domingo, 12 de abril de 2015

Opinião do dia – Fernando Henrique Cardoso

Infelizmente o que aconteceu no Brasil nos últimos meses não foi uma perda de popularidade só. Popularidade você ganha, você perde. Mas foi perda de credibilidade. Aí não tem jeito. Quando não tem nem popularidade nem credibilidade fica difícil mover as peças. Se não ganhar a credibilidade não vai.

Nós estamos, por circunstâncias, em um momento em que a capacidade de liderança de quem está na Presidência da República está muito abalada. Tanto que entregou a chave do cofre para alguém que pensa o oposto. E entregou para ele fechar o cofre, mesmo que não possa mais mexer nele. E, agora, entregou o comando político para outro que também pensa diferente, para outro partido. É uma situação delicada a que estamos vivendo.

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Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, foi presidente da República. Da palestra em S. Paulo, 10 de abril de 2015.

Maioria apoia abertura de processo de impeachment, mostra Datafolha

Maioria quer impeachment de Dilma e não conhece vice

Ricardo Mendonça – Folha de S. Paulo

Quase dois terços dos brasileiros (63%) afirmam que, considerando tudo o que se sabe até agora a respeito da Operação Lava Jato, deveria ser aberto um processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.

O desconhecimento a respeito do que aconteceria depois disso, porém, é grande.

No grupo dos que defendem a abertura de um processo que, no fim, poderia resultar na cassação da petista, só 37% sabem que o cargo de presidente ficaria com o vice. Quando instados a mencionar o nome do vice, metade desse subgrupo erra.

Conclusão: só 12% dos eleitores brasileiros são a favor de um processo de impeachment contra Dilma, estão conscientes de que o vice assumiria o cargo e sabem que o vice é Michel Temer (PMDB).

As conclusões são de pesquisa Datafolha finalizada na sexta-feira (10), dois dias antes das manifestações programadas contra a presidente para este domingo. O instituto ouviu 2.834 pessoas. A margem de erro é de dois pontos.

Dilma não é investigada pela Operação Lava Jato, que descobriu a existência de um vasto esquema de corrupção na Petrobras, mas o Ministério Público Federal afirma que parte da propina paga pelas empresas que participaram do esquema foi repassada na forma de doações ao PT.

Embora o maior grupo da população apoie a abertura do processo de impeachment –posição que nenhum partido relevante defende explicitamente até agora–, a maioria (64%) não acredita no afastamento de Dilma. Menos de um terço (29%) acham que a presidente seria afastada.

O apoio aos protestos contra a presidente é alto (75%), assim como a taxa de eleitores que associam Dilma ao escândalo de corrupção na Petrobras, objeto da investigação da Operação Lava Jato.

Para 57%, Dilma sabia da corrupção na estatal e deixou acontecer. Outros 26% opinam que ela sabia, mas nada poderia fazer para impedir.

A pesquisa mostra também que a Lava Jato pode estar alterando a percepção dos brasileiros a respeito dos problemas do país. Pela primeira vez, o tema corrupção aparece empatado com saúde na liderança do ranking de maiores preocupações. Para 23%, o maior problema é a saúde. Para 22%, corrupção.

O instituto apurou um empate também –este no limite da margem de erro– ao simular uma nova eleição presidencial. Se Dilma fosse cassada e novas eleições fossem convocadas hoje, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) alcançaria 33% das intenções de voto contra 29% do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).


Aprovação de Dilma para de cair, mostra Datafolha

• Estabilização em 13%, porém, é em um dos piores patamares em 22 anos

• Reprovação por parte de 50% da população ou mais ocorre em todas as regiões e em todos os segmentos de renda

Ricardo Mendonça (Editor-adjunto de Poder) – Folha de S. Paulo

Pesquisa Datafolha finalizada na sexta-feira (10) mostra que a popularidade da presidente Dilma Rousseff parou de cair.

Em relação ao levantamento anterior, em março, os números a respeito de seu desempenho no comando do país são bastante parecidos.

Para 13%, ela faz um governo bom ou ótimo, a mesma taxa apurada no mês passado. Para outros 60%, a administração é ruim ou péssima, só dois pontos a menos que o observado na pesquisa anterior.

A aparente estabilização da popularidade após um período de forte queda, porém, não pode ser considerada uma boa notícia para Dilma.

Primeiro porque esses patamares estão entre os piores desde o início de seu primeiro mandato, em 2011, e entre os piores mesmo na comparação com todos os presidentes desde Fernando Collor de Mello, o primeiro eleito pelo voto direto após a redemocratização do país.

A atual taxa de aprovação de Dilma só é comparável com os piores momentos dos ex-presidentes Itamar Franco (12% de aprovação em novembro de 1993, época do escândalo do Orçamento, na Câmara) e Fernando Henrique Cardoso (13% em setembro de 1999, quando a população sentia os efeitos da desvalorização do Real).

Na véspera de ser afastado da Presidência por um processo de impeachment, em 1992, Collor tinha 9% de aprovação --a pior taxa apurada em toda a série de pesquisas nacionais do Datafolha.

O segundo motivo é que a reprovação de Dilma por parte de 50% da população ou mais parece pulverizada. Ocorre em todos os segmentos estudados pelo Datafolha.

É assim entre homens e mulheres, em todas as regiões do país, entre eleitores de todas as faixas etárias, dos mais aos menos escolarizados e ainda com todos os padrões de renda.

Também estáveis --e em patamares igualmente recordes e alarmantes-- estão as expectativas em relação à economia. Para 78%, a inflação deverá aumentar no próximo período. Para 70%, o desemprego vai subir. E 58% acham que a situação econômica do país deve piorar.

O Datafolha ouviu 2.834 pessoas; a margem de erro é de dois pontos.
(RM)

Congresso recupera prestígio entre eleitores

• Temas de fácil aderência popular, como a diminuição da maioridade penal, elevam o protagonismo da Casa

Mauro Paulino (Diretor-Geral do Datafolha) Alessandro Janoni (diretor de pesquisas do Datafolha)

O conjunto de resultados do Datafolha de hoje compõe um retrato em alta definição do momento político do país. A baixa popularidade da presidente, ancorada às incertezas econômicas e aos desdobramentos da Operação Lava Jato, retroalimenta-se na crise com o Congresso Nacional, que, por sua vez, recupera algum prestígio no imaginário da população.

A reprovação ao Legislativo caiu mais do que a do Executivo, principalmente entre mais ricos e escolarizados, perfil preponderante nas manifestações de rua. Temas de fácil aderência popular, como a diminuição da maioridade penal, elevam o protagonismo da Casa que, por outro lado, enfrenta o governo em questões que lhe são caras, como o ajuste fiscal e a lei da terceirização.

Uma espécie de antecipação da síndrome do pato manco --termo usado pelos americanos para presidentes impopulares em final de mandato e sem apoio no Congresso-- apodera-se do governo Dilma logo após sua reeleição.

Em ambiente tão hostil, o índice dos que defendem a abertura do processo de impeachment da presidente não chega a ser surpresa. Uma análise qualitativa do dado revela de onde vem a maior parte dos que querem a saída da petista e o quanto a população desconhece a consequência imediata do impedimento.

Dentre os que reprovam Dilma, 79% apoiam a abertura do processo de impeachment. Destes, 61% pertencem ao grupo dos "refratários" à presidente --não votaram na petista no segundo turno e reprovam agora sua administração. Outros 18% provêm dos que elegeram Dilma, mas que agora estão "frustrados" com sua gestão, especialmente assombrados pelo fantasma do desemprego.

Essa alta correlação entre insatisfação com o governo e o posicionamento pró-impeachment sustenta a opinião dessa parcela que, revoltada e insegura quanto ao futuro, dispensa provas de envolvimento, mesmo que indireto, da presidente nos casos de corrupção na Petrobras.

Também é característica do "Fora Dilma" a baixa taxa de conhecimento sobre o que acontece em caso de impedimento da presidente. No total da amostra, são apenas 12% os brasileiros que defendem a abertura do processo, sabem que o vice é quem assumiria e identificam corretamente Michel Temer (PMDB) como o virtual ocupante do cargo. A maioria, porém não sabe que o vice assume em caso de impedimento ou, quando sabe, desconhece Temer.

Mas o apoio majoritário dos brasileiros aos protestos contra o governo legitima ainda mais, junto à opinião pública, os eventos que ocorrem hoje, remetendo para segundo plano contrastes de perfil e níveis de informação entre população no geral e os manifestantes. A valorização da TV aberta como principal fonte do noticiário político pelos entrevistados dá pistas do efeito que as imagens das ruas têm sobre o eleitorado.

E não é apenas o futuro de Dilma e o do PT que estão em jogo. Cada vez mais, menos brasileiros citam Lula como o melhor presidente da história do Brasil.

Datafolha aponta que 63% dos eleitores apoiam abertura de impeachment contra Dilma

• Pesquisa também mostra que a maior parte da população não sabe quem assumiria a Presidência no lugar da petista

Catarina Alencastro e Flávia Barbosa – O Globo

SÃO PAULO e CIDADE DO PANAMÁ — Pesquisa do Datafolha divulgada na tarde deste sábado mostra que 63% dos entrevistados apoiariam a abertura de um processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff (PT), a partir do que foi revelado até o momento na Operação Lava-Jato, que investiga um esquema de corrupção que envolve partidos políticos, empreiteiras e diretores da Petrobras. Outros 33% afirmaram que são contra o impeachment e 4% disseram não saber. Entretanto, o Datafolha demonstra também que a maior parte das pessoas não sabe o que poderia acontecer após uma possível destituição da presidente ao cargo. Dilma, que participou hoje da Cúpula das Américas, na Cidade do Panamá, não quis comentar a pesquisa.

Os resultados da pesquisa foram publicados no site do jornal “Folha de S.Paulo” nesta tarde. Os pesquisadores perguntaram àqueles que defendem a saída da presidente quem assumiria no seu lugar, caso Dilma fosse mesmo afastada do cargo. Deste grupo, 27% responderam que seria o vice-presidente (sem citar seu nome), 10% citaram Michel Temer (PMDB) nominalmente, 15% disseram que o substituto seria o candidato derrotado na última eleição, o senador Aécio Neves (PSDB), 8% deram outras respostas e 40% admitiram que não sabiam o que aconteceria.

Entre aqueles que rechaçam o impeachment, 33% disseram que o cargo de presidente é assumido por seu vice, 19% citaram Michel Temer, 5% falaram em Aécio Neves, 9% deram outros nomes e 33% disseram não saber responder à questão.

Com relação ao total de entrevistados, 29% acreditam que, em caso de impeachment da presidente, o cargo é ocupado pelo vice, 13% citaram Michel Temer, 12% falaram de Aécio Neves, 8% deram outras respostas e 39% afirmaram não saber a resposta. Quando os eleitores foram perguntados sobre qual é o nome do vice-presidente, 63% declararam não saber. Outros 36% acertaram a resposta, enquanto 1% respondeu um nome errado.

Embora a maioria das pessoas apoie a abertura de um processo de impeachment contra Dilma, 64% não acreditam no afastamento da presidente em decorrência da Operação Lava-Jato. Para 57% dos entrevistados, Dilma sabia da corrupção na Petrobras e deixou que os escândalos continuassem. Outros 26% acreditam que, embora soubesse do esquema, a presidente não poderia fazer nada para impedir que ele continuasse. Por fim, 12% responderam que Dilma não sabia da corrupção na Petrobras.

A maior parte dos entrevistados (75%) se declarou a favor dos protestos contra o governo Dilma, enquanto 19% das pessoas se manifestou contra as manifestações. Uma série de protestos contra Dilma está marcada para ocorrer neste domingo em vários locais do país.

Reprovação de Dilma fica estável
A reprovação da presidente Dilma ficou estável em relação à última pesquisa do Datafolha, feita em 16 e 17 de março. O número de eleitores que considera o governo Dilma ruim ou péssimo oscilou de 62% para 60%. Como a margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais, o índice ficou estacionado. Em 2 de dezembro, o índice era de 24%.

A quantidade de pessoas que considera o governo bom ou ótimo ficou estável em 13% nas duas últimas pesquisas. Em dezembro, estava em 42%. Já aqueles que o acham regular oscilou de 24%, em março, para 27%, em abril. Em dezembro, a taxa era de 33%.

A pesquisa também revela pessimismo do eleitor com relação à economia. Entre os ouvidos, 58% acredita que a situação econômica vai piorar, 78% acham que a inflação vai subir e 70% diz que o desemprego vai aumentar.

Quando a pergunta quem foi o melhor presidente do Brasil, 50% escolheram Luiz Inácio Lula da Silva, 15% afirmaram que foi Fernando Henrique Cardoso, 6% apostaram em Getúlio Vargas, 3% em Juscelino Kubitschek. Dilma foi eleita melhor presidente da história por 2%, mesmo percentual conquistado por José Sarney.

Nova eleição
O instituto de pesquisa também perguntou aos eleitores em quem eles votariam caso fossem convocadas novas eleições presidenciais. O resultado revela um empate técnico entre Aécio e o ex-presidente Lula. O tucano foi escolhido por 33% dos eleitores, enquanto o petista ficou com 29% das intenções de voto.

Marina Silva, que concorreu às últimas eleições pelo PSB, e o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa aparecem empatados em terceiro lugar, com 13% das respostas. O Datafolha ouviu 2.834 pessoas em 171 municípios entre 9 e 10 de abril. A margem de erro é de dois pontos percentuais.

No Panamá, Dilma não comenta pesquisa
A presidente Dilma Rousseff se negou a responder sobre a pesquisa Datafolha publicada neste sábado. Na entrevista coletiva que concedeu durante a VII Cúpula das Américas, ao ser perguntada sobre o assunto, disse que só trataria de assuntos internacionais e, sobre Brasil, falaria quando estivesse de volta ao Brasil.

- Querida, eu não vou falar do Brasil. Sabe por que eu não vou falar? Porque eu posso falar pra vocês amanhã ou depois de amanhã, quando nós chegarmos lá (no Brasil), sem problema nenhum. Mas aqui eu vou falar do que eu estou fazendo aqui - disse a presidente brasileira.

Dilma também foi perguntada sobre a nova etapa da Operação Lava-Jato, que investiga desvios de recursos da Caixa Econômica Federal e do Ministério da Saúde. E deu resposta semelhante.

Governo enfrenta segunda grande manifestação popular neste domingo

Sem tempo para respirar

• Datafolha revelou neste sábado que 63% apoiam impeachment de Dilma

Simone Iglesias e Júnia Gama – O Globo

BRASÍLIA e SÃO PAULO — Pouco depois de completar três meses de governo — período em que foi confrontada por crises quase diárias na economia, nas relações políticas e nas ruas —, a presidente Dilma Rousseff enfrenta neste domingo nova manifestação popular contra sua gestão. Pesquisa Datafolha divulgada neste sábado mostra que 63% dos brasileiros apoiam a abertura de um processo de impeachment contra a presidente, a partir do que foi revelado até o momento na Operação Lava-Jato, que investiga esquemas de corrupção na Petrobras e em outras estatais envolvendo partidos políticos, entre eles o PT.

A pesquisa, divulgada no site do jornal “Folha de S.Paulo”, mostra também que a reprovação de Dilma continua muito alta, apesar de estável em relação ao levantamento anterior, realizado em março. O número de eleitores que considera o governo Dilma ruim ou péssimo oscilou de 62% para 60%. Como a margem de erro é de dois pontos percentuais, o índice ficou estacionado. O percentual de entrevistados que considera o governo bom ou ótimo ficou estável em 13% nas duas pesquisas. Já o daqueles que acham o governo apenas regular subiu levemente de 24%, em março, para 27%, em abril.

No intervalo de menos de um mês entre o primeiro grande protesto, realizado em 15 de março, e o de hoje, a presidente se viu obrigada a fazer uma reformulação no Ministério, com ênfase na articulação política — alvo de críticas dos aliados e obstáculo para o ajuste fiscal.

Maioria a favor dos protestos
A expectativa do governo é que os protestos de hoje sejam menores do que os de março, quando mais de 2 milhões de pessoas foram às ruas. Durante a semana, o Planalto monitorou as redes sociais e concluiu que, desta vez, a adesão será inferior. Segundo auxiliares presidenciais, de lá para cá, não houve fato novo de repercussão contra Dilma. O governo avalia que a indicação de Renato Janine Ribeiro para o MEC, a maior exposição de Dilma com viagens e entrevistas e a mudança na coordenação política melhoraram o ambiente.

A pesquisa Datafolha revela, porém, que nada menos que 75% dos brasileiros são a favor dos protestos, e apenas 19% são contra. Outros 5% são indiferentes, e 1% não soube responder. Para 57% dos entrevistados, Dilma sabia da corrupção na Petrobras. Outros 26% acreditam que, embora soubesse do esquema, a presidente não poderia fazer nada para evitá-lo. Por fim, 12% responderam que Dilma não sabia da corrupção na Petrobras.

O governo e o PT admitem que a redução da tensão não significa um horizonte tranquilo. A opinião geral é de um cenário sombrio, sem previsão de mudança a médio prazo. A própria presidente tem trabalhado com uma perspectiva de melhora da avaliação popular sobre seu governo apenas em 2017 e 2018. Este ano e o próximo serão de arrocho econômico e de enfrentamento de dificuldades.

A situação incomoda muito os petistas, que consideram ter perdido o controle do governo, ao entregar a coordenação política ao PMDB.

— Dilma abriu mão de comandar a economia e, agora, a política. Parece uma renúncia branca, somada à desconstituição de nossas bandeiras históricas, como é o caso do projeto da terceirização de trabalhadores. A presidente se tornou, por opção própria, refém de Joaquim Levy e de Michel Temer, indemissível — resumiu um senador petista.

O Datafolha mostra, no entanto, um desconhecimento dos entrevistados sobre o que aconteceria se o afastamento da presidente fosse aprovado pelo Congresso. Dos eleitores que defendem o impeachment, só 27% estão conscientes de que, caso ela saísse, o vice-presidente assumiria; e outros 10% sabem que o cargo seria ocupado por Michel Temer (PMDB). Entre os apoiadores do impeachment, 15% disseram acreditar que o candidato derrotado na última eleição, o senador Aécio Neves (PSDB), assumiria a Presidência, e 40% disseram não saber o que aconteceria. Os 8% restantes deram outras respostas.

Do total de entrevistados, 63% disseram não saber o nome do vice, e só 36% disseram que é Michel Temer.

Embora a maioria das pessoas apoie a abertura de processo de impeachment contra Dilma, 64% não acreditam que o afastamento da presidente vá ocorrer. O Datafolha também perguntou aos eleitores em quem eles votariam caso fossem convocadas novas eleições presidenciais. O resultado revela empate técnico entre Aécio e o ex-presidente Lula. O tucano foi escolhido por 33%, enquanto o petista ficou com 29% das intenções de voto.

Marina Silva, que concorreu às últimas eleições pelo PSB, e o ex-ministro do Supremo Joaquim Barbosa aparecem empatados em terceiro lugar, com 13%. O Datafolha ouviu 2.834 pessoas em 171 municípios entre 9 e 10 de abril.

No partido da presidente, o ambiente é de preocupação com a perda de conquistas e com a dificuldade de o governo apresentar uma agenda positiva, que seja simbólica para sua base de eleitores. A principal aposta é a recuperação da imagem na Educação, já que Dilma propôs para este mandato o lema da “Pátria Educadora”. Os petistas ainda querem do Planalto um compromisso com temas caros ao partido, como o combate à homofobia e a rejeição à PEC que reduz a maioridade penal. Neste último tema, o governo vem sendo derrotado na Câmara.

Enquanto isso, o PMDB tem perspectivas mais otimistas por ter conseguido chegar ao centro das decisões. Ainda assim, o clima é de expectativa sobre o que Temer poderá fazer como articulador. Todos aguardam para ver se ele terá, de fato, autonomia para agir, atender aos aliados na distribuição de cargos e evitar que os impasses entre governo e Congresso se tornem graves — ou se o temperamento de Dilma não resistirá a ver o vice se sobressaindo. Explicitam que se trata da “última cartada” do governo e que, se não funcionar, o cenário é apocalíptico. Nesse ponto, petistas e peemedebistas convergem.

— As condições para melhorar com Temer existem: ele tem legitimidade e experiência para a função. Se funcionará, depende mais do governo do que dele ou do Congresso. Vamos ver se, realmente, ele terá autonomia — disse o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ).

Ao contrário do início do primeiro mandato, quando viveu relativa calmaria, a presidente convive há três meses com momentos de turbulência. Foi obrigada a compor com Temer, a quem deixou à margem das decisões nos últimos anos. Semana passada, ele foi instado por Dilma a assumir formalmente a articulação política, para tentar debelar a crise com o PMDB e com os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e, assim, reverter o cenário de derrotas no Congresso.

Dilma resistiu ao máximo à ideia de mudar o núcleo político que escolhera originalmente, com três petistas de sua confiança: Aloizio Mercadante (Casa Civil), Pepe Vargas (Relações Institucionais) e Miguel Rossetto (Secretaria-Geral). Porém, ficou sem alternativa, após perder o controle da pauta legislativa e ser pressionada pelo ex-presidente Lula a incluir o PMDB na cúpula da articulação.

Um personagem que esteve presente em muitos dos momentos de crise pelo qual o governo passa é o presidente da Câmara. Após derrotar o Planalto na disputa pelo comando da Casa e declarar independência em relação ao governo, Cunha proporcionou derrotas em votações como o projeto que regulamenta o novo indexador da dívida dos estados e municípios.

Outra derrota pilotada por Cunha foi a aprovação do projeto de quarentena para fusão de novos partidos, que implodiu antes do nascimento a estratégia palaciana de ter alternativa à hegemonia do PMDB. Também pode ser atribuída a Cunha a pressão que levou à queda de Cid Gomes e Pepe Vargas, e do então líder do governo, Henrique Fontana (PT-RS).

Três meses após ser nomeado por Dilma ministro da Educação, Cid declarou haver “300, 400 achacadores” entre os deputados. Não resistiu à reação de Cunha de convocá-lo para se explicar e trocou artilharia com parlamentares na sessão cujo desfecho foi sua saída do cargo.

Renan passou a criar dificuldades
Pepe Vargas foi alvo de críticas de Cunha desde que assumiu a função de ministro das Relações Institucionais, por sua tentativa de derrotar o peemedebista na disputa pela presidência da Câmara e pela pouca influência que tem sobre os deputados. Cunha o acusou de oferecer vantagens e tentar arregimentar com ameaças o apoio para seu então rival, o petista Arlindo Chinaglia (SP). Desde então, Eduardo Cunha não poupou ataques a Vargas, que ficou sem condições de permanecer como articulador com o Congresso. Como prêmio de consolação, Dilma o transferiu para a Secretaria de Direitos Humanos, abatendo Ideli Salvatti sem aviso prévio.

Aliado no primeiro mandato, Renan Calheiros virou o jogo no Senado, onde Dilma mantinha maioria de votos confiável. Citado na Lava-Jato, Renan viu o dedo do governo na inclusão de seu nome na lista de investigados. Passou a criar dificuldades para o Planalto, especialmente no ponto mais sensível: o ajuste fiscal.

A devolução da medida provisória sobre desonerações, que deixou o Planalto atordoado, foi o ápice do bombardeio disparado pelo cacique peemedebista. Renan adotou como prática as críticas públicas ao governo, ao qual chamou de “envelhecido”, e considerou a coalizão “capenga”, além de ter recusado convite de Dilma para um jantar com a cúpula do partido. Em seus encontros com o ministro da Fazenda, reclamou que o PMDB só é chamado para executar as tarefas impopulares, sem participar da formulação política.

Dilma ainda tem que lidar com os desdobramentos da Lava-Jato, afetando desde sua amiga Graça Foster, que deixou a presidência da Petrobras, até o PT e os aliados PMDB, PP e PTB.

Grupos testam força nas ruas contra Dilma

• Um mês depois dos protestos de 15 de março, ativistas organizam novas manifestações contra o governo neste domingo

• Líderes esperam ampliar movimento para maior número de cidades; Planalto conta com mobilização menor

Gustavo Uribe, Marina Dias – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Quase um mês depois dos protestos que arrastaram multidões nas principais cidades do país contra o governo Dilma Rousseff, os movimentos que pedem o impeachment da presidente voltarão às ruas neste domingo (12) para testar seu poder de mobilização.

As manifestações de 15 de março reuniram cerca de 210 mil pessoas na avenida Paulista, segundo o Datafolha, e foram as maiores realizadas na capital desde os comícios pelas Diretas Já, em 1984. Mas até entre os organizadores dos protestos há dúvidas sobre sua capacidade de repetir o desempenho de março.

Monitoramento feito pela Polícia Militar de São Paulo nas redes sociais apontou crescimento da mobilização em cidades do interior, mas pouca diferença na capital. O Planalto também conta com uma mobilização menor.

"A avenida Paulista é uma incógnita, porque agora estamos com mais movimentos em cidades do interior e da região metropolitana", afirma Rogério Chequer, um dos líderes do movimento Vem Pra Rua, um dos organizadores das manifestações.

Para os outros dois grupos na linha de frente dos protestos, o MBL (Movimento Brasil Livre) e o Revoltados Online, será possível repetir ou superar o número de manifestantes na capital paulista.

Os três grupos convocaram manifestações em mais de 400 cidades do país, o dobro do chamado em 15 de março.

Eles marcharão pela primeira vez com a mesma bandeira, "Fora Dilma". Avesso à tese do impeachment nos protestos de março, o Vem pra Rua mudou de posição.

"O Vem pra Rua cada hora está com uma pauta", diz Renan Santos, um dos líderes do MBL. "No último protesto, todos vieram com a defesa do impeachment e eles ajudaram a confundir a pauta."

O Vem pra Rua também critica o comportamento do MBL. "Estamos buscando diálogo para coordenação [dos protestos] com o MBL há semanas, mas não houve resposta. Temos divergências, mas temos muitas causas em comum", reclama Chequer.

Eles fazem questão de se apresentar como apartidários e não gostam de ser equiparados a movimentos que defendem uma intervenção militar, como o SOS Forças Armadas.

O MBL pediu à Justiça para que os movimentos favoráveis à intervenção militar fiquem a 500 metros de distância de seu carro de som.

"Nossa pauta defende a destituição do governo, do Congresso e do Poder Judiciário", afirma Renato Tamaio, líder do SOS Forças Armadas.

O envolvimento com os movimentos pela saída da presidente ainda é visto com cautela pelo PSDB, principal partido de oposição ao governo.

Esperado no protesto marcado para Belo Horizonte, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) disse a aliados que decidirá "de última hora" se irá. Na sexta-feira (10), o tucano divulgou um vídeo em que convoca a população para as manifestações: "Se você está com um nó na garganta, vá para a rua e se manifeste".

Com adesão menor nas redes, grupos do ‘Fora Dilma’ tentam atingir mais cidades

• Diante da perspectiva de levar menos gente às ruas nos grandes centros, movimentos procuram dar capilaridade às manifestações e chegar a mais de 400 municípios

Valmar Hupsel Filho e Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

Os grupos contrários ao governo federal chegaram a uma bandeira comum para os protestos de hoje - todos adotaram o slogan "Fora Dilma" -, mas não obtiveram o mesmo grau de mobilização nas redes sociais registrado às vésperas de 15 de março, data em que atraíram o maior contingente de um ato político desde a campanha pelas Diretas-Já. Diante da perspectiva de levar menos gente para as ruas, os três principais movimentos anti-Dilma tentam dar mais capilaridade às manifestações e realizá-las em mais municípios do que no mês passado.

"Nossa intenção é fazer com que a mensagem chegue em mais cidades", afirma o porta-voz do Vem Pra Rua, Rogério Chequer. Em sua página no Facebook, o grupo diz ter atos confirmados em 413 cidades brasileiras e no exterior. O Movimento Brasil Livre (MBL), outro grupo organizador dos protestos, confirmou presença em 161 cidades. No dia 15 de março, os protestos ocorreram em 212 cidades, atraindo um público total de 1,9 milhão de pessoas, 1 milhão delas em São Paulo, segundo estimativa - para alguns inflada - da Polícia Militar. De acordo com o Datafolha, a mobilização na Avenida Paulista reuniu 210 mil.

Na primeira grande manifestação antigoverno, Revoltados On Line e Movimento Brasil Livre já pediam o impeachment da presidente Dilma Rousseff, mas o Vem Pra Rua, não. Este último grupo agora aderiu ao slogan, que será reforçado pelo Solidariedade (SD), único partido a participar formalmente dos atos de hoje - o PSDB, por exemplo, convocou apoiadores, mas não fala abertamente em impeachment. Integrantes do SD vão tentar aproveitar o público das manifestações para colher assinaturas pelo impedimento da presidente.

Assim como os organizadores, o governo e o PT avaliam que as manifestações de hoje serão menores e não terão tanto impacto quanto as de 15 de março. Mesmo assim, a orientação é de acompanhar com atenção redobrada o movimento principalmente em São Paulo, onde há a maior concentração de pessoas.

Levantamento da consultoria Interagentes, especializada em análises de mídias sociais, mostra que a mobilização na internet para o ato de hoje é cerca de dois terços menor do que a registrada antes de 15 de março.

Coordenado pelos sociólogos Sério Amadeu e Tiago Pimentel - a dupla trabalhou na campanha de Dilma em 2014 - , o estudo mostra que para o primeiro protesto foram convidados 18,2 milhões de pessoas via internet. Destes, 2,1 milhões confirmaram presença, 192 mil disseram "talvez" e 830 mil recusaram. Para hoje 5,5 milhões de pessoas foram convidadas, 607 mil confirmaram presença, 46 mil disseram "talvez", e 204 mil recusaram.

O Ibope também mediu o humor nas redes e detectou queda nas referências aos termos "manifestação" e "protesto". Não há como se medir, no entanto, convocações ou mobilizações por mensagens de WhatsApp, ferramenta também usada pelos grupos.

Organização. Em São Paulo, a PM estima que de 10 a 16 carros de som sejam levados para a Avenida Paulista a partir das 14 horas para dar voz a ao menos oito grupos que pedem o impeachment. Apesar de rechaçado pelos demais grupos, o SOS Forças Armadas estará presente pedindo a intervenção militar. Como no dia 15, não haverá caminhada: os carros ficarão parados na avenida.

No Rio ativistas planejam se concentrar às 11 horas no posto 5 da praia de Copacabana (zona sul), para, três horas depois, seguir em caminhada rumo ao hotel Copacabana Palace, a 2,5 km de distância. Convocado pela internet por grupos como Cariocas Direitos, MBL-RJ, Revoltados On Line e União Contra a Corrupção (UCC), o ato desta vez será único - em 15 de março houve um pela manhã e outro à tarde.

Os organizadores planejam reunir ao menos o mesmo público do evento anterior - 18.500, na avaliação da PM. "Tivemos dois meses para divulgar aquele ato. Este foi promovido em muito menos tempo, então já será bom se tivermos público semelhante", afirmou Denis Abreu, do Cariocas Direitos. Segundo ele, outros dois fatores que ajudaram a impulsionar o protesto do dia 15 não estão presentes hoje: o pronunciamento de Dilma na semana anterior e o ato promovido dois dias antes por CUT, UNE e MST com apoio mais explícito à presidente.

Como nas manifestações de 15 de março, políticos da oposição devem marcar presença discreta nos atos, sem discursar em carros de som. / Colaboraram Vera Rosa e Fábio Grellet

Três visões, um objetivo: o Estado mínimo

• Grupos pregam diferentes gradações de menor intervenção estatal e defendem corte de tributos

Ricardo Galhardo e Valmar Hupsel Filho - O Estado de S. Paulo

Em linhas gerais, o Brasil defendido pelos integrantes dos três principais movimentos que convocaram os protestos de hoje - Movimento Brasil Livre, Revoltados On Line e Vem Pra Rua - teria atuação mínima do Estado na economia, com a maioria das estatais privatizada, redução de impostos e encargos trabalhistas, além de uma política de segurança pública linha-dura, com maioridade penal menor do que a atual - 18 anos.

O Vem Pra Rua poderia ser chamado de um movimento de centro-direita, formado por adultos que receberam boa educação e são bem sucedidos em suas profissões, e que conta com a simpatia de setores do PSDB - apesar de se autodeclararem apartidários. O grupo é personificado pelo empresário Rogério Chequer, de 46 anos, único rosto visível do movimento.

Segundo ele, o grupo defende ideias genéricas, como a melhoria da qualidade dos serviços públicos em saúde e educação. “Queremos que todo cidadão brasileiro chegue aos 17 anos em igualdade de condições, não importa de que região ou classe social ele venha”, diz.

O MBL se vende como a direita moderna, juvenil e extremamente contundente ao expor ideais liberais. Formado por jovens em sua maioria com idade abaixo dos 30 anos, o movimento tem como público estudantes universitários e jovens com ideologia politicamente conservadora, mas liberais em questões comportamentais, como os direitos homossexuais.

Kim Kataguiri - um ex-estudante de economia de 19 anos que deixou a faculdade porque “os professores sabiam menos” que ele próprio - personifica a estética do grupo com vídeos de humor nos quais se propõe a “derrotar o discurso esquerdista”. Sempre que pode, cita autores liberais como o austríaco Ludwig von Mises e o norte-americano Milton Friedman.

O grupo defende pautas específicas, como a redução pela metade do número de ministérios, instalação de CPIs para investigar o programa Mais Médicos e os empréstimos do BNDES, assim como a privatização da Petrobrás e de todas as estatais.

Além dos protestos de rua, o MBL adota a estratégia de pressão para tentar impor uma postura mais incisiva dos parlamentares de oposição. Na semana passada, organizaram um bananaço na sede do diretório do PSDB em São Paulo. O grupo promete anunciar um novo “grande ato” no final do protesto de hoje na Avenida Paulista.

Redes. Já o Revoltados On Line concentra a atuação na internet. Com mais de 700 mil seguidores no Facebook, é o mais popular e adota uma ideologia de extrema-direita. Criado há cerca de 7 anos com o objetivo de combater a pedofilia online, o grupo foi o primeiro a ganhar notoriedade fora das redes sociais, amparado na popularidade do cantor Lobão.

O Revoltados On Line chegou a flertar com os defensores de uma intervenção militar e tinha pouco critério na escolha das informações que compartilhava - o que o levou a referendar boatos e inverdades. Aos poucos, moldou suas posições até assumir uma identidade legalista pró-impeachment. Centrado na figura de seu líder, Marcello Reis, o grupo deve se transformar em uma associação ainda neste ano.

O Vem Pra Rua fez o caminho inverso do Revoltados On Line. Começou próximo da social-democracia tucana, mas aos poucos incorporou posições mais radicais e divergentes do PSDB, como a defesa do impeachment de Dilma, por ora descartada pelo partido. O grupo não discute questões morais como os direitos gays e o aborto e considera a adoção do voto distrital suficiente para a reforma política.

“Nós nos preocupamos enormemente com a distância e a desconexão entre a classe política e a sociedade”, diz Chequer. Para depois do protesto de hoje, o Vem Pra Rua pretende focar sua atuação em ações pontuais de pressão sobre os parlamentares.

Movimentos não têm futuro sem partidos, afirma historiador

Entrevista. José Murilo de Carvalho

• Para José Murilo de Carvalho, oposição, porém, não consegue dialogar com novos grupos

Wilson Tosta – O Estado de S. Paulo

RIO - Sem partidos fortes nem líderes nacionais, o movimento de rua contra a presidente Dilma Rousseff não tem futuro, afirma o historiador José Murilo de Carvalho. “O drama é que não há oposição que consiga dialogar com ele”, diz o autor de Os Bestializados: o Rio de Janeiro e a República que Não Foi, entre outras obras. “O grosso da oposição (partidária) adotou uma tática oportunista”, critica. Para o pesquisador, “a oposição formal apenas espera que o governo e o PT supostamente “sangrem” até a derrota. Seria necessário, opina, preparar já uma nova agenda para o País.

“Méritos e deméritos” dos governos petistas geraram a oposição de rua que agora prega o fim do ciclo do PT no Palácio do Planalto, avalia José Murilo. Ele lembra que os governos federais do partido desde 2003 melhoraram a renda de milhões de brasileiros e ampliaram o acesso à universidade.

Esses fatores, diz o historiador, aumentaram a capacidade crítica e de mobilização da população, que agora reage a outros efeitos que teriam sido gerados pelo petismo. Problemas como a corrupção, avalia, ajudaram a juntar nas mobilizações antigos e novos descontentes, que agora querem despachar a legenda do poder. “A incompetência, a arrogância e a corrupção quebraram o encanto”, declara o pesquisador. Ele ressalta que a esquerda perdeu a rua e “terá de se repaginar” se não quiser “ficar para trás”.

Para o historiador, os setores médios da população que se mobilizam contra o governo Dilma vão às ruas “desde os anos 50” do século passado, com a campanha “O Petróleo é Nosso”.

Ele avalia também que o conceito de “classe média” causa confusão nas análises, já que, para perceber quais são os seus interesses e lutar por eles, as pessoas precisam de certo grau de instrução e organização. Essas são características de setores intermediários. As críticas a isso, ironiza, vêm de intelectuais do mesmo extrato social que atacam.

Para José Murilo, a mobilização de 2015 tem a mesma “marca” da movimentação de setores médios que tiveram as Diretas-Já, em 1984, o movimento pelo impeachment de Fernando Collor, em 1992, e as passeatas contra a Copa do Mundo no Brasil de junho de 2013. Dessas, diz ele, o atual movimento são continuação. Mas faltam ao País, afirma, políticos com a estatura de estadistas. “Que saudades de Ulysses (Guimarães) e Tancredo (Neves), Petrônio Portela, e mesmo de (Leonel) Brizola.” Leia a entrevista concedida por e-mail ao Estado.

Em 15 de março, centenas de milhares de pessoas foram às ruas contra o governo Dilma. O senhor espera que esse público se repita no 12 de abril?

Não me arrisco a prever. O mal-estar continua, se não aumentou. Mas marchas muito frequentes podem também cansar. As demonstrações de ontem (terça-feira passada, promovidas pela CUT contra o projeto que amplia as terceirizações) já caíram muito em relação à anterior organizada pela mesma turma.

Um dos pontos sobre este movimento é que é basicamente de classe média, com poucos pobres. Isso ocorreu em outros momentos da história brasileira?

Esse conceito de classe média confunde mais do que ajuda. Refere-se a grupos complexos e mutáveis de pessoas. De modo geral, desde os anos 50 vão para a rua pessoas que têm condição de perceber seus interesses e de lutar por eles. Isto exige certo grau de educação e de organização: associações, sindicatos, internet. Grupos intermediários têm essas condições. O povão povão, quando se manifesta, em geral é sob formas menos pacíficas: invasões, saques, quebra-quebras. Diretas-Já, impeachment (do então presidente Fernando Collor em 1992) e junho de 2013 tiveram a marca de setores intermediários. Sob o nome de classe média, causam urticárias em intelectuais orgânicos da chamada esquerda, todos eles, naturalmente, de classe média, ainda presos a definições superadas. Mas no mundo de hoje, com a diluição das barreiras entre as classes pela dinâmica social, eles (esses setores) serão cada vez mais decisivos.

Há quem compare a mobilização, pela composição social e por algumas bandeiras, como saída da presidente constitucional, intervenção militar, críticas a programas sociais, às Marchas da Família que precederam o golpe de 64. Esse paralelo é justo?

Em 1964 houve grande polarização e ameaças de golpe vinham dos dois lados. Venceu quem conseguiu o apoio majoritário das Forças Armadas, com a ajuda da Guerra Fria e da histeria anticomunista, que uniu setores médios e povão. Hoje, o golpismo é residual nas marchas e só serve para fornecer combustível ao establishment governamental.

Trata-se de um movimento sem líderes de massa, sem partidos, sem entidades, com base nas redes sociais. Isso tem futuro?

Não tem. O drama é que não há oposição que consiga dialogar com ele. O grosso da oposição adotou tática oportunista de ver o governo e o PT sangrarem, sem preparar uma nova agenda que atenda as demandas atuais.

Pode-se dizer que março/abril de 2015 é uma continuação de junho de 2013?

Sem dúvida. A única diferença é que, vindo após a eleição, (o movimento atual) agregou um conteúdo mais político. Mesmo assim, o antipartidarismo ainda era forte e a oposição foi suficientemente sábia em não tentar participar das marchas.

Não é estranho, depois de tudo o que o Brasil passou na ditadura, ver tanta gente, inclusive jovens, pedindo intervenção militar no País?

Ainda não vi pesquisas que indiquem que essa tendência tenha peso significativo. Será mesmo “tanta gente”?

Por que os governos petistas geraram passeatas que pedem sua saída?

Por méritos e deméritos. A política social de melhorar a renda de milhões e ampliar as matrículas nas universidades resultou em aumento de expectativas e da capacidade crítica, portanto da mobilização. A incompetência, a arrogância e a corrupção quebraram o encanto e levaram antigos e novos descontentes para as ruas.

Muitos manifestantes, ao atacar o governo, pedem “o seu Brasil de volta”. O que tem mais peso nas manifestações: as denúncias de corrupção ou as mudanças na sociedade, como cotas, programas sociais, redução de desigualdades?

As coisas estão ligadas. Os governos do PT, sobretudo o último, dilapidaram o patrimônio que tinham construído.

Para ter fôlego, um movimento como esse precisa de um projeto político mais bem definido que avance em relação ao ‘Fora Dilma’?

Esse é nosso problema e nossa desvantagem em relação à Espanha. O “Fora Dilma” só leva a (Michel) Temer (o vice-presidente). A tradução das manifestações em instrumento político de intervenção eficaz e duradoura será conquista difícil, se vier a ser.

Como a oposição tem tirado proveito da insatisfação com o atual governo?

Ela se tem beneficiado, mas, como disse, de maneira oportunista, sem novas propostas. Falta-lhe imaginação, grandeza política e cívica. Aliás, a falta geral de estadistas hoje é dramática. Que saudades de Ulysses (Guimarães) e Tancredo (Neves), Petrônio Portela, e mesmo de (Leonel) Brizola.

A classe média conservadora aprendeu com a esquerda a se mobilizar, copiando algumas das formas de organização esquerdistas?

Quem é a classe média conservadora? Quem é a classe média não conservadora? Os setores médios estão nas ruas desde a década de 1950, com a campanha do Petróleo é Nosso.

A esquerda perdeu a rua?

Se você chama de esquerda o PT, o movimento sindical, o MST e semelhantes, a evidência do momento é que perdeu. Ela também vai ter que se repaginar. O Brasil está caminhando, quem não perceber vai ficar para trás.

As redes sociais são a base para as mobilizações. Essas manifestações seriam um fenômeno típico da internet, sem maiores consequências?

São um fenômeno da internet, que mudou a dinâmica e a natureza da participação política, fenômeno que as instituições ainda não conseguiram absorver.

Grupos da internet lideram protestos em todo o país neste domingo

• Manifestantes repetem fórmula que levou 2 milhões às ruas em março

Mayara Mendes e Julianna Granjeia – O Globo

RIO E SÃO PAULO — Manifestantes prometem voltar às ruas neste domingo para protestar contra o governo da presidente Dilma Rousseff nos 26 Estados do Brasil e Distrito Federal. Vários grupos estão encarregados da organização dos atos, repetindo a fórmula que mobilizou cerca de dois milhões de pessoas no último dia 15 de março em todo o país. Os organizadores estimam manifestações em mais de 400 cidades neste domingo.

Com objetivos parecidos, mas perfis e pautas distintas, o Movimento Vem pra Rua Brasil, os Revoltados Online e o Movimento Brasil Livre (MBL) revelam segmentos diferentes de eleitores insatisfeitos que pretendem protestar. A diferença entre os movimentos começa no alcance nas redes sociais. O Revoltados Online tem 764.233 seguidores no Facebook, o Vem pra Rua Brasil reúne 471.889 e o Movimento Brasil Livre tem 121.387.

O número de cidades em que simpatizantes já confirmaram presença no domingo é mais favorável ao Vem pra Rua Brasil: 413 contra 121 municípios do MBL. O Revoltados informou não estar contabilizando, apesar de confirmar organização em São Paulo, Rio e Brasília.

O Revoltados Online vende camisetas e adesivos pedindo o impeachment e divulga uma conta bancária para receber doações. Segundo Marcello Reis, líder do movimento, com o dinheiro dessas atividades um trio elétrico foi alugado por cerca de R$ 10 mil para percorrer a Avenida Paulista, região central de São Paulo.

— Não vamos parar enquanto não tiver uma solução. Eles entenderam o nosso recado sim, só não quiseram ouvir. Por isso, não estamos fazendo muitas pautas. Nossa reivindicação é simples e objetiva: impeachment e fim das urnas eletrônicas — afirmou Reis.

O Vem Pra Rua Brasil vai para as ruas hoje com o mote “Eles Não Entenderam Nada — O Nosso Partido É o Brasil”. Em sua página, o movimento afirma que “para mudar o Brasil, a lista de assuntos é bastante longa” mas destaca pontos para reivindicar no protesto: cassação, renúncia ou impeachment (“fora Dilma, mas sempre dentro da lei”), transparência nas operações do BNDES e proteção da Operação Lava-Jato.

— Estamos priorizando a investigação neutra dos casos de corrupção e dos processos de investigação em cima da presidente. Mantemos como causa os demais pontos, mas estamos focados em não ter pizza na investigação do petrolão — afirmou o porta-voz do movimento, Rogério Chequer, por telefone, minutos antes de participar da palestra “Vencendo o populismo com as armas da democracia: um encontro com Gloria Alvarez”, no Instituto Fernando Henrique Cardoso.

O presidente do PSDB, senador Aécio Neves, divulgou nesta semana vídeo convocando a população para participar da manifestação. No vídeo gravado em um carro em movimento, Aécio chama para as ruas todos que estão com “nó na garganta” para dizer que “não aguentam mais tanta mentira”. Ele, no entanto, ainda não confirmou se irá participar.

Já o MBL diz se diferenciar pela defesa de políticas liberais na economia, como a privatização da Petrobras. Renan Santos, um dos líderes do MBL, afirma que não se trata apenas de um movimento anti-Dilma ou anti-PT:

— O grupo é totalmente baseado em ideias liberais. Nos unimos por afinidade antes de tudo, não é só um grupo anti-PT. Mesmo que o foco no momento seja tirar a Dilma do poder e combater o que o PT representa, as pessoas estão juntas por uma identidade ideológica.

Lula nas asas da empreiteira

Diretor da Odebrecht pagou ‘voo sigiloso’ de Lula para Cuba em 2013

• Alexandrino Alencar, que fez parte da comitiva, é citado por delatores da Lava-Jato como operador de propinas

Thiago Herdy – O Globo

SÃO PAULO — O atual diretor de Relações Institucionais da Odebrecht, Alexandrino Alencar, levou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em um périplo por Cuba, República Dominicana e Estados Unidos, em janeiro de 2013. A viagem foi paga pela construtora e, oficialmente, não tinha relação com atividades da empresa nesses países.

Lula foi a um evento da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) sobre o clima, visitou o presidente da República Dominicana e falou no congresso de trabalhadores da indústria nos EUA. Na Operação Lava-Jato, Alencar é o dirigente da Odebrecht acusado por três delatores de ser operador de pagamento de propinas para a empresa no exterior.
A relação oficial de passageiros do voo, obtida pelo GLOBO, mostra que ele era o único que não fazia parte do círculo de convivência de Lula. Estavam na aeronave funcionários do Instituto Lula, o biógrafo Fernando Morais e o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Rafael Marques.

O documento de solicitação do serviço, da Líder Táxi Aéreo, mostra também que o contratante exigiu discrição. No campo “passageiro principal” do formulário, o funcionário da Líder escreveu: “voo completamente sigiloso”. Procurada, a Líder não comentou o motivo do registro.

Para evitar que fosse vinculada ao fretamento, a Odebrecht usou uma de suas parceiras para pagar a despesa: a DAG Construtora, da Bahia. O dono da empresa, Dermeval Gusmão, primeiro negou ter pagado pelo voo. Anteontem à noite, ligou para informar que localizou um pagamento de R$ 435 mil à Líder e disse que um de seus diretores pode ter feito isso a pedido da Odebrecht.

Viagem com lula em 2011
Alencar já havia sido convidado por Lula para acompanhá-lo em comitiva do governo brasileiro à África, em 2011, quando ele já não era mais presidente. Na época, o pedido causou constrangimento ao Itamaraty, porque o diretor não trabalhava no governo nem tinha relação direta com atividades do ex-presidente.

No mesmo ano, a Odebrecht pagou para que Lula viajasse à Venezuela, também na companhia de Alencar, segundo a revista “Época”. Alencar foi um dos principais interlocutores para viabilizar a construção do estádio Itaquerão, antigo sonho de Lula, segundo o livro de memórias do ex-presidente do Corinthians Andrés Sanchez.

O primeiro delator a citar o nome do diretor da Odebrecht na Lava-Jato foi o doleiro Alberto Youssef. Ele disse que a Braskem, do grupo Odebrecht, obteve vantagens na compra de insumos da Petrobras, graças a uma renegociação de preços conduzidas na estatal pelo então diretor Paulo Roberto Costa. Em troca, a Braskem teria aceitado pagar US$ 5 milhões em propinas, a serem divididos entre dirigentes do PP e Costa, com intermediação de Youssef.

O doleiro mencionou o local onde se reunia com o diretor da Petrobras e Alencar: nos hotéis Hyatt e Tivoli, em São Paulo, entre 2006 e 2012. Segundo os depoimentos, a construtora depositava os valores em contas fora do país; os recursos eram internalizados em operações de fachada.

Youssef disse que marcava encontros com Alencar por telefone. O número do diretor da Odebrecht consta da lista de ligações realizadas ou recebidas por um dos aparelhos de Youssef, conforme relatório sigiloso da empresa Blackberry, enviado aos investigadores da Lava-Jato e localizado pelo GLOBO.

Funcionário do doleiro e também delator, Rafael Angulo disse ao Ministério Público ter se reunido com Alencar na sede da Odebrecht, em São Paulo, para lhe fornecer o número de contas bancárias no exterior que deveriam ser usadas para depósitos. Também aparecia para recolher comprovantes de pagamentos realizados.

Ao depor, Costa confirmou o pagamento de propina pela Braskem, mas negou que tenha discutido a parte que cabia ao PP com a empresa, limitando-se “à parte da propina que cabia ao próprio depoente”.

Construtora alega ter pagado por palestra do ex-presidente
A Odebrecht informou ter pagado pela viagem do ex-presidente por três países em função de agenda complementar cumprida por ele na República Dominicana, que não foi divulgada pelo Instituto Lula. Segundo a construtora, além de se encontrar com o presidente do país, Lula realizou uma palestra “para empresários, investidores, políticos e formadores de opinião”.

Ao GLOBO, o Instituto Lula confirmou a palestra e disse que “às vezes sim, às vezes não” a organização divulga na agenda oficial do ex-presidente a sua participação em eventos privados.

Por meio da assessoria da Odebrecht, O GLOBO perguntou a Alexandrino Alencar se conhecia o doleiro Alberto Youssef e qual era seu posicionamento sobre as acusações feitas por ele, no âmbito da Operação Lava-Jato. O diretor negou o que chamou de “alegações caluniosas feitas por réu confesso” e disse que não conhecia Youssef.

Quando O GLOBO informou à assessoria da Odebrecht que o número do diretor constava de relatório da Blackberry em posse dos investigadores da Lava-Jato, Alencar mudou o posicionamento e disse ter conhecido o doleiro “por intermédio de José Janene”, na condição de assessor do deputado, que morreu em 2010.

Perguntado sobre o motivo do contato telefônico que teve com o doleiro, mesmo depois de Janene já ter falecido, Alencar respondeu lacônico: “agendamento de reunião”.

Sobre a viagem de janeiro de 2013, a Odebrecht informou que Alencar teria acompanhado o ex-presidente apenas no trecho que incluiu a República Dominicana e Cuba, onde a empresa construiu o Porto de Mariel. Segundo a assessoria, o dirigente não teria acompanhado o ex-presidente na viagem ao Estados Unidos, apesar do trecho também ter sido pago pela construtora.


Perguntada sobre o motivo de pedir à DAG Construtora que pagasse pelo fretamento, em vez de ela própria efetivar a despesa, a Odebrecht disse ter solicitado o favor à sua parceira comercial “por uma questão de logística”.

O GLOBO perguntou a Alexandrino Alencar sobre a relação dele com o ex-presidente Lula. O dirigente afirmou que “conhece o ex-presidente Lula e sempre teve com ele uma relação de cordialidade e respeito”.

Por meio de nota, a Braskem, que é controlada pela Odebrecht, negou que tivesse pagado propina ao PP e a Paulo Roberto Costa para obter vantagens em compras da estatal. “Todos os contratos e os pagamentos seguiram os preceitos legais e foram aprovados de forma transparente, de acordo com as mais rigorosas regras de governança corporativa”, disse a empresa, que completou, na nota: “Além disso, é importante ressaltar que os preços praticados pela Petrobras na venda de matérias-primas nunca favoreceram a Braskem e sempre estiveram atrelados às referências internacionais mais caras do mundo, com notórios efeitos negativos para a competitividade da Braskem e da petroquímica nacional”.


Nomeação de Temer acirra disputa no PMDB

• Escolha de vice para articulação política é considerada última cartada de Dilma

• Aliados da presidente apostam que Renan Calheiros e Eduardo Cunha continuarão jogando contra petista

Ranier Bragon, Valdo Cruz – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Classificada por assessores como a última cartada da presidente Dilma Rousseff, a transferência da responsabilidade pela articulação política do governo para o vice-presidente Michel Temer acirrou a disputa interna de poder no PMDB, partido com comando historicamente dividido por caciques regionais.

Presidente da legenda, mas com pouca ascendência sobre esses grupos, Temer vê agora a chance de recuperar o protagonismo que vinha perdendo lentamente para os presidentes do Senado, Renan Calheiros (AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (RJ).

Segundo um assessor presidencial, Dilma ficou sem saída quando o ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, recusou convite para assumir a Secretaria de Relações Institucionais, e foi obrigada a entregar a Michel Temer o comando político do governo.

Um interlocutor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que Dilma "colocou todas as suas fichas" numa jogada só e deu sua "última cartada", abrindo mão de parte de seu poder para fortalecer Temer e tentar reduzir o dos dois peemedebistas que comandam o Congresso.

Em torno desses três políticos orbitam deputados, senadores, ministros, governadores e outros políticos com interesses diversos que ameaçam a tentativa de Dilma de reerguer a sua base de apoio.

As dificuldades maiores estão na Câmara dos Deputados, presidida desde fevereiro por Eduardo Cunha e que impôs uma sucessão de derrotas ao governo Dilma.

Eleito com um discurso crítico e de independência em relação ao Executivo, Cunha não dá sinais de que irá mudar de posição por causa da indicação de Michel Temer.

Aliados a Eduardo Cunha estão o prefeito do Rio, Eduardo Paes, o governador do Estado, Luiz Fernando Pezão, o ex-governador Sérgio Cabral, o futuro ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves (RN), e a maior parte da bancada de deputados da sigla.

Sob sua bênção, o deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ) conseguiu se eleger líder da bancada e é cotado para disputar a sucessão de Pezão. Esse grupo também almeja nos bastidores lançar um nome à Presidência da República na eleição de 2018, cenário que se nublaria em caso de sucesso de Temer na articulação política do governo.

O vice-presidente conta com aliados como o ministro Eliseu Padilha, Henrique Alves, que transita entre o seu grupo e o de Cunha, e o senador Jader Barbalho (PA), que possui grande capacidade de articulação interna e já mostrou que vai estar na linha de frente em defesa de Temer.

Já Renan tem se mostrado insatisfeito com a participação que seu grupo tem na Esplanada, o que o leva a adotar um discurso crítico contra o governo. Ele é padrinho político do ministro do Turismo, Vinicius Lages, que em breve perderá o posto para Alves.

Têm relação estreita com Renan os senadores Romero Jucá (RR) e Valdir Raupp (RO), que assumirá a presidência do PMDB nesta semana, assim que Temer se licenciar.

Trégua
Segundo interlocutores de Dilma e Temer, a expectativa é que Renan e Cunha façam um recuo e deem uma trégua ao governo. Mas eles vão continuar operando nos bastidores contra a petista, avaliam.

Segundo aliados do vice-presidente, tudo vai depender de Dilma. Ela terá de cumprir a promessa de dar a Temer todos os instrumentos para fazer a articulação política --principalmente a distribuição de cargos do segundo escalão-- e pôr fim à crise.

Caso contrário, dizem, a presidente teria de recomeçar tudo do zero para tentar chegar ao final do mandato, em 2018, com um patamar mínimo de aprovação popular.

Merval Pereira - Soluções para o STF

- O Globo

A dificuldade que a presidente Dilma está encontrando para escolher o novo ministro do Supremo Tribunal Federal na vaga de Joaquim Barbosa, com receio de que o Senado vete o nome indicado pelo Palácio do Planalto, poderia ser superada com a adoção de uma medida tomada por Getúlio Vargas em julho de 1933, recuperada pelo advogado e historiador Alberto Venâncio, da Academia Brasileira de Letras.

O Presidente da República simplesmente pediu ao Supremo uma lista quíntupla para preenchimento da vaga de Soriano de Sousa. É preciso salientar, destaca Venâncio, que não houve nenhum corporativismo, pois na lista havia dois advogados, Carlos Maximiliano, posteriormente Ministro da Corte, e Levi Carneiro, que foi juiz da Corte Internacional de Haia.

Costa Manso, o escolhido, com a maioria das indicações (10 votos, o que indica que ele apareceu na lista de todos os membros do STF) foi desembargador do Tribunal de São Paulo, Presidente do Tribunal de Justiça e colaborou em várias leis estaduais, e teve no Supremo Tribunal atuação destacada.

A demora para a indicação do novo ministro, que já está atrapalhando votações nas Turmas do STF devido à possibilidade de empate, tem provocado reações de alguns ministros. A situação insólita faz com que o STF trabalhe há mais de 8 meses sem o plenário de 11 membros completo, e supera a média de 150 dias que Dilma tem levado para escolha de novos ministros do Supremo: foram 204 dias para nomear o ministro Luís Roberto Barroso, 62 dias para o ministro Teori Zavascki, 132 dias para a ministra Rosa Weber e 195 dias para o ministro Luiz Fux.

Os presidentes anteriores nem de perto se aproximaram desse recorde, inclusive Lula, que indicou oito membros para o Supremo, e a indicação mais demorada foi a da ministra Carmen Lúcia, que levou 57 dias. Itamar Franco foi o presidente que indicou mais rápido: levou apenas dois dias para nomear Mauricio Correa ministro do Supremo.

O constitucionalista Gustavo Binenbojm lembra que assunto poderia ter até mesmo relação direta com um pedido de impeachment de Dilma, embora a Constituição não fixe um prazo para a Presidente fazer a indicação. Mas bastaria que alguma entidade legitimada (partido político, entidade de classe, mesa da Câmara ou do Senado, Procurador-Geral da República, por exemplo) ajuizasse uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão.

Aí, como se trata de omissão de providência administrativa, o Supremo poderia fixar um prazo de trinta dias para que a Presidente efetuasse a indicação e submetesse o nome à apreciação do Senado, de acordo com o artigo 102, parágrafo 2º, da Constituição. Caso a Presidente persistisse na omissão, aí estaria caracterizado o descumprimento de ordem judicial e, por conseguinte, o crime de responsabilidade previsto no art. 85, inciso VII, da Constituição.

Há uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB com pedido um pouco diferente. Eles pedem que o Supremo fixe um prazo, e caso tal prazo decorra sem que haja a indicação, que o Supremo declare que a competência se transferiu para o Senado.

O Ministro Teori Zavascki rejeitou a petição inicial, “a meu ver com razão, pois o Supremo não poder legislar, muito menos para alterar a própria Constituição”, explica o constitucionalista. Seria uma ironia, ressalta Binenbojm, que, diante desse mar de corrupção, a Presidente sofresse o impeachment por conta de uma situação como essa. “Mas, na hipótese mais provável, o Supremo zelaria pela sua dignidade e a obrigaria a fazer logo a indicação”.

Eliane Cantanhêde - A origem

- O Estado de S. Paulo

Começa a ficar clara a resposta a uma dúvida crucial do escândalo histórico da Petrobrás: o ovo ou a galinha? Um cartel de empreiteiras aliciou políticos, ou partidos do governo manipularam um cartel de empreiteiras? A Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça Federal começam a desvendar o mistério com o nome nada sutil da nova fase da Operação Lava Jato: A Origem.

O início de tudo isso não foi um cartel de empresas desses que existe desde sempre, nem foi uma corrupção, digamos, trivial. A verdadeira origem da sangria da Petrobrás foi um esquema armado por partidos e políticos no poder a partir de 2003.

Primeiro, a Lava Jato prendeu doleiros, ex-diretores da Petrobrás e grandes executivos de empreiteiras, deixando de lado os parlamentares, que têm o foro privilegiado do Supremo Tribunal Federal. Comeu pelas bordas, até chegar no ponto central, ou na "origem": os políticos.

Sem poderes para botar a mão em senadores, deputados e governadores, a Justiça Federal do Paraná chegou ao chamado "cerne da questão" por vias indiretas: prendendo na sexta-feira três ex-deputados, ou seja, três políticos sem mandato e sem foro privilegiado: André Vargas, ex-petista, Luiz Argôlo, do Solidariedade, e Pedro Corrêa, o reincidente do PP, já preso pelo mensalão.

Essas prisões vão definindo os sujeitos e compondo a narrativa com calma e clareza, com princípio, meio, fim. Também ampliam o raio de ação, que deixa de ser unicamente a Petrobrás e suas contratadas, chega à Caixa Econômica Federal e atinge a própria administração direta, com o Ministério da Saúde no foco.

Como sempre, as quantias são de tirar o fôlego: R$ 40 milhões para cá, R$ 80 milhões para lá... De uma coisa não se pode acusar os bandidos de colarinho branco no Brasil: não são nada modestos. Tudo é na casa de milhões, senão bilhões.

Enquanto isso, a presidente Dilma Rousseff investe na sua "agenda positiva" e é capaz de tirar fotos fazendo coraçãozinho com as duas mãos e até de dizer que a Petrobrás está uma beleza. Agora, além de entrega de casas populares, ela ganhou de presente do Facebook o "Banda Larga para todos", muito importante, aliás.

Bem, Dilma tem mesmo de correr atrás do prejuízo, dando uma entrevista atrás da outra para a mídia estrangeira e encontrando-se com o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, no Panamá, para marcar a viagem a Washington ainda neste semestre, tentar recuperar a confiança, atrair investimentos e reabrir vias comerciais da maior potência e do maior mercado do planeta. Não era sem tempo. E como o Brasil anda precisando!

Isso remete a um regime parlamentarista. Dilma como chefe de Estado, ou "chanceler", enquanto o vice Michel Temer e o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, como chefes de governo, dividem os dissabores da crise econômica e política e disputam as glórias de primeiros-ministros.

Para Fernando Henrique Cardoso, a liderança de Dilma "está abalada". Para Aécio Neves, a entrega da política para Temer foi "renúncia branca". Mas não custa lembrar que o PSDB surgiu em 1988 com a bandeira do parlamentarismo e, nesse regime, quem cai não é o presidente, não é Dilma.

Se o ajuste fiscal e a economia derem com os burros n'água, Levy cai. Se a política explodir, Temer explode junto. Mas a presidente - ou "rainha da Inglaterra", como definem os mais ácidos - só renuncia se quiser ou se sofrer um impeachment à moda presidencialista, o que parece muito improvável.

Dilma está jogando nacos de poder às feras, mas não é dessas de renunciar. E, como admitem gregos e troianos, oposicionistas e governistas, o impeachment não depende só de Lula, PT, PMDB e muito menos só de PSDB, DEM e PPS. Depende das ruas.

Segundo todas as previsões, as manifestações deste domingo, 12 de abril de 2015, deverão ser bem menores do que as 15 de março. Mas são esses atos que dão luzes, ou rumos, ao governo, aos políticos e aos analistas. Cabe observar. E aprender.

Bernardo Mello Franco - Privilégio supremo

- Folha de S. Paulo

A prisão de três ex-deputados na sexta-feira pode gerar uma falsa expectativa em quem vai protestar hoje contra o petrolão. Se é o seu caso, não se anime. Para os 35 parlamentares da Lava Jato, a conta ainda vai demorar a chegar.

André Vargas, Luiz Argôlo e Pedro Corrêa não deixaram mais rastros do que os outros políticos investigados. Apenas perderam o mandato e, com isso, passaram a responder por seus atos na Justiça como qualquer cidadão brasileiro.

A Constituição afirma que todos são iguais perante a lei, mas garante que alguns sejam mais iguais do que os outros. Isso vale para os deputados, senadores e governadores do petrolão. Eles só poderão ser julgados por tribunais superiores, graças ao chamado foro privilegiado.

Essa diferença de tratamento dividiu a Lava Jato em três. Um núcleo avança com velocidade na 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, do juiz Sergio Moro. Lá são investigados doleiros, empresários, hierarcas da Petrobras e ex-parlamentares. Muitos já conheceram a carceragem da PF paranaense ou o Complexo Médico-Penal de Pinhais.

Os outros dois núcleos da operação caminham a passos lentos. Um está no Superior Tribunal de Justiça, onde correm os inquéritos contra os governadores do Rio e do Acre. O outro subiu para o Supremo, que deverá julgar os 35 parlamentares.

Embora a Lava Jato tenha começado há mais de um ano, as investigações que envolvem autoridades só passaram a existir para a Justiça no mês passado. Por isso, deputados e senadores sob suspeita continuam a tocar a vida em Brasília. Os mais ousados chegam a usar a tribuna para atacar os procuradores.

O ex-ministro Joaquim Barbosa costumava definir o foro privilegiado como "uma esperteza que os políticos conceberam para se proteger". Ele estava certo. No caso do mensalão, o Supremo surpreendeu ao condená-los. No petrolão, ainda será preciso esperar para ver.

Fernando Gabeira- Hora e vez de Sibá Machado

• Mais uma vez, o povo na rua. Grande parte de nossa esperança está depositada na sociedade.

- O Globo / Segundo Caderno

Mais uma vez, o povo na rua. Grande parte de nossa esperança está depositada na sociedade. Ela é quem pode dinamizar a mudança. A maioria vai gritar “Fora Dilma”, “Fora PT”. Não há espaço agora para outras palavras. No entanto, a saída de Dilma é apenas o começo. Vai ser preciso um ajuste econômico. Todos deveriam se informar e tomar posição sobre ele. O governo Dilma não se mexe na redução de ministérios e cargos de confiança. Não há um projeto sério de contenção de gastos com a máquina. E sem isso, o impacto do ajuste, aumentando impostos e cortando benefícios sociais, dificilmente será digerido pelo Congresso e pela própria sociedade.

O Congresso é passível de suborno com verbas e cargos. A sociedade, não. Mas um simples ajuste econômico merecia um pouco mais de reflexão para além deste domingo.

Vale a pena retomar um crescimento apoiado no consumo de carros e eletrodomésticos? É possível superar a limitação do voo da galinha na economia brasileira, achar um caminho sustentável?

Os rios brasileiros estão exauridos. Vamos continuar a destruição? A Califórnia luta há anos com a escassez de água. É um estado que sempre soube se reinventar. Abriga a indústria do cinema, o Vale do Silício. Apesar de toda a experiência, a crise atual ameaça seu futuro.

Cada vez que um grande movimento vai às ruas pedindo a saída de Dilma, ela, na realidade, vai saindo aos pouquinhos. Hoje não controla a política, nem a economia. Inaugura, faz discursos para a claque. Apegado à negação de seus erros, o PT é quase um fantasma. Seu líder na Câmara é Sibá Machado. Ele acha que as manifestações do dia 15 e também as de hoje são organizadas pela CIA. E foi ao ministro da Fazenda pedir novos financiamentos para as empreiteiras do Lava-Jato.

A tendência é achar que o Sibá Machado não existe, que é criação de algum escritor dedicado ao realismo fantástico. Mas Sibá existe e ocupa a liderança de um partido com 64 deputados na Câmara. Como foi possível Dilma ser presidente do Brasil? Como foi possível Sibá Machado tornar-se o líder de um partido que está no poder há 12 anos?

Não há espaço para explicar tudo. Mas Dilma é fruto da vontade de Lula, que detesta a ideia de surgirem outros líderes no partido. Sibá é o fruto da disciplina de quem espera na fila a hora do revezamento. Todos podem ser líderes, independentemente de estarem preparados. É a hora e a vez de Sibá Machado.

Estamos atravessando uma atmosfera de “Cem anos de solidão”. Sibá pede mais dinheiro público para quem nos roubou. Dilma afirma que sua tarefa é recuperar a Petrobras, que ela e o PT destruíram. Não acredito que sejam cômicos por vocação, embora o Sibá leve muito jeito. Isaac Deutscher, o grande biógrafo de Trotsky, demonstra que muitas vezes os governos fazem bobagem porque já não têm mais margem de manobra.

O buraco em que o PT se meteu é mais grave do que a estreiteza da margem de manobra. É a escolha de quem se agarra à negação para fugir da realidade. Por isso é que, além dos incômodos da crise, do assalto às estatais e fundos de pensão, o PT irrita. São muitas as pessoas simples que se sentem não apenas assaltadas como contribuintes, mas desrespeitadas pelo cinismo oficial.

Já é um lugar comum afirmar que vivemos a maior crise dos últimos tempos. Nela, entretanto, há um dado essencial: aparato político burocrático segue afirmando que a realidade é a que vê e não a compartilhada por milhões de pessoas na rua.

O que pode acontecer numa situação dessas? Collor saiu de nariz empinado e submergiu alguns anos. Ele chamava verde e amarelo, aparecia preto. O PT chama vermelho, aparecem verde e amarelo.

O curto circuito pictórico parece não dizer nada para eles. No fundo, havia em Collor uma espécie de orgulho pessoal. No PT, há uma confiança na manipulação. O partido no poder escolheu o caminho mais espinhoso. Seu líder na Câmara parece delirar, mas apenas quer cumprir suas tarefas elementares de negação.

O assalto à Petrobras não existiu. As manifestações foram arquitetadas pela CIA, e as empreiteiras, coitadinhas, precisam de grana oficial para financiar nossas campanhas. E os marqueteiros nos observam como jacarés tomando sol. Daqui a pouco vão entrar em ação para convencer a todos que o Brasil é maravilhoso e vai ficar melhor ainda.

É assim que a negação se reflete numa alma simples como a de Sibá Machado. Ele vem de uma região marcada pelas experiência místicas com a ayahuasca, planta que provoca visões. Um pouco distante dali, mas também na Amazônia, o pastor Jim Jones comandou um suicídio coletivo.

Na hora e vez de Sibá, o próprio inferno será refrigerado. Ganha-se muito dinheiro quando se passa pela cadeia, como fez José Dirceu. E há sempre Cuba e Venezuela para um recuo estratégico.

Vamos para a rua fingindo que os agentes da CIA nos organizam. No fundo, sabemos que se dependêssemos deles, correríamos o risco de uma grande trapalhada.

Mas pra que contrariar Sibá Machado e o PT na sua fase tardia ? De uma certa forma, já não estão entre nós. Morreram para o debate racional.