, o índice avançou 6,28% e ficou bem próximo do teto de 6,5% da inflação para todo o ano, como foi determinado pelo Conselho Monetário Nacional. Este patamar para o índice entre janeiro e junho é o mais elevado desde os 7,75% alcançados em 2003.

Devido à intensa retração da economia, o mercado de trabalho continua em plena deterioração. Em maio, o fechamento de vagas formais superou a criação em 115.599, de acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Esse número é pior que o corte de 100 mil vagas como manifestaram nesta semana fontes do governo ao Broadcast, serviço de informações em tempo real da Agência Estado. A mediana das previsões obtidas pelo AE Projeçõesera o encerramento de 52 mil postos.

A piora do mercado de trabalho formal em maio foi a maior para o mês da série histórica levantada pelo ministério do Trabalho e Emprego a partir de 1992. Segundo o governo, as indústrias lideraram os resultados negativos do Caged no mês passado, com a perda de 60.989 vagas, seguida por -32.602 em Serviços, -29.795 na Construção Civil e -19.351 no Comércio. A boa notícia veio da agricultura, que gerou 28.362 empregos.

E ontem o IBGE divulgou que a Receita Bruta de Serviços em abril subiu 1,7% ante o mesmo mês de 2014. Contudo, ao ser descontada a inflação medida pelo IPCA, ocorreu uma queda de 6,1%, de acordo com Alessandra Ribeiro, economista e sócia da consultoria Tendências.

Para ela, o indicador deve acentuar a queda, em termos reais, de 2,3% em 2014 para perto de 4,5% neste ano devido a vários fatores, como inflação alta, recuo da produção industrial próxima a 5%, piora do mercado de trabalho e redução da renda disponível das famílias. "Neste contexto, o fraco nível de atividade deve levar o PIB a uma queda de 1,4% neste ano", disse. E o IPCA, com a correção de preços administrados e do câmbio, segundo ela, deverá subir 8,9% em 2015.

Retaliação em pauta

• Parlamentares endurecem discurso e pedem exclusão da Venezuela do Mercosul

Eliane Oliveira, Catarina Alencastro e Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA- Um dia depois de divulgar uma nota condenando os atos de violência contra uma comitiva de oito senadores brasileiros em Caracas, o Itamaraty protestou contra o tratamento dado aos parlamentares, que tentavam visitar presos políticos, e agiu em duas frentes. O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, telefonou para a chanceler da Venezuela, Delcy Rodriguez, para pedir explicações sobre o ocorrido; e o secretário-geral do órgão, Sergio Danese, convocou a embaixadora venezuelana em Brasília, Maria Lourdes Urbaneja, com o mesmo fim. No Senado, os integrantes da oposição endureceram o discurso e pediram a exclusão da Venezuela do Mercosul.

De volta ao Brasil, o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), e os demais integrantes da comitiva hostilizada na Venezuela disseram que houve uma "ação deliberada" dos governos brasileiro e venezuelano para que os parlamentares não tivessem acompanhamento diplomático e fossem "abandonados". E afirmam que tomarão medidas políticas e jurídicas para excluir o país do bloco. Aécio pediu ainda o depoimento do ministro de Relações Exteriores, Mauro Viera, no Senado para dar explicações.

O presidente da Comissão de Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), responsabilizou diretamente a presidente Dilma Rousseff por ter dado a ordem para que os representantes do Itamaraty abandonassem a comitiva. O presidente nacional do DEM, senador José Agripino Maia (RN), também quer a convocação do embaixador do Brasil na Venezuela, Ruy Pereira.

Aécio disse que a Venezuela descumpre as cláusulas democráticas do Acordo de Ushuaia, assinado pelos países do Mercosul e reforçadas quando da adesão da Venezuela ao bloco.

— A questão mais grave que se põe nesse momento é que o conjunto de informações que nos chegam, a partir inclusive da reunião que parlamentares tiveram com o ministro das Relações Exteriores, é de que houve uma ação deliberada do governo venezuelano, como lá percebíamos, mas agora também do governo brasileiro, para expor uma delegação oficial de senadores, que nada mais fazia que prestar solidariedade aos presos políticos e defender a democracia na Venezuela. Os energúmenos não nos intimidaram — disse Aécio, cobrando "respostas do governo brasileiro".

Mais direto, Aloysio defendeu a exclusão da Venezuela do Mercosul. O grupo estuda entrar com uma ação no Supremo Tribunal Federal.

— Vamos atuar junto aos órgãos do Mercosul para a exclusão da Venezuela por desrespeito afrontoso às cláusulas democráticas — disse Aloysio.

Para isso, a oposição atuará em diferentes frentes. Primeiro, querem que o governo brasileiro faça uma ação junto ao Conselho do Mercado do Mercosul por descumprimento das cláusulas democráticas assinadas pelos países-membros do bloco. O Acordo de Ushuaia, em seu Artigo 4, diz o seguinte: "No caso de ruptura da ordem democrática em um Estado Parte do presente Protocolo, os demais Estados Partes promoverão as consultas pertinentes entre si e com o Estado afetado".

O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), disse que apresentará uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para dar poderes ao Congresso de suspender acordos internacionais quando cláusulas são rompidas.

— Montaram uma arapuca para nossa comitiva, e ficamos expostos a todo tipo de agressão — disse Caiado.

Itamaraty nega acusação
O senador Aloysio Nunes Ferreira contou ainda que, além da omissão dos diplomatas, até mesmo os pilotos do avião sabiam que eles não iriam se afastar do aeroporto por muito tempo.

— Os pilotos da aeronave contataram a segurança do aeroporto dizendo que iam fechar o avião para almoçar. Sabe qual foi a resposta? Não precisa, eles vão voltar logo — disse. — Soubemos depois que eles (os diplomatas) receberam instrução do governo brasileiro para não nos acompanhar, apesar do embaixador ter nos dito que o conselheiro da embaixada estaria conosco o tempo todo.

Segundo o Itamaraty, não há previsão, pelo menos por enquanto, de se chamar de volta o embaixador brasileiro na Venezuela — tudo vai depender dos esclarecimentos a serem prestados pelo governo daquele país. A situação é delicada, pois não se pode afirmar que os manifestantes que teriam atacado o veículo estivessem no local a mando do governo de Nicolás Maduro, por exemplo. Detalhes da conversa entre os dois chanceleres não foram divulgados.

— A chamada de um embaixador ou qualquer pedido de esclarecimento é uma insatisfação — disse um diplomata.

Aversão dos senadores de eles que haviam sido abandonados pela embaixada brasileira em Caracas foi rechaçada pelo Itamaraty. Segundo o Ministério das Relações Exteriores, a ajuda incluiu a cessão de uma aeronave da Força Aérea Brasileira; a obtenção de autorização de sobrevoo e pouso; e a presença do embaixador brasileiro no aeroporto. Além do apoio logístico aos senadores, que tiveram uma van à sua disposição; e pedido de acesso à penitenciária de Ramo Verde, que foi aprovado.

A programação da visita ficou a cargo da Comissão de Relações Exteriores do Senado. Já estava acertado que Pereira não participaria da visita ao presídio. Por isso, segundo o Itamaraty, entrou em outro carro, que estava à frente da van, no trajeto até Caracas.

— O embaixador também ficou no engarrafamento e manteve permanentes contatos telefônicos com a comitiva de senadores. Com a confusão, o embaixador voltou com os parlamentares ao aeroporto e, portanto, eles não estavam sozinhos — disse a fonte diplomática.

Ontem, o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) protocolou requerimento de informação na Mesa Diretora da Câmara sobre o custo da viagem.

— Quero saber o motivo, os resultados e o custo. Senadores pegam um avião da FAB, vão a um país sem autorização judicial para visitar um preso político, para criar um factoide para promoção pessoal — disse Pimenta.

Tensão entre chavismo e oposição sobe após visita

• Governistas criticam, e MUD pede que Dilma quebre o silêncio

Janaína Figueiredo – O Globo

BUENOS AIRES - A meteórica visita dos senadores brasileiros a Caracas, na quinta-feira, aprofundou ainda mais o clima de tensão política que se vive no país. Deputados e dirigentes chavistas acusaram os parlamentares de serem "insolentes" e tentarem "interferir em assuntos internos da Venezuela"! Já a oposição responsabilizou o presidente Nicolás Maduro pelos ataques à delegação, e afirmou, através da Mesa de Unidade Democrática (MUD), que o governo da presidente Dilma Rousseff "não pode mais ficar em silêncio e deve pedir uma explicação ao Palácio de Miraflores".

Integrantes do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) na Assembleia Nacional (AN) repudiaram, duramente, a presença dos senadores brasileiros.

— Não tenho palavras para expressar a indignação que sentimos por esta atitude insolente — declarou o deputado chavista Christian Zerpa, da Comissão Permanente de Política Externa.

Segundo ele, "este grupo de senadores cometeu ingerência em assuntos internos da Venezuela".

— Eles já nos julgaram e acusaram de violar os direitos humanos — enfatizou o deputado.

Já o Defensor do Povo, Tarek Willian Saab, disse que (visitar a Venezuela) "já virou uma espécie de esporte ou hobby para políticos que não têm audiência em seus países"

— O povo já tirou suas próprias conclusões sobre estes opositores que difamam a Pátria — frisou o defensor chavista.

Para a MUD e familiares de presos políticos, a presença no país de visitantes estrangeiros tem sido fundamental para manter suas demandas presentes na agenda da comunidade internacional. Na última quinta-feira, os senadores foram acompanhados pelas mulheres do dirigente Leopoldo López, preso desde fevereiro de 2014 e há mais de três semanas em greve de fome, e do prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, em regime de prisão domiciliar por problemas de saúde — Lilian Tintori e Mitzy Ledezma, respectivamente.

— Tudo foi planejado, não tenho dúvidas. E não entendo como a embaixada brasileira não protegeu seus senadores — comentou Mitzy, que estava no ônibus apedrejado por manifestantes chavistas. — Aqui ninguém atua sem ordem do governo. Nicolás Maduro é o grande responsável por esta vergonha.

"Brasil contra a parede"
Perguntada sobre as acusações de "ingerência" feitas pelo chavismo, Mitzy respondeu:

— E a presença dos cubanos aqui, o que é? Esperamos que a presidente do Brasil peça explicações oficialmente ao governo de Maduro sobre a humilhação a oito senadores de seu país.

Os ataques à comitiva levaram a MUD a cancelar uma reunião com os senadores, segundo confirmou o secretário-geral da aliança opositora, Jesus Torrealba. Ele afirmou que "o que aconteceu mostra a profunda deterioração da governabilidade"

— A região de Maiquetía, onde está o aeroporto, ficou isolada pelo bloqueio aos senadores e ninguém disse nada, quando temos presos políticos acusados de manifestar-se nas ruas — argumentou Torrealba.

O representante da MUD questionou a decisão da presidente Dilma Rousseff de receber recentemente o presidente da AN, Diosdado Cabello, por ser "uma figura muito questionada".

— A presidente deverá avaliar se o silêncio é uma opção. Não deveria ser — disse Torrealba.

Carlos Romero, professor da Universidade Central da Venezuela, afirma que o incidente "demonstrou até onde é capaz de chegar o chavismo":

— Esta situação coloca o governo brasileiro contra a parede, já que deveria responder diplomaticamente.

Murillo de Aragão - O Estado Sequestrado

- O Estado de S. Paulo

Há muito o Estado brasileiro está sequestrado. Antes, pelo regime militar. Agora, depois da redemocratização, a cidadania perdeu o controle para os políticos, a burocracia e o aparelhamento de cargos por apadrinhados políticos e sindicais. Cada um dos sequestradores opera de acordo com uma lógica própria. Muitos políticos usam o Estado para se reeleger e se perpetuar no controle; outros, para fazer negócios. Alguns, para ambos.

A prova está na sucessão de escândalos que envolvem políticos, partidos, estatais e obras públicas. A burocracia sequestrou o Estado para ter acesso a ganhos econômicos na forma de salários e outros benefícios. Os que aparelham o Estado estão lá para gerar negócios e poder político para seus apadrinhados.

Em meio a um mar de lama e prejuízos bilionários, a Petrobrás nos dá uma prova da prevalência dos interesses menores. Ela deixará de pagar dividendos a seus acionistas, mas pagará mais de R$ 1 bilhão a seus funcionários a título de resultados, mesmo não tendo havido lucro.

Outra prova do sequestro está no fato de que mais da metade dos partidos políticos registrados no País vive só dos cofres públicos. Não arrecadam um centavo sequer de seus militantes.

Outros tantos, inclusive com representantes no Congresso, tiveram 99% de suas despesas bancadas pelo Fundo Partidário. Dos 32 partidos registrados, 17 tiveram mais de 90% de suas despesas pagas pelo fundo. Pequenos partidos, grandes negócios.

Nenhum dos sequestradores opera com vista ao interesse da cidadania, apesar do discurso recheado de palavras e intenções em favor do bem comum. Quase sempre operam em torno das próprias agendas. É um bom acaso quando tais interesses coincidem com os da cidadania. Mas nem sempre isso acontece. Em alguns lugares, quase nunca. Por exemplo, em 2014 o Brasil ocupava o vergonhoso 112.º lugar, entre 200 nações, em termos de saneamento! No mesmo ano, 45% dos municípios do País despejavam resíduos sólidos em aterros não tratados. Sujeira na política e sujeira no meio ambiente estão mais que relacionadas.

O mensalão e o petrolão são mais uma prova de como o esquema escravizou os cofres públicos para financiar políticos e partidos. Ambos são esquemas que macularam o sistema político e fragilizaram o processo eleitoral de forma a favorecer alguns em detrimento da maioria. O abuso de poder econômico no sistema eleitoral serviu para renovar periodicamente o sequestro da sociedade. Muitos dos sequestradores consideram-se líderes de um povo que não sabe o que quer. Arvoram-se em condutores de planos que não levam a lugar nenhum. E que encobrem o desejo de manter o Estado sequestrado, longe da sociedade. Divorciado da cidadania. Querem manter um Estado patrocinador que decide tudo sob o manto da opacidade.

A cidadania muitas vezes é tratada como gado, merecedora somente de migalhas de um governo “gastão”, caro e ineficiente. Temos carga tributária europeia e serviços precários, com frequência inexistentes. Estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário nos coloca como o pior país do mundo na relação carga tributária-PIB-Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Somos a 7.ª economia do planeta e estamos em 85.º no IDH. Somos, vergonhosamente, o 120.º melhor ambiente de negócios no planeta!

Saneamento e ambiente de negócios não interessam ao mundo político. A diferença brutal entre os rankings se dá pelo sequestro do Estado à sociedade. Esta é indesejada e indesejável quando se expressa politicamente de forma aguda. Só é bem-vinda na época das eleições, para referendar o sequestro e manter tudo como antes. As agendas operam em torno de um vetor: a manutenção do poder a qualquer preço.

A dinâmica do sequestro do Estado é ditada pelo calendário eleitoral. A cada dois anos temos eleições. Assim, o que importa é atender à agenda eleitoral. Por isso as obras são entregues às portas das eleições. Por isso os gastos com publicidade aumentam. Trata-se do império do curto prazo e do imediato atendimento do óbvio ululante para se manter no jogo. Enquanto isso, jogamos o nosso futuro para as calendas.

Planos de longo prazo são engavetados. A Baía de Guanabara, por exemplo, está sendo despoluída há décadas e isso não termina nunca. Nem a ocorrência da Olimpíada no Rio de Janeiro foi capaz de resolver esse vexame. A Ferrovia Norte-Sul começou em 1988 e ainda não foi concluída. A ligação expressa entre o Aeroporto de Confins e o centro de Belo Horizonte demorou 25 anos para ser concluída! Os Rios Pinheiro e Tietê, na capital paulista, eram poluídos 50 anos atrás e continuam assim. Continuarão assim por mais um par de décadas? Provavelmente, sim.

O futuro não importa para os sequestradores, desde que a cidadania continue aprisionada e financiando a sua perpetuação no poder, com altos impostos, baixas cobranças e bovinamente pacífica ante a corrupção e a incompetência. Um Estado operando com elevados graus de opacidade, como indica a sucessão de escândalos, mostra que nossos impostos financiam nossa escravidão.

O Brasil é um país de imenso potencial. Com sua agricultura, por exemplo, alimenta mais de 800 milhões de habitantes no planeta. Mas poderia ser muito melhor. O trabalho e o empreendedorismo no País são punidos. Nossa infraestrutura e a logística de escoamento das safras são precárias. Os sequestradores não querem o setor privado forte, mas a iniciativa privada cooptada por benesses.

Continuaremos sequestrados como cidadãos em nosso país? Submetidos a uma agenda de interesses que nem sempre é o interesse da sociedade? Sim. Por um bom tempo. Avançamos nos últimos 30 anos, estamos construindo uma sociedade multipolar em termos de exercício de poder, mas muito ainda tem de ser feito. A luta da cidadania para construir um Estado democrático está só começando.

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*Murillo Aragão é advogado, consultor e mestre em ciência política e doutor em sociologia pela UNB. É autor do livro 'Reforma Política - O debate inadiável'

Merval Pereira - Que país é este?

- O Globo

Para se ter uma ideia do que representa a prisão de Marcelo Odebrecht, basta saber que ele mandava ir para sua casa todo diretor da empreiteira que fosse alvo de boatos de prisão. Queria, com isso, dar garantias ao funcionário de que ninguém o molestaria.

Ver policiais em sua casa ontem pela manhã em São Paulo deve ter irritado muito o dirigente da maior empresa brasileira.

Momentos como esse marcam a reviravolta de um país. "Quando vão pegar a Odebrecht?" era a pergunta que não calava, como se dependesse da resposta a credibilidade de toda a Operação Lava-Jato.

O fato de ter demorado tanto demonstra bem os perigos que corriam os procuradores do Ministério Público, a Polícia Federal e o próprio juiz Sérgio Moro para dar esse passo decisivo. Não foi à toa que investigaram por quase um ano as duas maiores empreiteiras do país, Odebrecht e Andrade Gutierrez, antes de prender seus principais dirigentes.

A prisão dos dois prova que o país está mudando. É sintomático de um novo momento que o Brasil vive, tentando controlar a corrupção, completamente disseminada. A prisão icônica de Marcelo Odebrecht, com base numa investigação extensa, é um indício de provas da atuação dele nos desvios da Petrobras e em outras estatais também.

Se tivesse havido a delação premiada na ação penal do mensalão, o resultado teria sido bem mais aprofundado. O publicitário Marcos Valério só está preso, condenado a mais de 40 anos, porque até o último momento acreditava que seus cúmplices no PT, especialmente Lula, tivessem força política para evitar o julgamento.

Bem que o ex-presidente tentou, mas já ali não tinha mais a capacidade de interferir, embora tenha sido poupado da denúncia pelo receio do procurador-geral da República à época de que, incluindo-o entre os denunciados, o processo não andasse. Sobrou para o seu ex-ministro da Casa Civil e notório homem forte José Dirceu a carga de ser o comandante da trama.

Assim como o juiz Sérgio Moro diz hoje que "é inviável" que os presidentes das empreiteiras não soubessem do que acontecia, devido ao tamanho da operação criminosa, já não é um bicho de sete cabeças dizer que as relações de Lula com as empreiteiras eram tão próximas que é "inviável" que o ex-presidente nada soubesse do que andavam tramando os políticos e empreiteiros na Petrobras e em outras estatais pelo país afora.

Além do mais, o PT é um dos partidos mais beneficiados pelos desvios das estatais. É uma questão de tempo as investigações chegarem ao Instituto Lula e a sua empresa de palestras, juntando dois mais dois. A relação do ex-presidente com as empreiteiras, notadamente a Odebrecht, é do conhecimento público, e o que há de menos grave nelas é o conflito de interesses.

Lula não é um ex-presidente qualquer que passou a fazer parte do circuito internacional de palestras, o que é muito natural.

Ele continua sendo a eminência parda dos governos petistas, influindo decisivamente nos rumos do país, para o bem e para o mal.

Por isso, não poderia ter esse relacionamento comercial com empresas que prestam serviços ao governo que comanda dos bastidores. Se nos áureos tempos do mensalão Dirceu já disse que "um telefonema meu é um telefonema", imaginem um telefonema de Lula.

Se o ex-presidente Lula tiver algum tipo de participação nos desvios, certamente a informação vai aparecer. É preciso investigar a ligação entre as palestras e as viagens internacionais do ex-presidente, financiadas pela Odebrecht, e a interferência dele para beneficiar a empresa.

Para chegar até aqui, tivemos que passar pelo mensalão. O que está sendo desvendado nesses dez anos é simplesmente uma maneira de fazer negócios (e política) que predomina no país não é de agora, mas que o PT exacerbou ao máximo, provavelmente escudado na popularidade de Lula.

"Que país é este?", perguntou, genuinamente surpreso, o ex-diretor da Petrobras Renato Duque, indicado pelo PT, ao ser preso em sua casa. É o que veremos ao fim da Operação Lava-Jato.

Igor Gielow - Alta tensão

- Folha de S. Paulo

Um dos mais argutos políticos em atividade definiu a nova fase da Lava Jato como ponto de inflexão. Repassando os rumores de que a apuração sobre a Odebrecht levaria à campanha de Dilma em 2014, ele vê pela primeira vez desde a eclosão do caso risco real de o governo ser fulminado.

Não se sabe ainda se é para tanto, mas Planalto e PT estão preocupados. No mínimo, considerando que os rumores sejam apenas isso, porque a operação atingiu a Odebrecht.

Não se trata só da maior empreiteira brasileira, o que em si enseja preocupações legítimas para uma economia já em depressão e com desemprego em alta, mas também de uma das empresas mais próximas não só do governo, mas também de Lula.

Virtual candidato em 2018, o petista vê o corredor estreitar-se a cada uma das estações da cruz da Lava Jato. As relações do instituto que leva seu nome com empreiteiras já estavam na mira; agora o pesadelo atende pelo nome de delação premiada.

Não só governistas têm com que se preocupar, como o "Para Todos" que dá nome à etapa indica. O chefão da Andrade ora alojado na PF de Curitiba é unha e carne com o tucanato.

Palacianos bateram bumbo sobre o fato, talvez porque miséria goste de companhia. Mas são eles que têm mais a perder, ainda mais com impopularidade de Dilma e a ameaça de uma rejeição de contas virar mote de processo de impeachment.

Com esse cenário carregado, os olhos se voltam para o trabalho da investigação. Um deslize agora pode significar o fim da Lava Jato, já que todas as acusadas estão no mesmo balaio e procurando agulhas envenenadas no palheiro da apuração. A carta do risco sistêmico de contágio a bancos credores reaparecerá.

Um objetivo central da Lava Jato sempre foi chegar aos donos do dinheiro. Apenas uma apuração rápida, objetiva e serena garantirá que seu zênite neste particular não seja também a véspera do epílogo.

Celso Ming - A economia fraqueja

- O Estado de S. Paulo

Há muito não se via uma sexta-feira com essa concentração de notícias ruins na área econômica - e não se fala aqui das novas prisões de empreiteiros pela Operação Lava Jato.

É inflação ainda mais alta, mais queda na atividade econômica e aumento do desemprego.
A inflação medida pelo IPCA-15 saltou para 0,99%, uma esticada surpreendente, que não estava no radar de nenhum analista (veja o gráfico).

Para quem não está familiarizado com essas siglas, IPCA-15 é o mesmo que o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo): mede o custo de vida, que serve de base para a definição do tamanho dos juros pelo Banco Central. A diferença é a de que, no IPCA-15, o período de 30 dias não é o de calendário (caso do IPCA). É medido a partir da metade de um mês à metade do mês seguinte - daí o 15. O índice de junho mostra que, apesar da forte contração da atividade econômica, dos juros aos 13,75% ao ano e do desemprego, a inflação continua subindo. Em 12 meses, está encostando nos 9,0%.

No mês, a alta está mais forte na área de despesas pessoais (1,79%) e alimentos (1,21%). Uma explicação para isso é a que foi avançada aqui na edição do dia 11: como o poder aquisitivo está caindo pela inflação e pelo desemprego, o consumidor já não está mais comprando veículos e aparelhos domésticos. Sobra um dinheirinho para mais alimentação e cuidados pessoais. Daí a maior demanda que aumenta os preços.

Também foi divulgado ontem o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), que se propõe a funcionar como uma prévia do avanço do PIB. A queda verificada em abril (ante março) foi de 4,68% que, uma vez feitos os ajustes sazonais, aponta queda de 0,84%. Nos primeiros quatro meses do ano o recuo é de 2,48% e no período de 12 meses, de 1,38%.

Economia ainda mais fraca produz um impacto mais forte sobre as contas públicas, porque a arrecadação tende a mergulhar. E o enfraquecimento ainda maior das contas públicas traz as consequências funestas já conhecidas.

A terceira notícia ruim de ontem foi o desempenho do mercado de trabalho medido pelo Caged, o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, que registra contratações e dispensas de pessoal com carteira de trabalho assinada. Em maio, verificou-se queda de 115,6 mil postos de trabalho, o primeiro mês de maio negativo desde 1992, quando foi iniciada a série histórica.

Tudo isso não começou no mês passado. É consequência da política desastrosa adotada no primeiro governo Dilma, que dizimou a matriz macroeconômica. A temporada é de ajustes - como se sabe. Mas, além de dolorosos, esses ajustes parecem insuficientes para reequilibrar a economia dentro do prazo proposto pelos atuais ministros da área. As análises já vêm empurrando o início da recuperação não mais para o terceiro trimestre, mas, quem sabe, para o quarto ou, até mesmo, para o ano que vem.

O Banco Central, que não passa firmeza na expectativa de que entregue a inflação à meta de 4,5% até o fim de 2016, tem ainda menos razões para desacelerar o ritmo de aperto dos juros.