quinta-feira, 5 de março de 2015

Opinião do dia – Max Weber

Nos Estados modernos, os partidos políticos podem basear-se fundamentalmente em dois princípios intrínsecos distintos. Podem os partidos ser essencialmente organizações para concessão de cargos, como o têm sido nos Estados Unidos desde o fim das grandes controvérsias sobre a interpretação da Constituição. Nesse caso estão os partidos meramente interessados em colocar seu líder na posição máxima, a fim de que este possa transferir cargos estatais a seus seguidores, ou seja, aos membros dos staffs ativos e de campanha do partido.

Desde que os partidos não têm princípios explícitos, eles competem um contra o outro, incluindo em seus programas as exigências das quais esperam o maior impacto. Essa característica partidária é muito pronunciada nos Estados Unidos devido à ausência de um sistema parlamentar; o presidente da federação, eleito pelo povo, controla — juntamente com os senadores eleitos pelos Estados — a concessão do vasto número de cargos federais. Apesar da corrupção resultante, esse sistema era popular, pois impedia o aparecimento de uma casta burocrática. Tecnicamente era exeqüível, porquanto mesmo a pior administração, conduzida por diletantes, podia ser tolerada em vista da ilimitada abundância de oportunidades econômicas. A crescente necessidade de substituir o inexperiente protegido pelo partido e funcionários oportunistas pelo funcionário especializado, tecnicamente treinado, reduz progressivamente os benefícios do partido e resulta inevitavelmente numa burocracia de tipo europeu.

Ou, então, os partidos se baseiam sobretudo em uma ideologia partidária e querem dedicar-se à concretização de ideais políticos que lhe são inerentes. De forma relativamente pura, esse tipo era representado na Alemanha pelo Partido Católico do Centro da década de 1870 e pelos sociais-democratas antes de se burocratizarem. De maneira geral, os partidos combinam ambos os tipos. Têm objetivos explícitos que são determinados pela tradição, e por isso esses objetivos só podem ser modificados pouco a pouco. Além disso, querem controlar também a concessão de cargos. Em primeiro lugar, objetivam colocar seus líderes nos principais postos políticos. Se obtêm êxito na luta eleitoral, os líderes e funcionários podem proporcionar a seus adeptos cargos estatais seguros durante o período de preponderância do partido. Esta é a regra em Estados parlamentaristas; portanto, os partidos ideológicos também seguiram esse caminho.

Em Estados não-parlamentaristas (como a Alemanha Imperial), os partidos não controlam a concessão dos cargos máximos, mas os partidos mais influentes podem geralmente pressionar a burocracia dominante no sentido de conceder cargos apolíticos a seus protegidos, ao lado dos candidatos recomendados por ligações com funcionários efetivos; logo, esses partidos podem exercer concessão “subalterna”.

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Max Weber (1864-1920), - Parlamentarismo e governo numa Alemanha reconstruída - (Uma contribuição à critica política do funcionalismo e da política partidária) - , p. 21. Abril Cultural, 1980.

Derrota tira poder de Dilma para indicações no STF

Governo perde mais uma

• Câmara aprova PEC da Bengala, que tira de Dilma direito de indicar 5 novos ministros para o STF

Simone Iglesias, Cristiane Jungblut e Catarina Alencastro – O Globo

Crise com o congresso

BRASÍLIA - A lista de políticos envolvidos no escândalo de corrupção na Petrobras ampliou o descompasso entre o governo e o Congresso. O dia de ontem foi marcado por reuniões no Palácio do Planalto, no Senado e na Câmara, com troca velada de acusações entre os dois poderes. Nenhum esforço do governo foi suficiente para evitar mais uma derrota: a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) da Bengala, que amplia a idade máxima para a aposentadoria dos ministros de tribunais superiores de 70 para 75 anos, foi aprovada em primeiro turno por 318 votos a favor, 131 contra e 10 abstenções. Pela regra atual, a presidente Dilma Rousseff teria direito de indicar cinco ministros para o Supremo Tribunal Federal até o fim de seu mandato. Caso a medida seja aprovada em dois turnos, a presidente só fará novas indicações - além do substituto de Joaquim Barbosa - caso ministros se aposentem voluntariamente.

O governo vinha se mobilizando desde a legislatura passada para evitar a votação, mas desde que assumiu a presidência da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) anunciou que votaria a emenda. Deputados do PT encaminharam contra a aprovação da emenda, acusando-a de casuística.

A votação da PEC da Bengala levou inclusive ao cancelamento da reunião que a bancada de deputados do PT teria com os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Joaquim Levy (Fazenda), Nelson Barbosa (Planejamento) e Pepe Vargas (Relações Institucionais). O encontro tinha o objetivo de debelar a rejeição dos petistas às medidas provisórias do ajuste fiscal.

As tentativas de melhorar a relação com o Congresso foram ainda dificultadas por declaração do ministro da Educação, Cid Gomes, de que há "uns 400 deputados que quanto pior melhor para eles", que querem o governo fragilizado para "achacarem mais". Pronunciada em Belém, na semana passada, a frase veio à tona ontem e levou a Câmara a decidir convocar o ministro para prestar esclarecimentos. Irritado com o que Cid disse, Eduardo Cunha anunciou que não votaria projetos da área do ministro até que ele explicasse suas declarações.

- Essa casa não é um prostíbulo que esse ministro acha que é - protestou o deputado Pauderney Avelino (DEM-AM), líder da minoria.

A nova retaliação do Congresso ao governo ocorreu em meio ao recrudescimento da insatisfação dos presidentes da Câmara e do Senado, com o Planalto. Cunha e Renan Calheiros (PMDB-AL) culpam o governo, mais especificamente o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, por serem alvo de abertura de inquérito pelo STF e pela tentativa de desidratação do PMDB. Renan disse ontem que não tem envolvimento com a Lava-Jato e que, se foi citado, foi de forma indireta e por "terceiros". A aliados, lembrou que já enfrentou processo de cassação e "coisas muito piores".

O governo nega qualquer gestão para incluir ou retirar citados na lista de investigados da Lava-Jato. Segundo um ministro do núcleo político, o governo não tem poder para influenciar a Procuradoria Geral da República:

Numa demonstração do clima tenso, Renan deixou o ministro de Relações Institucionais, Pepe Vargas, esperando por mais de meia hora em seu gabinete na presidência do Senado. Na conversa com Vargas, Renan avisou que a próxima bomba para o governo no Congresso será o veto da presidente Dilma Rousseff à correção de 6,5% da tabela do Imposto de Renda. Renan avisou que é preciso uma solução negociada, ou a derrota é certa. Na saída do encontro, Vargas disse que "distensionou" o ambiente entre Renan e o Planalto.

- O presidente nos colocou a sua visão de que seria importante o governo encontrar uma saída negociada em torno do veto do Imposto de Renda, negociada com as duas Casas. Vamos trabalhar nos próximos dias para ver o que é possível.

Sobre a devolução da medida provisória que anulava os efeitos da desoneração sobre a folha das empresas, ocorrida na véspera, Vargas disse que Renan quis deixar claro que o governo precisa conversar mais. A presidente Dilma tentou evitar a devolução da MP na tarde de terça-feira, mas não conseguiu conversar com Renan a tempo. Ela telefonou para o presidente do Senado, mas ele já estava anunciando sua posição no plenário do Senado e sendo cumprimentado pela oposição. Desde então, Dilma e Renan não se falaram.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, conversou com Renan por telefone, mas também não teve sucesso. Senadores disseram ao GLOBO que Levy lembrou a Renan que ele é pai de um governador, Renan Filho, de Alagoas.

- Sou presidente do Congresso e não do governador - respondeu Renan, segundo senadores.

A decisão de Renan de devolver a MP da desoneração foi vista no Planalto como uma "jogada de marketing" para dividir as manchetes com a citação de seu nome pela PGR. Apesar da troca de farpas, o fontes do governo acreditam numa "reconstrução" de ponte com o presidente do Senado.

Pela manhã, Dilma fez reuniões para tratar das medidas de ajuste fiscal com líderes dos partidos aliados no Congresso. Não convidou para as conversas o vice-presidente Michel Temer, com quem tinha se comprometido a chamar para as discussões políticas com a base. Diante do incômodo causado, no fim da tarde Dilma chamou o vice ao seu gabinete para conversar. (Colaboraram Júnia Gama e Fernanda Krakovics)

As derrotas de Dilma
Orçamento impositivo.
A Câmara aprovou a PEC que obriga a execução das emendas parlamentares

Reforma Política.
O PT foi excluído do comando da comissão, que ficará nas mãos da oposição

Líder do PMDB na Câmara
O deputado Leonardo Picciani (RJ) se tornou o líder. Nas eleições de 2014, ele defendeu o voto em Aécio Neves (PSDB)

Partidos.
A Câmara aprovou projeto que altera a criação de partidos. Se for aprovado no Senado, o ministro Gilberto Kassab (Cidades) não poderá criar uma nova sigla para que o Planalto tenha uma alternativa ao PMDB

MP da desoneração.
O presidente do Senado, Renan Calheiros, devolveu ao governo a MP 669, que anula o programa de desoneração da folha de pagamento das empresas

CPI da Petrobras.
Presidente da Câmara, Eduardo Cunha defendeu que a investigação seja a partir de 2005, quando Lula já era presidente, e não desde o governo FH, como desejava o PT

'Dilma está emparedada pelo Congresso, que impõe sua agenda'

Entrevista – Murilo de Aragão

• O propalado fracasso na relação Dilma Rousseff com o Congresso mudará de vez a política do país, opina o cientista político Murilo de Aragão. Para ele, a falta de habilidade e de apreço de Dilma pela política põe um ponto final na postura submissa do Legislativo em relação ao Executivo

Isabel Braga – O Globo

BRASÍLIA -

O que representa a atitude do presidente do Senado, Renan Calheiros, de devolver um projeto importante para o ajuste fiscal após ser avisado que seu nome estava na lista de políticos da Lava-Jato?
A atitude do Renan combina dois fatores claros para mim: primeiro, o desejo do Congresso de ser reconhecido como poder que é. É uma atitude institucional e segue tendência clara, que começou com a decisão de votar os vetos presidenciais e aprovar o orçamento impositivo. O segundo fator é operacional. A coordenação política do governo com o Congresso não está funcionando. Uma MP com essa relevância teria que ter sido previamente negociada com as principais lideranças.

Renan já havia boicotado um jantar com Dilma. Ele passou de aliado preferencial a rebelde?
Não acredito que a não ida tenha sido retaliação a alguma desfeita de natureza pessoal. O que existe é um desconforto dentro da coalizão do PMDB e um fortalecimento institucional do Congresso.

Os nomes de Renan e Cunha na lista do procurador podem significar um enfraquecimento dessa independência do Legislativo?
Qualquer envolvimento ou investigação traz desconforto. Agora, não atribuo a esse episódio o acirramento da relação entre governo e Congresso. São atitudes independentes. Estar incluído na lista é decisão do Ministério Público, a partir de investigações do Judiciário. Há um fortalecimento institucional e deficiência na coordenação política.

O senhor faz um diagnóstico de crise no presidencialismo de coalização. Pode explicar o porquê?
O presidencialismo de coalização visa dar ao presidente eleito uma maioria no Congresso. Seria, a grosso modo, um semiparlamentarismo, porque o governo precisa ter uma maioria para aprovar suas propostas e se proteger contra a oposição. Na medida em que as forças políticas do Congresso não se acham adequadamente representadas no governo, ocorrem tensões. E essas tensões ficaram evidenciadas ao longo do primeiro mandato de Dilma.

Mas como chegou a esse ponto?
Não houve a adequada participação dos partidos nos ministérios, na distribuição de cargos e de verbas relacionadas a esse suporte no Congresso. Com isso se criou um passivo de insatisfações e recalques que desemboca agora no segundo mandato. Ela está sendo emparedada pelo Congresso, que impõe sua agenda.

Mas a presidente tem 39 ministros, com representantes desses partidos neles. O que não funciona?
Os ministérios, muitas vezes, são vazios. Quem comanda a máquina não é o titular do partido que o ocupa. Recebe o ministério, mas não a caneta para administrar. E algumas vezes ela escolhe o ministro do partido, não é o partido que escolhe, o que gera tensão. E o terceiro ponto diz respeito à proporcionalidade não adequada ao tamanho das siglas no Congresso. O PT criou uma ideia de que ter a presidente daria uma supremacia maior do que deveria ter. Quem deveria mandar é a coalização dos partidos que apoiaram a eleição de Dilma e Michel Temer.

Mas não foi sempre assim?
O PMDB demorou a perceber que tem mais poder do que ele exerce efetivamente. Só após a irritação causada pelo primeiro mandato de Dilma é que o desperta para essa realidade.

Janot descarta investigação de menções a Dilma e Aécio

• STF vai avaliar recomendação do Ministério Público sobre petista e rival tucano

• Citações feitas por delatores da Operação Lava Jato sobre os adversários ainda são mantidas em sigilo

Severino Motta, Andréia Sadi, Gabriel Mascarenhas – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, recomendou ao Supremo Tribunal Federal que não abra investigações sobre a presidente Dilma Rousseff e seu adversário nas eleições de 2014, o senador Aécio Neves (PSDB-MG).

Os dois foram citados em depoimentos dos delatores da Operação Lava Jato, que investiga um vasto esquema de corrupção na Petrobras. O Supremo deverá acatar a recomendação ainda nesta semana, e com isso Dilma e Aécio não serão alvo de inquéritos.

Ainda não está claro o contexto das menções feitas a Dilma e Aécio nos depoimentos, porque os documentos enviados por Janot ao ministro Teori Zavascki, relator dos processos da Operação Lava Jato no STF, são sigilosos.

No ano passado, a revista "Veja" revelou que o doleiro Alberto Youssef disse em um de seus depoimentos que Dilma e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu antecessor e padrinho político, sabiam do esquema de corrupção que atuava na Petrobras.

Na avaliação do caso de Dilma, disseram investigadores à Folha, foi levado em conta o artigo 86 da Constituição, que define as situações em que um presidente da República pode ser investigado por crimes de responsabilidade e outras infrações.

De acordo com o artigo, durante o exercício de seu mandato, o presidente da República não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções. Procurado, o Palácio do Planalto não fez comentários sobre a decisão de Janot sobre Dilma.

Sobre Aécio, em um de seus depoimentos, o doleiro Youssef afirmou ter ouvido dizer que o senador tinha influência sobre negócios em uma diretoria da estatal Furnas, no fim do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), segundo o advogado do delator.

Sem entrar em detalhes sobre a citação, Aécio afirmou que "setores do governo, que são os protagonistas desse escândalo" tentaram "envolver a oposição" no caso, e que recebeu como uma "homenagem" a decisão de Janot.

O ministro Teori Zavascki deve levantar o sigilo dos processos até sexta-feira, quando promete se pronunciar sobre os 28 pedidos de abertura de inquérito e 7 de arquivamento que recebeu de Janot.

Os pedidos de investigação atingem 54 pessoas, incluindo deputados e senadores que só podem ser investigados com autorização do Supremo. A lista inclui os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Janot também recomendou o arquivamento do caso do ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). A presidente Dilma deve nomeá-lo ministro do Turismo depois que o STF confirmar o arquivamento do caso.

A Procuradoria aceitou pedidos de inquérito sobre a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), que chefiou a Casa Civil no primeiro mandato de Dilma, e seu marido, o ex-ministro das Comunicações Paulo Bernardo, também petista.

Segundo Youssef, operadores do esquema de corrupção entregaram R$ 1 milhão para a campanha da senadora nas eleições de 2010. Gleisi nega ter recebido doações ilegais.

Em mensagem enviada a todos os membros do Ministério Público Federal nesta quarta-feira, o procurador Janot disse que fez "uma opção clara e firme pela técnica jurídica" ao encaminhar os pedidos de investigação ao Supremo, "independentemente dos envolvidos, dos seus matizes partidários, ou dos cargos públicos que ocupam ou ocuparam".

Janot sugeriu aos demais procuradores que se mantenham "unidos e fortes" para combater "investidas que busquem diminuir o Ministério Público brasileiro, desnaturar o seu trabalho ou desqualificar os seus membros".

Colaborou Frederico Vasconcelos, de São Paulo

Janot pede arquivamento de investigações contra Dilma na Lava Jato

• Em recomendação ao Supremo, Janot justifica que a Constituição não permite investigação contra chefe do Executivo por atos não relacionados ao exercício do cargo da Presidência

Débora Bergamasco - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Supremo Tribunal Federal o arquivamento de investigação sobre a presidente Dilma Rousseff por conta de citação feita sobre ela no curso das apurações da Operação Lava Jato, que investiga esquema de corrupção na Petrobrás. No documento enviado ao ministro Teori Zavascki, Janot, entretanto, não faz nenhum juízo de valor sobre essa citação. O Estado apurou que ele se limita a dizer que a Constituição não permite que o chefe do Executivo seja investigado por qualquer ato que não seja relacionado com o exercício do cargo da Presidência, posto assumido por Dilma apenas em 2011.

Essa justificativa foi adotada por opção de Janot. Ele poderia, simplesmente, não ter incluído o nome dela na lista, mesmo que apenas para arquivar a investigação. A recomendação pelo arquivamento acompanha o pedido encaminhado por Janot ao Supremo nessa terça-feira de abertura de inquérito contra 54 pessoas suspeitas de envolvimento na Lava Jato. Além deles, o procurador apresentou sete pedidos de arquivamento - entre eles o de Dilma e do senador Aécio Neves (PSDB-MG).

Pela citação de Janot, as referências feitas sobre Dilma nas investigações da Lava Jato aconteceram antes de ela assumir a Presidência da República, em 2011. No governo Lula, a petista chefiou o Ministério de Minas e Energia e comandou a Casa Civil. Nesse período também presidiu o Conselho de Administração da Petrobrás, entre 2003 e 2010. Nesse ano, deixou a Casa Civil para disputar sua primeira eleição presidencial.

A referência a Dilma nessa lista amplia sua exposição política, justamente num momento em que o cenário dentro do Congresso é de conflito aberto com o PMDB, principal partido aliado do governo e do PT. Além disso, Dilma também enfrenta enormes dificuldades com deputados e senadores para conseguir aprovar suas propostas de ajuste fiscal na busca pela recuperação da economia.

O material enviado por Janot ao STF está em regime de segredo de Justiça. O sigilo deve ser aberto pelo ministro do Supremo Teori Zavascki, relator do caso.

Menções a Dilma e a Aécio foram descartadas

• Para PGR, citações aos nomes da presidente e do senador eram insuficientes para pedidos de investigação

Vinicius Sassine – O Globo

Escândalos na Petrobras

BRASÍLIA - Ao receber o material da Operação Lava-Jato com as referências a autoridades com foro privilegiado, a Procuradoria Geral da República (PGR) se deparou com citações aos nomes dos dois candidatos que disputaram o segundo turno das eleições presidenciais de 2014: a presidente Dilma Rousseff (PT) e o senador Aécio Neves (PSDB). Durante a análise do conteúdo, na fase que antecedeu aos pedidos de abertura de inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF), a PGR considerou que as menções aos dois não eram suficientes para pedidos de investigação. Não se sabe, porém, se o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, efetivou o descarte da apuração formalizando as solicitações de arquivamento ao Supremo. Integrantes do PSDB garantem, no entanto, que houve arquivamento para o caso de Aécio. Os 28 pedidos de inquérito protocolados no STF, onde são listados 54 nomes, e os sete de arquivamento permanecem sob sigilo. A expectativa é de que o ministro relator do caso, Teori Zavascki, derrube o sigilo até amanhã.

O GLOBO procurou a assessoria de imprensa da PGR para saber o destino formal dos dois casos. Por conta do sigilo dos pedidos de inquérito, o órgão não forneceu a informação. "As citações às pessoas estão sob sigilo", disse a assessoria.

Dilma sem envolvimento nos fatos
No caso de Dilma, a avaliação inicial foi de que as citações seriam apenas referências ao nome da petista, sem um envolvimento direto nos fatos. A citação a Aécio dizia respeito a fatos antigos, da década de 90. Além disso, a referência não guardava relação com o esquema de desvios de recursos da Petrobras, desbaratado na Operação Lava-Jato.

A base para as petições de Janot no STF foram os depoimentos dos dois principais delatores do esquema, o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. O grupo de apoio a Janot, montado no fim de janeiro para analisar as citações aos políticos com foro privilegiado, aventou sobre o que fazer em relação às citações a Dilma e Aécio.

Ao longo do dia, parlamentares do PSDB informaram ter recebido a informação de que Janot recomendou ao STF o arquivamento das citações a Aécio na Operação Lava-Jato. O tucano, que é presidente do partido, comemorou a decisão e disse que houve uma movimentação do governo para tentar envolver a oposição no caso.

- Não tinha conhecimento, mas recebo como uma homenagem o arquivamento. Houve uma tentativa de envolver a oposição. E, se o procurador concluiu que não houve nada, ele tem a última palavra - disse Aécio.

A reportagem apurou que, em determinado momento da análise das citações ao tucano, chegou-se a cogitar a possibilidade de pedido de abertura de inquérito contra o presidente do PSDB. O entendimento que teria prevalecido foi de que as referências não dariam sustentação para o Supremo atender ao pedido do Ministério Público, e determinar a abertura de inquérito.

Youssef citou irmã de Aécio
Em um dos depoimentos da delação premiada, o doleiro Youssef disse que soube que Aécio recebeu dinheiro desviado de Furnas Centrais Elétricas no período em que era deputado federal. Os pagamentos teriam sido feitos por intermédio de uma das irmãs do senador. O relato da propina chegou a Youssef por intermédio do ex-deputado José Janene (PP-PR), já morto. Janene é apontado como um dos chefes dos desvios de dinheiro em contratos da diretoria de Abastecimento da Petrobras.

- Em relação ao senador Aécio, ele falou que ouviu dizer. Não tem prova nenhuma. Ele não conhece o senador. Nunca esteve com ele - disse ao GLOBO o advogado Antônio Figueiredo Basto, coordenador da defesa do doleiro nos processos relacionados à Operação Lava Jato.

Youssef mencionou a irmã do senador, mas não soube dizer qual delas. O senador tem duas irmãs. Para Basto, a acusação é frágil. Esse teria sido o motivo que levou Janot a não pedir abertura de inquérito contra Aécio, segundo o advogado. Ele disse ainda que, se for chamado a depor novamente, Youssef não voltará a falar sobre o assunto porque não teria como provar as acusações.

(Colaboraram Eduardo Bresciani e Jailton de Carvalho)

STF extingue pena de Genoino, beneficiado por indulto de Dilma

• Condenado no mensalão, petista foi preso em 2013; alvará de soltura já foi expedido

Carolina Brígido – O Globo

BRASÍLIA - Condenado no processo do mensalão por corrupção ativa, o ex-deputado José Genoino (PT-SP) recebeu perdão judicial ontem e não vai mais precisar cumprir os três anos e quatro meses de pena que ainda restavam. Ele está livre por força de um decreto baixado em 24 de dezembro pela presidente Dilma Rousseff concedendo indulto natalino a presos de todo o país que atendessem a determinados critérios. Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) atestou que o petista preenche os requisitos do decreto e concedeu o benefício.

O relator Luís Roberto Barroso expediu ontem mesmo o alvará de soltura em favor de Genoino. Embora tivesse prerrogativa para decidir sozinho o futuro do ex-deputado, ele preferiu levar o caso ao plenário, por prudência.

- Como esse foi um julgamento emblemático e é o primeiro caso de extinção de punibilidade, me pareceu bom submeter ao plenário a minha decisão reconhecendo a validade do indulto - disse Barroso.

Passagem rápida pelo sistema prisional
Os demais ministros presentes concordaram com o relator. Votaram pela libertação do preso Teori Zavascki, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. Apenas o ministro Luiz Fux não estava presente.

Genoino recebeu pena de quatro anos e oito meses, mas teve passagem rápida pelo sistema prisional, em decorrência da própria legislação penal. Ele foi preso em 15 de novembro de 2013. Logo depois, foi transferido para a prisão domiciliar por problemas de saúde. Em maio do ano passado, voltou para a prisão, onde permaneceu por três meses.

Em agosto, Genoino recebeu autorização de Barroso para cumprir o restante da pena em casa, pois já havia cumprido um sexto da pena total. Hoje, ele mora em um condomínio fechado de Brasília. No regime domiciliar, ele é obrigado a se recolher em casa à noite e nos finais de semana. Agora, poderá circular livremente.

O decreto presidencial concede o perdão a presos de todo o país que atendam os critérios estabelecidos pelo Conselho Nacional de Política Penitenciária. Os requisitos são bom comportamental e temporal. Em parecer encaminhado ao STF quarta-feira, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, confirmou que Genoino atende às exigências e, por isso, recomendou a concessão do indulto. O STF seguiu a recomendação.

No quesito comportamental, o preso não pode ter recebido penalidade aplicada por falta grave entre 24 de dezembro de 2013 e a mesma data do ano seguinte. "Verifica-se que não houve, durante o período de cumprimento da pena, notícia de cometimento de falta disciplinar grave pelo apenado", escreveu Janot.

Requisitos do decreto foram cumpridos
A exigência temporal é de que o preso esteja em livramento condicional ou cumprindo pena em regime aberto, com a pena remanescente inferior a oito anos, em caso de não reincidentes. O preso também deve ter cumprido um quarto da pena. Para atender ao critério, Genoino deveria ter cumprido um ano e dois meses da pena até o dia 25 de dezembro. Como ele tinha 34 dias remidos, atingiu o cumprimento de um ano, dois meses e 14 dias. Segundo a legislação penal, a cada três dias de estudo ou trabalho, o preso elimina um dia da pena.

"Considerando que o apenado preenche os requisitos estabelecidos no decreto, imperioso o reconhecimento do direito à concessão do induto natalino, declarando-se extinta a punibilidade", diz o parecer do procurador-geral.

Quem obtém indulto não precisa cumprir o restante da pena. O benefício está previsto na Constituição Federal como atribuição do presidente da República. Geralmente, ele é concedido no Natal. Pelo decreto, os presídios deverão encaminhar às Varas de Execuções Penais a lista dos detentos que se enquadram nos requisitos exigidos para o induto. O prazo para o envio dos nomes é de até seis meses. Os advogados dos presos também podem pedir o benefício diretamente, para agilizar o procedimento.

Ainda que não houvesse o indulto, a Vara de Execuções Penais (VEP) do Distrito Federal já previa que Genoino fosse beneficiado com o livramento condicional em 30 de abril. Nesse caso, ele ficaria livre, mas submetido a condições específicas impostas pela Justiça - como a obrigação de ter ocupação lícita, comparecer em audiência judicial a cada dois meses, além de não frequentar bares e não ingerir bebida alcoólica.

No caso de o condenado desobedecer alguma regra, o juiz pode determinar o retorno ao regime domiciliar. Mas, se tudo corresse bem, Genoino viveria em liberdade condicional até junho de 2018, data do fim de sua pena. Agora, ficará livre, como se já tivesse cumprido toda a pena.

Lista de Janot agrava crise e Congresso intensifica ações para desgastar Dilma

• Depois de presidente do Senado devolver medida provisória do ajuste fiscal, presidente da Câmara adota medidas contrárias ao governo; citados na Operação Lava Jato, eles atribuem vazamentos de seus nomes ao Palácio do Planalto

João Domingos e Tânia monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O vazamento da informação segundo a qual Renan Calheiros, presidente do Senado, e Eduardo Cunha, presidente da Câmara, integram a lista de políticos citados pelos delatores da Operação Lava Jato, que apura um esquema de corrupção na Petrobrás, agravou a crise entre o Congresso e o Palácio do Planalto. Os nomes, que estão sob sigilo de Justiça, vieram à tona na terça-feira, 3, dia em que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, entregou a lista com pedidos de abertura de inquéritos ao Supremo Tribunal Federal.

O PMDB de Renan e Cunha já caminhava para uma posição de independência e passou a dar apoio total ao presidente do Senado, que, também anteontem, devolveu ao Executivo uma das medidas provisórias do ajuste fiscal, prioridade de Dilma Rousseff.

Nesta quarta, outras medidas do Legislativo fustigaram o governo. Na Câmara, o plenário aprovou a convocação do ministro da Educação, Cid Gomes, em retaliação à afirmação dele de que a Casa teria mais de “400 achacadores”. A reação a Cid foi comandada por Cunha, que ainda retirou da pauta projeto do Ministério da Educação que cria o Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação Superior (Insaes), entidade destinada a avaliar e regular as faculdades no País. O presidente da Câmara avisou que só levará o projeto para a pauta novamente se Dilma solicitar a urgência, prerrogativa constitucional de que o Executivo dispõe.

Antes, um dos principais aliados de Cunha, o pastor Sóstenes Cavalcante (PSD-RJ), lançou candidatura avulsa à presidência da Comissão de Direitos Humanos, prometida por acordo ao PT. Além disso, houve intensa articulação para a sessão da CPI da Petrobrás de hoje, com o objetivo de acuar o governo e os petistas.

Cunha também colocou em votação a chamada PEC da Bengala, que estende de 70 para 75 anos a idade de aposentadoria compulsória para ministros de tribunais superiores, que foi aprovada em primeiro turno. Com isso, Dilma perde a possibilidade de nomear seis ministros do STF até o fim do seu mandato.

O impeachment também rondou a presidente. Após um almoço com Cunha, o presidente do oposicionista Solidariedade, deputado Paulinho da Força (SP), afirmou que o partido vai encomendar a juristas estudos para basear um pedido de impeachment da presidente por ela ter autorizado, como chefe do Conselho de Administração da Petrobrás, a compra da refinaria de Pasadena, nos EUA, em 2006.

Dilma fez ontem reuniões em separado com os líderes dos partidos aliados na Câmara e no Senado, sempre na tentativa de reduzir a crise. Mas o efeito foi contrário. As cobranças por maior diálogo e interlocução antes de decisões continuaram e o clima de tensão não arrefeceu. Dilma exigiu fidelidade dos partidos da base aliada, lembrando que eles foram contemplados com ministérios e outros cargos importantes.

Ela ainda desencadeou uma série de costuras. Primeiro, mandou o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, conversar com Cunha para restabelecer a ponte com os deputados, já que no Senado o clima estava hostil.

À tarde, Dilma despachou para o gabinete de Renan seu ministro de Relações Institucionais, Pepe Vargas. Mas o presidente do Senado deu um “chá de cadeira” de mais de uma hora no ministro. Ao deixar o gabinete de Renan, Vargas disse que a visita visou “distensionar” as relações entre o Congresso e o Planalto e reconheceu que, se o governo quiser melhorar a relação com o PMDB, tem de ouvir mais o partido antes de tomar suas decisões.

Trâmite. Relator da Lava Jato no Supremo, o ministro Teori Zavascki deve concluir até amanhã a análise do material enviado anteontem por Janot. Zavascki recebeu 28 pedidos de abertura de inquérito contra 54 pessoas, além de sete pedidos de arquivamento. Além de decidir se aceita os pedidos do procurador-geral, o ministro determinará o grau de sigilo que terão as peças ligadas à Lava Jato.

Membros do gabinete de Zavascki já estão trabalhando na análise do material e a expectativa é de que até o fim da semana estejam redigidas as decisões sobre a retirada de segredo de cada um dos inquéritos e dos pedidos de arquivamento. O ministro poderá, contudo, manter em sigilo casos em que a publicidade possa prejudicar as investigações.

As peças só se tornarão públicas quando houver análise de todos os casos enviados ao Supremo.

Colaboraram Andreza Matais, Beatriz Bulla, Fábio Brandt, Talita Fernandes e Daniel Carvalho

UTC pagou dívida eleitoral do PT, diz doleiro

• Youssef afirma, em depoimento, que repassou R$ 2,5 mi a gráfica a mando de empreiteira

Flávio Ferreira e Paulo Muzzolon – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Em depoimento aos investigadores que fazem parte da força-tarefa da Operação Lava Jato, que apura um esquema de corrupção na Petrobras, o doleiro Alberto Youssef afirmou que depositou R$ 2,5 milhões para um gráfica para pagar dívida de campanha do PT em 2012.

Segundo Youssef, que firmou acordo de delação premiada com a Lava Jato em troca de uma pensa menor, o pagamento foi feito a pedido da empreiteira UTC para uma gráfica em São Paulo.

O doleiro afirmou ainda que os repasses foram realizados por meio de contas bancárias de Leonardo Meirelles e Meire Pozza, ex-sócio e ex-contadora de Youssef, respectivamente.

Se confirmados, os depósitos configurariam caixa dois, pois foram feitos diretamente para a gráfica, sem registro nas contas do partido.

"Na época uma pessoa chamada Chico, a mando da UTC, procurou o depoente pedindo a disponibilização dos valores destinados à gráfica, informando que se tratava de uma dívida do Partido dos Trabalhadores", afirma trecho da delação.

Segundo reportagem do "Valor", a dívida referia-se à campanha de Fernando Haddad (PT) à Prefeitura de São Paulo, e foi quitada a mando do presidente da UTC, Ricardo Pessoa, atualmente preso na carceragem da Polícia Federal em Curitiba.

O advogado Alberto Toron, que representa o empresário, afirmou desconhecer a delação de Youssef e a reportagem do "Valor", e que portanto não iria comentar. A assessoria da UTC informou que a empresa não está prenunciando sobre o caso.

A Folha não havia conseguido, até a conclusão desta edição, contato com o diretório municipal do PT. Ao "Valor", a sigla informou que as doações de empresas feitas para a campanha de Haddad foram legais e rejeitou a acusação do doleiro.

Suspeito fez depósito em conta para Vaccari

• Operador do doleiro Alberto Youssef depositou R$ 400 mil em nome da mulher do tesoureiro do PT, em 2008

• Na época, o petista não cuidava das finanças do partido; ele diz que a transação foi um empréstimo já quitado

Flávio Ferreira – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Pela primeira vez na Operação Lava Jato, as autoridades que investigam o caso obtiveram comprovantes de transações bancárias que ligam o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, a suspeitos de operar no esquema de corrupção na Petrobras.

A força-tarefa da Lava Jato apura se duas operações de recebimento e envio de R$ 400 mil em 2008 e 2009 com o uso de uma conta da mulher de Vaccari tiveram ligação com o suposto pagamento de propina pela Toshiba em negócios com a Petrobras.

O dinheiro foi movimentado a partir de uma conta de uma empresa controlada pelo empresário Cláudio Mente, que, segundo o doleiro Alberto Youssef, operava o pagamento de subornos na estatal de petróleo.

Vaccari afirma que as transações resultaram de um empréstimo concedido a ele por Mente, seu amigo, para a aquisição de uma casa.

Os documentos fazem parte de um inquérito aberto em janeiro para investigar se a Toshiba repassou duas parcelas de propina a Vaccari, no valor de R$ 400 mil cada uma, entre 2009 e 2010, para o fechamento de um contrato no valor de R$ 117 milhões com a Petrobras para obras no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).

Essa suspeita surgiu após Youssef apontar a realização desse crime em um dos depoimentos de sua delação premiada na Lava Jato.

Nessa investigação foi anexado o depoimento do advogado Carlos Alberto Pereira da Costa, apontado como laranja de Youssef e gestor da empresa de Mente, a Comércio de Produtos Agropecuários, que tem o nome fantasia de CRA (Centro de Reproduções das Américas).

Em fevereiro, Costa afirmou à PF ter providenciado uma remessa de R$ 400 mil de uma conta da CRA para uma conta de Giselda Rousie de Lima, mulher de Vaccari, em novembro de 2008.

O advogado relatou que elaborou um contrato de empréstimo para justificar a transferência, mas que a CRA nunca emprestou dinheiro.

De acordo com Costa, o contrato de novembro de 2008 e um termo de quitação do empréstimo, com data de 29 de dezembro de 2009, foram elaborados no mesmo dia, o que era comum na empresa para "esquentar" transações financeiras.

O advogado entregou à Polícia Federal o comprovante da transferência para Vaccari em 2008 e também um extrato que aponta uma remessa de R$ 400 mil da conta do atual tesoureiro do PT para a conta da CRA no dia 22 de dezembro de 2009.

À época, Vaccari presidia a Bancoop (Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo). O Ministério Público move ação penal em que acusa Vaccari de ter desviado valores da entidade para o PT --o que ele nega.

Vaccari assumiu a tesouraria do PT em 2010.

Em depoimentos prestados em fevereiro à força-tarefa da Operação Lava Jato, Costa e Youssef apontaram que Mente operava o pagamento de propinas para empreiteiras.

A Polícia Federal agora vai buscar o depoimento de executivos da Toshiba para aprofundar as investigações.

Janot rejeita pressão política na Lava-Jato

Janot critica pressão e diz que se baseou em critérios técnicos 

• Ministro do STF deve analisar pedidos do procurador até amanhã e acabar com sigilo da lista

Jailton de Carvalho – O Globo

BRASÍLIA - Um dia após pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) abertura de 28 inquéritos contra 54 pessoas, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot rejeitou as pressões políticas sobre o Ministério Público e disse que se baseou em critérios técnicos, sem levar em conta vínculos partidários e cargos públicos dos acusados. O procurador deixou claro ainda que está ciente da forte reação que terá pela frente e de possíveis tentativas de desqualificar as investigações. Janot fez o desabafo numa carta endereçada aos colegas do Ministério Público.

"Não acredito que esses dais de turbulência política fomentarão investidas que busquem diminuir o Ministéro Público brasileireo, desnaturar o seu trabalho ou desqualificar os seus membros. Mas devemos estar unidos e fortes", afirmou o procurador-geral. Na semana passada, Janot recebeu um alerta do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para aumentar sua segurança pessoal. Na última sexta-feira, ele relatou que teve sua casa em Brasília invadida em janeiro, pouco após criar a força-tarefa para preparar os pedidos de inquérito contra parlamentares. O caso está sendo investigado pela Polícia Civil.

Segundo o procurador-geral, a Operação Lava-Jato, base das acusações contra os políticos, chegou num momento crucial. Caberá ao ministro Teori Zavascki, relator no STF, decidiu se acolhe ou não os pedidos de inquéritos contra os presidentes do Senado, Renan Calhereiros (PMDB-AL), da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e outros acusados de receber dinheiro desviado de contratos entre empreiteiras e a Petrobras.

"Estou certo que, uma vez levantado o sigilo do caso pelo ministro Teori Zavascki, o trabalho até este momento realizado será esquadrinhado e submetido aos mais duros testes de coerência!", disse Janot. "Não espero a unanimidade nem a terei. Desejo e confio, sim, nesse momento singular do país e, particularmente, do Ministério Público brasileiro, que cada um dos meus colegas tenha a certeza de que realizei meu trabalho em direção aos fatos investigados, independentemente dos envolvidos, dos seus matizes partidários ou dos cargos públicos que ocupam ou ocuparam", acrescentou.

Teori planeja terminar até amanhã a análise dos pedidos de abertura de inquérito feitos por Janot. O sigilo deverá ser derrubado e o país conhecerá os nomes dos investigados. Janot também pediu diligências iniciais, como a oitiva de testemunhas, o compartilhamento de provas obtidas na primeira instância, além de quebras de sigilos fiscais e bancários. Teori deverá concordar com os pedidos.

Janot também quer o arquivamento de sete petições, por falta de provas suficientes contra os suspeitos. Janot solicitou que os inquéritos tramitem de forma pública, sem o sigilo judicial. Teori deve concordar com esse pedido. Permanecerão em segredo apenas provas que, se fossem divulgadas, comprometeriam o bom andamento das investigações. Também devem continuar sob sigilo provas que expõem a intimidade do investigado, como informações bancárias.

A decisão de pedir a inclusão num mesmo inquérito de pessoas sem foro junto ao STF vem adiando os pedidos de investigações contra os governadores citados na Lava-Jato - chefes de Executivos locais são investigados e processados no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A procuradoria ainda analisa os casos dos dois governadores citados: Luiz Fernando Pezão (PMDB), do Rio, e Tião Viana (PT), do Acre. Por conta da decisão de sugerir a conexão de fatos criminosos num mesmo inquérito no STF e da repercussão disso nos casos do STJ, os pedidos de abertura de inquérito contra os governadores só devem ser feitos na próxima semana.

Uma fonte com acesso às investigações relata que a quantidade de casos arquivados não deve passar de três - os outros quatro se referem apenas a uma baixa nos registros do STF, a partir do encaminhamento de casos para a primeira instância, no Paraná. Um dos casos seria o do ex-deputado federal Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), ex-presidente da Câmara. Caso Alves esteja fora da lista de Janot, está cotado para ser ministro do Turismo.

- Não recebi nenhuma comunicação. Aguardo naturalmente confiante a decisão da Justiça. Encontro-me em Natal, e acompanho fatos apenas pelo noticiário da imprensa - afirmou o ex-deputado.

Dois senadores do PT, Gleisi Hoffmann (PR) e Humberto Costa (PE), estariam entre os citados nos depoimentos das delações premiadas que embasaram os pedidos de Janot, segundo um investigador que atuou no caso. A lista de Janot é mantida sob sigilo. Caberá a Teori concordar com o pedido de Janot para derrubar o sigilo e abrir o andamento dos processos. Teori sinalizou que tornará público os procedimentos.

Ontem, no Tribunal de Contas da União (TCU), a área técnica concluiu parecer considerando que os acordos de leniência a serem assinados entre a Controladoria Geral da União (CGU) e as empreiteiras investigadas na Lava-Jato precisam ser submetidos ao Ministério Público Federal (MPF). Além disso, o órgão vinculado à Presidência da República deve comprovar que as construtoras vão apresentar informações inéditas sobre as irregularidades investigadas, demonstrando a "real vantagem para a administração". O governo da presidente Dilma Rousseff defende os instrumento da leniência no caso das empresas suspeitas de participação no esquema de desvios da Petrobras.

No último dia 21 de fevereiro, o Ministério Público junto ao TCU apresentou uma representação ao presidente do tribunal, ministro Aroldo Cedraz, em que pede a suspensão dos acordos envolvendo as empreiteiras da Lava-Jato. No documento, o procurador Júlio Marcelo de Oliveira argumenta que é preciso "evitar que se celebrem acordos que possam atrapalhar o curso das investigações dessa importante operação (a Lava-Jato)". O ministro Augusto Nardes foi designado para ser o relator do processo. Antes de tomar uma decisão, o ministro recebeu o parecer elaborado pela Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura de Petróleo, Gás Natural e Mineração. O documento foi concluído anteontem e anexado ao processo.

Em despacho assinado ontem, Nardes determinou que a unidade técnica faça uma oitiva da CGU, do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), da Advocacia Geral da União (AGU) e da Procuradoria Geral da República (PGR) a respeito do assunto. O prazo dado é de cinco dias. "A necessidade de participação do MPF nos processos administrativos referentes aos acordos de leniências firmados no âmbito administrativo se configura inequívoca, tendo em vista os reflexos que trazem ao processo judicial", citou o ministro.

Dólar sobe com crise política e cotação para turista vai a R$ 3,33

Mais uma barreira rompida

• Dólar comercial atinge r$ 2,98, e quem planeja viajar ao exterior já paga até r$ 3,33 pela divisa

Ana Paula Ribeiro, Alyne Bittencourt – O Globo

Câmbio em disparada

SÃO PAULO, RIO E BRASÍLIA - A percepção de risco em relação ao Brasil já não era boa. E agravou-se ainda mais diante da piora das relações entre o governo federal e o PMDB, que detém as presidências da Câmara e do Senado. Os investidores calculam que o risco político está maior, dificultando as chances de implementação do ajuste fiscal - e isso se refletiu diretamente na cotação da moeda americana. O dólar comercial fechou ontem em alta de 1,77%, a R$ 2,980, maior valor de fechamento desde os R$ 2,987 de 19 de agosto de 2004. Na máxima do pregão, a divisa chegou aos R$ 3, valor mais alto registrado desde os R$ 3,013 de 18 de agosto de 2004. Os recordes não pararam por aí. No câmbio turismo, aquele usado por quem viaja ao exterior, os valores também dispararam: atingiram máxima de R$ 3,33.

O preço médio do dólar turismo em São Paulo, compilado pela agência CMA, ficou em R$ 3,18, uma alta de 3,24% em relação ao pregão anterior. Sobre esse valor, há ainda a cobrança de IOF, que é de 0,38% no papel-moeda e de 6,38% no cartão viagem.

No Rio, a Corretora Cotação cobrava R$ 3,33 pelo dólar turismo para quem escolhia carregar um cartão pré-pago, o chamado Travel money - Valor que já inclui o IOF. Para quem comprava em espécie, a divisa saía a R$ 3,17, também já com o imposto. Nas corretoras TOV e Ultramar, o valor cobrado para o cartão pré-pago era de R$ 3,29. Mas, na primeira, o dólar em espécie saía a R$ 3,14, contra R$ 3,09 na segunda. No Banco do Brasil, o consumidor tinha de desembolsar R$ 3,18 pelo dólar turismo no pré-pago e R$ 3,08 pela moeda em espécie. No Bradesco, os valores eram de R$ 3,29 e R$ 3,14, respectivamente.

Lista da Lava-Jato pesa na incerteza
A tensão nos mercados se deve ao temor de que o governo não consiga aprovar as medidas necessárias para o ajuste fiscal, dificultando o cumprimento da meta do superávit primário, de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país). E essa incerteza faz crescer o receio de que o Brasil possa perder o grau de investimento concedido pelas agências de classificação de risco, que representa um selo de bom pagador. Se o país perder essa classificação, receberá menos investimentos externos. Além disso, analistas temem uma paralisia nos trabalhos legislativos, devido à deterioração nas relações entre o governo da presidente Dilma Rousseff e o Congresso.

- Houve um mau humor com a devolução, pelo presidente do Senado, da medida provisória que trata das desonerações. Além disso, a lista do procurador-geral, Rodrigo Janot, criou um desequilíbrio político - avaliou Bernard Gonin, analista econômico da Bozano Investimentos, referindo-se à lista de políticos que teriam envolvimento com a Operação Lava-Jato.

Na terça-feira à noite, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), devolveu a medida provisória (MP) que altera as regras de desoneração da folha de pagamentos. A reação do governo foi enviar à Câmara dos Deputados um projeto de lei, com o mesmo conteúdo, com urgência constitucional. "Ao se alterar de medida provisória para projeto de lei, a cobrança das novas alíquotas terá de esperar pelo menos 90 dias. Dessa forma, o efeito final da medida será bem inferior ao projetado pela equipe econômica, ou seja, R$ 5,8 bilhões neste ano", avaliou Marco Aurélio Barbosa, da CM Capital Markets, em relatório a clientes.

Além disso, os integrantes da agência de classificação de risco Standard & Poor"s se reuniram ontem com representantes dos ministérios da Fazenda e Planejamento. Isso acabou aumentando os rumores sobre a possibilidade de o país perder o grau de investimento.

- Ontem houve um clima mais de pânico, por isso esse movimento de desvalorização da moeda brasileira. Se o governo não conseguir aprovar as MPs do ajuste fiscal, pode gerar uma crise mais forte - explicou Raphael Figueredo, analista da Clear Corretora.

Na abertura dos negócios, chegaram a circular rumores de que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, teria pedido para deixar o cargo - todos negados pelo Palácio do Planalto.

Preocupação com os dados dos EUA
Outro fator que tem contribuído para a desvalorização do real é a expectativa em relação aos novos dados da economia americana, que podem mostrar um aquecimento ainda maior no mercado de trabalho - um indicador acompanhado com lupa pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano). O índice de desemprego de fevereiro será divulgado amanhã. Se houver melhora nos dados de emprego, aumenta a chance de a alta de juros nos Estados Unidos ser antecipada. Atualmente, o juro básico do país está próximo de zero. A elevação dessa taxa atrairia para os EUA investidores externos, que deixariam os mercados emergentes, pressionando mais a cotação do dólar.

Os negócios na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) também refletiram as tensões do cenário político brasileiro. Os papéis preferenciais (PN, sem direito a voto) da Petrobras caíram 4,06%, cotados a R$ 9,21, enquanto os ordinários (ON, com voto) recuaram 3,78%, a R$ 9,15. Também tiveram queda significativa as ações da Vale. As PN tiveram desvalorização de 2,32%, e as ON, de 1,92%. Os bancos, que têm maior peso na composição do Ibovespa, também operaram em terreno negativo. Os papéis PN do Itaú recuaram 0,87%, e os do Bradesco caíram 2,07%. No caso do Banco do Brasil, a queda foi de 5,03%.

Na contramão desse movimento, as ações das empresas de papel e celulose fecharam em forte alta. Isso se deve ao fato de essas companhias se beneficiarem da valorização do dólar. Os papéis da Suzano subiram 3,20%, enquanto os da Fibria avançaram 3,49%.

- Se tem um setor que está bem é o de papel e celulose, devido à alta do dólar. Não tem crise com a moeda nesse patamar - disse Alan Oliveira, analista da Futura Invest.

Fluxo cambial volta ao vermelho
Já o fluxo cambial, que é a diferença entre os ingressos e as saídas de dólares do país, voltou a ficar negativo em fevereiro, em US$ 1,142 bilhão. Em janeiro, havia registrado um resultado positivo, de US$ 3,9 bilhões. Com isso, o saldo acumulado nos dois primeiros meses do ano ficou no vermelho em US$ 245,868 milhões.

Segundo o Banco Central (BC), as transações comerciais entraram na conta com um superávit de US$ 567,5 milhões, com exportações em US$ 12,379 bilhões e importações de US$ 11,812 bilhões. Já as operações financeiras - que reúnem, entre outros, investimentos estrangeiros diretos e em carteira, remessas de lucros e dividendos e pagamento de juros, apresentaram saldo negativo de US$ 1,856 bilhão.

BC sobe juros mais uma vez, apesar da retração econômica

Para uma economia fraca, mais juros

• Decisão unânime do Copom de elevar a taxa Selic para 12,75% é criticada por economistas e entidades de classe que questionam a eficácia da alta dos juros no combate à inflação

André Boudon, Alessandra Taraborelli – Brasil Econômico

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central mais uma vez agiu conforme o previsto e elevou em meio ponto percentual a taxa referencial de juros, a Selic, para 12,75%. O que ainda gera dúvidas cada vez mais fortes é em relação à eficácia da política monetária restritiva sobre a inflação, que não para de subir, mesmo com o ciclo de aperto monetário que desde setembro passado elevou os juros em 1,75 ponto percentual. A decisão foi unânime, de acordo com o comunicado divulgado pela autoridade monetária. "Avaliando o cenário macroeconômico e as perspectivas para a inflação, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic em 0,50 p.p., para 12,75% a.a., sem viés". Unânimes também foram as críticas das entidades ligadas ao setor produtivo.

Para a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), a decisão de aumentar a taxa Selic pela quarta vez consecutiva é incompatível com o quadro de recessão da economia brasileira. No comunicado, a federação afirma que o ajuste fiscal "feito por meio de aumento da carga tributária e corte dos investimentos públicos não só é nocivo ao crescimento no longo prazo como também não parece ser viável na atual conjuntura econômica e política". O presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Rogerio Amato, afirmou, também em comunicado, que a decisão do BC contribui para desacelerar ainda mais a economia. "Todos os indicadores de desempenho das empresas mostram que a economia está fraca e caminhando para a recessão. A combinação de aumento de impostos e tarifaço, de um lado, e juros elevados, de outro, deve agravar a tendência de desaceleração, com reflexo negativo sobre o emprego e a renda". Segundo a Força Sindical, a decisão do BC foi "desastrosa". "Os insensíveis tecnocratas do Banco Central perderam, novamente, uma ótima oportunidade de afrouxar um pouco a corda que está estrangulando o setor produtivo, que é quem gera emprego e renda.

Infelizmente, mais uma vez, o governo se curva diante dos especuladores. A decisão frustra a sociedade, que ansiava por uma queda na taxa básica de juros", criticou a entidade. O economista-chefe do Santander Brasil, Mauricio Molan, acredita que novas altas de juros seriam desnecessárias, já que a economia está em recessão. Porém, o Banco Central deve manter o ritmo de alta e subir a taxa em mais 0,50 ponto percentual na próxima reunião para segurar os efeitos da valorização do dólar sobre a inflação. Além disso, os efeitos do ajuste fiscal ainda são incertos. Por isso, o economista acredita que os juros altos agora não terão apenas a função de desaquecer a atividade mas de conter expectativas. "O país caminha para contração forte da demanda neste ano, o que vai segurar a inflação no ano que vem, sem necessidade de mais elevações de juros.

Mas há incertezas grandes no mercado, em função da capacidade do governo implantar o ajuste fiscal", disse. Para o economista-chefe da Garde Asset Management, Daniel Weeks, o Banco Central está numa encruzilhada, com a inflação se deteriorando e a atividade econômica desacelerando. A alta de 0,50 ponto porcentual na taxa Selic, para 12,75% ao ano não será suficiente para impedir que a inflação chegue próximo do patamar de 8% este ano, em razão da alta dos preços administrados, principalmente energia e combustível, e da desvalorização do real. "Energia e combustível são preços que entram na cadeia produtiva e o impacto é maior. Um aumento de cerca de 50% na energia entra no custo de toda a economia", diz, ressaltando ainda que a pressão na inflação pode se intensificar com o final da operação de swap cambial. De acordo com Weeks, se o BC decidir pelo fim da cota diária de swap cambial, o dólar poderia ultrapassar R$ 3,00 no final do ano o que levara a taxa Selic a situar-se em 14%em dezembro.

"No nosso cenário alternativo, com o BC parando de rolar e deixando o câmbio andar, a moeda chegaria no final do ano entre R$ 3,30 e R$ 3,50, o que significaria Selic entre 13,50% e 14% para que não tenha que revisar a inflação de 2016", pondera. "No curto prazo vai ser duro, mas no médio e longo prazo o que se vê é um crescimento mais sustentável", avalia. Ao contrário de uma grande fatia do mercado que apostava em mais uma alta de 0,25 ponto porcentual da Selic em abril, Weeks acredita que a autoridade monetária não terá espaço para reduzir o ritmo de alta. "Abril não vai ter espaço para reduzir a alta, vai ser o momento em que o inflação deve estar acima de 8%", diz. Para o diretor de gestão de recursos da Ativa Investimentos, Arnaldo Curvello, a política monetária tem eficácia pequena, é mais um fator psicológico. "A inflação está subindo, é mais medo. Brasil parou e sobe juro neste cenário? A inflação de tarifa já existia estava apenas sendo acobertada, agora ela apareceu", diz, se referindo aos preços administrados. "Não vejo eficácia. Se não sobe juro, dólar sobe. Está tudo desalinhado", diz, acrescentando ainda que o único "fio de esperança", é o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, com medidas fiscais eficientes.

Curvello chama a atenção para o fato de o Senado ter sinalizado que não está disposto a ajudar o governo. "O cenário está bagunçado do ponto de vista político. A principal variável agora é a ingovernabilidade. O governo percebeu que não vai ser tão fácil aprovar as medidas necessárias. Esse é um problema que pode minar a credibilidade do governo e, principalmente, das medidas que estão sendo anunciadas", afirma. Para a economista do BI&P Indusval & Partners Natalia Cotarelli, o BC tem feito o seu papel de elevar o juro para conter a inflação. No entanto, ela concorda que os preços administrados e o dólar estão trazendo pressão adicional. "Não consigo ver a inflação em 4,5%em 2016, mas acredito que a convergência se dará para o intervalo da meta", estima. Sobre a ata da reunião que será divulgada na próxima quinta-feira, Natalia acredita que o colegiado do BC deve adotar um tom mais neutro, deixando espaço para mexer na Selic conforme for necessário.

Um quinto do ajuste fiscal depende do Congresso

• Crise com o Legislativo dificulta a aprovação de r$ 24,05 bilhões em cortes de gastos e elevação de impostos

Martha Beck – O Globo

BRASÍLIA - O agravamento da crise política tornou mais difícil para a equipe econômica realizar o plano de ajuste fiscal traçado para 2015 e cumprir a promessa de realizar um superávit primário de R$ 66,3 bilhões, equivalente a 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país). Como o país teve déficit fiscal no ano passado, o tamanho do ajuste proposto pelo governo é maior do que os R$ 66,3 bilhões. No total, as medidas defendidas pelo Ministério da Fazenda somam R$ 113,5 bilhões, sendo que R$ 24,05 bilhões dependem de aprovação do Congresso. Ou seja, 21,2% do ajuste fiscal, ou mais de um quinto, estão sujeitos à aprovação dos parlamentares.

Caberá ao Congresso, por exemplo, decidir se aprova as restrições na concessão de benefícios previdenciários e trabalhistas. Elas representariam uma redução de gastos de R$ 18 bilhões este ano. Os parlamentares também vão definir se o governo terá sinal verde para reverter o programa de desoneração da folha de pagamento das empresas, que daria uma ajuda de R$ 5,35 bilhões para o superávit este ano.

Mão pesada no orçamento
Além disso, o aumento da alíquota do PIS/Cofins sobre produtos importados anunciado em janeiro - que representará um aumento de arrecadação de R$ 700 milhões este ano - também foi encaminhado por medida provisória (MP) e depende de aprovação do Legislativo.

O restante do ajuste cabe à própria equipe econômica e inclui um corte estimado no Orçamento do ano de R$ 60 bilhões - houve um contingenciamento de forma preventiva para o primeiro quadrimestre. O governo já anunciou que não vai mais aportar R$ 7,75 bilhões na Conta de Desenvolvimento Energético este ano. Também houve uma redução da alíquota do Reintegra (programa que dá aos exportadores créditos tributários sobre a venda de manufaturados no exterior), o que reduzirá os gastos em R$ 1,8 bilhão. Houve aumentos de tributos que podem ser ajustados por decreto, como o Imposto sobre Operações Financeiras e a Cide, que devem elevar as receitas em R$ 19,9 bilhões.

Segundo o especialista em contas públicas Raul Velloso, mesmo com as dificuldades na negociação com o Congresso, o ajuste fiscal ainda tem condições de ser executado. Ele afirma que o governo sempre pode fazer acertos do lado dos gastos. Isso comprometerá os investimentos e o crescimento da economia, mas será a única saída para o reequilíbrio das contas públicas proposto pela equipe econômica:

- Se o Congresso não aprovar as medidas, a equipe econômica vai fazer uma execução completamente predatória do Orçamento. Vai exercer o controle de caixa com mão pesada. O investimento não vai ocorrer este ano, mas (o ministro da Fazenda Joaquim) Levy sabe que o governo não pode falhar no ajuste fiscal.

Crise chega à articulação política

• Segundo parlamentares, situação do ministro das Relações Institucionais ficou insustentável após devolução da MP 669

Edla Lula – Brasil Econômico

À beira de uma crise institucional com o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto procura um substituto para o ministro das Relações Institucionais, Pepe Vargas. Ainda sem um líder de governo no Senado, o governo tem tido dificuldade para debelar a crise com o PMDB, que até bem pouco tempo figurava como fiel aliado na Casa. A avaliação entre interlocutores do Congresso é de que o ministro Vargas fracassou em sua missão de promover o diálogo entre os dois poderes e acabou colaborando para o agravamento da crise. A prova disso seria que até Renan Calheiros incorporou o espírito da "independência", como já vinha fazendo o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, desde 2013. Demonstrando total falta de articulação coma base, na terça-feira à noite, enquanto Renan anunciava que devolveria a MP 669, que eleva a carga tributária sobre a folha de pagamento, o Executivo já divulgava a elaboração de um Projeto de Lei com o mesmo teor da MP.

Esqueceu de avisar ao líder do PT, Humberto Costa (PE), que discursou veementemente na tentativa de demover o presidente da Casa da ideia de devolução, mantendo as MPs em tramitação. "Os dias de Pepe Vargas estão contados", disse um parlamentar do partido da presidenta que preferiu não se identificar. Segundo ele, Vargas não encontra respaldo nem mesmo entre vários deputados petistas. "A questão é saber quem vai aceitar cumprir esse papel neste momento de crise", aponta a fonte. Na tentativa de reverter a situação, o ministro se movimentou ontem, promovendo o encontro entre Dilma e líderes da base aliada, primeiro com senadores e depois com deputados. No final do dia, Vargas foi até o presidente do Senado para dar um passo em direção à reconciliação. Voltou ao Planalto para novo encontro com Dilma, do qual também participou o vicepresidente Michel Temer.

Falando a jornalistas, Pepe Vargas negou que haja desarticulação "A gente nunca deixou de conversar com o presidente Renan. Ontem de manhã falei com o presidente Renan", disse. No entanto, segundo ele, Renan não informou ao governo que devolveria a MP. O ministro afirmou não enxergar Renan como um "adversário" do governo: "O consideramos um parlamentar, um presidente do Senado, que faz parte do partido do vice-presidente da República e que faz parte dos partidos que compõe o nosso governo". No encontro da manhã, a presidenta ouviu de cada líder um rosário de queixas relacionadas à falta de diálogo, que já se verificava em seu primeiro mandato e se aprofundou neste início de governo, com o envio das matérias do ajuste fiscal em forma de MPs, sem o conhecimento prévio nem mesmo da base. Segundo Humberto Costa, a presidenta prometeu que daqui para a frente será diferente.

"Ela assumiu o compromisso de que todas as Medidas Provisórias, projetos de lei, e até mesmo medidas do governo que não tenham necessidade de se transformar em lei serão discutidas previamente com os líderes de sua base no Congresso Nacional, à exceção daquelas que possam impactar de imediato, diretamente o mercado financeiro", disse o líder do PT no Senado. A presidenta também sinalizou positivamente em relação à demanda da base de apresentar uma agenda positiva, de retomada do crescimento da economia. "É um conjunto de medidas que será bem recebido pela sociedade", afirmou Costa, citando o Plano de Exportação, prometido para este mês de março, projetos na área de educação e a nova etapa do Minha Casa, Minha Vida. O senador confirmou que o Planalto discutirá com a base a formulação de uma nova proposta para o reajuste na tabela do imposto de renda. Sobre o projeto de lei do governo que substitui a MP 699, ele afirmou que o governo buscará celeridade na aprovação. Costa defendeu a manutenção, no projeto, dos mesmos termos da MP. "Ficou evidente que as medidas estão corretas, não se está eliminando o estímulo que foi dado. O governo abriu mão de R$ 25 bilhões da sua receita e, com essa medida, quer recuperar apenas R$ 12 bilhões", ressaltou.

Venezuela tem situação dramática de violações de direitos humanos, diz ONU

• Alto comissário de Direitos Humanos afirma que há preocupação com a detenção prolongada de líderes opositores no país latino

Jamil Chade - O Estado de S. Paulo

GENEBRA - A ONU considera a Venezuela como uma das situações mais dramáticas de violações de direitos humanos hoje no mundo e faz um ataque direto contra o governo de Nicolás Maduro. A crise na Venezuela foi citada nesta quinta-feira, 5, no discurso anual que o alto comissário de Direitos Humanos da ONU, Zeid Al Hussein, apresentou aos governos das Nações.

"Continuo muito preocupado com a deterioração da situação de direitos humanos na Venezuela", declarou em Genebra. "Estou preocupado em especial com as respostas duras do governo à críticas e à expressão pacífica de seus dissidentes."

No total, o representante da ONU listou 32 países onde violações ocorrem de uma forma preocupante no mundo. Na América Latina, a situação na Venezuela e a violência no México foram destacadas.
Zeid, entre diversos pontos de seu discurso, atacou a autorização dada pelo governo de Maduro para que "força letal possa ser usada contra manifestantes". "Isso é profundamente preocupante", disse o número 1 da ONU para Direitos Humanos.

O jordaniano denunciou a atitude de "altos membros do governo" de "intimidar" e lançar "campanhas de difamação" contra defensores de direitos humanos e criticou a prisão de líderes da oposição. "Estou particularmente preocupado com a detenção prolongada de líderes da oposição e de manifestantes, frequentemente por longos períodos."

Há dois dias, também em Genebra, a chanceler venezuelana, Delcy Rodriguez, conversou com o Estado e garantiu que as prisões contra membros da oposição estão ocorrendo "dentro da lei". "O que se espera de um governo legítimo quando é alvo de ataques violentos?", questionou.

Para a ministra, porém, a questão não é ter governos como o Brasil para mediar um diálogo com a oposição, como pedem ativistas contrário a Maduro. "Não estamos falando de mediação, de nenhum tipo de mediação internacional. Se fosse esse o caso, teríamos de mediar todas as situações que existem em todos os países", declarou.

"Consideramos o Brasil como um país irmão e, como nos demais países da Unasul, existe um acompanhamento da situação da Venezuela", disse. "E esse acompanhamento ocorre com respeito à auto-determinação do povo venezuelano, com respeito ao legítimo governo da Venezuela. Maduro fez o convite aos chanceleres da Unasul que no ano passado cooperaram para derrotar os grupos violentos e grupos terroristas na Venezuela."

Ela voltou a acusar o governo americano de tentar "derrubar" o governo Maduro. "Temos provas do envolvimento do governo de Washington", insistiu. Diante do Conselho de Direitos Humanos da ONU, a chanceler afirmou que, sob o comando de Hugo Chávez, a Venezuela "foi um dos primeiros países do mundo a ter um Estado de direitos humanos". "Hoje, podemos falar em um modelo de inclusão social e é isso que alimenta as forças ocultas para tentar desestabilizar o governo", concluiu.

Merval Pereira - O paradoxo de Dilma

- O Globo

Ao mesmo tempo em que aumentaram seus problemas políticos com a divulgação do que seria parte da lista do procurador-geral Rodrigo Janot, paradoxalmente a presidente Dilma foi blindada pela fragilização do Congresso, com os presidentes da Câmara e do Senado incluídos entre os investigados na Operação Lava-Jato.

Se já era precipitada a defesa do impeachment a esta altura, sem que dados concretos respaldem a suspeita, quase certeza, da população de que a presidente Dilma "tinha conhecimento da corrupção na Petrobras" (77% dos entrevistados); "sabia dos desvios e deixou continuar" (52%); "sabia e nada pôde fazer" (25%), segundo revelou a recente pesquisa Datafolha, agora com processo no STF seria politicamente inviável que uma Câmara presidida por Eduardo Cunha recebesse um pedido de impedimento da presidente ou que o Senado presidido por Renan Calheiros desse prosseguimento ao processo, que seria presidido pelo presidente do Supremo Tribunal Federal.

Essa blindagem, que estava sendo comemorada ontem por aliados mais próximos de Dilma é, no entanto, o que faz com que os dois políticos estejam convencidos de que esse foi o objetivo da inclusão de seus nomes na lista. Como é natural no ser humano, especialmente em políticos da qualidade dos dois, esquecem seus próprios pecados para transferir a outros a culpa por seus infortúnios.

E, como continuarão nos seus cargos durante a maior parte da investigação, e manterão seus mandatos até mesmo depois de eventualmente serem denunciados, ambos estarão em situação de poder para enfrentar o Palácio do Planalto e pressionar politicamente a presidente Dilma.

Se estão convencidos de que foi o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, quem levou o procurador-geral da República a incluí-los na lista e não acreditam mesmo na independência de Janot, consideram, portanto, que pressionando o governo poderão contar com sua interferência no decorrer das investigações da Polícia Federal.

Tem-se então o fato de que a vida da presidente Dilma não ficará mais fácil, ao contrário, com diversos aliados governistas incluídos na lista de investigação de Janot. As dificuldades políticas se somam às econômicas, e o clima de incerteza no Congresso retira qualquer possibilidade de o governo garantir que as medidas de equilíbrio fiscal serão aprovadas.

O ambiente político está contaminado por questões pessoais que terminam sendo fundamentais para tomadas de decisões, muitas vezes certas, mas por motivos errados. É o caso da devolução da medida provisória sobre a desoneração da folha de pagamentos, atitude tomada por Renan com uma razão formal correta e outra, subjacente e negada, mas sabidamente importante, que foi sua inclusão na lista de investigados.

Cada atitude sua, mesmo baseada em razões institucionais, guardará a partir de agora um ranço antigovernista difícil de camuflar. Também Eduardo Cunha teve aumentada sua dose de oposicionista pragmático com a inclusão de seu nome na lista de Janot.

A CPI da Petrobras será um bom palco para exercer sua "independência" do Planalto do Planalto, a base de sua eleição para a presidência da Câmara. O PMDB, como copartícipe do governo, terá sempre uma atitude formal de aliado, mas à medida que sua colaboração não é requisitada pela presidente Dilma, mais distante vai ficando da corresponsabilidade do governo.

O vice Michel Temer só é convocado quando o circo está pegando fogo, como é o caso atual. Só que a esta altura do campeonato, com a presidente fragilizada pela péssima perspectiva econômica, e com a base aliada em pé de guerra, será difícil uma aproximação mais efetiva.

Será o Senado, por exemplo, que aprovará o nome indicado para a vaga do ministro Joaquim Barbosa no Supremo Tribunal Federal. Com vários senadores e deputados na lista de investigados, esse novo ministro, que participará na segunda turma que vai julgar o petrolão, terá sérias dificuldades na sabatina.

Razão primeira para o distanciamento do PMDB do governo, o PT está na berlinda mais uma vez na investigação do petrolão, e não poderá contar com a solidariedade do que seria em tese seu maior aliado no Congresso. A não ser que tudo termine em pizza, dando razão às desconfianças e certezas de Cunha e Calheiros.

Aí é a democracia que estará sendo afrontada.

João Bosco Rabello - Declaração de Guerra

- O Estado de S. Paulo

Ainda que estejam contaminadas pelas suas inclusões na lista dos que sofrerão inquérito no Supremo Tribunal Federal, as ações dos presidentes da Câmara e do Senado, Eduardo Cunha e Renan Calheiros, nas últimas horas, estabelece um divisor de águas nas relações do Congresso com o governo da presidente Dilma Rousseff, sob liderança do PMDB.

A devolução da Medida Provisória que revia as desonerações das folhas de pagamentos de quase uma centena de empresas, por Renan, e a disposição de Cunha em agravar a oposição ao Planalto, são avisos claros de que o campo para negociações políticas encolheu a um ponto crítico, no rastro da desconfiança com o governo do PT.

A lista do Procurador Geral, Rodrigo Janot, enviada ontem ao STF, apenas precipita o que já se desenhava há tempos: o isolamento da presidente Dilma Rousseff, que levou além do limite razoável sua indisposição para o exercício político.

Tirando-se a lista do contexto, é notória a insistência da presidente da República em governar à revelia do Congresso Nacional, o que tentou até institucionalizar com a derrotada proposta de criação dos conselhos populares. Dilma esticou a corda mesmo no cenário crítico de crise econômica e política.

O envio de Medida Provisória com efeito tributário depois do esforço do ex-presidente Lula de resgatar a comunicação com a cúpula do Congresso – e, portanto, com o PMDB-, foi sinal de insensibilidade política com potencial para gerar uma crise institucional.

Ontem, o Congresso fez um movimento claro para se afirmar como um dos três poderes da República, em atitude preventiva em relação aos inquéritos contra parlamentares, mas também para estabelecer o fim do ciclo de submissão ao Executivo, com a adesão da oposição e a omissão do PT, que permanece resistente a sacrificar o que lhe resta de apoio eleitoral para aprovar medidas recessivas.

O pacote fiscal do ministro Joaquim Levy terá de ser formatadao com a participação do Legislativo, mas não por iniciativa do governo. É uma condição arrancada pelo Congresso, em torno da qual estão aliados PMDB e oposição – com o PT ausente.

O PMDB, portanto, inverteu o cenário que o PT tentou estabelecer, que fazia do aliado de segunda categoria o engajado na implantação do processo recessivo, enquanto discursava para a platéia contra as medidas da Fazenda. Agora, o PT terá que assumir seu papel, pois a omissão significará sua participação no isolamento da presidente da República.

O tempo joga a favor do Congresso Nacional e contra a presidente. A decisão do Procurador Geral de pedir abertura de inquérito contra os parlamentares que integram sua lista, ao invés de denunciá-los, estenderá o processo muito além do que se previa, pois inquéritos pressupõem mais investigações para se chegar à etapa de julgamento.

Esse tempo é provavelmente maior do que a capacidade de resistência da presidente Dilma que, certamente, baseou sua decisão de enfrentar o PMDB na suposição de que a chegada do processo do “petrolão” ao STF enfraqueceria não só o partido de seu vice, Michel Temer, mas toda a sua base de sustentação, subtraindo-lhe a energia necessária para manter-se rebelde.

A presidente pretende falar ao país em rede nacional de televisão, por ocasião do Dia da Mulher, quando assumiria a defesa das medidas impopulares, que vem adiando. Esse prazo mesmo já mostra o quanto a presidente perdeu o senso de urgência, que submete à conveniência de não expor a relação de causa e efeito entre seu primeiro mandato e a crise presente.

Nessa batida, outras ações virão no âmbito legislativo, entre elas, a provável aprovação da PEC da Bengala, que estende para 75 anos a idade limite para aposentadoria de ministros de tribunais superiores, a derrubada do veto ao reajuste da tabela de Imposto de Renda em 6,5%, como quer o Congresso, e o tratamento hostil ao PT.

Atribui-se ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha, ainda, a intenção de contratar para a CPI da Petrobras, a empresa de auditoria e investigação, Kroll, a mesma que operou no processo de impeachment do ex-presidente Fernando Collor, como forma de ampliar as investigações no exterior de movimentações bancárias que podem ampliar a lista de envolvidos no esquema do “petrolão” – e em outros ainda submersos.

A Kroll é uma das maiores empresas de investigação mundial e o foco de Cunha é aproximar o escândalo mais ainda do Planalto, a ser verdade a intenção que lhe é atribuída. Ou seja, juntando os cacos, Renan e Cunha fizeram ao Planalto e ao PT uma declaração de guerra.

Do que pode resultar no que o falecido senador Antônio Carlos Magalhães, cunhou como “guerra de extermínio” – e que ele mesmo protagonizou com o ex-senador Jáder Barbalho, ambos abatidos no tiroteio que travaram durante longo período no Senado.

Mas, por ora, a cena de ontem no plenário do Senado é de aliança e sintomática. Renan e o presidente do PSDB, Aécio Neves, em reconciliação pública – o primeiro retratando-se dos ataques recentes que fizera ao tucano e, este, aplaudindo a decisão do segundo de devolver a Medida Provisória do Planalto.

Não há atos gratuitos em política – e este, certamente, confirma a regra. Renan agrava a situação do governo ao abraçar a oposição e, esta, cumpre o objetivo de agravar a situação do governo do PT. Ou seja, a aliança da hora é contra o PT.

Há uma mensagem subliminar no ato de Renan Calheiros: quem devolve uma Medida Provisória do governo aliado, também pode ser receptivo a um eventual pedido de impeachment, embora a hipótese ainda se mantenha distante.

Mas o simbolismo parece claro: se Renan e Cunha, figuras máximas do Poder Legislativo, atribuem ao governo pressão para a inclusão de seus nomes na lista de Janot – e aqui sobressai o inadequado encontro de véspera entre o Procurador e o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo -, raciocinam que não precisam mais ter escrúpulos com relação à figura máxima do Executivo.