sexta-feira, 10 de abril de 2015

Opinião do dia – Aécio Neves

PT passou boa parte da sua existência querendo provar que era diferente dos outros. Hoje faz um esforço enorme para se mostrar igual aos outros. Mas nós não somos igual ao PT. Nós não recebemos financiamento em troca de superfaturamento de obras, como aconteceu com o desvio de recursos públicos e segundo as inúmeras delações premiadas, com o PT."

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Aécio Neves, senador (MG) e presidente nacional do PSDB

Petrobras estima propina de até R$ 6 bi

• Valor, calculado para o balanço, se refere a 3% de contratos e aditivos feitos com empresas citadas na Lava Jato

• Estatal decidiu usar o percentual mais alto citado nas delações, para evitar acusação de minimizar as perdas

Natuza Nery – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A Petrobras estima que o cálculo de perdas com o esquema de corrupção na estatal ficará entre R$ 5 bilhões e R$ 6 bilhões. A conta atinge todos os contratos e aditivos firmados com as empresas citadas na Operação Lava Jato, da Polícia Federal, e deve constar do balanço de 2014.

Conforme a Folha apurou, o valor próximo a R$ 6 bilhões corresponde a 3% dos ativos suspeitos de algum tipo de desvio. Trata-se do percentual mais alto relatado nas delações premiadas feitas por ex-executivos e empresários suspeitos de envolvimento em irregularidades.

Segundo pessoas que atuaram na revisão dos contratos, a conta de "pagamentos indevidos" é conservadora justamente para mostrar aos investidores que a Petrobras não está disposta a esconder prejuízos e, portanto, merece ter seu balanço auditado e aprovado pela PwC.

A empresa quer apresentar seus demonstrativos financeiros até o dia 20 e, assim, colocar um ponto final na novela que se arrasta desde 31 de outubro de 2014, quando a PwC se recusou a assinar o resultado do terceiro trimestre de 2014, porque altos executivos que assinariam a prestação de informações ficaram sob suspeita.

Nota rebaixada
A recusa abriu uma crise sem precedentes e contribuiu para que a companhia perdesse, neste ano, o chamado grau de investimento (selo de local seguro para se investir) por parte da Moody's, agência de classificação de risco.

Para tranquilizar investidores e a auditoria, a Petrobras, hoje liderada por Aldemir Bendine, precisou submeter à SEC (reguladora do mercado de capitais dos EUA) os critérios de cálculo dos desvios. Para isso, adotou o limite de 3% como referência.

Auxiliares presidenciais afirmam que o Palácio do Planalto está otimista e aguarda para o dia 17 a apresentação do balanço chancelado pelos auditores independentes.

Contratos viciados
Em depoimento à Justiça Federal no ano passado, Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, afirmou que o PT chegava a ficar com 3% sobre o valor dos contratos da estatal, dependendo das diretorias envolvidas. O partido nega ter recebido o dinheiro.

Nesta quinta (9), os advogados de Costa afirmaram, em petição, que não houve sobrepreço porque os percentuais desviados para partidos "eram retirados da margem das empresas" (leia mais na página A5).

O ajuste no valor dos ativos só aparecerá de forma individualizada, no balanço, nos casos de refinarias paralisadas ou colocadas à venda.

Os empreendimentos ainda em uso são avaliados em conjunto, com base no valor de mercado.

O balanço precisará ser auditado e aprovado pela PwC antes de passar pelo crivo do conselho de administração.

A estatal quer publicar o balanço nos próximos dias, para acalmar o mercado.

A partir de 31 de maio, o atraso daria aos credores o direito de pedir a antecipação do pagamento de dívidas, o que aprofundaria os problemas de caixa da estatal.

Tesoureiro do PT não explica reuniões com delatores

Encontro sem explicação

• À CPI, Vaccari admite ter ido se reunir com doleiro Youssef, mas alega não saber o motivo

Eduardo Bresciani e André de Souza – O Globo

BRASÍLIA - Interrogado durante sete horas na CPI da Petrobras, o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, admitiu ontem ter tido encontros com os delatores da Operação Lava-Jato Pedro Barusco e Alberto Youssef, que o acusam de receber milhões de reais em propinas do esquema de corrupção na estatal, mas negou repetidas vezes que tenha tratado de finanças com os dois. Em relação a Youssef, um doleiro que anteriormente já tinha sido preso no escândalo do Banestado, Vaccari chegou a afirmar que não sabe o motivo pelo qual esteve no escritório dele, em São Paulo.

- Eu conheci Alberto Youssef casualmente, há muitos anos - alegou o tesoureiro: - Não tenho relacionamento com ele. Nunca tratei de finanças do PT ou de finanças em geral com ele.

Youssef declarou em seu depoimento à Justiça que mandou entregar dinheiro para uma cunhada de Vaccari e para o próprio, inclusive na porta do diretório nacional do PT, em São Paulo. Diante das inúmeras perguntas dos parlamentares, o tesoureiro contou que foi ao encontro a chamado do próprio Youssef. Mas que, ao chegar ao local, o doleiro não estava. Ele disse que ficou apenas quatro minutos no prédio.

- Volto a insistir. Eu fui ao escritório do senhor Alberto Youssef sem agenda porque ele havia me convidado para ir lá. Portanto, essa dúvida que o senhor tem eu também tenho - disse Vaccari a um deputado: - O senhor Youssef mandou recado para eu ir ao seu encontro. Compareci lá e ele não estava. Fui embora. Já considero essa pergunta respondida inúmeras vezes.

Em relação a Pedro Barusco - ex-gerente da Petrobras que estimou que o PT recebeu até US$ 200 milhões de propina por intermédio de Vaccari - o tesoureiro deu versão bem parecida. Afirmou que nos encontros com Barusco as conversas tratavam de "política e assuntos diversos":

- Eu conheci Pedro Barusco quando ele já estava aposentado. Quem me apresentou foi o senhor Renato Duque. Foi um jantar. Tive poucos contatos. Ele nunca fez parte da minha intimidade. Nunca tratei com ele assuntos sobre finanças do partido ou sobre finanças. Sempre havia mais pessoas junto e, às vezes, o Renato Duque.

As negativas de Vaccari e suas respostas curtas e repetitivas irritaram a oposição, que defende acareação entre ele e os delatores da Lava-Jato. Barusco já reiterou à CPI suas acusações.

- Essa acareação é necessária e vai ser muito boa - afirmou o sub-relator Bruno Covas (PSDB-SP).

Antes de ser interrogado, Vaccari se complicou ao tentar fazer uma apresentação, com slides, de uma reportagem sobre as doações de recursos para campanhas políticas feitas pelas empresas envolvidas na Lava-Jato, com o objetivo de defender a legalidade das doações recebidas pelo PT. Mostrou que, nas eleições de 2010 e 2014, os três grandes partidos (PMDB, PT e PSDB) receberam montantes equivalentes. Mas se enrolou ao citar o total de doações para o PT feitas em 2014 por empresas não investigadas nos desvios da Petrobras. O gráfico que ele mostrou tinha a inscrição 20%, quando o correto seria 65%.

- Esse gráfico aqui tá errado. Aqui tá errado. Aqui o número é 65% das empresas investigadas, aliás, não investigadas, que doaram ao PT. Das empresas investigadas foram 35%. Depois tenho que corrigir essa distorção aí - afirmou o petista.

Sobre acareação com Barusco e Youssef, ele disse que está à disposição das autoridades. Afirmou que seu cargo pertence ao PT e que não houve ainda pedido formal de sua saída. Questionado se ainda tem apoio do partido, disse, laconicamente: "Até hoje (ontem), sim".

Deputados da oposição o compararam a Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT condenado no processo do mensalão por corrupção passiva.

- É igual ao Delúbio. O senhor só não é debochado como ele. Mas o senhor é cínico, hipócrita - afirmou Onyx Lorenzoni (DEM-RS).

O líder do PSDB, Carlos Sampaio (SP), afirmou que ele terminará preso e o PT, extinto.

Os petistas defenderam Vaccari.

- A oposição está querendo o terceiro turno - disse Afonso Florence (PT-BA), citando políticos do PSDB que respondem a processos.

O presidente do PSDB, o senador Aécio Neves (MG), reagiu às informações de Vaccari de que seu partido recebeu o equivalente de recursos do PT nas doações de empreiteiras da Lava-Jato.

- O PT passou boa parte da sua existência querendo provar que era diferente dos outros. Hoje, faz um esforço enorme para se mostrar igual aos outros. Mas nós não somos iguais ao PT. Não recebemos financiamento em troca de superfaturamento de obras - disse Aécio.

Cem dias nas mãos de Levy e do PMDB

• Dilma completa período simbólico sem conseguir dar rumo ao segundo mandato

Vera Rosa, Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Cem dias completados hoje. Nesse período simbólico de todo início de governo, a presidente Dilma Rousseff não conseguiu criar uma agenda positiva para se contrapor às denúncias de corrupção na Petrobrás nem explicar à população por que foi reeleita em outubro passado com um discurso contrário a cortes e apertos e agora governa adotando medidas amargas na economia.

Desde que iniciou o segundo mandato, em janeiro, Dilma está isolada. Sem conseguir dialogar com os atores econômicos e políticos, tornou-se refém de seu ministro da Fazenda, Joaquim Levy - de uma escola liberal tão atacada por ela durante a campanha -, e de seu principal aliado no Congresso, o PMDB, partido cujos integrantes sempre dizem se sentir "desprezados" pela presidente e por outros petistas.

"A vida é mais complexa do que parece", costuma repetir Dilma aos auxiliares mais próximos.
Com a popularidade em queda - 64% dos brasileiros consideram seu governo ruim ou péssimo - e a base de sustentação parlamentar em frangalhos, a presidente sofre uma derrota atrás da outra no Congresso. Todas elas protagonizadas pelo PMDB, que chefia a Câmara dos Deputados com Eduardo Cunha (RJ) e o Senado com Renan Calheiros (AL). Os dois peemedebistas - ao lado de outros 33 parlamentares - são alvo da Operação Lava Jato, um dos principais fatores da desestabilização política. Desde que a dupla passou a ser considerada suspeita oficialmente, com a abertura de inquéritos no Supremo Tribunal Federal, o clima político recrudesceu.

Em pouco mais de três meses de segundo mandato, Dilma já trocou cinco ministros. Além de Cid Gomes, que deixou a pasta de Educação após protagonizar um confronto direto com Cunha na Câmara, saíram Thomas Traumann (Comunicação Social), defenestrado após vazamento de um documento que apontava "caos político" no governo; Pepe Vargas, que foi transferido para Direitos Humanos logo após Dilma ser obrigada a passar a articulação política do governo para o vice Michel Temer; e Marcelo Neri, substituído na Secretaria de Assuntos Estratégicos pelo peemedebista Mangabeira Unger. Ideli Salvatti, que estava nos Direitos Humanos foi a quinta a perder o cargo.

Oposição. "São cem dias de desgoverno", disse ontem o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), que levou um bolo preto ao plenário com a inscrição "Sem (sic) dias de Dilma 2", acompanhado de duas estrelas vermelhas do PT. "Esse bolo amargo deveria ser servido apenas à bancada do governo", disse Mendonça.

Até dois dias atrás, quando Dilma oficializou seu vice peemedebista no posto de articulador político, quem se destacou na função foi o ministro da Fazenda. Levy foi obrigado a entrar em cena para negociar com os parlamentares e pedir apoio ao ajuste fiscal que o governo tenta aprovar. Mas até o PT é contra as medidas, que restringem o acesso de trabalhadores a benefícios como seguro-desemprego e abono salarial.

"Levy tem se esforçado bastante para aprovar as medidas, mas um ministro da Fazenda não pode se expor assim", disse o senador Delcídio Amaral (PT-MS). "A articulação política do governo precisa funcionar."

Nesses cem dias, não foram poucas as queixas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação à sua sucessora, que não lhe dá ouvidos. Nos bastidores, até mesmo auxiliares de Dilma dizem que ela não tira a crise de cima da mesa e "o máximo que consegue é encaixá-la na gaveta".

Num cenário marcado por problemas com aliados, nomeações emperradas, inflação alta, "pibinho" e desemprego batendo à porta, a crise política acabou se convertendo no principal fator de incerteza na economia.

Se, por um lado, a chegada de Levy aumentou a confiança de que as contas públicas serão ajustadas, abrindo espaço para a queda dos juros, por outro, as dificuldades de relacionamento do Planalto com o Congresso lançam dúvidas sobre o quanto será possível avançar com os cortes de gastos e aumento das receitas.

É por causa desse ambiente negativo que os investimentos privados - grande aposta do governo para a retomada do crescimento - não deslancham. Do ponto de vista dos investidores estrangeiros, por exemplo, o momento é favorável para trazer recursos ao Brasil. O dólar chegou a valores astronômicos, ultrapassando, em muito, a marca dos R$ 3 e a Operação Lava Jato forçou as grandes construtoras e a Petrobrás a colocarem ativos à venda. Mesmo assim, muitos optaram pela cautela, à espera de um quadro político mais claro.

Ruas. Dilma, que assumiu com o discurso de que ia defender a Petrobrás dos "inimigos externos", foi obrigada a afastar da presidência da estatal sua amiga Graça Foster e viu a empresa entrar em uma crise sem precedentes. Além dos problemas da economia e da política, Dilma enfrentou apagões, greve de caminhoneiros e uma manifestação contrária a seu governo que reuniu milhares nas ruas do País no dia 15 de março - os protestos devem se repetir no próximo domingo. No Planalto, a aposta é que - aprovado o ajuste fiscal - a economia começará a reagir até o fim do ano. Assim, os três anos seguintes serão menos tumultuados.

SEM DIAS DE DILMA 2

Temer: 'Dilma me pediu ajuda para governar'

• No Rio, presidente confirma que "autonomia está dada" para vice fazer articulação política com Congresso

Tatiana Farah – O Globo

SÃO PAULO - Recém-nomeado para fazer a articulação política do governo, o vice-presidente Michel Temer (PMDB) afirmou ontem que terá autonomia para agir com o Congresso, inclusive oferecendo cargos e fazendo nomeações que contemplem a base aliada. Temer teve um encontro privado com o ex-presidente Lula, que havia aconselhado a presidente Dilma Rousseff a dar mais espaço ao PMDB e mais poder ao vice-presidente. Temer também conversará com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, na próxima semana, para discutir reforma política.

Após o encontro com Lula, o vice-presidente negou que o país viva um momento de ingovernabilidade e atribuiu à sua experiência parlamentar o convite para assumir a coordenação política.

- Ela (Dilma) me disse: Somos parceiros, você vai me ajudar a governar. E e é isso que estou fazendo - resumiu.

Questionado pelos jornalistas sobre a autonomia que teria na função de articulador político, Temer foi taxativo:

- A presidenta me deu poderes para tanto. Evidentemente, que eu sempre conversarei com ela, afinal, ela é a presidenta da República. Eu tenho autonomia para fazer todos os levantamentos, todos os estudos (de mapeamento de cargos), não apenas nesse ponto, que eu diria que é de menor relevância, mas no diálogo com o Congresso Nacional. É o que me cabe e eu farei com muito prazer.

No Rio, para entregar unidades do Minha Casa Minha Vida, a presidente afirmou que Temer tem a autonomia de seu cargo para renovar o diálogo do governo com o Congresso.

"Ele é do coração do governo"
- O vice-presidente, assim como qualquer outra pessoa que integre o governo, leva em consideração que a nossa base é integrada por diversos partidos. Então, dado que os nossos compromissos são comuns e ele os conhece todos, até porque participou desses compromissos, a autonomia dele está dada pelo fato de que ele integra o governo. Ele é do coração do governo, não é uma pessoa estranha. Ele vive o dia a dia do governo - disse Dilma.

A presidente buscou reforçar a intenção de que dividirá com os aliados, sobretudo com o PMDB, as decisões que vinha centralizando. Dilma procurou mostrar que confia na habilidade de Temer para obter uma trégua ao governo.

- É bem sintética a minha avaliação: a (expectativa em relação a Temer é a) melhor possível. Tenho certeza que Michel Temer tem todas as condições: tem a autoridade de ser o vice-presidente e a experiência de vida, inclusive tendo sido presidente da Câmara Federal. E, de outro lado, ele tem uma imensa capacidade para o diálogo, para o consenso, para construir toda a relação que é necessária para uma coalizão da envergadura da nossa - elogiou a presidente.

Segundo Temer, a reunião com Lula, que aconteceu no instituto do ex-presidente, foi marcada pela reforma política. Mas Temer admitiu que Lula falou sobre a nova função do peemedebista.

- Delicadamente, ele me disse que talvez eu me saia bem - comentou.

Temer minimizou o potencial de conflito com os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Eduardo Cunha, ambos do PMDB e que estão em rota de colisão com o governo.

- Eles são meus companheiros, né? Meus amigos. E nós temos estabelecido muito bem essa conceituação institucional. O Congresso Nacional tem suas competências e as exerce com muita sobranceria. De outro lado, evidentemente, o Executivo não governa sozinho, governa com o Congresso.

Raupp presidirá PMDB
Temer disse que a decisão sobre sua saída da presidência do PMDB só deve ser tomada na próxima semana. Sua intenção de colocar o senador Romero Jucá (RR) em seu lugar se frustrou ontem diante da sinalização da segunda vice-presidente do partido, deputada Irís de Araújo (GO), de que não abriria mão do cargo. Com isso, o primeiro vice, o senador Valdir Raupp (RO), que concordara em ceder a prerrogativa para Jucá, assumirá a presidência do PMDB na próxima semana. Raupp é um dos citados nos inquéritos da Lava-Jato como receptor de doações de empresas investigadas.

Outro revés para o governo foi a aprovação, na Câmara, de uma emenda que abre o sigilo das operações do BNDES. Ela ainda será analisada pelo Senado. Por outro lado, o governo conseguiu enterrar mais uma CPI, a dos fundos de pensão, com a retirada de assinaturas dos cinco senadores do PSB. Interlocutores garantem que Temer comandou a operação que levou ao arquivamento da CPI. Em nota, os senadores do PSB alegaram que a criação de mais uma CPI poderia tirar o foco de temas mais importantes para tirar o Brasil da crise econômica, e que irão focar em três CPIs: Zelotes, HSBC e extermínio de jovens.

No fim da tarde de ontem, Temer assumiu a presidência da República interinamente, em razão da viagem de Dilma para a Cúpula das Américas, no Panamá. ( Colaboraram Alexandre Rodrigues, Simone Iglesias e Maria Lima)

Sem economia e política, resta o social

• Após delegar poderes a Levy e Temer, Dilma sinaliza que vai focar em agenda positiva

Alexandre Rodrigues – O Globo

Ao afirmar ontem que a autonomia do vice-presidente Michel Temer na articulação política "está dada", a presidente Dilma Rousseff recorreu à mesma expressão usada pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, quando foi apresentado por ela como novo ocupante da pasta, em novembro de 2014. Com a economia e a política entregues a dois agentes de peso que se tornaram verdadeiras tábuas de salvação de seu governo, a presidente reforçou ontem seu discurso social, indicando que pode se concentrar nessa área para tentar gerar uma agenda positiva.

Ainda nas primeiras 24 horas como articulador, Temer avançou costurando um acordo de líderes dos partidos da base aliada em torno das medidas do ajuste fiscal que precisam ser aprovadas no Congresso. Dessa forma, o vice-presidente se associa oficialmente ao esforço de Levy - a quem já vinha ajudando nos bastidores a abrir portas no Congresso - para superar o maior desafio do governo: fechar as contas.

Dependente do sucesso da dupla, a quem precisa delegar de fato, Dilma dá sinais de que pode se voltar para as políticas sociais do governo para tentar recuperar sua popularidade em baixa. Segundo a pesquisa Ibope/CNI divulgada no início do mês, ela tem a aprovação de apenas 12% dos brasileiros.

Ontem, a presidente voou de Brasília a Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, para uma visita de menos de duas horas para entregar 500 unidades habitacionais do Minha Casa Minha Vida num reassentamento de famílias atingidas por enchentes. No discurso, Dilma deixou claro que vê o programa habitacional como sua iniciativa mais bem-sucedida.

Embora sem citar o ambiente de restrição orçamentária, enfatizou que o programa "vai ter sim" uma terceira etapa com mais 3 milhões de moradias para famílias de baixa renda, totalizando 6,8 milhões de unidades até 2018. Deixou claro que a tesoura de Levy não chegará ao projeto que virou a vitrine de seu governo. Lembrou ainda que o programa foi acusado de eleitoreiro, em 2009, quando, ainda ministra de Lula, se preparava para concorrer à Presidência pela primeira vez. Após enfileirar os números de casas entregues, disse que os resultados mostram "competência".

Dilma também defendeu outras ações sociais do governo, como o programa Mais Médicos e investimentos em saneamento. Diante de uma plateia restrita a beneficiários que não batem panela e nem economizam aplausos, contou que se esforça especialmente para participar das cerimônias do Minha Casa Minha Vida. De fato, de 13 viagens feitas por Dilma no país este ano, cinco foram para entregar mais de 4 mil casas.

Ela avisou que pretende seguir fazendo isso ao longo do ano, quando ficarão prontas 1,6 milhão de moradias.

Lula e Temer discutem cargos do 2º escalão

• Segundo o vice-presidente, Dilma lhe deu permissão para negociar com siglas aliadas

Catia Seabra, Marina Dias – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Em um momento de dissonância na base aliada, a presidente Dilma Rousseff delegou a seu vice, Michel Temer (PMDB), a tarefa de distribuir entre partidos os cargos do segundo escalão do governo.

Segundo a Folha apurou, foi traçado um prazo de duas semanas para que Temer faça a negociação com o comando das siglas aliadas.

Na tarde desta quinta-feira (9), o vice-presidente discutiu a montagem com o ex-presidente Lula, em uma reunião na capital paulista.

O encontro aconteceu três dias depois de Temer assumir a articulação política do governo. E foi Lula quem sugeriu a escolha de um peemedebista para a função.

"A presidente me deu poderes para tanto [fazer nomeações]. Evidentemente sempre falarei com ela, mas tenho autonomia para fazer os levantamentos", disse Temer ao sair do Instituto Lula.

O ex-presidente, por sua vez, ficou encarregado de dar fim às disputas dentro do PT e acomodar o partido no segundo escalão do governo.

Na próxima semana, Temer conversará com os líderes dos demais partidos aliados. No PMDB, sua prioridade é a nomeação do ex-deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) para o Ministério do Turismo, ainda uma costura no primeiro escalão.

"Delicadamente, ele [Lula], disse que talvez eu me saia bem", brincou.

Publicamente, Temer justifica as reuniões com o argumento de que precisa articular uma reforma política. PMDB e PT divergem sobre o modelo ideal. "É fundamental fazer uma reforma política, mas qual será é o Congresso que irá definir", explicou.

Os principais partidos da base, a começar pelo próprio PT, reclamam da morosidade da presidente Dilma na composição do governo.

Uma das queixas recorrentes está na demora para a indicação dos integrantes das assessorias dos ministérios.

Alguns ministros recém-empossados ainda trabalham com equipes de antecessores.

Desemprego no país sobe para 7,4% no trimestre

• Desemprego nacional avança para 7,4%, e ganho de renda perde fôlego no início do ano

Clarice Spitz – O Globo

A desaceleração da economia levou ao aumento do desemprego em todo país no início deste ano. Com uma parcela maior de pessoas à procura de uma vaga, a taxa de desocupação acelerou para 7,4% no trimestre móvel encerrado em fevereiro, ante 6,8% do mesmo período do ano passado. É a mais alta desde o trimestre encerrado em maio de 2013, quando fora de 7,6%. Na comparação com curto prazo, o movimento também foi de alta, já que no trimestre encerrado em novembro a taxa estava em 6,5%.

Pela metodologia do IBGE na elaboração da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios, a Pnad Contínua, o trimestre terminado em fevereiro incorpora dados de dezembro, janeiro e fevereiro, o que suaviza variações mais bruscas dos indicadores. A pesquisa confirma uma tendência que já era observada nas regiões metropolitanas, pela Pesquisa Mensal de Emprego (PME) que mostrara que, em fevereiro, a taxa de desemprego subiu para 5,9%, e a renda caiu.

Segundo o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo, existe uma tendência de piora no mercado de trabalho, desde o fim do ano passado, nos cerca de 3.500 municípios cobertos pela pesquisa.

- Num período recente, há uma tendência de alta na taxa de desocupação. A grande expectativa é saber quando ela vai cair. Desde 2014 há um processo de que, ainda que sejam gerados postos de trabalho, a pressão no mercado pelo lado da procura é mais forte - afirmou Azeredo.

Para pesquisador da FGV, piora forte
O pesquisador do Ibre, da Fundação Getulio Vargas (FGV), Rodrigo Leandro de Moura vê uma piora forte na passagem do trimestre encerrado em janeiro para aquele terminado em fevereiro. Ele cita a queda de 0,4% na ocupação no período, enquanto a força de trabalho aumentou em 0,25%. Segundo Moura, a estimativa é que a taxa de desemprego do país termine o ano entre 7,5% e 7,8%. Em 2014, a taxa média foi de 6,8%.

- A geração de postos está bem mais fraca e não consegue absorver os novos entrantes. A retração da população ocupada, na margem, já era observada na Pesquisa Mensal de Emprego e na Pnad Contínua ainda ocorria - afirmou Moura.

A piora nos dados mais recentes também chamou a atenção de Rafael Bacciotti, da Tendências Consultoria. Ele considera que a procura de pessoas por um posto de trabalho deverá se intensificar nos próximos meses, e a renda tende a perder mais fôlego. A renda média real no trimestre móvel encerrado em fevereiro foi de R$ 1.817, uma alta 1,1% em relação ao mesmo período do ano passado e de 1,3% frente ao trimestre encerrado em novembro.

Efeito do salário mínimo
Segundo o IBGE, isso está ligado à dispensa de temporários e, possivelmente, à perda expressiva de ocupação entre pessoas de baixa renda, o que influencia no mercado de trabalho.

Bacciotti, da Tendências, ressalta que a renda real passou de avanço de 2,1% no trimestre encerrado em janeiro em comparação ao mesmo período do ano passado para 1,1% do trimestre encerrado em fevereiro.

- Assim como na Pesquisa Mensal de Emprego, há um movimento de alta do desemprego mais bem delineado, uma deterioração no mercado de trabalho mais claro no início deste ano, com enfraquecimento da ocupação, e, em um cenário de contração da atividade e de expectativa de crescimento, as expectativas são ainda piores - afirmou.

Para o professor da Unicamp Claudio Dedecca, a renda mostrou avanço no trimestre encerrado em fevereiro - enquanto caiu nas metrópoles de acordo com última PME - porque ainda captou os efeitos do aumento do salário mínimo. Segundo ele, a inflação já corroeu parte do ganho de renda de janeiro e ainda deverá se fazer sentir nos dados da Pnad Contínua:

- O efeito já será negativo no dado de março. A situação do mercado de trabalho está mais tensa que no ano passado, mas acho que é prematuro dizer que ele está explodindo e que o desemprego vai a dois dígitos.

Para Alexandre Andrade, da GO Associados, uma das explicações para que a renda ainda esteja mostrando ganhos, mesmo que menores, é a escassez de mão de obra qualificada em algumas funções.

- Não vejo como, numa situação econômica como essa, os sindicatos consigam poder de barganha nas negociações. Acho que deve haver um crescimento menor dos salários mais alinhados à produtividade ou o salário real crescendo próximo de zero, só repondo a inflação. A tendência é crescer menos - afirma.

A massa de rendimento (total de salários) também teve ganhos acima da inflação. Ela somou R$ 162 bilhões, uma alta de 2,2% em relação ao mesmo período do ano passado e um avanço de 0,7% em relação ao trimestre terminado em novembro.

- No curto prazo (comparação entre janeiro e fevereiro), a massa de rendimento real mostrou tendência de queda, isso tem a ver com o número menor de pessoas ocupadas - explica Azeredo.

Na Câmara, PMDB apoia fim de sigilos no BNDES

• Mesmo com Temer na articulação política, 42 deputados da sigla votam contra Dilma

Ranier Bragon e Gabriela Guerreiro – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Mesmo com o vice Michel Temer no comando da articulação política, a presidente Dilma Rousseff sofreu nova derrota na Câmara dos Deputados nesta quinta (9) com o apoio maciço do PMDB.

Por 298 votos contra 95, o plenário da Casa aprovou uma emenda do PSDB a uma medida provisória que derruba o sigilo nos financiamentos do BNDES. Dos 53 deputados do PMDB que votaram na sessão, 42 se posicionaram contra o governo Dilma.

A medida tem que passar ainda pelo Senado e por Dilma, que pode vetá-la.

Temer foi indicado por Dilma na terça (7) para tentar contornar a crise com o Congresso, onde sua base está desmantelada desde que Eduardo Cunha (PMDB-RJ) derrotou o governo e se elegeu presidente da Câmara.

Embora tenha elogiado a escolha de Temer, Cunha deixou claro que não iria alterar sua linha de atuação na Câmara, o que tem incluído a aprovação de uma série de projetos contra o governo.

Ontem, porém, ele disse que a medida aprovada é inconstitucional e será vetada: "O sigilo é regulado por lei complementar e estamos debaixo de lei ordinária, então pra mim é flagrantemente inconstitucional, o governo certamente vai ter que vetar".

Apesar da derrota, Temer vem conseguindo alguns êxitos. Conseguiu frear a tramitação do projeto que busca cortar quase à metade os atuais 38 ministérios. No Senado, ele conseguiu barrar a criação de outra CPI.

PF prende três ex-deputados em nova etapa da Lava Jato

• Ex-parlamentares são os três primeiros políticos presos na operação; PF cumpre 32 mandados em seis Estados e no DF

Fausto Macedo, Ricardo Brandt, Fábio Fabrini e Mateus Coutinho - Estado de S. Paulo

O ex-deputado André Vargas (sem partido) foi preso nesta sexta-feira, 10, em Londrina (PR) na 11ª etapa da Operação Lava Jato denominada “A Origem”, deflagrada nesta manhã. Também foram preso os ex-deputados Luiz Argôlo (SD-BA) e o ex-parlamentar já condenado no mensalão e atualmente cumprindo pena no regime semiaberto, Pedro Corrêa (PP-PE). O nome da operação faz referência às investigações dos ex-parlamentares, cujo envolvimento com o esquema do doleiro Alberto Youssef foi descoberto nas primeiras etapas da operação, no ano passado.

Ao todo, cerca de 80 Policiais Federais cumprem 32 mandados judiciais: sete mandados de prisão, nove mandados de condução coercitiva e 16 mandados de busca e apreensão nos Estados do Paraná, Bahia, Ceará, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo e no Distrito Federal. Os ex-parlamentares são os três primeiros políticos a serem presos na operação.

Nesta etapa, estão sendo investigados os crimes de organização criminosa, formação de quadrilha, corrupção ativa, corrupção passiva, fraude em licitações, lavagem de dinheiro, uso de documento falso e tráfico de influência envolvendo três grupos dos ex-deputados. A investigação vai além da Petrobrás e também abrange desvios de recursos ocorridos em outros órgãos públicos federais. Também foram detidos Leon Vargas, irmão do ex-deputado André Vargas, Eliá Santos da Hora, secretária de Argôlo, e um publicitário, identificado como Ricardo Hoffmann. O outro preso, identificado como Ivan Mernon da Silva Torres, é apontado como laranja de Corrêa.

Os presos serão trazidos para a Superintendência da Polícia Federal em Curitiba/PR onde permanecerão à disposição da Justiça Federal. Como perderam a prerrogativa de foro, o caso dos ex-parlamentares está sendo investigado pelo juiz Sérgio Moro, responsável pelas ações da Lava Jato.

Ex-deputados. No caso de Vargas, a relação entre o ex-parlamentar e o doleiro Alberto Youssef, um dos principais alvos da operação e acusado de liderar um esquema de lavagem de dinheiro internacional, veio a tona desde o começo das investigações. A PF interceptou contatos entre o doleiro e o deputado – 270 mensagens de texto trocadas pelo aparelho BlackBerry, entre 19 de setembro de 2013 e 12 de março de 2014.

A suspeita é de que Vargas trabalhava em favor da rede articulada pelo doleiro, tendo inclusive feito lobby para o laboratório Labogen, de Leonardo Meirelles outro réu da Lava Jato, no Ministério da Saúde. O caso deu origem a um inquérito específico na Justiça Federal no Paraná. Além disso, o parlamentar chegou a viajar de férias com a família em um jatinho fretado pelo doleiro em 2013.
Seu envolvimento com o doleiro levou Vargas a ter o mandato cassado em dezembro do ano passado e também ser expulso do PT.

Já Luiz Argôlo, segundo afirmou Alberto Youssef em sua delação premiada, teria recebido emprestado um helicóptero do doleiro para sua campanha eleitoral de 2014. Na época, Argôlo foi candidato a deputado federal. Ele teve 63.649 votos e tornou-se suplente.

Segundo Youssef, o ex-parlamentar comprou a aeronave em 2012, mas não teve dinheiro para quitar as prestações. O político teria pedido dinheiro emprestado ao doleiro para fazer os pagamentos. Youssef contou à Polícia Federal que não aceitou e fez uma contraproposta.

À PF, o doleiro informou também que “João (Luiz) Argôlo fazia parte do rol de parlamentares do PP que recebia repasses mensais a partir dos contratos da Diretoria de Abastecimento da Petrobrás”. Argôlo deixou o PP no fim de 2013 e transferiu-se para o Solidariedade. Interceptações telefônicas da PF apontam também que o ex-deputado teria recebido propina de R$ 400 mil da OAS por meio de Youssef.

O ex-deputado Pedro Corrêa, por sua vez, foi condenado a sete anos e dois meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no mensalão e vinha cumprindo pena no regime semiaberto no Centro de Ressocialização do Agreste, a 210 km de Recife (PE). Ele foi citado pelo ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa em sua delação premiada como um dos beneficiados no esquema de propinas para o PP a partir de dinheiro desviado da estatal.

Simon vê PT 'sem rumo' e diz que PMDB vive momento mais importante no governo

Entrevista

• Ex-senador gaúcho comentou decisão de Dilma em escolher o vice, Michel Temer, como seu mais novo articulador político

Gabriela Lara – Estado de S. Paulo

PORTO ALEGRE - O desdobramento da crise política enfrentada pela presidente Dilma Rousseff (PT) brindou o PMDB com um protagonismo mais próximo daquele almejado por Pedro Simon para o partido no cenário nacional. Em entrevista ao Broadcast Político, o ex-senador gaúcho reconheceu que, com a nomeação do vice-presidente da República, Michel Temer, para coordenar a articulação política do governo, o PMDB vive o momento mais importante desde que passou a integrar a base governista petista.

Simon apoiou a aliança do PMDB com Lula, mas se tornou um dos símbolos da ala peemedebista contrária à participação da legenda no governo de Dilma. Há anos defende que o PMDB tenha candidato próprio ao Palácio do Planalto e, nas eleições de 2014, fez campanha para Marina Silva - que concorreu pelo PSB. Agora, acredita que o PT "perdeu o rumo" e que a habilidade de Temer para o diálogo com o Congresso pode dar o fôlego de que Dilma precisa para governar. "Ele tem condições de fazer este entendimento", afirmou. Considerado "independente" dentro do partido que ajudou a criar, o político parece mais sereno do que nos tempos de Congresso. Após se despedir de 32 anos de Senado e 60 de vida pública, ele se diz realizado por viajar o Brasil para propor "um grande debate" sobre o País. Veja abaixo os principais trechos da entrevista:

O senhor sempre criticou a aliança do PMDB com o governo da presidente Dilma. Como avalia hoje esta relação?

Após ficar oito anos no governo com o Fernando Henrique Cardoso e mais 12 com o PT, hoje o PMDB está vivendo um momento muito interessante e importante. De repente aconteceu que o PT perdeu o rumo. Ele não sabe o que faz, não sabe levar adiante... Os índices de prestígio e de credibilidade da presidenta que estavam em 80% hoje estão 12%. E então o PMDB tem nas mãos o comando da Câmara e do Senado, e a figura do Michel Temer.

O PMDB está assumindo um protagonismo no governo que antes não tinha?

Estou dizendo é que neste momento é escolhida a figura do vice-presidente da República para a intermediação política. Ele tem condições de promover este entendimento que o governo devia fazer, mas que a Dilma não tinha condição de fazer. O diálogo dele é o do entendimento. Tenho certeza de que ele vai conversar, vai fortalecer o bloco do governo (no Congresso Nacional), mas nada o impedirá, na posição em que está, de buscar um entendimento, conversar inclusive com partidos da oposição.

O PMDB está no seu momento mais importante nos governos recentes do PT?

É o momento em que ele (o partido) tem realmente a posição mais importante. O problema grande que temos hoje é o da crise política, crise de diálogo. Ninguém se entende. E então a presidente entrega para o vice-presidente (a articulação política). Nunca houve uma coisa como esta, foi o momento mais importante. Com todo mundo dizendo que o presidente da Câmara tem uma pauta dele, que o presidente do Senado tem outra pauta, que a oposição tem outra pauta, pode ser que o vice-presidente tenha condição de iniciar este entendimento.

Por que a presidente tomou esta decisão agora? Ela percebeu que teria mudar a estratégia?

Com toda a sinceridade, ela não é do ramo. O único cargo a que foi eleita é o de presidente da República. Ela não foi nem vereadora, nem presidente de partido. Ela teve a competência de em determinado momento reconhecer que este era o caminho. Ou nós fazemos um grande movimento em torno das reformas reais, ou vai ser uma confusão.

Como o senhor avalia a atuação de Eduardo Cunha na Presidência da Câmara e de Renan Calheiros à frente do Senado?

Não dá para dizer que o Renan Calheiros e o Eduardo Cunha estejam fazendo uma política própria. Estão dizendo: 'Vamos colocar em votação as coisas que precisam ser votadas, independentemente de pressão ou coação por parte do governo'. Eles ficam numa posição simpática porque adotam uma posição de independência. Como o normal é uma atitude servil ao Executivo, quando se tem uma atitude de independência isso chama a atenção, mas não é mais do que a obrigação. Na hora de votar um projeto é preciso ver o que é importante para o País. O governo selou um acordo com os governadores em torno da dívida dos Estados. Tudo resolvido, mas estamos em abril e o governo da presidenta não regulamenta o projeto, mesmo com a lei votada no ano passado e o acordo feito. É o interesse do Executivo (adiar a regulamentação). Mas qual é o interesse da nação?

Que análise o senhor faz dos 100 dias do segundo mandato da presidente?

O que ouvi de comentários é que, com esta nomeação (de Michel Temer), agora ela poderá governar, porque até agora ela não fez nada.

O senhor concorda com isso?

Não se fez nada, só teve coisas negativas até agora. Não vi uma coisa positiva no governo dela. Agora é o recomeço.

Como está sua rotina em Porto Alegre? Sente falta do Congresso?

Não sinto. Estou tentando iniciar algo que acho que a sociedade toda deveria fazer: ir para a rua propor um grande debate em torno do Brasil. E que esta pauta não seja um pacote apresentado pela presidenta, nem pela OAB, nem pela oposição, e que resulte em uma perspectiva do entendimento. Eu já dizia no Senado que em meus 60 anos de vida pública não havia visto uma situação tão complexa como a que estamos vivendo. Não temos uma ditadura, nada está ameaçando as instituições, mas a situação, na minha opinião, é impressionantemente complicada. Se a sociedade fosse às ruas e buscasse o diálogo para encontrar uma fórmula para as mudanças, seria uma saída. Estou percorrendo o Brasil, atendendo a convites e fazendo palestras nesse sentido.

Roberto Freire - Parlamentarismo, a reforma política de que o Brasil precisa

- Portal do PPS

Em menos de quatro meses de mandato, Dilma Rousseff vem agonizando politicamente diante do esfacelamento de seu governo, do esgotamento do lulopetismo e do agravamento das crises econômica e política. A perda de apoio popular da presidente da República, em meio aos escândalos de corrupção na Petrobras e às sucessivas derrotas impostas por sua própria base aliada no Congresso, fazem o país caminhar rumo a uma séria crise institucional cujas consequências são inimagináveis. A solução para sairmos de um momento tão difícil deve ser radical, mas democrática, constitucional e permanente.

No âmbito das discussões sobre a reforma política, participei de uma audiência pública na comissão especial que trata do tema na Câmara, na última terça-feira (7), e defendi que seja enviada ao plenário da Casa a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 20/1995, de autoria do então deputado Eduardo Jorge, que institui o parlamentarismo no Brasil. O texto está pronto para ser votado desde 2001 e oferece a mais importante e profunda reforma política de que o país necessita para sair fortalecido de impasses institucionais como o que vive hoje.

As lideranças políticas que têm espírito público e compromisso com o Brasil não podem ser meras espectadoras de uma crise que paralisou um governo já imobilizado pela própria incompetência. Esse impasse dificilmente será superado em um ambiente contaminado como o atual, com os mesmos vícios, os mesmos personagens, o mesmo discurso desgastado dos últimos 12 anos, além das falsas promessas que vêm sendo amplamente rejeitadas pela população brasileira nas ruas. No regime parlamentarista, adotado com êxito por algumas das principais democracias do mundo, quanto maior a crise, mais radical é a solução.

Se o parlamentarismo estivesse em vigor no Brasil, o governo Dilma não mais existiria. Sem maioria, acumulando derrotas no Congresso, sem credibilidade junto à sociedade e à opinião pública, enredado em inúmeras denúncias de corrupção, responsável pelo maior estelionato eleitoral da história republicana e incapaz de responder ao clamor popular que tomou as ruas de norte a sul do país, a atual gestão chegaria ao fim sem que isso traumatizasse a nação ou trouxesse qualquer risco ao processo democrático. Caso não fosse possível formar uma nova maioria parlamentar, o Congresso seria dissolvido e seriam convocadas novas eleições.

Ao contrário do que podem argumentar os áulicos do governo lulopetista, a defesa do parlamentarismo no Brasil não é “golpismo” ou uma tentativa de enfraquecer a atual presidente – tanto que a proposta, se aprovada, entraria em vigor apenas a partir de 2018, após o fim do segundo mandato de Dilma. E mesmo que a crise atual se aprofunde a ponto de viabilizar um eventual impeachment – prerrogativa constitucional à qual já recorremos uma vez, em 1992, então com o apoio entusiasmado do PT para derrubar o governo Collor –, o próximo presidente já assumiria o mandato com a missão de preparar o país para um novo regime.

A reforma política não deve se restringir a medidas paliativas ou remendos inócuos. Se quisermos, de fato, aproveitar este momento para fazer o país avançar, não devemos temer um debate franco, que envolva a sociedade, sobre o fim do atual modelo de “presidencialismo de cooptação” – como definiu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em artigo recente – e a instituição do regime parlamentarista. O debate está posto e é hora de enfrentá-lo, para o bem do Brasil.

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Roberto Freire é deputado federal (SP) e presidente nacional do PPS

Merval Pereira - Máquina de triturar

- O Globo

A régua para se medir o nível de deterioração do segundo mandato da presidente Dilma pode ser a comparação com os primeiros meses do primeiro mandato. Há praticamente três meses e meio no exercício da Presidência da República neste segundo termo, a presidente Dilma já mudou nada menos que cinco ministros, e já tem encomendada a sexta alteração, com a garantia dada pelo vice-presidente Michel Temer, o responsável pela parte política do governo, de que o ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves entrará na equipe.

Todos os ministros foram trocados para aperfeiçoar a equipe ou azeitar as relações com a base aliada, o mesmo que aconteceu no primeiro mandato, com uma diferença básica: Dilma teve que demitir seis ministros entre junho e dezembro de 2011, todos por denúncias de corrupção.

Hoje, o ministro Marcelo Néri (Assuntos Estratégicos) foi trocado quase clandestinamente por Mangabeira Unger. Cid Gomes (Educação) deu lugar a Renato Janine Ribeiro, com espalhafato, não apenas pela crise que o mais velho dos Gomes produziu no Congresso, como pela repercussão positiva da nomeação do novo ministro.

Thomas Traumann, na Comunicação Social da Presidência, foi substituído pelo petista Edinho Silva. As funções da Secretaria de Relações Institucionais foram incorporadas pelo vice-presidente Michel Temer. E Ideli Salvatti, alocada nos Direitos Humanos, foi a mais recente humilhada pela máquina de triturar aliados em que se transformou o Planalto.

Da mesma maneira que o titular das Relações Institucionais, Pepe Vargas, soube pelo noticiário da internet que havia sido destituído, Ideli soube por uma entrevista de Pepe Vargas que este iria para o seu lugar. Vargas ainda amargou uma humilhação adicional, pois teve que desdizer o que dissera na entrevista, até ser confirmado no novo cargo pela própria presidente.

Parece ser uma especialidade da presidente Dilma montar um mau Ministério, e depois ter que trocá-lo com o governo já em curso. No primeiro mandato, o que parecia ser uma guinada do governo rumo a uma limpeza nos seus quadros acabou demonstrado ter sido apenas um arroubo de quem não tinha autonomia para tanto.

A presidente Dilma teve que aceitar de volta os mesmos grupos que pretendia alijar do governo, e em alguns casos com humilhação, como quando uma parcela do PR exigiu a troca do ministro César Borges, a quem a presidente elogiava constantemente, por outro, representante do grupo de Alfredo Nascimento, o mesmo que fora tirado do ministério acusado de corrupção.

Hoje, as mudanças visam, sobretudo, melhorar as relações com o PMDB. Mais ainda do que no primeiro mandato, a presidente encontra-se refém na política do vice-presidente Michel Temer, que na percepção generalizada tornou-se um primeiro-ministro à brasileira.

E, na economia, o ministro da Fazenda tornou-se o fiador do governo perante os organismos internacionais, e uma eventual saída sua do ministério desencadearia uma crise sem precedentes, a começar pela perda do grau de investimento pelas agências reguladoras.

Contra a impunidade
Na coluna de ontem, interpretei a decisão do ministro Teori Zavascki de negar a liminar para habeas corpus de um empreiteiro preso como sinal de que as teses do juiz Sérgio Moro estão prevalecendo nos tribunais superiores, inclusive no STF.

Tudo indica que não é possível afirmar isso em relação ao relator do petrolão na Segunda Turma do STF, embora seja correta a interpretação com relação a instâncias anteriores e ao STJ.

O ministro Zavascki apenas não viu razões para aprovar a liminar, e pretende que o mérito seja discutido à frente, depois do parecer do procurador-geral, na Segunda Turma.

Ele apenas transcreveu em sua decisão acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que rejeitou HC lá impetrado, sem que isso signifique que tenha aderido às teses.

O acórdão da 5ª Turma do STJ citado foi redigido pelo desembargador Newton Trisotto, e não pelo ministro Rogério Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), como citei na coluna de ontem.

Eliane Cantanhêde - Temer e o vácuo de poder

- O Estado de S. Paulo

A economia e a política são o coração e o pulmão do governo, aqui e em qualquer lugar do mundo. A presidente Dilma Rousseff, antes tão centralizadora, delegou a economia para um estranho no ninho, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e a política para o seu vice, Michel Temer, que preside justamente o PMDB.

Então, o que faz a presidente da República? Inaugura unidades do Minha Casa Minha Vida, faz discursos dizendo que a Petrobrás está uma maravilha, dá entrevistas para TVs estrangeiras, tira fotos em reuniões protocolares com prefeitos e, se preside alguma coisa, preside solenidades no Planalto.

São atividades acessórias, senão decorativas, de uma presidente que nunca tinha sido eleita coisa nenhuma antes de ser empurrada rampa acima do Planalto, fracassou na condução da economia no primeiro mandato e não tem vocação para o fundamental a um(a) líder: a política.
Já seria grave se faltassem três meses para o fim do mandato, mas é muito pior porque tudo isso ocorre em três meses do início do mandato. É um governo novo que se move como velho, cheira a mofo, não gera expectativas.

Levy, um estranho nesse ninho, é o onipotente e o onipresente da economia. Define a política, redige os projetos, negocia com o Congresso, formaliza os ajustes acertados. Em linguagem a la Lula, Levy chuta em gol e defende ao mesmo tempo. Se der certo, a vitória será de Dilma?

Temer é do ramo, conhece a política, chama os políticos pelo nome, sabe se movimentar pelos salões e gabinetes do Congresso, mas delegar a articulação política para ele num momento como esse é mais do que temerário, por motivos óbvios. Como é temerário que ele passe a ser o interlocutor direto do governo com Lula e com Fernando Henrique Cardoso, sem intermediários - ou intermediária.

Temer é presidente de fato, e ainda de direito, do PMDB, a maior fonte de problemas e a maior ameaça a Dilma. Vamos pensar juntos: quando o pau quebrar entre o partido e o Planalto - e quebra todo santo dia -, como Temer se comportará? Será leal à presidente e ao governo, ou ao partido que representa desde sempre e que preside até agora? É um risco que Dilma jamais poderia correr.

Para dramatizar mais a fragilidade e o isolamento de Dilma, há também a fragilidade e o isolamento do próprio PT. Se Levy tem alma e bico tucano, alçar Temer à articulação política é dar todo o poder - aquele que emana do povo, pelo povo e para o povo - ao PMDB. O partido que mais fustiga o Planalto tem agora a articulação política do governo, as presidências da Câmara e do Senado. Fechou o cerco.

É o PMDB, por exemplo, quem aperta ou afrouxa as rédeas das CPIs e quem expôs o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, a uma saraivada de perguntas constrangedoras e transmitidas por horas e horas ao vivo, para quem quisesse ver e ouvir. E é quem vai acabar tendo o comando das CPIs articuladas no Senado. Assunto não falta: BNDES, HSBC, Carf, fundos de pensão. Uma dessas CPIs acaba ganhando vida para atazanar ainda mais o PT e o governo.

Tanto quanto é legítimo perguntar o que faz a presidente da República, é também razoável perguntar: e o PT, que ganhou as eleições em outubro, manda onde, em quem, em quê?

Em vez de tentar uma resposta, vamos a um personagem que resume tudo: o petista Pepe Vargas, ex-articulador político. Criticado sem piedade por Lula e demitido por Dilma pela imprensa, ele convocou entrevista para anunciar que tinha sido convidado para ser ministro de Direitos Humanos. Recebeu um telefonema, parou a entrevista no meio e voltou dizendo que... não tinha sido convidado para nada.

Que sensação fica? Como Dilma não manda mais nada, precisa demonstrar força em cima dos mais fracos. Pepe Vargas não é só um ministro fraco, é também do PT, um partido cada vez mais fraco.

Ratos. Sobre os ratos na CPI da Petrobrás, sem comentários.

Bernardo Mello Franco - A vaquinha de Jefferson

Folha de S. Paulo

Autor da denúncia do mensalão, o ex-deputado Roberto Jefferson, 61, recorrerá ao Supremo Tribunal Federal na próxima segunda-feira para deixar a cadeia e cumprir o resto da pena em casa.

Ele pagou ontem a multa imposta pela corte ao condená-lo a sete anos e 14 dias por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O depósito de R$ 840.862,54 era exigido para pedir a progressão ao regime aberto.

Uma foto do recibo chegou aos celulares de quem participou da vaquinha. "Acabo de pagar a multa. Agradeço aos amigos a força que me deram", escreveu Jefferson. A quantia foi quitada em dinheiro em uma agência do Banco do Brasil.

Na lista de doadores, estão políticos como o deputado Benito Gama e o ex-senador Sérgio Zambiasi. Jefferson mantém contatos com todos eles, em articulação discreta para acelerar a fusão do PTB com o DEM.

O ex-deputado tem pressa para deixar a cadeia. Está de casamento marcado com a enfermeira Ana Lúcia Novaes, 46. Os dois já vivem juntos há 13 anos e vão formalizar a união no fim de maio com festa em Três Rios, no interior fluminense.

"A Ana esteve ao meu lado na CPI, na cassação, no julgamento e na luta contra o câncer. Deus reserva a poucos homens uma mulher como ela", derrama-se o ex-deputado. "E eu devia uma satisfação à família dela..."

Segundo Jefferson, a cerimônia será "coisa simples", e os convidados não passarão de 200. Ele encomendou o terno ao alfaiate brasiliense Severo Silva, que faz suas roupas desde que chegou ao Congresso. A noiva teve mais trabalho: visitou lojas no Rio e em São Paulo atrás do vestido.

Enquanto a liberdade não sai, Jefferson dá expediente em um escritório de advocacia no Rio e volta à noite para a prisão. Ontem ele se divertiu com os ratos na CPI e reprovou o depoimento do tesoureiro petista João Vaccari. "Eu preferia o Delúbio, mesmo cheio de Lexotan. Ele era mais autêntico...", comentou, antes de soltar sua conhecida gargalhada.

Cristian Klein – Os ratos roeram

• Coalizão de Dilma está sendo partilhada ou corroída?

Valor Econômico

Para acessá-la basta clicar no link abaixo:

Os ratos roeram

Fernando Gabeira - Bye Bye Dilma

- O Estado de S. Paulo

Domingo é dia. De novo. O governo respondeu mal. Ele joga com o tempo. Sabe que é difícil manter tanta gente na rua quando sem um resultado tangível. É um cálculo válido para período de estabilidade e crescimento. O Brasil em crise é um fio desencapado. As manifestações não conseguiram ainda seu objetivo: Fora Dilma.

No entanto, Dilma já não está tão dentro como antes. A iniciativa política foi arrebatada pelo PMDB. O ajuste econômico é conduzido pelo liberal Joaquim Levy, que o negocia com o Congresso Nacional.

O debate sobre o ajuste tem conteúdo para ser discutido dias seguidos. Quase todos concordam que um ajuste adequado levará o Brasil de novo ao crescimento. Mas poucos se perguntam sobre o crescimento. Será que vamos reunir forças para um novo voo de galinha? Retomar o crescimento significa entupir os lares de eletrodomésticos e carros, exaurir os rios de forma irresponsável?

Mesmo para um voo de galinha as perspectivas não são boas. Teremos energia para o crescimento em 2016? Nossas estradas suportam um aperto econômico - elas que foram devastadas pelo tempo e pela corrupção? Todos se interrogam para onde estamos indo. Marchar para uma euforia consumista e, depois, cair na depressão torna a política econômica uma nova droga.

O escritor Frei Betto usou a imagem do filme Good Bye Lenin! para expressar o espanto de alguns eleitores de Dilma: é como se dormissem com a vitória de sua candidata e acordassem com a de Aécio Neves, seu adversário. Esse filme de Wolfgang Becker é bem lembrado porque conta a história de uma comunista fervorosa de Berlim oriental que ficou oito meses em coma e acordou depois da queda do Muro. E o esforço do seu filho era para mascarar os traços do capitalismo e evitar que ela se chocasse com o movimento da História.

Good Bye Lenin!, na minha opinião, não exprime apenas a perplexidade dos eleitores de Dilma. Ele exprime a perplexidade de toda a esquerda, que deveria estar acordando de um grande sonho e se espantar com o mundo, como a comunista de Berlim ao ver um imenso anúncio publicitário do outro lado da rua. Seria como se um cubano acordasse na Costa Rica ou um venezuelano nos supermercados do Peru, algo tão diferente. Nesses anos em que o Muro de Berlim caiu, muitos continuaram em coma, ou protegidos das mudanças no mundo real.

Isso não teria tanta importância se a esquerda não fosse para o poder com uma parte das ilusões. Ela confundiu partido com Estado e capitalismo de leis implacáveis com seus sonhos socialistas.

Não deveria. Marx estudou muito para explicitar essas leis. Nem sempre acertou, mas as estudou profundamente e jamais apoiaria um enfoque apenas consumista. Não porque Marx fosse da elite branca. Mas porque saberia que a conta seria cobrada na frente.

Hoje a conta está sendo cobrada. Dormiu-se com a promessa do paraíso, acorda-se numa realidade inequívoca: tanto Dilma como Aécio seriam obrigados a algum tipo de ajuste.

A confusão entre governo e poder, entre partido e Estado acabou arruinando uma experiência, finalmente, dinamitada pela corrupção.

Uma esquerda no governo não poderia comprometer-se a fundo com Cuba e Venezuela. Ainda que admirasse os dois modelos, o que é um alto grau de miopia, deveria levar em conta uma posição nacional.

Uma esquerda no governo deveria abster-se de levar o capitalismo a um outro sistema, mas, sim, tirar o melhor proveito de suas potencialidades e reduzir seus impactos negativos. O capitalismo pode alcançar altos níveis de inovação e criatividade, como nos Estados Unidos, ou mesmo uma respeitável rede de proteção, como na Escandinávia.

Não vejo como transitar do capitalismo para outro sistema econômico, exceto através da decadência e destruição de seus alicerces. E isso nem na Venezuela vai acontecer. O sonho bolivariano encarnou num homem que esmaga os opositores e conversa com passarinhos. Quando vão despertar? Quando encontrarem Nicolás Maduro cantando salsas e merengues nas pizzarias do seu bairro?

Bye Bye Dilma não é apenas o acordar de um sonho eleitoral. E um sono de 12 anos - de pouco mais de 25 anos se contarmos da queda do Muro de Berlim. O projeto não se perdeu apenas pela questão ética. Seus passos estão intensamente discutidos no escândalo do petrolão e outros que se espalham como tanques em chamas.

Mas os fins, quais eram mesmo os fins? Para onde é que nos levavam?

Dentro do País vivemos a crise do populismo econômico. Lá fora, nossa importância diplomática foi dramaticamente reduzida.

Não dói somente ver Dilma e o PT se comportarem como se nada de errado tivesse acontecido. Dói também ver a perspectiva de um grande esforço fiscal desaguar numa visão de crescimento de novo insustentável, tanto econômica como ambientalmente.

A Califórnia passou por mil desafios, abrigou a indústria de cinema e da informática, e agora se vê diante da necessidade de se reinventar. E muitos perguntam se conseguirá, como das outras vezes. A crise hídrica é grave por lá. No Brasil nem sequer nos colocamos a ideia de uma primeira reinvenção. E a crise hídrica é grave por aqui.

Toda vez que falam "vamos fazer o ajuste fiscal, voltar a crescer", tenho um calafrio. De novo, um voo de galinha na economia e na política?

Seria necessário rever o caminho. A visão puramente eleitoral é sempre punida pelas leis do capitalismo. Não há espaço para uma esquerda monocrática que confunde suas ideias com o interesse nacional, que julga aproximar-se do socialismo, mas avança para o colapso econômico.

Essa esquerda dormiu abraçada numa bandeira vermelha e acordou com a multidão em cores verde e amarelo. Se acordou, finge que está dormindo.

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*Fernando Gabeira é jornalista

Rogério Furquim Werneck - Danos e reparações

• Embora a capacidade de se retratar não seja exatamente seu forte, Dilma tem uma longa lista de retratações a fazer

- O Globo

O dicionário “Houaiss” registra três acepções distintas da palavra “reparação”. A primeira é “ação de restaurar ou consertar algo; reparo”. A segunda, “satisfação dada a alguém por uma falta, uma ofensa; retratação”. E a terceira, “ação de indenizar; ressarcimento”. O que torna o segundo governo da presidente Dilma especialmente difícil é sua vasta e complexa agenda de reparações, que combina, ao mesmo tempo, as três acepções da palavra.

A parte mais óbvia dessa agenda é a que diz respeito à acepção de “reparo”. Ao longo desses primeiros cem dias do novo governo, o país vem se dando conta da gravidade dos danos causados por equívocos e excessos cometidos no primeiro mandato da presidente Dilma. Já não há como ter ilusões. Em vista da devastação das contas públicas, serão necessários vários anos de penoso e persistente esforço de contenção de gastos, para impedir que a dívida do setor público continue a aumentar como proporção do PIB, e um grande esforço de restauração das bases institucionais da responsabilidade fiscal.

A inflação acumulada em 12 meses já passa de 8% ao ano. E não será fácil trazê-la de volta à meta, na contracorrente da depreciação cambial e das vultosas correções de preços que vinham sendo irresponsavelmente represados. A perda de competitividade da economia, marcada por funesta combinação de custos em alta e produtividade em queda, vem se traduzindo em necessidades de financiamento externo da ordem de 4% do PIB, que já superam por larga margem o que pode ser financiado pelo influxo esperado de investimento estrangeiro.

Em meio a tal desarranjo, o dinamismo da economia desapareceu por completo. À estagnação de 2014, deve se seguir uma recessão de bom tamanho em 2015. E, até onde a vista alcança, não há ainda perspectiva clara de retomada sustentada do crescimento econômico.

Os reparos que se fazem necessários não estão restritos à esfera macroeconômica. Há setores inteiros a reconstruir, como o elétrico e o petrolífero. A começar pela Petrobras, arruinada por uma conjunção perversa de populismo, inconsequência desenvolvimentista, predação, incompetência e corrupção. E há também fundos de pensão de estatais saqueados, bancos públicos fragilizados e governos subnacionais em estado pré-falimentar. Tudo isso compõe um desafio de reparo e reconstrução assustadoramente vasto.

Menos óbvia, mas tão ou mais problemática, é a parte da agenda de reparações que diz respeito à acepção de “retratação”. Parcela substancial dela tem a ver com retratações relacionadas ao desempenho desastroso da economia e à reconstrução que agora se faz necessária. Embora a capacidade de se retratar não seja exatamente o seu forte, a presidente Dilma tem pela frente uma longa lista de retratações a fazer. É difícil que consiga recuperar sua imagem e restaurar a confiança no governo, sem, de uma forma ou de outra, reconhecer erros e admitir que fez apostas irresponsáveis e que a manipulação eleitoreira da campanha de 2014 ultrapassou todos os limites do que poderia ser considerado razoável. Nada disso lhe será fácil.

A terceira parte da agenda de reparações, a que diz respeito à acepção de “ressarcimento”, é de caráter distinto. Não é composta de iniciativas e atitudes que o governo poderá voluntariamente tomar, na medida dos seus interesses e das suas possibilidades, mas de sanções que podem vir a ser impostas, seja ao próprio governo, seja a seus integrantes e aliados, pelos efeitos danosos de políticas e práticas adotadas ao longo dos três últimos mandatos presidenciais.

As ações judiciais que vêm sendo movidas contra a Petrobras e seus administradores, tanto no Brasil como no exterior, já permitem vislumbrar o lado mais conspícuo das desgastantes exigências de ressarcimento com que o governo poderá ter de lidar. Mas isso parece ser só o começo de um ajuste de contas muito mais abrangente, cujos desdobramentos deverão atormentar o Planalto até o fim do mandato.

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Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio

Celso Ming - Aumenta o desemprego

- O Estado de S. Paulo

O desemprego aumentou e deve aumentar ainda mais. Foi o que mostrou a nova Pesquisa por Amostras de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) divulgada nesta quinta-feira pelo IBGE.

O nível de desocupação no período de três meses (trimestre móvel) terminado em fevereiro atingiu 7,4%. É um número mais alto do que os 6,8% apresentados no mesmo período do ano passado e do que os 6,5% do trimestre terminado em novembro.

Quem não está habituado com as danças estatísticas desta área no Brasil deve estar um tanto confuso. No mês passado, o mesmo IBGE avisou que o nível do desemprego foi de 5,9%. Mas outras pesquisas também sugerem situação pior do que essa.

Essa diferença se deve não só a universos diferentes de medida, mas também a metodologias diferentes. O levantamento mais conhecido é a Pesquisa Mensal de Emprego feita pelo IBGE. Avalia a ocupação de um mês para outro com metodologia equivalente à praticada no resto do mundo, mas com uma limitação: restringe a pesquisa a apenas seis regiões metropolitanas do Brasil. Já a Pnad Contínua é feita em âmbito nacional e mede o desemprego por trimestres móveis, mas não submete os resultados a ajustes sazonais.

Há, também, o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), apontado mensalmente pelo Ministério do Trabalho, que avalia apenas o vaivém dos contratos de trabalho com carteira assinada. Ficam de fora a ocupação informal (mercado paralelo) e o trabalho autônomo. E tem ainda o Dieese, organismo financiado por sindicatos, cuja pesquisa incorpora o chamado trabalho precário. Sua limitação é a de que se restringe à Grande São Paulo.

Independentemente dessas diferenças, são duas as novidades apontadas pela pesquisa da Pnad Contínua. A primeira é a intensificação das dispensas de pessoal a partir de janeiro, não só porque foi tempo de férias e o comércio fica mais fraco depois das vendas de Natal, mas, também, porque a crise e o ajuste fiscal empurraram as empresas ao corte de custos.

A outra novidade é a de que há muito mais gente procurando trabalho, além dos que perderam o emprego ou dos que estão chegando agora ao mercado. É uma situação que reflete dois movimentos.

O primeiro é a redução de vagas de trabalho já mencionada. Quem acompanha o noticiário vem notando o aumento da frequência das dispensas de pessoal pelas empresas. E o Caged mostra há alguns meses que se fecham mais postos de trabalho do que se abrem no País. O outro movimento é a queda do poder aquisitivo da população em consequência da inflação aliada ao aumento da insegurança com o emprego. É fator que empurra mais gente da família à procura de reforço do orçamento doméstico.

Aparentemente contraditória é a informação de que a massa de rendimento real do trabalhador vem aumentando, num quadro de aumento do desemprego. Uma explicação para isso pode ser a concentração dos reajustes salariais neste período.

Enfim, a situação do emprego deve piorar antes de começar a melhorar.


Marta Suplicy - Patinação

- Folha de S. Paulo

Não é no gelo nem em pista. É no governo mesmo. Toda semana quero mudar de assunto e não consigo. Esta semana não foi a bola que entrou redonda no Planalto e saiu quadrada, mas a trapalhada foi de tal tamanho que virou vexame.

Ação que humilhou um ministro, que soube por meio de um site que estava sendo demitido, um convite ao futuro ocupante sem conversar com seu partido, o que propiciou o não aceite público do convidado. E, para finalizar, usar da prerrogativa presidencial de extinguir um ministério e nomear o vice-presidente como responsável pela interlocução política do governo sem dar os passos básicos que antecedem tal operação. Inclusive no Legislativo. Nunca antes o país presenciou tanta falta de jeito e perda de oportunidades de fazer o erro reverter em aprendizado e benefício.

A seguir a patética --e inacreditável-- entrevista de Pepe Vargas aceitando o "apelo" da presidenta para assumir a Secretaria de Direitos Humanos e logo sendo interrompido na coletiva por um telefonema. Volta acabrunhado para dizer que não havia confirmação. No final do dia ocorre a nomeação. Foi de um constrangimento que ninguém merece. Nem nós.

Logo após passamos a ter a dimensão do desacerto. O vice não aceita mais o ministério, somente a incumbência do trabalho de interlocução. Saíram todos descontentes, como sempre.

Nos ombros do vice repousa agora imensa responsabilidade. Mas qual é o significado do vice-presidente, que também é presidente do maior partido aliado, ser incumbido da tarefa de fazer a articulação política do governo? Temer já entrou na roda em momentos de apuro nas relações entre seu partido e o governo.

Mas é diferente de assumir as negociações com o Congresso como um todo. Não que não possua o talento necessário. Ele já conversa bem com todos os segmentos e ter-se mantido há anos na presidência do PMDB, com tantos caciques, comprova suas habilidades.

Temer pode obter um bom resultado, o que facilitará a aprovação das MPs de ajustes que o governo necessita. Entretanto o resgate da credibilidade perdida pela figura da presidenta dificilmente ocorrerá. Na hora em que tenta um atalho de governabilidade via Temer, Dilma continua fugindo da responsabilidade da autocrítica, sem fazer a repactuação sincera com a sociedade.

Melhorando a relação com o Congresso não sei quão "feliz" ficará a presidenta, e seus próximos, com o aumento de poder do vice e de seu partido. Já entregou a economia e agora com a terceirização da política, como reagirá com a mudança efetiva do eixo do poder?

Em patinação, fazer piruetas e saltos, sem talento ou treino adequado, costuma ser muito arriscado.

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Marta Suplicy é senadora (PT-SP)