segunda-feira, 13 de abril de 2015

Opinião do dia – Roberto Freire

Acho que há, também, uma melhor avaliação do papel que o PMDB possa vir a desempenhar se estiver independente ou se se aliar à oposição, mesmo com a nomeação do vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP) para a coordenação política do governo.

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Roberto Freire é deputado federal (SP) e presidente nacional do PPS

Nova onda de protestos contra Dilma se espalham por 24 Estados e DF

• Números foram inferiores aos cerca de 1,9 milhão de pessoas que foram às ruas no dia 15 de março; maior concentração ocorreu na Avenida Paulista

O Estado de S. Paulo

Em nova onda de protestos contra o governo federal em um mês, cerca de 640 mil pessoas, segundo a Polícia Militar foram as ruas em 24 Estados e no Distrito Federal. A maior concentração ocorreu na capital paulista, onde a PM registrou 275 mil pessoas na Avenida Paulista, número bem inferior ao divulgado no dia 15 de março, quando a PM registrou mais de 1 milhão de pessoas. Segundo o Instituto Datafolha, a manifestação registrou 100 mil pessoas, também inferior aos 210 mil registrados no dia 15 de março.

Organizado pelos movimentos "Vem Pra Rua", "Revoltados Online" e "Movimento Brasil Livre", os atos estavam previstos para ocorrer em 400 cidades, mas segundo levantamento do Estado ocorreram em 152 municípios pelo País.

Em Brasília, a manifestação começou às 9h30 e a principal bandeira era de críticas contra o governo da presidente Dilma Rousseff e do partido dela, o PT. Algumas faixas elogiavam o papel da Polícia Federal nas investigações da Operação Lava Jato, que apura esquema de corrupção na Petrobras. Os organizadores terminaram a manifestação com a palavra de ordem: "Dilma vá para Cuba"

Em Belo Horizonte, o ato começou na Praça da Liberdade, às 10 horas, e seguiu para a Praça da Estação, no centro da cidade. Conforme a Polícia Militar, na praça da Estação, o pico de pessoas presentes chegou a 6 mil, um pouco a mais do que no local de concentração, que foi estimado em 5 mil. Lideranças dos movimentos organizadores, porém, contabilizaram 20 mil pessoas na Praça da Estação e umas 15 mil na Praça da Liberdade. Mesmo com números diferentes, eles estão bem distantes do ato do dia 15 de março, quando, segundo a PM, 24 mil pessoas participaram. Havia a expectativa da presença do senador e presidente nacional do PSDB, Aécio Neves, o que não ocorreu.

Divisão. No Rio de Janeiro, o ato pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), em Copacabana (zona sul), foi menor do que aquele promovido em 15 de março, especialmente em razão de uma cisão entre os grupos organizadores, que trocaram acusações e defendem soluções diferentes para a crise política brasileira. Cada qual com seu carro de som, eles ocuparam uma pista da avenida Atlântica ao longo de um quilômetro, entre os postos 5 e 6.

Os grupos Vem pra Rua e Revoltados On Line iniciaram seus atos às 11h, enquanto os grupos União Contra a Corrupção (UCC), Movimento Brasil Livre, Extermínio e O Pesadelo dos Políticos, que dividiram o terceiro carro de som, partiram às 14 horas. O grupo Vem Pra Rua, que estimou em 100 mil o público de março, desta vez calculou ter atraído 110 mil, mas o ato foi visivelmente menor. A PM não calculou o público.

O principal motivo para a cisão entre os grupos é uma troca de acusações sobre financiamento por partidos políticos. O Vem pra Rua é acusado pelos demais de ser bancado pelo PSDB, mas nega. "Não recebemos dinheiro de nenhum partido, justamente para poder criticar. Isso só divide os movimentos", diz a dentista Rizzia Arrieiro, porta-voz do Vem pra Rua.

Novos protestos contra governo têm adesão menor

• PM calcula 700 mil nas manifestações. Organização fala em 1,5 milhão

• Mobilização chegou a 252 cidades de 24 estados e do Distrito Federal, mas ficou aquém da que reuniu 2 milhões de pessoas em 15 de março

Pela segunda vez em menos de um mês, brasileiros saíram às ruas de todo o país para protestar contra a presidente Dilma Rousseff e contra os escândalos de corrupção. Desta vez, as manifestações tiveram adesão menor e mobilizaram cerca de 700 mil pessoas, de acordo com a Polícia Militar, contra 2 milhões que foram às ruas em 15 de março. Mas os organizadores dos protestos comemoraram o aumento de 147 para 252 no número de cidades que fizeram atos, o que, para eles, indica uma disseminação do sentimento de insatisfação com o governo. Como em 15 de março, os políticos de oposição preferiram não participar, e foram criticados pelos organizadores. Muitos manifestantes pediram o impeachment de Dilma e pequenos grupos voltaram a pedir intervenção militar. Desta vez, o governo não deu entrevistas para comentar a mobilização, mas a presidente usou uma página nas redes sociais, administrada pelo PT, para afirmar que o combate à corrupção é uma "ação permanente da sua gestão".

Menos pessoas, mais cidades

  • Menores que as de 15 de março, manifestações reuniram 700 mil em 218 municípios

Cássio Bruno, Letícia Fernandes, Lauro Neto, Renato Onofre, Sérgio Roxo, André de Souza, Renata Mariz e Washington Luiz - O Globo

RIO, SÃO PAULO E BRASLIA- Menos de um mês após as grandes manifestações de 15 de março, os brasileiros voltaram às ruas ontem em 24 estados e no Distrito Federal para protestar contra a presidente Dilma Rousseff e contra os escândalos de corrupção no país. Desta vez, os protestos foram menores e mobilizaram cerca de 700 mil pessoas, contra as 2 milhões que foram às ruas mês passado. Mas o número de cidades com atos aumentou de 147 para 218, indicando que as demonstrações de insatisfação com o governo estão mais pulverizadas.

Como em 15 de março, os atos tiveram como mote central as críticas ao governo Dilma. Muitos manifestantes pediram o impeachment da presidente, inclusive em faixas e cartazes, mas esta não era a reivindicação de todos os que estavam nas ruas. O PT e o governo foram responsabilizados por escândalos de corrupção como o revelado pela Operação Lava-Jato. Pequenos grupos pediram a intervenção militar, e houve outros protestos pelos motivos mais variados.

Assim como em março, os políticos ficaram em segundo plano ontem. Nenhum deles se arriscou a discursar em cima de carro de som. Os poucos que foram, como o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) e o deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força (SD-SP), ficaram no chão. Os maiores líderes da oposição acompanharam tudo de casa.

Desta vez, o governo não se pronunciou. Mas, no Facebook, em perfil de Dilma administrado pelo PT, a presidente afirmou: "A guerra contra a corrupção deve ser, simultaneamente, uma tarefa de todas as instituições, uma ação permanente do governo e também um momento de reflexão da sociedade de afirmação de valores éticos".

Em SP, o protesto reuniu 275 mil pessoas na Avenida Paulista, segundo a PM. O número ficou bem abaixo daquele do ato do dia 15, quando um milhão de pessoas esteve na rua, também segundo a PM. Embora com adesão menor, os organizadores dos grupos Vem Pra Rua e Brasil Livre, que estimaram o público em 800 mil pessoas, comemoravam a pulverização do movimento pelo país.

— O nosso objetivo era mesmo ter número maior de cidades. E chegamos ao triplo (em relação ao dia 15). É mais importante para a gente estar em mais cidades do que ter um grupo grande, mas localizado — afirmou Kim Kataguari, um dos líderes do Movimento Brasil Livre (MBL).

Ontem, novamente, a bandeira e os gritos de "fora, Dilma" e "fora, PT" dominaram o ato na capital paulista. A manifestação foi pacífica. Segundo a PM, apenas uma mulher foi detida por tirar a roupa. Chamou a atenção uma enorme bandeira verde e amarela com a palavra "impeachment" em preto, estendida na Avenida Paulista.

Em minoria, grupos que defendem intervenção militar no país também marcaram presença. Paralelamente ao ato da Paulista, um grupo de caminhoneiros que protestava contra o governo Dilma percorreu ruas da capital paulista. O Solidariedade, partido de Paulinho, foi a única legenda a levar bandeiras para a avenida e recolheu assinaturas em favor do impeachment.

Sobrou até para políticos de oposição no protesto na Avenida Paulista. Kim Kataguiri, do MBL, disse no carro de som que o PSDB faz uma oposição passiva. Outro coordenador do grupo, Renan Santos, foi ainda mais incisivo:

— Vamos ter de perder tempo para construir uma oposição. Ninguém está aqui para fazer fotografia. Estamos aqui para derrubar a presidente.

Havia dois carros de som pedindo intervenção militar. Num deles, os oradores vestiam roupas de camuflagem. Um deles usava capacete de combate. O veículo tocava uma paródia da música "Pra não dizer que não falei das flores", de Geraldo Vandré. Noutro carro, com faixas em inglês, um orador falava em inglês e era traduzido por um jovem.

No Rio, vestidos de verde-amarelo e com faixas pedindo o impeachment de Dilma e, em menor número, a intervenção militar, milhares de pessoas ocuparam a orla de Copacabana. A PM, que colocou na rua cerca de 800 policiais, recusou-se a dar estimativa oficial de público, mas o comando do Batalhão de Grandes Eventos da PM disse de manhã ao site G1 que cerca de 10 mil pessoas estiveram no ato. Já os organizadores divergiram: para Maria Fernanda Gomes, coordenadora municipal do Movimento Brasil Livre, a estimativa ficou em 20 mil, mas Rizzia Arrieiro, porta-voz do Vem Pra Rua, falou em 110 mil participantes.

Por três horas, manifestantes cantaram o Hino Nacional, puxado por dois carros de som. Uma das críticas nos cartazes era ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Dias Toffoli. Ele vai se transferir para a Segunda Turma do STF, onde deve presidir e julgar parte dos inquéritos da Operação Lava-Jato. Toffoli foi advogado do PT e indicado ao STF pelo ex-presidente Lula. Aliado de Dilma, o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), também foi alvo do ato. Houve vaias ao ex-presidente e aplausos ao juiz Sérgio Moro e à PM.
O humorista Marcelo Madureira fez um discurso pedindo a saída de Dilma e a prisão de Lula, e chamou o PT de "câncer do Brasil". Já dom João de Orleans e Bragança, da família real brasileira, também no protesto do Rio, disse ser contra o impeachment.

O ato foi pacífico na maior parte do tempo, mas houve casos isolados de confusão. Em três momentos, a PM interveio para que pessoas contrárias ao protesto não fossem agredidas. Um homem chegou a sair escoltado por policiais após provocar os manifestantes. Em Niterói, pelo menos 600 pessoas participaram de protesto pacífico contra o governo.

Em Brasília, cerca de 25 mil manifestantes, segundo a PM, saíram pela Esplanada dos Ministérios. Os organizadores estimaram em 70 mil a 80 mil pessoas. Muitos pediam que os militares tirassem Dilma do poder, mas negavam apoiar uma ditadura, defendendo uma "intervenção militar constitucional".

Mesmo com número menor no ato de ontem, o representante do MBL, Paulo Pagini, considera que a marcha mobilizará o governo:

— Foi um sucesso, acho que eles (os políticos) ouviram agora. Estamos pedindo a moralização. Mudar a política, mudar a situação de reeleição.

Quando volume considerável de manifestantes se concentrou na Esplanada, um militante ao microfone, em um dos cinco carros de som do ato, atribuiu a participação à ajuda divina, dizendo que "mais cedo tinha pouca gente, Deus pôs um dedo e encheu". Em seguida, ele puxou um Pai-Nosso. A maioria dos manifestantes próximos ao carro de som acompanhou a oração de mãos dadas.

A área do Congresso, ponto final do ato, foi cercada por cordões de isolamento atrás do espelho d"água. Mesmo assim, um grupo conseguiu entrar no espelho d"água com a bandeira do Brasil. Os prédios do Itamaraty e do Ministério da Justiça também foram protegidos. No fim da manhã, duas pessoas foram detidas: uma portava um facão quando se envolveu numa briga de trânsito, nas imediações do ato; a outra tinha sinais de embriaguez.

Em duas capitais — Fortaleza e Campo Grande — o número de manifestantes aumentou ontem em comparação com 15 de março.

Grupos antigoverno exibem menos força na volta às ruas


  • Manifestações atraem milhares nas principais cidades * Adesão foi maior em março * Líderes pressionam oposição

Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Grupos de oposição ao governo voltaram às ruas neste domingo (12) para protestar contra a corrupção na política, a presidente Dilma Rousseff e o PT. As manifestações atraíram milhares de pessoas nas principais cidades do país, mas tiveram alcance menor que os protestos do dia 15 de março.

A maior concentração foi registrada mais uma vez em São Paulo. Cem mil pessoas foram à avenida Paulista, segundo cálculos feitos pelo Datafolha. O número representa metade do público reunido pela manifestação de março, quando 210 mil pessoas foram à Paulista, segundo o instituto.

Houve protestos em pelo menos 111 cidades, incluindo as capitais de 24 Estados e Brasília. As manifestações foram organizadas por vários grupos nas redes sociais. Estimativas da Polícia Militar e de organizadores, com critérios menos confiáveis que os do Datafolha, sugerem que as manifestações atraíram 275 mil pessoas em São Paulo e cerca de 268 mil nas outras capitais.

Segundo o Datafolha, a principal motivação das pessoas que foram à avenida Paulista neste domingo foi a indignação com a corrupção, apontada por 33% dos manifestantes. O impeachment de Dilma, principal bandeira dos grupos que organizaram o protesto, tinha o apoio de 77%, mas apenas 13% o citaram como motivo para ir à rua.

Impedidos de falar nas manifestações de março, os políticos mantiveram distância desta vez. Líderes dos grupos à frente do protesto cobraram dos partidos de oposição empenho pelo impeachment de Dilma. O governo reconheceu que o descontentamento da população é grande, mas expressou alívio com a menor adesão aos protestos.

Irritação com corrupção foi motivação para maioria

• Só 13% dizem ter ido à Paulista pelo impeachment, mas 77% são a favor

• Maioria dos que foram protestar em São Paulo no domingo também diz que esteve no protesto de março na capital

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O impeachment da presidente Dilma Rousseff conta com o apoio de 77% das 100 mil pessoas que estiveram neste domingo (12) na avenida Paulista, mas nem metade delas acha que ela será afastada. É o que mostra a pesquisa Datafolha realizada durante a manifestação.

Ainda assim, só 13% dos manifestantes saíram de casa com a intenção de pedir o impeachment da presidente. O motivo mais citado por eles para ir à Paulista foi a indignação com a corrupção, apontado por 33% dos entrevistados. Uma em cada dez pessoas estava lá para protestar contra o PT.

Mais de 60% dos manifestantes disseram que estavam repetindo a dose, já que participaram também do protesto do dia 15 de março. O perfil do público que foi aos dois eventos é muito parecido, a não ser pela grande presença de pessoas mais velhas no ato deste domingo.

De acordo com o Datafolha, 41% do público presente tinha mais de 51 anos. É o dobro do que se viu na manifestação de março. Maria Luiza Lima, 77 anos, esteve nas duas acompanhada pela filha e disse que voltará se houver uma terceira.

Moradoras da Vila Carrão, na zona leste, elas pegaram ônibus e metrô para participar do protesto. "Sou eleitora, quero continuar votando e, para isso, é preciso limpar a política", diz Maria Luiza.

Boa parte dos manifestantes neste domingo apareceu em família. Havia também muitos casais. Grande parte das pessoas vestia camisetas da seleção brasileira de futebol ou outras peças de roupas amarelas.

Vários exibiam faixas amarelas na cabeça com a inscrição "Fora Dilma", que podiam ser compradas por R$ 5 dos camelôs. Questionados pelo Datafolha, 96% deles consideram o governo Dilma ruim ou péssimo.

A presença de pessoas que vieram de outras cidades também aumentou, de 13% em março para 17% neste domingo. Foi o caso da psicóloga Sueli Santos, 56, que veio de Vinhedo para participar da manifestação.

"A revolta está nessa corrupção, nesse desgoverno do PT. Chegou a hora de dar um grito", afirmou.

Quase 80% dos manifestantes têm ensino superior, 35% trabalham com carteira assinada e 41% ganham acima de dez salários mínimos. No segundo turno da última eleição presidencial, 83% declaram ter votado no candidato Aécio Neves (PSDB) e apenas 3% em Dilma.

Apesar disso, 95% afirmaram não serem filiados a nenhum partido.

Dos manifestantes, 74% sabem que o vice-presidente assumiria o governo em caso de um afastamento de Dilma, sendo que 90% têm conhecimento de que o vice é Michel Temer (PMDB).

A avaliação do Congresso Nacional também não é boa: 77% o consideram ruim ou péssimo, 19% acham que é regular e apenas 3% avaliam o trabalho de deputados e senadores como ótimo ou bom.

A grande maioria, 86%, prefere a democracia a uma ditadura, regime que é apoiado por apenas 9% dos que estiveram na avenida Paulista. Para 3%, tanto faz --democracia ou ditadura.

A esquerda era minoria entre os manifestantes da Paulista; apenas 7% das pessoas se diziam dessa corrente. A maioria, 34%, disse ser de centro, 20% de centro-direita e 26% de direita.

O Datafolha entrevistou 1.320 pessoas na Paulista, das 12h às 18h. A margem de erro é de três pontos percentuais, para mais ou para menos.

Moratória da crise está longe de ser decretada

• O domingo trouxe algum respiro ao Planalto e mostrou a oposição reticente para empunhar bandeiras ainda incertas

Igor Gielow (Diretor da Sucursal de Brasília) – Folha de S. Paulo

A batida charada existencial do "copo meio cheio ou meio vazio" se aplica bem ao que ocorreu neste domingo, 12 de abril, segunda etapa das manifestações de rua contra o governo Dilma Rousseff.

Certamente há motivos para comemoração no Palácio do Planalto, mesmo com a propaganda interna informando a inevitabilidade de um "grande fracasso".

Afinal de contas, o movimento do 15 de março poderia ter mantido ou aumentado sua intensidade --embora em São Paulo, bastião mais vistoso do antipetismo hoje no país, as cenas ainda fossem algo impressionantes.

Esta é a visão "copo cheio", do ponto de vista governista. Foi trombeteada por seus apoiadores em redes sociais e, especialmente, por um certo jornalismo on-line financiado por verbas oficiais.

Na mão contrária, Dilma assistiu a 25 mil pessoas (segundo a PM local) irem à rua em seu quintal brasiliense. Público formado por funcionários públicos usualmente amáveis ao governo, qualquer que seja. Não foram os 45 mil de um mês atrás, mas longe da inexpressividade.

Em São Paulo, se insinua um cenário no qual os atos tendem a se consolidar ao estilo das "manifs" parisienses, um elemento perene do ambiente urbano.

Mais do que isso, o número que realmente importa neste fim de semana para o governo não é o de contagens feitas nas ruas. É o do Datafolha que mostrou uma estabilização da rejeição ao governo, além de comprovar que muito mais gente do que foi visto na avenida Paulista no domingo está a defender o impeachment de Dilma.

Novamente a lógica do copo se impõe para fins de discurso. Um otimista governista dirá que a popularidade de Dilma parou de cair e que o Planalto tem, a partir da reformulação de sua articulação política com o vice Michel Temer, espaço para tentar melhorar sua agenda pública.

Para o pessimista governista (ou um otimista oposicionista), qualquer governo com níveis de rejeição registrados pelo de Dilma não tem motivos para dormir bem à noite.

No registro do real, é notável que, se alcançar algum nível de governabilidade no Congresso, isso não resolve o problema da paralisia econômica do país ou dos investimentos engessados.

No meio do caminho, onde geralmente a realidade se encontra, o domingo trouxe algum respiro ao Planalto e mostrou uma oposição reticente para empunhar de fato bandeiras ainda incertas, dadas as condições políticas objetivas: estamos hoje mais num parlamentarismo branco comandado pelo PMDB do que à beira do impeachment de Dilma --e consequente unção da oposição.

Mas o alívio está longe de ser profundo o suficiente para ser decretada a moratória da crise.

Aécio e Marina não vão aos atos, mas apoiam as manifestações

• Adversários de Dilma na campanha eleitoral se pronunciaram por nota e reiteraram críticas ao governo federal

Elizabeth Lopes e Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO e BRASÍLIA - A exemplo do que ocorreu em 15 de março, os dois principais adversários da presidente Dilma Rousseff na eleição do ano passado, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e a ex-ministra Marina Silva (PSB), não participaram dos protestos deste domingo, 12.

Eles, porém, voltaram a divulgar notas sobre os eventos. Presidente nacional do PSDB, Aécio destacou que seu partido se solidariza com os brasileiros que voltaram às ruas e ocuparam as redes sociais.

Segundo o tucano, esses brasileiros, “mais uma vez, manifestaram, legitimamente, repúdio e indignação contra a corrupção sistêmica que envergonha o País e cobraram saídas para o agravamento da crise econômica”.

Na nota, o senador mineiro diz que “o governo do PT impõe à sociedade a pior equação: recessão com inflação alta, juros altos e corte de investimentos nas áreas essenciais da educação e saúde”. De acordo com ele, após 100 dias do 2º mandato, “as famílias brasileiras sofrem agora os efeitos da crise sobre os principais setores produtivos. Empresas em diversos segmentos deram início a cortes ainda mais severos, transformando o que antes eram preocupações com o aumento do desemprego em realidade concreta”.

Aécio, que passou o fim de semana em Belo Horizonte, anunciou que não compareceria à manifestação na capital mineira por volta do meio dia de ontem. Segundo sua assessoria, o objetivo seria o de evitar dar tom partidário ao protesto.

Marina, que permanece no PSB até a formalização de seu futuro partido, a Rede Sustentabilidade, relativizou o fato de as manifestações reunirem um número menor de pessoas em comparação com as do dia 15 de março.

“Menos gente nas ruas não significa menor insatisfação; ao contrário, pode até significar um aumento da desesperança, o represamento de uma revolta que pode retornar mais forte depois de algum tempo”, escreveu Marina no Facebook.

Freire: reivindicação nos protestos foi mais objetiva quando maioria da sociedade quer impeachment de Dilma

Por: Assessoria do PPS

O presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), disse que as manifestações contra o governo neste domingo (12) foram mais focadas em um objetivo: o impeachment da presidente Dilma Rousseff. O parlamentar observou que as ruas refletiram o que a pesquisa Datafolha apontou: “a sociedade (63% dos entrevistados) está amplamente a favor da abertura de um processo de impeachment”.

“Em 15 de março, eram várias reivindicações, e o que unificava o movimento era ser contra o governo e o PT”, lembrou. Neste domingo, houve uma diminuição no número de participantes dos protestos, “mas uma maior definição dos seus objetivos”. O deputado frisou também que desta vez o número de estados e municípios foi bem maior do que em março (21 estados e o Distrito Federal).

Freire participou da manifestação na avenida Paulista, onde se reuniram 275 mil pessoas, segundo a Polícia Militar. “O clima era de alegria e confraternização, mas as pessoas estavam, evidentemente, indignadas com o governo e com o PT”.

Para Roberto Freire, as pessoas estão compreendendo melhor o papel da política e dos políticos no momento que o país vive. Ele lembrou que o Datafolha mostrou uma melhora na avaliação do Congresso Nacional. “Acho que há, também, uma melhor avaliação do papel que o PMDB possa vir a desempenhar se estiver independente ou se se aliar à oposição, mesmo com a nomeação do vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP) para a coordenação política do governo”.

Demonstrando expectativa com relação ao PMDB Rogério Chequer, do Vem pra Rua, disse ao jornal Folha de São Paulo que a aliança do partido "não deve ser com o PT, mas com a rua”, afirmou. Chequer informou que na próxima quarta (15) representantes de 50 movimentos virão a Brasília para oferecer uma pauta de reivindicações da sociedade ao Congresso Nacional.

Para políticos, mau humor continua

• Tanto o governo quanto a oposição avaliam que a diminuição do número de manifestantes não significa que a insatisfação com a presidente Dilma está menor. Um assessor do Planalto lembrou que o Datafolha não mostrou mudança no mau humor com o governo. Para líderes da oposição, o sentimento de indignação é o mesmo.

Insatisfação com Dilma não caiu, concordam governo e oposição

• Planalto se preocupa com alta reprovação mostrada no Datafolha; para líder do DEM, indignação continua

Fernanda Krakovics, Isabel Braga e Geralda Doca – O Globo

BRASÍLIA - Tanto o Palácio do Planalto quanto a oposição avaliaram que o número menor de manifestantes nas ruas ontem, comparado a 15 de março, não significou uma mudança no cenário de insatisfação com a presidente Dilma Rousseff. Apesar de aliviados com a menor adesão, integrantes do governo admitiram que não há motivo para comemorar. A preocupação maior é com a alta reprovação do governo mostrada na pesquisa Datafolha. Líderes da oposição lembraram que, mesmo com menos gente nas ruas, o sentimento de indignação da população com o governo continua muito alto.

— O Datafolha mostra que não há mudança de humor em relação ao governo. O fato de as manifestações estarem menores não é sinal de que a crise passou — afirmou um assessor do Planalto.

A pesquisa mostra que 60% dos brasileiros acham o governo ruim ou péssimo, e 63% apoiam a abertura do processo de impeachment de Dilma.

Sem reunião de avaliação, nem coletiva
Diferentemente do que aconteceu em 15 de março, quando dois milhões de pessoas foram às ruas, de acordo com a PM, ontem o Palácio do Planalto tentou tratar com naturalidade as manifestações. Desta vez, Dilma não convocou ministros para reunião de avaliação nem houve entrevista coletiva de ministros, o que em 15 de março deu margem a um panelaço pelo país. A presidente, que chegou do Panamá na madrugada de ontem, monitorou os protestos do Palácio da Alvorada e falou com ministros pelo telefone.

Para alguns integrantes da oposição, a redução do número de participantes pode estar relacionada com a proximidade dos dois atos e ao fato de ter sido realizado após a Semana Santa, o que prejudicou a mobilização. Para o líder do DEM da Câmara, Mendonça Filho, o sentimento contra o governo continua muito forte:

— O sentimento não mudou, a indignação permanece, e desta vez o movimento se espalhou por cidades menores. A impopularidade dela está estacionada em patamar absurdo, com a rejeição batendo 60%. Isso se agrava porque são apenas cem dias de governo. Um governo pode até perder a popularidade, isso até se recupera, mas ela e o PT perderam a credibilidade.

O líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima, também afirmou que a diminuição do número de manifestantes não reflete a redução da desaprovação ao governo Dilma.

— Essa leitura de que foi menos gente é uma leitura muito pobre. Os que não foram às ruas ontem não passaram a apoiar o governo. E, para mim, a volta dos manifestantes às ruas é um recado claro de que a oposição precisa encontrar um canal de diálogo com essa insatisfação, com esse movimento todo — disse o líder tucano.

O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), estava em Belo Horizonte e optou por não participar do movimento de rua. Segundo sua assessoria, o tucano entende que esse é um movimento espontâneo e não tem que ser partidário, mesma postura adotada em 15 de março. Para Aécio, sua participação poderia dar um tom de partidarização do ato, o que não é conveniente.

Em nota que assinou como presidente do PSDB, Aécio mostrou seu apoio e solidariedade ao movimento. Na nota, Aécio afirmou que as famílias brasileiras sentem os efeitos da crise econômica sobre os principais setores produtivos do país, e Dilma se mantém imobilizada, tentando terceirizar "responsabilidades intransferíveis".

"Além da crise ética e moral, o governo do PT impõe à sociedade a pior equação: recessão com inflação alta, juros altos e corte de investimentos nas áreas essenciais da Educação e da Saúde", diz um trecho da nota.

União de correntes em torno do "Fora, Dilma"
Para Mendonça Filho, os organizadores precisam ficar atentos para não banalizar os protestos:

— Faço uma alerta para quem está mobilizando: não banalizar, não fazer um ato a cada três semanas, pode enfraquecer, independentemente da indignação. Achei muito perto (os dois atos), mas como cidadão fui aos dois.

Para o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO) — que participou do protesto em SP —, o ato de ontem teve um significado maior, porque uniu correntes em torno do "Fora, Dilma":

— Ficou provado que o desejo de ver Dilma e o PT fora do governo não se limita a uma região só. Mais de 400 cidades protestaram contra o PT, algo jamais visto, nem nas Diretas Já, nem nas manifestações que derrubaram Collor.

Integrantes do governo afirmaram ontem que o governo tem que reagir às manifestações com uma agenda positiva, e não com declarações. A dificuldade, na avaliação desses ministros e assessores da presidente, é que este ano é de "arrumar a casa" com o ajuste fiscal. Segundo um ministro, a pesquisa Datafolha revela que as pessoas continuam pessimistas em relação ao futuro, com medo de perder emprego, renda e conquistas obtidas.

Ministros do núcleo político tentaram minimizar o cenário negativo afirmando que há uma insatisfação geral com a classe política, e que a presidente Dilma acaba sendo a catalisadora das insatisfações. Um ministro que integra a coordenação política afirma:

— Há uma crise de funcionamento do Estado. A presidente é a mais atingida porque é a personagem política central. Mas por que a oposição não pode ir para a rua discursar? Há uma insatisfação geral com a classe política desde as manifestações de 2013.

Líderes de ato cobram mais firmeza da oposição

• Manifestantes reclamam que partidos não endossam a tese do impeachment

• Vem pra Rua anuncia que movimentos antipetistas farão ato em Brasília no dia 15; MBL anunciou marcha

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO Os movimentos que foram às ruas em São Paulo neste domingo (12) contra o governo da presidente Dilma Rousseff (PT) também fizeram críticas à oposição, principalmente ao PSDB e ao senador Aécio Neves (MG), segundo colocado na disputa pelo Palácio do Planalto em 2014.

A cobrança central do MBL (Movimento Brasil Livre) e do Vem Pra Rua, organizadores dos atos, é por uma postura mais atuante em favor do impeachment da presidente.

Os senadores tucanos Aloysio Nunes (SP) e José Serra (SP) também foram cobrados para que seja instaurado no Congresso um processo de impeachment contra a presidente, assim como os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Todos eles se declaram contra o processo.

Kim Kataguiri, coordenador nacional do MBL, disse que a oposição não pode continuar com "uma postura frouxa". Já Renan Santos, também do MBL, criticou Aécio e disse que o tucano "sumiu" nas últimas semanas. Líder do Vem Pra Rua, Rogério Chequer cobrou em seu discurso "mais oposição, investigação e punição".

Aécio tem divulgado vídeos nas redes sociais para fazer convocação aos protestos, mas não compareceu a nenhuma das manifestações. Neste domingo, ele disse, em nota, que Dilma está "imobilizada". O PSDB se solidarizou com os brasileiros que voltaram a manifestar "repúdio e indignação" contra a "corrupção sistêmica".

O DEM ponderou que o tom dos protestos de hoje indicou que, agora, há um "objetivo comum: a saída de Dilma". O Solidariedade disse que irá procurar outros partidos para cobrar a defesa do impeachment.

Neste domingo, os deputados Paulinho da Força (SDD-SP), Roberto Freire (PPS-SP), Jair Bolsonaro (PP-RJ) e seu filho, Eduardo Bolsonaro (PSC-SP), eram os únicos políticos presentes no ato em SP.

Segundo Bolsonaro, os políticos "têm medo de estar nesse movimento".

"Sou bem tratado pelo meu passado, mas Aécio deveria estar aqui. Político tem que estar com o povo", disse.

O protesto deste domingo levou à avenida Paulista 14 carros de som. Três deles faziam defesa da intervenção militar. "Mudança não é Aécio, mudança é intervenção", diziam os apoiadores do SOS Forças Armadas.

Além deles, estavam presentes o Revoltados Online, o Movimento Liberal Acorda Brasil, o Movimento Civil XV de Março e o Solidariedade, entre outros.

O MBL anunciou a organização de uma marcha a Brasília que terá início na próxima sexta (17), com saída da zona oeste de São Paulo. A meta é chegar à capital federal em 20 de maio.

O líder do Vem Pra Rua diz que representantes de 50 movimentos anti-PT vão a Brasília na quarta-feira (15). "A aliança do PMDB não tem que ser com o PT, mas com a rua", defendeu Chequer.

Movimentos vão a Brasília pressionar parlamentares

• Organizadores planejam ida ao Congresso para pedir processo de impeachment e buscar ‘elo político’ após as duas manifestações

Ricardo Galhardo e Valmar Hupsel Filho - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Divididos e com o poder de mobilização em queda, os principais movimentos que organizaram os protestos deste domingo, 12, decidiram deixar as mobilizações de rua em segundo plano e buscar apoio no Congresso Nacional para suas reivindicações, a principal delas o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

“Já fizemos duas manifestações grandiosas mas isso não gerou um elo político”, disse o microempresário Renan Santos, um dos líderes do Movimento Brasil Livre. Ele anunciou que na sexta-feira um grupo de integrantes do MBL vai iniciar uma marcha saindo de São Paulo até Brasília, onde pretende se encontrar com líderes do Congresso e encaminhar a pauta do movimento.

O foco do MBL a partir de agora é fazer ações pontuais. Segundo Santos, os demais movimentos que foram às ruas neste domingo e até políticos de oposição ao governo que apoiaram as manifestações também mudaram de estratégia. “Os outros grupos pediram para não ter mais manifestações. Sentimos uma pressão de vários setores, principalmente de políticos e do mercado financeiro. Antes do ato do dia 15 de março, falei com mais de uma dezena de líderes do Congresso e todos apoiaram. Agora foi diferente”, afirmou.

O empresário Rogério Chequer, porta-voz do Vem Pra Rua, grupo que ao lado do MBL foi um dos que atraíram mais gente na tarde deste domingo na Avenida Paulista, anunciou a criação da Aliança dos Movimentos Democráticos do Brasil, formada por 50 grupos que vão à Brasília na quarta-feira também para encontrar lideranças do Congresso dispostas a encaminhar formalmente os pleitos dos movimentos.

O Vem Pra Rua aderiu há cerca de duas semanas aos grupos que pedem o impeachment de Dilma. Em seu discurso, ontem na Paulista, Chequer centrou fogo no PMDB, partido que tem a maior bancada na Câmara. “PMDB, não adianta você conquistar mais poder. O acordo agora não é com o PT, é com o povo brasileiro.”

Divisões. Chequer tentou dar um tom de unidade aos movimentos ao afirmar que o objetivo do Vem Pra Rua é “aglutinador” e não o de ter o protagonismo dos protestos. Mas o discurso esbarra na fala de outras lideranças. “Soube que o Chequer disse que eu estou nesta aliança. Estou mesmo?”, ironizou Renan Santos. Segundo ele, o MBL foi procurado mas não aceitou fazer parte da aliança.

No Rio, as divisões entre os grupos ficou escancarada com críticas e acusações abertas entre as lideranças. O principal motivo para a cisão é uma troca de acusações sobre financiamento por partidos. O Vem Pra Rua é acusado pelos demais de ser bancado pelo PSDB, mas nega. “Não recebemos dinheiro de nenhum partido, justamente para poder criticar. Isso só divide os movimentos”, afirmou a dentista Rizzia Arrieiro, porta-voz do Vem Pra Rua.

Ela alega diferenças ideológicas em relação ao bloco composto por União Contra a Corrupção (UCC), Movimento Brasil Livre (MBL), Extermínio e O Pesadelo dos Políticos, favoráveis à intervenção militar. “O pessoal do MBL não está alinhado com que a gente pensa. A gente respeita as instituições, não passa por cima delas”, disse Rizzia.

O empresário Rodrigo Brasil, um dos líderes do Revoltados On Line no Rio, concorda com o Vem Pra Rua, mas criticou o MBL e seus parceiros. “O pessoal lá está metido com político e a gente está fora disso”, disse.

“O racha vem do pessoal do Vem pra Rua, que é ligado ao PSDB”, acusou o técnico em segurança do trabalho Maicon Freitas, um dos líderes do UCC. “A gente faz vaquinha para pagar o carro de som.” / Colaboraram Carina Bacelar e Fábio Grellet

Planalto diz estar atento ao 'alerta' das ruas

• Temer prometeu diálogo e presidente utilizou Facebook para destacar combate à corrupção

Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Após avaliar que usou uma estratégia errada ao lidar com as manifestações de 15 de março, levando o problema para dentro do Palácio do Planalto, o governo preferiu evitar se expor, numa tentativa de preservar a presidente Dilma Rousseff. Ao contrário das seguidas entrevistas de ministros convocadas no mês passado, desta vez a reação oficial coube ao vice-presidente Michel Temer.

"O fato de ter menos gente nas ruas não diminui a importância do alerta que está sendo dado pela população, mostrando que é fundamental que o governo compreenda que há necessidade de dialogar e ouvir mais", disse Temer, novo articulador político do Planalto, via assessoria. Mais tarde, na cremação do jurista e ex-ministro Paulo Brossard (mais informações na pág. A12), em Porto Alegre, afirmou: "O governo precisa identificar quais são estas reivindicações e atender estas reivindicações. É isso que o governo está fazendo".

A página do Facebook administrada pelo PT em nome de Dilma postou mensagem afirmando que "o combate à corrupção é uma meta constante" do governo da presidente. O texto destaca que, no mês passado, Dilma encaminhou ao Congresso "um conjunto de medidas que vão permitir maior atuação contra diferentes frentes da corrupção".

O post cita frase de Dilma segundo quem "a guerra contra a corrupção deve ser, simultaneamente, uma tarefa de todas as instituições, uma ação permanente do governo e também, um momento de reflexão da sociedade, de afirmação de valores éticos".

Reunião. A decisão de que caberia a Temer falar pelo governo foi decidida em reunião entre Dilma e os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil) e José Eduardo Cardozo (Justiça), na noite de ontem. Hoje, uma nova avaliação das manifestações está prevista, com participação de Temer.

O ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, endossou a fala do vice-presidente dizendo que o governo "está atento" à pauta das manifestações. "Eu penso que, independentemente do seu tamanho, as manifestações devem ser consideradas e reconhecidas", afirmou. Para Edinho, o governo "capitaliza o descontentamento com a forma como foi organizado o sistema político", embora considere os protestos "naturais" e "legítimos".

O Palácio do Planalto continua preocupado com o tamanho e o alcance das manifestações em todo o País. A preocupação aumentou com a mais recente pesquisa Datafolha, que mostra estabilização da perda de popularidade de Dilma - cujo governo é aprovado por só 13% da população -, mas apoio de 63% ao impeachment.

No 15 de março, Cardozo e o ministro Miguel Rossetto (Secretaria-Geral) deram entrevista para avaliar as manifestações. As declarações, exibidas ao vivo na TV, foram recebidas com panelaços em diversas capitais. / Colaborou Vera Rosa

Obama e Raúl Castro têm encontro histórico na Cúpula das Américas

• 'Estamos dispostos a discutir tudo, mas precisamos ser pacientes', diz Raúl; para Obama, haverá avanço ‘na direção do futuro’

Cláudia Trevisan e Lisandra Paraguassu - O Estado de S. Paulo

CIDADE DO PANAMÁ - Quatro meses depois de anunciarem a retomada das relações entre seus países, os presidentes de Estados Unidos, Barack Obama, e Cuba, Raúl Castro, realizaram seu primeiro encontro formal neste sábado, 11, no Panamá, durante a Cúpula das Américas. "Nós estamos dispostos a discutir tudo, mas precisamos ser pacientes, muito pacientes", declarou o dirigente cubano. "Nós estamos em uma posição de avançar na direção do futuro", ressaltou Obama.
Ecoando declarações dadas nos últimos dias pelo presidente americano, Raúl disse os dois países podem conviver apesar de suas diferenças. "Nós podemos discordar em relação a certas coisas hoje, mas podemos concordar amanhã". Segundo ele, as divergências não são um problema, desde que haja "respeito às ideias do outro".

Obama ressaltou a natureza histórica do encontro entre ambos. "Depois de 50 anos de uma política que não funcionou, é o momento de tentarmos algo novo." O presidente americano disse que continuará a defender princípios democráticos e direitos humanos, da mesma maneira em que Cuba manterá suas preocupações em relação a políticas dos EUA. No discurso que realizou durante a cúpula, Raúl criticou a presença americana na base de Guantánamo e afirmou que o embargo contra Cuba viola o direito internacional.

"Com o tempo, será possível para nós virar a página e desenvolver uma nova relação entre nossos países", observou Obama.

Os dois presidentes surpreenderam o mundo no dia 17 de dezembro com o anúncio de que deixariam para trás cinco décadas e meia de rompimento e restabeleceriam os laços entre seus países. Mas o embargo econômico imposto no início dos anos 60 continua em vigor e só pode ser levantado por decisão do Congresso dos EUA.

Líderes apostam em nova era de avanços

• Chefes de Estado concordam que é preciso maior desenvolvimento econômico e social no continente

Flávia Barbosa – O Globo

-CIDADE DO PANAMÁ -O início de uma "nova era" das relações interamericanas, detonada pela primeira participação de Cuba em um fórum hemisférico em 53 anos, dominou a VII Cúpula das Américas, encerrada sábado, no Panamá. Paralelamente à política, porém, os 35 chefes de Estado e governo concordaram que o continente precisa também de um divisor de águas no processo de desenvolvimento econômico e social. O consenso dos líderes, costurado nos fóruns paralelos e na plenária final, é que a agenda estratégica passa por uma ofensiva de formação científica e tecnológica, em nível técnico e superior; pela expansão em massa do acesso à internet; e pela integração física e comercial, para promover um crescimento inclusivo e ambientalmente sustentável.

Só assim a região estará preparada para a chamada economia do conhecimento, que está ancorada na inovação, amplia a competitividade e gera mais riquezas internamente. É ainda o caminho para continuar o processo de redução da pobreza e da desigualdade e a expansão da classe média.

— Precisamos dar o salto da economia do conhecimento. Agricultura, indústria, serviços, tudo tem de ser baseado em inovação, tecnologia, inovação, inovação — afirmou a presidente Dilma Rousseff, que defendeu a ampliação do ensino técnico.

Esse é um investimento para alterar estruturalmente a dinâmica de crescimento da América Latina, que não pode mais contar com o motor das commodities, que financiou a expansão na primeira década dos anos 2000. A palavra de ordem é competitividade.

O presidente americano, Barack Obama, lembrou que a tecnologia está provocando mudanças significativas nas indústrias tradicionais e nas pequenas empresas.

— Precisamos das pessoas mais bem treinadas do mundo, e não apenas nas universidades de elite. Os sistemas de faculdades comunitárias são incríveis nos EUA, precisamos apoiar mais iniciativas assim, perguntar aos empresários para que e como devemos treinar aquelas pessoas — afirmou Obama.

Modelo de ensino unificado
Os países acordaram a criação do Sistema Interamericano de Educação, com foco na qualidade do ensino e na transferência de experiências e excelência. Um dos modelos a serem explorados seriam os programas brasileiro Ciências Sem Fronteiras e o americano 100 Mil Fortes nas Américas, de bolsas e intercâmbio de universitários, mencionados no encontro dos empresários.

—(O objetivo) é que todos os jovens das Américas se sobressaiam como os mais cultos, os mais educados e os mais competitivos — afirmou o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, autor da proposta abraçada pelo continente.

Neste contexto, a palavra conectividade entrou com força no léxico dos líderes das Américas. A expansão da banda larga é vista como essencial para levar educação e treinamento a jovens e adultos mais pobres e fora dos centros urbanos. Não foi à toa que o mais celebrado empresário presente ao Fórum de CEOs foi Mark Zuckerberg, do Facebook, que fechou parcerias com Panamá e Brasil.

— A inclusão digital e a conectividade são a alfabetização da nossa época — afirmou o presidente do México, Enrique Pena Nieto.

Houve amplo reconhecimento pelos líderes de que o Estado é importante para garantir os objetivos de inclusão social no plano econômico, mas incapaz, pelas limitações fiscais e de expertise, de implementar sozinho as mudanças necessárias nas Américas. Por isso, foi grande o apoio das maiores e mais dinâmicas economias da região, como EUA, Brasil e México, às Parcerias Público-Privadas (PPP) e a reformas que liberem o empreendedorismo.

Ênfase na integração
Também foi significativa — e, de certa forma, uma mudança na agenda regional — a ênfase que países como o Brasil deram à integração comercial. Os líderes entendem que são necessárias medidas para desburocratizar procedimentos aduaneiros. Ainda que não tenha sido reavivada a iniciativa da Aliança de Livre Comércio das Américas (Alca), é clara a percepção de que é preciso mais parcerias para acelerar exportações e importações entre os 35 países.

— Os países das Américas têm um peso importante nas relações econômicas de Cuba com o exterior. Particularmente, esses laços se estreitaram com a América Latina e o Caribe, a partir do reconhecimento da importância da complementação econômica — afirmou Rodrigo Malmierca, ministro de Comércio Exterior e Investimento Estrangeiro de Cuba.

— Vamos continuar promovendo avanços em matéria de integração regional e explorando oportunidades oferecidas pela Celac e pela Alba.

Para alcançarem o objetivo de expansão do comércio exterior, um salto fundamental nas relações entre as nações é a coordenação de projetos comuns de infraestrutura. São áreas de interesse especialmente a geração e a transmissão de energia e a infraestrutura de logística e transportes.

— Essa integração deve buscar maior comércio regional e a ampliação de investimentos — afirmou a presidente Dilma.

— Quanto mais pudermos coordenar na região, mais benefícios teremos. Hoje, por exemplo, na América Central, o custo de energia chega a ser três vezes maior do que nos EUA. Se conseguirmos construir um único mercado de energia, ficará para todos mais barato — exemplificou Obama.

De acordo com o presidente Juan Carlos Varela, do Panamá, infraestrutura foi um dos temas dominantes nos bastidores da sessão plenária da Cúpula. Os países pediram que as organizações multilaterais de crédito, como Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ajudem os Estados na identificação de projetos e estudos técnicos.

— Neste sentido, celebramos a proposta surgida no retiro privado dos mandatários, de se criar um Centro de Desenvolvimento de Infraestrutura para apoiar os países da região em seus esforços — disse Varela.

Parte do roteiro desta nova estratégia aparece no documento sobre os consensos da Cúpula das Américas, preparado pelo anfitrião, o governo do Panamá. O encontro terminou, pela terceira vez consecutiva, sem declaração final, que é um mandado formal de ação para todos os organismos multilaterais hemisféricos. O parágrafo crítico às sanções dos EUA à Venezuela, exigido por Caracas e seus aliados bolivarianos, inviabilizou a declaração. No encerramento, Juan Carlos Varela informou que o Peru vai sediar a VIII Cúpula das Américas, em 2018.

‘Chegou o fim do tempo das vacas gordas. A hora é de reformas’, adverte diretora do FMI

• Para Christine Lagarde, América Latina deve impulsionar um ambicioso programa de reformas para ativar economia

- O Globo

RIO — Os países da América Latina devem impulsionar um programa de reformas para crescer mais, pois a época das “'vacas gordas” para as matérias-primas acabou com a desaceleração da China, afirmou a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, em entrevista publicada neste domingo pelo jornal peruano El Comércio.

“É importante que todo o mundo entenda que terminaram os tempos das vacas gordas para as matérias-primas, que tantos impulsos favoráveis proporcionaram ao crescimento da região”', assinalou Lagarde.

Segundo a diretora do FMI, a desaceleração da China tem tido efeitos negativos sobre os preços das matérias-primas em todo o mundo, o que, por sua vez, tem afetado as perspectivas econômicas de países exportadores da América Latina, como Chile e Peru.

“Levando isso em conta, e para evitar que se prolongue o período de crescimento fraco, as autoridades da América Latina deveriam impulsionar um ambicioso programa de reformas estruturais”', recomendou, sem entrar em detalhes.

As declarações de Lagarde foram feitas quando faltam seis meses para a capital peruana, Lima, sediar a assembleia conjunta do FMI e do Bando Mundial (Bird), evento que ocorrerá em outubro e marcará o retorno do encontro à América Latina, 48 anos depois deste ter sido realizado no Rio de Janeiro, em 1967.

Em dezembro passado, o FMI advertiu que era esperada uma fraca recuperação da América Latina em 2015, como consequência da queda de investimentos e do fim do ciclo de altos preços das matérias-primas. Segundo as projeções mais recentes do Fundo, a região cresceu a um ritmo de 1,3% em 2014 e, este ano, o crescimento esperado era de 2,2%.

A dirigente do FMI recomendou às autoridades do Peru, considerado pelas entidades financeiras multilaterais como uma das principais economias da região, que ''acelerem as reformas estruturais para impulsionar o potencial de crescimento e continuem reforçando a inclusão social."

“Uma determinada implementação das reformas — também no mercado de trabalho — irá melhorar a produtividade, os investimentos, o capital humano e o emprego formal”', acrescentou.

No caso do Peru, a número um do FMI associou a recuperação em 2015 e a médio prazo, entre outras coisas, a fazer com que a produção das novas minas cresça à capacidade plena, superando inclusive o mal-estar social que possa causar entre grupos de ambientalistas.

O Peru, um dos maiores exportadores mundiais de metais preciosos, sofreu, em 2014, uma notória desaceleração em seu Produto Interno Bruto (PIB), que cresceu apenas 2,35%, sua taxa mais baixa em cinco anos, após acumular taxas médias de 5%.

Este mês, o governo peruano corrigiu as projeções de crescimento de 2015 para abaixo de 4%, após ter iniciado o ano com estimativas otimistas acima dessa taxa.

Aécio Neves - 100 dias

- Folha de S. Paulo

Diz o provérbio popular que não há nada tão ruim que não possa piorar. Esse parece ser o lema dos cem primeiros dias do segundo governo Dilma, tal a capacidade que este tem de gerar a cada dia indicadores e projeções que agravam o cenário de crise econômica e paralisia política que assombra o país. Se não bastasse a corrupção em níveis estratosféricos, por si só uma mancha que envergonha o país, a nação se vê tomada por um sentimento de logro e decepção.

É a constatação de que o país foi levado às cordas, de forma irresponsável por motivações políticas menores: a manutenção de um projeto de poder a qualquer preço. A ruína é ética, econômica, política. O PT conseguiu, em poucos anos, o que parecia impossível: quase destruiu a nossa maior empresa, protagonizou os maiores escândalos de malversação dos recursos públicos da história do país, desorganizou todo o sistema elétrico, promoveu a desindustrialização e postergou um programa mínimo de investimentos na infraestrutura.

Empresas e famílias estão sofrendo com a alta dos custos financeiros. Em março, houve o maior saque líquido de recursos da caderneta de poupança em um único mês em toda a série histórica do BC, desde 1995. Foi o mês que registrou também a pior inflação dos últimos 12 anos, e o desemprego avançou em todas as regiões.

Não estamos diante apenas de um governo inapto à boa gestão. O que estamos assistindo é o fim melancólico de um ciclo de poder, com um legado que promete ser terrível. Nada mais simbólico deste ambiente do que uma presidente da República que terceiriza as suas principais responsabilidades.

A economia está nas mãos de um fiador e a política entregue a um partido que não é o seu. Ao abrir mão de gerir as duas áreas sobre as quais se fundamentam todas as decisões da administração, o que se constata é que a presidente mantém o cargo, mas renunciou ao governo. O resultado é um país sem rumo, imerso em desafios.

A verdade é que enquanto surfou na herança bendita do governo do PSDB e foi beneficiado por circunstâncias externas, o governo do PT conseguiu apresentar alguns resultados ao Brasil. Mas, quando começou a agir como o que de fato ele é, trouxe o país para o poço em que nos encontramos hoje.

O que é espantoso é que o PT continua como dantes, impávido, incapaz de esboçar qualquer autocrítica que reconheça a sua enorme responsabilidade pelo descalabro em que se encontra o Brasil. Acusados de corrupção são oficialmente recebidos sob aplausos em reuniões do partido, que se limita a enxergar os milhões de brasileiros indignados como mal agradecidos e desinformados.

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Aécio Neves, senador(MG) e presidente nacional do PSDB

Ricardo Noblat - Deus salve a rainha!

- O Globo

"Deste governo há pouco a esperar, mesmo quando tenta corrigir os rumos" Fernando Henrique Cardoso

Que maneira infeliz de celebrar os primeiros cem dias de governo! Seis em cada dez brasileiros consideram péssima ou ruim a administração de Dilma. Quase seis em dez acham que ela sabia da corrupção na Petrobras e nada fez. Para quase oito em dez, a inflação aumentará. Assim como o desemprego, para sete em cada dez. Dois em cada três são favoráveis à abertura de um processo de impeachment contra Dilma.

AS MANIFESTAÇÕES de rua são apoiadas por sete em cada dez. E se a eleição para a escolha do sucessor de Dilma tivesse ocorrido na semana passada, Aécio Neves teria derrotado Lula por 33% dos votos contra 29%, segundo a mais recente pesquisa Datafolha. Dos seus vários bunkers em Brasília, a presidente só sai para lugares onde não corra o risco de ser vaiada. Se falar na televisão, pode deflagrar um panelaço.

O QUE DILMA fez para merecer isso? Mentiu. Apenas mentiu. Simples assim. O Brasil era um paraíso na propaganda dela para se reeleger. Menos de dois meses depois, o paraíso se evaporara. Dilma jurou que jamais faria certas coisas que só seriam feitas por seus adversários. Começou a fazê-las antes do fim do seu primeiro mandato. Mentiu de novo? Não. Era a mesma mentira. Tudo era uma mentira só.

UMA PESSOA QUE não ama seus semelhantes, ou que não sabe expressar seu amor por eles, não pode ser amada. Que o diga Jane, ex-criada do Palácio da Alvorada. Um dia, Dilma não gostou da arrumação dos seus vestidos. E numa explosão de cólera, jogou cabides em Jane. Que, sem se intimidar, jogou cabides nela. O episódio conhecido dentro do governo como "a guerra dos cabides" custou o emprego de Jane.

MAS ELA DEU sorte. Em meio à campanha eleitoral do ano passado, Jane foi procurada pela equipe de marketing de um dos candidatos a presidente com a promessa de que seria bem paga caso gravasse um depoimento a respeito da guerra dos cabides. Dilma soube. Zelosos auxiliares dela garantiram a Jane os benefícios do programa "Minha Casa, Minha Vida" uma soma em dinheiro e um novo emprego. Jane aceitou. Por que não?

LULA SE QUEIXA de Dilma porque ela não segue seus conselhos. Segue, sim. Só que às vezes demora. Para que abdicasse da maioria dos seus poderes, por exemplo, foi decisivo o bate-boca que teve com Lula no Palácio da Alvorada, em março último. A certa altura, Lula disse: "Eu lhe entreguei um país que estava bem..." Dilma devolveu: "Não, presidente. Não estava. E as medidas que estou tomando são para corrigir erros do seu governo"!

A RÉPLICA NÃO demorou. "Do meu governo? Que governo? O seu já tem mais de quatro anos"," disparou Lula. Os assessores de Dilma que aguardavam os dois para jantar e escutaram o diálogo em voz alta, não sabem dizer se ela nesse instante respondeu a Lula ou se preferiu calar. Um deles guardou na memória o que Lula comentou em seguida: "Você sabe a coisa errada que eu fiz, não sabe? Foi botar você aí"

FOI PRESSIONADA por Lula que Dilma entregou o comando da economia ao ministro Joaquim Levy, da Fazenda, que pensa muito diferente dela. Foi também pressionada por Lula que delegou o comando da política a Michel Temer, seu vice, a quem sempre desprezou. Levy está sujeito a levar carões públicos de Dilma, já levou. Temer, não. Levy pode ser trocado por outro banqueiro. Temer, não.

LULA INVENTOU o parlamentarismo à brasileira para tentar impedir o naufrágio de Dilma. É sua última cartada para salvar a chance de voltar à Presidência em 2018.

José Roberto de Toledo - No barco furado com Dilma

O Datafolha e o esvaziamento dos protestos confirmaram o que a estabilização da confiança do consumidor tinha antecipado: Dilma Rousseff bateu no fundo do poço. É um poço sarneysiano, mas tem fundo. Escalá-lo, porém, vai ser demorado e escorregadio. O ajuste fiscal deve provocar muitas contrações antes de parir algo de positivo para a economia. O único aliado da presidente é o tempo - se ela conseguir domar o PMDB e se segurar no cargo.

Tempo é algo que os prefeitos, todavia, não têm. Pesquisa inédita feita pela Ideia Inteligência mostra que, na média, eles estão com 47% de avaliação ruim/péssima, ante 21% de boa/ótima. Mais: 43% acham que a vida piorou em suas cidades, e 59% desaprovam a atual administração municipal. O drama dos prefeitos é que eles encaram as urnas já no próximo ano. Com tamanho déficit de popularidade, a reeleição lhes será árdua.

A pesquisa foi feita por encomenda da Frente Nacional de Prefeitos, que reúne de Fernando Haddad (São Paulo, PT) a Eduardo Paes (Rio de Janeiro, PMDB), passando por ACM Neto (Salvador, DEM). Não foram divulgados resultados isolados por cidade.

O quadro é desolador para os gestores municipais. Dois em cada três eleitores se dizem pouco ou nada informados sobre o atual prefeito de sua cidade. Só 29% ouviram falar de alguma realização da prefeitura - a taxa é ainda menor nos pequenos e médias municípios. Nos grandes, o que mais chamou a atenção do público foram ciclovias e ciclofaixas: 32% citaram esse tipo de obra, o único com mais de 5% de lembranças. As ciclovias são aprovadas por dois terços dos entrevistados nas metrópoles.

Comparando-se a pesquisa dos prefeitos com a recente pesquisa do Datafolha sobre Dilma, é possível identificar duas tendências distintas da opinião pública, que se completam.

A primeira é que a insatisfação dos brasileiros com seus governantes é ampla, geral e irrestrita. Pega todas as esferas de governo e não distingue partidos. É um sentimento genérico de descontentamento. Produz desconfiança em relação aos políticos e sensação de impotência no eleitor. O sistema mostra-se incapaz de atender, com a urgência necessária, às demandas do público.

Essa tendência vem da soma de agravos cotidianos. O tempo desmesurado perdido no trânsito, as interrupções frequentes no abastecimento de água, a insegurança, a demora para receber atenção médica adequada, a má qualidade do ensino, a percepção de corrupção generalizada. É o que estava na base dos protestos onipresentes de junho de 2013. É o que explica uma popularidade tão baixa para tantos prefeitos agora. Mas há outra tendência.

A segunda e mais recente onda de insatisfação da opinião pública nasceu do temporal de aumento de preços, originado pelos reajustes dos combustíveis e da eletricidade. Como são decididos pelo governo e foram decretados após a eleição, soaram como traição para quem votou em Dilma. Some-se o pessimismo em relação ao desemprego, e entende-se por que a presidente tem 13 pontos a mais de ruim/péssimo do que a média dos prefeitos.

As duas ondas se sobrepõem no caso de Dilma, mas produzem turbilhão também nos municípios. A agenda negativa federal contamina o resto, diz Maurício Moura, diretor da Ideia Inteligência. O prefeito médio acabou no mesmo barco furado da presidente. Com a diferença que ele terá menos tempo para achar uma boia de salvação e não se afogar nas urnas em 2016.

Nem sempre aos domingos. Conforme previsto aqui pela pesquisa Ibope DTM no Twitter e pelo Google Trends, o 12 de abril foi uma pequena fração do 15 de março. Faltaram muitas partes, sobrou um denominador comum: o grupo mais intransigente na defesa do impeachment, do "tiro na cabeça do PT" e/ou do golpe militar. O PSDB não foi nem para a janela ver o protesto passar. Mais uma vez a máxima funcionou: longe da timeline, longe das ruas.

Vinicius Mota - Rainha, enfim

- Folha de S. Paulo

Premonitórias foram as palavras do publicitário João Santana logo após a primeira eleição de sua pupila Dilma Rousseff. Ela estaria fadada a ocupar "a cadeira da rainha", uma lacuna na "mitologia política e sentimental brasileira".

A profecia agora se cumpre. Como ocorre com o monarca no Reino Unido, Dilma Segunda se senta no trono, mas não governa. Acalentou personificar a força da mulher e das minorias, mas entregou o cetro a quatro homens brancos, que farão o oposto do prometido na campanha.

Esse arremedo de república (ou, caricaturalmente, de monarquia) parlamentarista é a resultante não controlada nem planejada de um processo político estrambótico, em meio à deterioração da economia e da popularidade presidencial e à eclosão nas ruas de um movimento de centro-direita.

O arranjo político deve, por um momento, estancar a sangria em que se converteu a governabilidade nos últimos 90 dias. A popularidade da presidente parou de piorar, há sinais de distensão no Congresso, e a agenda de centro-esquerda do PT foi trocada por uma de centro-direita, liberal na economia e conservadora nos costumes e na distribuição de danos.

Desse modo o "governo de fato" se sintoniza com o que parece ser o sentimento majoritário circunstancial da sociedade. Amolda-se também ao tacão dos credores do governo e do país, que exige recomposição mínima de equilíbrio financeiro.

Fruto do improviso, esse balanço exótico de forças, que faz de Dilma uma presidente-observadora, não apresenta resposta duradoura à crise. Uma camada de gelo fino se cristalizou sobre um mar tumultuoso que continua a agitar-se logo abaixo.

A degradação da renda e do emprego da população apenas se inicia e veio para ficar por um longo tempo. O escândalo da corrupção partidária ainda tem muitos cartuchos para queimar. Faltará pão para saciar a fome de políticos vorazes.

Carlos Melo - As ruas, as casas e as várias crises

- O Estado de S. Paulo

A crise mais visível é a do governo e a de seu partido. Estaria aí a obrigação de apontar saídas. Mas não parecem capazes. A crise mais séria é a que causa danos sociais concretos e reside na economia; o País que volta a temer o desemprego, a falta de investimentos; o fantasma da inflação que se instala e leva à concentração de renda e à exclusão social; a precariedade dos serviços. Seria papel da oposição mostrar alternativa. Mas, na carona, assiste ao incêndio dos tanques.

Há também a crise moral, revelada pelos escândalos de corrupção. Traz a fúria, pede cabeças e justiçamentos, mas pouco toca nas mazelas da cultura: a remoção de pequenos privilégios cotidianos, a burla das leis, das normas, a desigualdade de direitos e oportunidades. Seria o caso de uma revolução de costumes, mas estamos longe disto. São várias as crises, estão em todo canto.

Nesse clima, multidões vão às ruas. Outros tantos observam de casa, pela internet. Todos, igualmente, vivem o mal-estar. O descontentamento e a revolta são traços do mundo contemporâneo e daí deriva a crise cíclica de representação: a política não responde à sociedade, a sociedade não constrói a política. Atônito, o sistema político bate cabeça e, no Brasil, gera a besta híbrida do presidencialismo sem poder e do parlamentarismo sem legitimidade. Ambos carecem de credibilidade. O animal híbrido, como se sabe, é estéril.

Preenchidas pelo vazio, as ruas querem urgência. Mas, fragmentadas, não apontam rumos. Perde-se o ímpeto, não pela solução, mas pelo tédio. O “Fora Dilma sem futuro” é, ao final, nada se nem sequer se imagina quem assumiria o leme dessa nave. A crise de verdade é a ausência de lideranças – nas ruas e nos partidos –, não apenas morais, mas capazes de intuir caminhos, estabelecer acordos, construir novo desenho político, um novo ciclo de desenvolvimento econômico e social, na direção do amanhã.

Resolver o quiproquó do Parlamento não contentará as ruas. Tampouco agradar às ruas pelas mãos do populismo eliminará, no longo prazo, o mal-estar que as ruas expressam. A crise maior está na incapacidade de apontar a rota da fuga que nos leva para frente. No fundo, os que foram às ruas sabem disto. E os que não foram também.

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Cientista político e professor do Insper

Valdo Cruz - Sem chance de errar

- Folha de S. Paulo

Em um governo pródigo em cometer erros, o recado deste domingo é que a cota de equívocos da presidente Dilma está próxima do seu limite, talvez quase sem espaço para novos desacertos.

Afinal, se de um lado houve uma sensação de alívio da parte do governo porque os protestos deste domingo tiveram uma adesão menor, por outro a pesquisa Datafolha mostrou que o nível de insatisfação dos brasileiros segue gigantesco.

Aumentou o apoio aos protestos, a maioria já quer a abertura de um processo de impeachment contra a presidente e o sentimento é de que o desemprego e a inflação vão subir.

Num clima negativo como este, os protestos não terem ganhado força é quase um motivo de comemoração, mas basta uma faísca, uma palavra mal colocada, uma derrapada do governo para estimular quem está muito insatisfeito a sair de casa.

Foi o que aconteceu em 15 de março. Dilma havia feito aquele pronunciamento desastrado, fora de hora. E o PT quis medir força com as ruas, destilando toda sua raiva. Resultado: açulou o desejo de quem queria protestar contra a presidente.

Agora, dizem os próprios assessores da petista, a cota de erros cometida entre um e outro evento diminuiu, tirando um pouco o fôlego dos protestos. Mas o terreno segue muito fértil para que sejam semeadas tempestades contra o governo.

O pior é que, antes de melhorar, tudo vai piorar. O desemprego vai aumentar, a inflação seguirá em alta e o país vai desacelerar ainda mais. Ingredientes que vão azedar e muito o humor dos brasileiros.

Daí que a presidente não tem mais chance de errar. Principalmente na política, onde sua última cartada, ao entregar o comando da área ao vice, Michel Temer, não pode falhar.

Caso contrário, o ajuste fiscal vai para o brejo. Sem ele, será o caos na economia e Dilma terá de recomeçar do zero. Pelos últimos lances, ela parece estar ciente desta realidade, o que já é um bom caminho.

Marcus Pestana - Inovação, empreendedorismo e desenvolvimento

- O Tempo (MG)

O motor do processo de desenvolvimento no século XXI é o conhecimento, a capacidade de inovação e o empreendedorismo. O elemento dinâmico no mundo contemporâneo se transferiu para a capacidade de um país inovar através do desenvolvimento científico e tecnológico. O Brasil vem perdendo o bonde da história não só em relação aos países desenvolvidos, mas também a países emergentes como China e Coreia do Sul.

Foi no sentido de compreender melhor o tamanho do desafio brasileiro que participamos da Missão Oficial do Congresso Nacional, a convite do Instituto das Américas e do Wilson Center Brazil Institute, em San Diego e Washington, nos Estados Unidos, de 29 de março a 3 de abril. Foram dois senadores e sete deputados de seis diferentes partidos políticos.

Conhecer a experiência do país mais dinâmico e inovador de todo o mundo foi extremamente positivo para entendermos nossas potencialidades e os gargalos que impedem um melhor desempenho do Brasil no setor.

Na Califórnia, podemos perceber ao vivo e a cores como San Diego e sua região, vocacionadas para o turismo e uma das principais bases militares dos EUA, conseguiram induzir, a partir da Universidade da Califórnia, um grande e dinâmico polo de desenvolvimento tecnológico. O diálogo com o reitor e com diversos executivos foi essencial para refinarmos nossa percepção do quanto estamos atrasados na criação do ecossistema adequado para a integração entre governo, iniciativa privada e academia, na transformação do conhecimento inovador em mola propulsora do desenvolvimento. E como a biodiversidade, uma das potencialidades visíveis do Brasil, pode ser uma fonte inesgotável de soluções.

O contato com pós-doutorandos e cientistas brasileiros que desenvolvem seus estudos e pesquisas lá foi esclarecedor para visualizarmos com clareza nossos erros e acertos. Ficou claro que o Brasil hoje não é atrativo para jovens cientistas brasileiros que romperam as fronteiras. E o quanto ainda é preciso caminhar na valorização dos pesquisadores. E como se faz necessário ampliar geometricamente o número de brasileiros se qualificando no exterior.

As visitas ao Instituto J. Craig Venter, ao Centro de Pesquisa e Incubação de Startups da Janssen (Johnson & Johnson) em San Diego e à fábrica de biológicos da Astrazeneca, em Maryland, ensinaram como precisamos quebrar muros e preconceitos, melhorar o arranjo institucional e financeiro e modernizar os marcos legais e regulatórios do setor. Em todos os pontos encontramos brasileiros cheios de sonhos e potencial.

Culminamos a missão com uma reunião no Departamento de Estado. Não só o nosso gap tecnológico ficou evidenciado, mas também que as relações Brasil/EUA andam meio fora dos trilhos.

Todos os indicadores do setor nos são desfavoráveis. Trabalhar uma agenda profunda de mudanças, mais do que um desejo, é uma imperiosa necessidade.

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Marcus Pestana é deputado federal e presidente do PSDB de Minas Gerais

Fernando Filgueiras – A dificuldade da comunicação política

• Comunicação é central para a vida democrática

- Valor Econômico

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Marco Aurélio Nogueira - Crise do governo Dilma excita as ruas e desafia a elite política do País

- O Estado de S. Paulo (12/4/2015)

Em um recente e esclarecedor texto (“Democracia, entendimento e o fator Temer”, disponível em http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1771), o competente cientista político Paulo Fábio Dantas Neto, professor da Universidade Federal da Bahia, sustentou uma instigante hipótese para que se pense nas saídas que se abrem para a resolução da crise política que corrói o governo Dilma. Para ele, “um bom pacto ajuda mais do que uma custosa cirurgia institucional”.

Paulo Fábio fundamenta sua posição numa análise criteriosa da situação política e da correlação de forças que hoje se batem no País. Não faz agitação, mas esforço de compreensão, exercício com que se busca limpar o terreno do entulho acumulado, persuadir por meio da razão e direcionar protagonistas.

Ele nos ajuda a refletir sobre a questão que hoje está posta na mesa: se nossa “elite política” prolongar seu fracasso e persistir na repetição das rotinas de que se tem valido nos últimos tempos, poderá haver solução virtuosa que dê às ruas excitadas um horizonte político confiável? A representação política – com a qual toda sociedade complexa mantem uma relação de dependência essencial – não age somente impulsionada pelos fluxos e pressões sociais, que refletem mudanças estruturais em curso e alterações nos humores cívicos. Ela também precisa da ação inteligente da elite dirigente: de estratégias, escolhas e atitudes que criem caminhos e brechas.

Paulo Fábio faz a pergunta certeira: “O que esperar de partidos e lideranças políticas quando, em momentos de insatisfação social ou de dificuldades econômicas, o jogo democrático apresenta-se truncado pelos impasses habituais das táticas do varejo político, ou quando as crises até resultam, em parte, desse próprio varejo? Espera-se que os partidos atuem como instituições (corpo organizado de regras) e os líderes como estrategistas do atacado, para restabelecerem a fluência do jogo. Às vezes, a perturbação é tão grave que é preciso mudar as regras. Mas na maioria dos casos um bom pacto ajuda mais do que uma custosa cirurgia institucional”.

Para ele, só teremos a perder se nos deixarmos aprisionar pelo “equívoco da percepção moralista da política no atual contexto brasileiro que é a demonização generalizada da nossa classe política e da sua vocação histórica para estabelecer pactos”. A imagem corrente tem reduzido os políticos à condição periférica de artífices de maldades sem-fim, uma espécie de “classe” predisposta a lutar exclusivamente por seus interesses corporativos. Trata-se de uma chave interpretativa que conta com a má qualidade dos componentes desta “classe”, mas que comete o erro primário de jogar fora a criança com a água suja do banho. Ou seja, reflete mais a indignação que vê os políticos como problema do que a compreensão crítica que percebe, neles, a presença de um recurso estratégico para o alcance de soluções coletivas.

Num livro que publiquei vários anos atrás (Em Defesa da política, Editora Senac São Paulo, 2001) e que me parece permanecer atual, também me pus o dilema: “supondo que fosse possível e razoável imaginar a completa extinção da classe política, quem faria o que fazem os políticos?”.

Como a história nem sempre é incluída nas percepções cotidianas da população, de repente se esquece que a obra da redemocratização – a ultrapassagem da ditadura, a reconstitucionalização do País, a eleição de governos democráticos – foi essencialmente uma operação política e não fruto do acaso ou de vontades arbitrárias. O eixo da transição democrática não foi fixado unilateralmente pela indignada pressão popular, mas por uma combinação fina de luta e conciliação, para a qual a elite política contribuiu de forma decisiva. Não houve somente brados de “abaixo a ditadura” e “fora militares”, mas muitas idas e vindas, muita sinuosidade, muitas conversas de bastidores, muita ação política e de políticos. Avanços efetivos existiram porque os slogans primários foram compensados por soluções políticas racionais.

A análise instigante do cientista político baiano ajuda a que se entenda, por exemplo, que o “fora Dilma” de hoje não contém em si nenhum passo à frente. As manifestações que têm se sucedido no País estão soltas no ar, carentes de cálculo racional e politização. Alimentam-se mais de decepção, ressentimento e frustração do que de busca de saídas coletivas. Apesar disso, não são pouca coisa, nem muito menos puro e simples exemplo de uma “conspiração” organizada pela mídia e pela “elite branca e golpista”, como sustentam setores do PT e do próprio governo.

O realismo político de Paulo Fábio faz com que ele ressalve até mesmo aquilo que tem sido visto como problema principal: o protagonismo adquirido pelo PMDB, que a rigor, nos últimos meses, praticamente encapsulou o governo Dilma. Sua análise sustenta a percepção, igualmente realista, “de que tem predominado, também nos ambientes políticos, o conflito entre o senso comum moralista e a lógica corporativa de um partido político. Seja por pragmatismo eleitoral ou por interesse patrimonialista, a elite política nacional (ao menos algumas de suas mais relevantes facções) flerta perigosamente com a silhueta de uma vala comum, onde a conjunção de crises ameaça jogá-la por inteiro”. Mas a elite política não é, e nunca foi nem será, um bloco monolítico, que atua como manada. Crises, além do mais, não significam o fim de tudo ou a inviabilização geral da nação.

“Podem ter o papel pedagógico de atiçar o instinto coletivo de sobrevivência, próprio de elites políticas experientes no governo da sociedade”. Por isso, na medida em que a crise política atual avança, mais ganham visibilidade certos atores “cuja estratégia mobiliza o entendimento como método”. Seria este o caso da desenvoltura com que passou a atuar o Vice-Presidente da República e também Presidente do PMDB, Michel Temer, “a quem não tanto a virtù, mas a fortuna transforma em peça importante para a viabilização de um cenário em que o idioma do entendimento pode levar a um desfecho em que a crise é espantada por uma conciliação”.

Paulo Fábio defende a possibilidade de uma solução virtuosa da crise pela via de “um arco de partidos, do governo e das oposições”, que viabilize o controle da economia e a pavimentação de um caminho institucional comum até as eleições de 2018. Nesta engenharia, o PMDB tenderá a jogar papel de relevo, seja em nível mínimo – ao fornecer ao PT melhores condições de governança – ou máximo, ao contribuir para que se articule uma frente política mais ampla que forneça algum vigor para o sistema de governo. Temer não é Renan nem Cunha: é uma espécie de obstáculo à ação desenfreada dos presidentes das duas casas legislativas. Encarna o PMDB “institucional”, com instinto aguçado de sobrevivência e qualificado para interferir com cálculo racional-democrático no cenário político.

O cientista político baiano não sabe “se será o governo ou a oposição (tucanos + PSB, PPS, etc.) quem entenderá primeiro que essa saída passa necessariamente pela atuação (e não pelo descarte) do PMDB institucional, entendimento que aconselha o fortalecimento de Temer e o esvaziamento do poder de Cunha e Renan, o que não é sinônimo, vale dizer, de enfraquecimento do Congresso. Há sinais, embora ambíguos, nos dois campos políticos principais, de que algo começa a se mover na direção dessa compreensão”. Da parte da situação, o governo poderá fazer de Temer “o canal de atendimento de algumas demandas das bases congressuais, como também “terceirizar”, através dele, um diálogo com a oposição”. Os grupos oposicionistas, por sua vez, poderão “encontrar em Temer um emissário junto ao próprio governo para negociar condições de aprovação das medidas de ajuste na economia” e para “construir uma agenda mais ampla, resgatando o discurso da campanha de Aécio Neves, que se pôs como candidato não só do PSDB, mas de um conjunto de forças que querem mudanças na orientação de governo, dentro dos marcos de uma institucionalidade democrática”.

Se passos nessa direção serão dados de fato é algo que não pode ser afirmado agora. Há problemas e dificuldades em boa dose e o tempo é inimigo de todos, para o bem e para o mal. Em ambos os lados já há quem se disponha a correr os respectivos riscos e se mova para o diálogo, mas há também quem jogue contra o diálogo. Falta grandeza e são poucas as lideranças com disposição e competência para fazer a roda girar em sentido positivo. O sentido de urgência ainda não se disseminou e depende da percepção dele a multiplicação de esforços em prol do diálogo democrático. Pequenos acordos ou pactos poderão, assim, evitar que a elite política fique alijada ou sem condições de traduzir em termos políticos e institucionais os desdobramentos da Operação Lava-Jato e o clamor das ruas excitadas.

O também analista político Luiz Eduardo Soares seguiu caminho parecido, numa inspirada postagem feita nas redes sociais (agora no site Gramsci e o Brasil:http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=1775). Às ponderações de Paulo Fábio, acrescentou uma firme e equilibrada contestação da ideia de “frente de esquerda” apresentada pelo diretório nacional do PT como forma de emprestar oxigênio e poder de comando ao governo Dilma.

Soares percebe que há uma “onda conservadora” crescendo no Congresso, “sob a batuta do que há de pior no PMDB — que ocupou o espaço deixado vazio pela desmoralização do PT e do governo”. Esta onda ameaça as conquistas sociais e os direitos civis e trabalhistas, além de alimentar a “crise provocada pelo bonapartismo arrogante e obscurantista de Dilma”.

Há no quadro atual pressões paralisantes, de caráter defensivo, e pressões mobilizadoras, que de algum modo podem potencializar a participação cidadã. Estas últimas ganharam alento com as manifestações de 15 de março e de hoje, 12 de abril, dando a sensação de que as ruas tenderiam a encurralar o governo. O problema é que os vetores de mobilização ainda não se combinaram com perspectiva política democrática, empurrando os cidadãos para atitudes de mágoa, frustração e ressentimento, facilmente capturadas por forças mais conservadoras e autoritárias, à direita e à esquerda.

A opção pela formação de “frentes de esquerda sectárias, estreitas, enamoradas do chavismo e dos populismos autoritários” não se mostra nem factível, nem particularmente virtuosa, até porque caminha na contramão das tendências em curso. Nas palavras de Luiz Eduardo Soares, a frente esquerdista proposta por parte do PT “é composta por lideranças e partidos que não foram capazes de enxergar aonde nos conduzia a política econômica desastrada de Dilma, ao longo do primeiro mandato, e que tampouco compreenderam como e por que a adesão do governo e do PT aos métodos políticos tradicionais, e sua tolerância com a corrupção, aprofundariam o descrédito da política, atingindo o coração da democracia”.

Na melhor das hipóteses, a ideia de que a saída da crise está à esquerda somente tem como efeito a reprodução de um discurso bipolarizado que se vale do simbolismo do “nós” contra “eles” para manter a política em estado de tensionamento moral e turbulência. Pode interessar circunstancialmente ao governo Dilma, mas não sugere nenhuma saída para sua crise. Acima de tudo, não valoriza a necessidade de se defender direitos e conquistas, não dialoga nem com a sociedade nem com seus setores mais indignados, que são literalmente empurrados para a direita.

A conclusão de Luiz Eduardo Soares é semelhante à de Paulo Fábio Dantas Neto. “O futuro a buscar é uma governança transparente, rigorosamente refratária à corrupção, aberta à participação, respeitando os direitos históricos dos trabalhadores, comprometida com a pauta humanista, os direitos humanos, os direitos dos indígenas, com a sustentabilidade e a redução das desigualdades, e refratária a improvisações irresponsáveis de efeitos destrutivos, sob a forma de um capitalismo de Estado ou de um projeto populista desenvolvimentista”.

O momento exige discernimento e pensamento complexo. Cientistas políticos como os mencionados aqui nos ajudam a pensar e sugerem pistas para que avancemos em termos de diálogo democrático e de ação política de novo tipo.

Enquanto o mundo assiste ao encontro entre Obama e Raul Castro e os brasileiros constatam que suas dificuldades são bem maiores do que se deduzia do discurso oficial dos últimos anos, faz nenhum sentido insistir no maniqueísmo e ficar gastando energia para saber se foram 100 ou 100.000 os que saíram às ruas para extravasar indignações.

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Marco Aurélio Nogueira é professor de teoria política na Unesp