quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Opinião do dia – Roberto Freire

Este governo é pior que queijo suíço com furos de corrupção

Roberto Freire, Deputado federal e presidente nacional do PPS. Estado de Minas, 7 de janeiro de 2015.

Graça atuou em gasoduto suspeito

Graça Foster atuou em processo de construção de gasoduto suspeito

• Documento de 2007 mostra que estatal comandou obra superfaturada

Eduardo Bresciani e Vinicius Sassine – O Globo

BRASÍLIA - A atual presidente da Petrobras, Graça Foster, atuou diretamente no processo de implementação da rede de gasodutos Gasene, que liga o Sudeste ao Nordeste, e que, segundo auditoria sigilosa do Tribunal de Contas da União (TCU), teve superfaturamento de mais de 1.800% em um de seus principais trechos. A investigação do tribunal foi revelada pelo GLOBO.

Segundo a ANP (Agência Nacional de Petróleo), a Petrobras criou uma empresa de fachada para construir o gasoduto, usando a sede do escritório de contabilidade contratado para o negócio. O proprietário do escritório, Antonio Carlos Pinto de Azeredo, exerceu o cargo de presidente da Transportadora Gasene entre 2005 e 2011. Em entrevista, disse ter sido apenas um preposto da estatal, sem qualquer autonomia.

Documento assinado em 2007 por Graça Foster, então diretora de Gás e Energia, mostra que ela levou à diretoria executiva da estatal a proposta de aprovação de parcerias para a Transportadora Gasene. Lá, constam duas informações que demonstram que a empresa era comandada, de fato, pela Petrobras. Nas páginas 4 e 5, explicita-se que a companhia estatal agia "em nome e por conta da Transportadora Gasene". Nas últimas duas páginas, é proposta a emissão de três cartas de atividade permitida à gestão da transportadora, forma adotada pela estatal para exercer o comando do negócio.

O carimbo com o encaminhamento à diretoria executiva tem a assinatura de Graça Foster. O documento foi elaborado em 12 de dezembro de 2007 pelas gerências de três diretorias, incluída a comandada pela atual presidente da Petrobras. O registro do encaminhamento é de 14 de dezembro de 2007, mesma data da aprovação pelo colegiado. O que Graça submeteu aos demais diretores foi a contratação da empresa chinesa Sinopec para a construção do maior trecho do Gasene, entre Cacimbas (ES) e Catu (BA), e o financiamento junto ao BNDES, com parte dos recursos vinculada ao banco de desenvolvimento chinês.

O documento chancelado por Graça mostra que a Petrobras, de fato, comandou diretamente todas as principais ações da SPE (Sociedade de Propósito Específico), criada para gerir o negócio. Foi a estatal quem fez as negociações com a Sinopec por meio de uma comissão integrada por gerentes da companhia. No item 16 do documento, afirma-se que a comissão negociou com a Sinopec "em nome e por conta da Transportadora Gasene, visando à contratação dos serviços de engenharia, gerenciamento, suprimento e construção para a implementação do gasoduto Cacimbas-Catu".

Já as cartas de atividade permitida instruem o presidente do Gasene a assinar contratos com a Sinopec no valor de R$ 1,9 bilhão, tanto para gerenciar o projeto quanto para construir parte dos dutos, e a assinar contrato de repasse junto ao BNDES, no valor de US$ 750 milhões, montante oriundo da parceria com o banco chinês. Uma terceira carta se referia a "celebrar os documentos necessários" para o financiamento de longo prazo do BNDES. No domingo, a Petrobras negou "qualquer ligação societária" com a SPE.

Declaração sobre Petrobras derrubou Moreira

• Dilma decidiu tirar ministro da Aviação Civil após ele ter defendido mudanças na estatal

Simone Iglesias e Geralda Doca – O Globo

BRASÍLIA - Até o dia 1º de janeiro, o ministro da Aviação Civil, o ex-governador do Rio Moreira Franco, havia recebido sinalização da presidente Dilma Rousseff de que permaneceria à frente da pasta no segundo mandato. Ela mudou de opinião, no entanto, após ler declarações do peemedebista defendendo mudanças na direção da Petrobras. Depois de participar de um seminário do PMDB sobre reforma política, dia 16 de dezembro, no Rio, Moreira afirmou que a Operação Lava-Jato trará "profundas consequências na governança e na gestão da empresa". Em seguida, disse que acreditava numa "mudança de tudo".

As declarações de Moreira ocorreram na semana em que foi revelado que a ex-gerente da Petrobras Venina Velosa da Fonseca havia alertado a atual presidente da companhia, Graça Foster, sobre irregularidades na estatal. Dilma ordenou então aos integrantes do governo que defendessem publicamente Graça e sua manutenção no cargo.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, foi um dos que cumpriu a tarefa. Moreira, porém, foi de encontro à determinação. Dias depois, o vice-presidente Michel Temer foi chamado ao gabinete presidencial, onde Dilma avisou que Moreira não ficaria no cargo.

Temer tentou evitar substituição
O xadrez da participação do PMDB no governo estava praticamente montado por Temer e pelo núcleo político do partido. Moreira ficaria na Secretaria de Aviação Civil, como indicação do vice, e Eliseu Padilha iria para os Portos ou Turismo, indicado pela bancada da Câmara. Essa vaga estava em negociação com a bancada do Senado. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), preferia manter Vinícius Lages no Turismo, mas, naquele momento, o mais provável era que Lages virasse secretário-executivo de Kátia Abreu no Ministério da Agricultura.

Segundo o relato de peemedebistas, Temer tentou argumentar com Dilma para manter Moreira, mas ela disse que não toleraria desrespeito ao acordo de defender Graça. A garantia de que Moreira ficaria era tão certa que ele estava com a agenda organizada para a posse de Dilma e ministros, no dia 1º.

Ministro do PT contesta Kátia Abreu sobre reforma agrária

• Com discurso oposto ao da nova ministra da Agricultura, titular do Desenvolvimento Agrário fala em 'derrubar cercas de latifúndios' e diz que direito de propriedade não pode ser 'inquestionável'

Lilian Venturini, Ricardo Della Coletta e Nivaldo Souza - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Diante de uma plateia lotada, composta por autoridades e movimentos sociais, o ministro Patrus Ananias assumiu nesta terça-feira, 6, o comando do Ministério do Desenvolvimento Agrário, em Brasília. Em seu discurso, prometeu compromisso com o avanço da reforma agrária e se mostrou disposto a debater o direito à propriedade, que, segundo ele, não pode ser "inquestionável".

"Não se trata de negar o direito de propriedade, uma conquista histórica e civilizatória. E sim de adequar o direito de propriedade aos outros direitos fundamentais", afirmou. "O direito de propriedade não pode ser, em nosso tempo, inquestionável, que prevalece sobre os demais direitos", complementou. O novo ministro reconhece que o tema "desperta polêmicas" e, por isso, diz que a discussão deve envolver o Congresso, o Poder Judiciário e movimentos sociais. "Passa pelo Congresso, pelo Poder Judiciário, Ministério Público. Passa sobretudo pela sociedade, pelos meios de comunicação e pelos movimentos sociais. No limite, é uma escolha feita pela própria sociedade", afirmou.

O discurso de Patrus vai em direção contrária ao posicionamento defendido pela nova ministra da Agricultura, Kátia Abreu. Ligada ao setor ruralista, a ex-senadora, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, argumentou que não existem mais latifúndios no Brasil e que a reforma agrária pode ser "pontual" e não "em massa". A nova titular não compareceu à cerimônia. Já Patrus esteve na transmissão do cargo de Kátia, nessa segunda.
Mais tarde, em entrevista coletiva, ele negou que sua fala tenha sido uma resposta à ex-senadora e disse que o assunto envolve uma "questão técnica".

O novo ministro assume a pasta no lugar de Miguel Rossetto, que já tomou posse na Secretaria-Geral da Presidência da República. Ex-ministro do Desenvolvimento Social no governo Lula e responsável pela implantação do programa Bolsa Família, Patrus recorreu à Constituição Federal e ao Papa Francisco para justificar seu posicionamento em favor da "função social da terra" e da democratização do acesso aos bens e direitos. Para ele, as reformas agrária e urbana "desafiam" o País.

"Ignorar ou negar a permanência da desigualdade e a injustiça é uma forma de perpetuá-las. Por isso não basta derrubar as cercas dos latifúndios, mas derrubar as cercas que nos limitam a uma visão individualista e excludente do processo social", complementou.

Prioridades. A exemplo do pronunciamento da presidente Dilma Rousseff, no dia 1º, o novo ministro prometeu dialogar com os movimentos sociais. Além de programas relacionados à reforma agrária e à agricultura familiar, Patrus destacou entre suas prioridades à frente da pasta a implantação da Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Anater).

A menção à estatal de inovação no campo, criada em 2013 pela presidente Dilma Rousseff, com a missão de oferecer assessoria técnica ao agricultor de pequeno porte, coloca Patrus em rota de colisão com a nova titular da Agricultura, Kátia Abreu.

Kátia Abreu sinalizou ontem, durante seu discurso de posse, que a Anater terá importante na sua pasta para “dobrar a classe média rural em quatro anos”. Ela destacou estatal como fundamental para promover uma “revolução do conhecimento no campo”. “Iremos de porteira em porteira para encontrar essas pessoas”, disse.

Colisão na largada

• Patrus (Desenvolvimento Agrário) e Kátia Abreu (Agricultura) divergem sobre latifúndio e uso da terra

Evandro Éboli e Carolina Brígido – O Globo

BRASÍLIA - Menos de uma semana após a posse do novo primeiro escalão do governo Dilma Rousseff, surgem as primeiras divergências na equipe: os ministros Patrus Ananias, do Desenvolvimento Agrário, e Kátia Abreu, da Agricultura, defenderam publicamente posições conflitantes sobre a questão agrária. Patrus destacou ontem, em seu discurso inaugural, o uso social da terra e condenou a existência de latifúndios. Na véspera, Kátia deixara claro que sua prioridade são os produtores rurais. Em entrevista, ela chegou a dizer que latifúndio não existe. Patrus foi à posse de Kátia, que não retribuiu o gesto.

Em seu discurso, o ministro citou cinco vezes a expressão função social da terra e mencionou a necessidade de ampliar a reforma agrária. E afirmou que o latifúndio persiste no país:

- O tema função social da terra desperta polêmica e enfrenta resistências. Ignorar ou negar a permanência da desigualdade e da injustiça é uma forma de perpetuá-las. Por isso, não basta derrubar as cercas do latifúndio. É preciso derrubar também as cercas que nos limitam a uma visão individualista e excludente do processo social - disse Patrus, aplaudido na sequência.

Essa declaração foi entendida como resposta ao que disse Kátia, em entrevista à "Folha de S. Paulo": 

"Latifúndio não existe mais. Mas isso não acaba com a reforma. Há projetos de colonização maravilhosos que podem ser implementados. Agora, usar discurso velho, antigo, irreal, para justificar reforma agrária? ", disse ela.

Na posse de Patrus, líderes de movimentos sociais levaram faixas de apoio. Vários eram do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que aprovou a indicação do mineiro para o cargo. Na cerimônia de Kátia, representantes do agronegócio marcaram presença.

Direito à propriedade no centro da polêmica
Kátia foi uma porta-voz do setor produtivo. Ela definiu os produtores rurais como a mais importante peça da mais eficiente agropecuária tropical do planeta. Já Patrus defendeu a entrega de terras aos acampados e a atenção aos pobres que estão às margens de bens e direitos.

O ministro associou à Constituição o acesso à terra e afirmou que o direito de propriedade não é algo inquestionável:

- Não se trata de negar o direito de propriedade, uma conquista histórica e civilizatória. Trata-se de adequar o direito de propriedade a outros direitos fundamentais, o interesse público e o desenvolvimento sustentável. O direito de propriedade não pode ser, em nosso tempo, um direito incontrastável, inquestionável e que prevalece sobre todos os demais e sobre o projeto de realização das possibilidades nacionais.

O artigo 5 da Constituição, sobre os direitos fundamentais, prevê a "inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade". E define que o direito à propriedade deve ser respeitado e, em seguida, que "a propriedade atenderá sua função social". No capítulo que trata da reforma agrária, prevê a desapropriação de terras para esse fim, desde que o imóvel rural não esteja cumprindo sua função social, mediante pagamento de indenização.

Em entrevista, Patrus foi questionado sobre a declaração de Katia, de que não há latifúndios:

- É uma questão técnica. Prefiro trabalhar dizendo que temos no Brasil grandes propriedades, talvez a maioria até esteja sendo corretamente explorada pelo grande produtor, produzindo alimento, produto agropecuário que tem a ver com o agronegócio. Mas tem também as terras improdutivas e sobre as quais devemos estabelecer o princípio da função social da terra, para, nelas implementar corretamente, e de acordo com a lei, as famílias que não tem terra.

Ao assumir a Agricultura, Kátia citou sua relação afetiva com o setor produtivo:

- Quero declarar meu eterno amor a essa categoria que ajudou a formar meu caráter.

O que diz Kátia
Latifúndio
"Latifúndio não existe mais. Mas isso não acaba com a reforma. Há projetos de colonização maravilhosos que podem ser implementados. Agora, usar discurso velho, antigo, irreal, para justificar reforma agrária? "
Em entrevista à "Folha de S.Paulo"

Produtores rurais
"Estejam certos de que este ministério terá os olhos voltados, todo o tempo, para a mais importante das peças da mais eficiente agropecuária tropical do planeta: os produtores rurais"

"Este será o ministério dos produtores rurais, sem nenhuma espécie de divisão ou segregação, e das empresas. Será um ministério da produção. Mas será, acima de tudo, um ministério do diálogo, um ministério dos brasileiros"

Exportações
"Estou certa de que temos ainda uma ampla capacidade de produzir mais e exportar mais"

O que diz Patrus
Latifúndio
"Não basta derrubar as cercas do latifúndio. É preciso derrubar também as cercas que nos limitam a uma visão individualista e excludente de função social da propriedade"

Movimentos sociais
"Aqui estamos em decorrência da ação de entidades sindicais e movimentos sociais comprometidos com a agricultura familiar, associados ao cooperativismo, à economia solidária, ao desenvolvimento dos territórios regionais (...) comprometidos ainda com as lutas democráticas pela reforma agrária e pela aplicação do princípio constitucional da função social da proriedade"

Grande produtor x função social
"Talvez a maioria (das grandes propriedades) esteja sendo corretamente explorada pelo grande produtor (...) mas tem também as terras improdutivas, sobre as quais devemos estabelecer o princípio da função social"

PSD e PR costuram criação de novos partidos para atrair descontentes da base e oposição

• Aliados do Palácio do Planalto planejam abrir nova legendas para aumentar influência; PMDB acusa governo de incentivar

• Ministro das Cidades, Gilberto Kassab corre para criar o PL, enquanto o ex-deputado Valdemar Costa Neto, condenado no mensalão, tenta fundar o MB

Ricardo Brito e Ricardo Della Coletta - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Após conquistarem os ministérios dos Transportes e das Cidades, duas das pastas com maior orçamento e capilaridade política do governo Dilma Rousseff, o PSD e o PR decidiram intensificar as ações para criação de dois novos partidos com o objetivo de atrair parlamentares da base e da oposição descontentes com suas legendas.

As articulações das duas legendas têm irritado o PMDB, principal aliado de Dilma no Congresso e que se sente, mesmo tendo ampliado de cinco para seis ministérios, desprestigiado com a reforma. A cúpula do PMDB enxerga nos movimentos uma tentativa de enfraquecê-lo politicamente.

Uma das principais ofertas para atrai-los é a promessa de liberação de emendas para suas bases eleitorais. O presidente do PSD, Gilberto Kassab, que assumiu nessa segunda-feira, 5, o Ministério das Cidades, deve contar com um orçamento de R$ 27,88 bilhões. A pasta é responsável por um dos principais programas federais, o Minha Casa, Minha Vida. Já o novo ministro dos Transportes, Antonio Carlos Rodrigues (PR), deverá ter em sua pasta R$ 19,28 bilhões.

A intenção é fundir o PSD de Kassab com o Partido Liberal (PL), ainda em processo de criação, e elevar a bancada da Câmara de 37 para até 70 deputados federais. Com o aval do ex-deputado Valdemar Costa Neto (SP) - condenado no processo do mensalão e que cumpre pena em casa - o PR patrocina a criação da legenda Muda Brasil (MB).

Ela deverá se tornar um satélite do PR e, segundo dirigentes ouvidos pelo Broadcast Político, deverá ajudar a formar um bloco partidário na Câmara com mais de 50 deputados. A princípio, a intenção da cúpula do PR não é se fundir à nova legenda, mas esta iniciativa não está descartada.

"Com um partido novo existirão parlamentares que se dirigirão pra pedir filiação", afirmou José Renato da Silva, ex-presidente da Câmara municipal de Suzano, no interior de São Paulo, e presidente da executiva provisória do Muda Brasil. "Temos essa expectativa, porque o MB também pode nascer grande", concluiu.

Oficialmente, ele disse que "infelizmente" Costa Neto não atua na formação do novo partido, mas quatro integrantes da cúpula do PR informaram que as articulações têm sido acompanhadas ou respaldadas por ele.

O movimento de atração de parlamentares se ampara na legislação eleitoral. Ela permite que deputados e senadores mudem para outros partidos que tiverem sido criados, incorporados ou fundidos com outras siglas sem o risco de terem os mandatos cassados por infidelidade partidária.

Outro fator de atração dos congressistas para essas legendas é que, nos caso de fusão ou incorporação, esses parlamentares "carregam" consigo o recursos do fundo partidário e o acesso gratuito ao tempo de rádio e televisão. Esse tipo de transferência não ocorre quando da fundação de um partido - como é o caso da ex-candidata do PSB à Presidência, Marina Silva, que tenta viabilizar o nascimento da Rede Sustentabilidade.

Dirigentes do PSD e do PR envolvidos nas negociações relataram que a estratégia é tentar concluir as duas operações antes de outubro. Um dos interesses é tentar atrair deputados federais que queiram mudar de partido para disputar as eleições municipais de 2016. Pela Lei Eleitoral, para ter direito concorrer, um candidato tem de estar filiado a um partido político há, pelo menos, um ano antes da realização do pleito.

Embora com objetivos parecidos, as estratégias - e apoiadores - dos dois partidos são distintas. O PSD conta com o aval velado do Palácio do Planalto a fim de garantir, pelo menos na Câmara, um bloco de apoio ao governo em contraponto ao PMDB, que busca viabilizar o líder do partido e desafeto do Executivo, Eduardo Cunha (RJ), como presidente da Casa. Com o futuro PL, o governo pretende diminuir a força do PMDB - maior partido do Senado e segundo, na Câmara.

No caso do PR, a atuação de aliados de Valdemar Costa Neto na coleta de assinaturas para a criação do partido-satélite foram aceleradas após o segundo turno das eleições e sem respaldo do governo Dilma. "Nossa atuação é totalmente independente", afirmou um deputado do partido envolvido nas negociações.

Nos bastidores, deputados e senadores do PMDB, "enfurecidos" com a conclusão da reforma ministerial, acusam a articulação política do Palácio do Planalto de estar incentivando o surgimento das duas novas forças políticas para diluir a influência dos peemedebistas. Mas se mostram céticos quanto o alcance das articulações do PSD e do PR, mesmo sabendo que deputados do partido já estão sendo alvo de assédio para migrarem para as novas legendas.

Um cacique peemedebista afirmou que o partido detém o controle sobre as principais comissões da Câmara e do Senado e, mesmo com essas novas legendas, ainda terá poder de influir em votações no Congresso. Para o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), se a intenção do governo é enfraquecer o PMDB ao eventualmente estimular tais articulações, o tiro "pode sair pela culatra". "Para enfraquecer o PMDB, o tiro tem que ser para matar", disse.

Partidos pressionam para ocupar todo o 2º escalão das pastas

• Aliados cobram da presidente autonomia para preencher cargos nos ministérios, mas ela deve rejeitar reivindicação

• Nos últimos dias, dirigentes do PMDB têm ameaçado retaliar Dilma pela perda de espaço ministerial

Andréia Sadi – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Com o fim da reforma ministerial, partidos aliados de Dilma Rousseff cobram da presidente a garantia de que terão a chamada porteira fechada"" para montar suas equipes nas pastas.

O termo é usado nos bastidores políticos de Brasília quando o ministro tem autonomia para nomear todo o segundo escalão de sua pasta.

Segundo a Folha apurou, no entanto, Dilma deve rejeitar o modelo, assim como fez no primeiro mandato.

Na reforma que terminou no mês passado, o PMDB garantiu a indicação de ministros para Minas e Energia, Portos, Agricultura, Turismo, Aviação Civil e Pesca. Mas líderes do partido reclamam que a legenda perdeu espaço no governo e foi reduzida a uma gestora de "secretarias"".

Para compensar o que chamam de enfraquecimento político, reivindicam autonomia para emplacar aliados nos órgãos ligados à Secretaria da Aviação Civil, como a Infraero, e no Turismo, como a Embratur, além de recuperar postos no setor elétrico.

Para um peemedebista, a Embratur vale mais"" que alguns ministérios.

Já o PP quer indicar nomes para órgãos vinculados à Integração Nacional, pasta sob o comando de Gilberto Occhi, indicado pela legenda.

Uma das principais disputas nos bastidores é pelo comando do Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contras as Secas). Hoje sob influência do PMDB da Câmara, o posto é cobiçado pela ala do Senado e pelo PP.

Parlamentares do PMDB também estão de olho nas principais diretorias do setor elétrico, especialmente na Eletrobrás e em Furnas. A direção da Eletrobrás está hoje sob comando de José da Costa Carvalho Neto, indicado pelo ex-ministro e governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT). Ele também é amigo de Walfrido Mares Guia, ex-ministro de Lula.

Já Furnas tem Flávio Decat como presidente, ligado ao ex-presidente do Senado José Sarney (PMDB-AP). O PMDB e o PR tinham controle de diretorias no órgão, mas perderam poder em 2011 com a eleição de Dilma. Com a saída de Sarney do Senado, parlamentares almejam recuperar espaço no órgão.

A Chesf (Companhia Hidroelétrica do São Francisco) deve ficar sob comando do PP.

Queixas
Nos últimos dias, dirigentes do PMDB têm ameaçado, nos bastidores, retaliar Dilma no Senado pela perda de espaço ministerial.

Assessores no Planalto minimizam as críticas do partido. Para um integrante do governo, a legenda pressiona para garantir cargos no segundo escalão. Um dos casos citados é o de Renan Calheiros (AL), presidente do Senado. Segundo auxiliares presidenciais, Renan quer manter influência na Transpetro.

O posto é comandado interinamente por Claudio Ribeiro Teixeira Campos, diretor de gás natural da empresa, desde que Sérgio Machado foi citado na Operação Lava Jato, da Polícia Federal.

Machado é apadrinhado por Calheiros, e está de licença desde dezembro. O senador, segundo assessores de Dilma, trabalha para indicar o sucessor de Machado.

Novo presidente do PSDB será eleito no dia 23 de maio

• Senador mineiro, Aécio Neves é o favorito para mais um mandato

Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - O PSDB definiu nesta terça-feira, 6, que convenção nacional da legenda que elegerá a nova direção partidária acontecerá no dia 23 de maio, em Brasília. Há consenso entre os tucanos que o atual presidente da sigla, o senador mineiro Aécio Neves, candidato derrotado à Presidência, deve ser reconduzido para mais um mandato, que terminará em 2017.

Isso significa que ele será o principal operador na montagem dos palanques municipais do partido nas eleições de 2016. Apesar de não existir oposição ao seu nome, Aécio terá de remodelar a direção executiva do partido para acomodar aliados indicados pelo governador paulista Geraldo Alckmin, que saiu fortalecido em 2014 ao se reeleger no primeiro turno. Ambos, Aécio e Alckmin, são apontados por aliados como candidatos naturais ao Palácio do Planalto em 2018. As convenções estaduais devem ocorrer em 26 de abril, e as municipais são esperadas para 19 de abril, nas cidades com mais de 500 mil eleitores, e em 15 de março para as restantes.

Demissões provocam greve na Volkswagen

• Sindicato paralisa fábrica para pressionar empresa a retomar negociações sobre excesso de mão de obra

Eduardo Laguna e Diogo Martins – Valor Econômico

A Volkswagen confirmou ontem que vai demitir 800 trabalhadores na fábrica de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, deflagrando uma greve lançada por tempo indeterminado pelo sindicato dos metalúrgicos da região para pressionar a montadora a anular essas demissões e voltar a negociar alternativas ao excesso de mão de obra na unidade.

O corte foi anunciado como a primeira das etapas de adequação do efetivo no parque industrial do ABC. Segundo a Volks, a derrocada da indústria de veículos, junto com o acirramento da concorrência, exige medidas para melhorar a competitividade da operação.

O sindicato, contudo, diz que a decisão viola o compromisso de preservação de empregos dado pela montadora no acordo trabalhista firmado em março de 2012, o mesmo que a Volkswagen tentou, sem sucesso, alterar no fim do ano passado em decorrência da piora nas condições do mercado.

"Estamos esperando a empresa entrar em contato. Espero ter uma reunião com os representantes da Volkswagen entre quarta [hoje] e quinta feira", disse ao Valor o presidente do sindicato, Rafael Marques, que ainda acredita na possibilidade de a companhia reverter as demissões. Ontem, dia de retorno dos operários das férias coletivas de fim de ano, a greve manteve paralisada a produção nas linhas da Volkswagen no ABC, onde são produzidos os modelos Gol, Saveiro e Polo. O sindicato pretende manter o movimento enquanto a montadora não der sinais de que voltará à mesa de negociação.

Da mesma forma, a entidade planeja parar hoje a fábrica da Mercedes-Benz, também instalada em São Bernardo, em manifestação contra demissões na montadora de caminhões. De acordo com Marques, 262 funcionários foram dispensados da Mercedes no mês passado, número não confirmado pela multinacional.

No caso da Volkswagen, o ministro do Trabalho, Manoel Dias, já se colocou à disposição para ajudar nas negociações entre as partes. Segundo Marques, nenhum trabalhador, seguindo orientação do sindicato, assinou a carta de demissão apresentada ontem pela fabricante de origem alemã. O plano é demitir os 800 operários no dia 5 de fevereiro, após licença remunerada de um mês. Além desse grupo, o sindicato afirma que outros 1,3 mil empregos estão ameaçados, já que o excesso de mão de obra na fábrica de São Bernardo do Campo é estimado em 2,1 mil operários, ou o equivalente a 16% dos 13 mil funcionários atualmente empregados na unidade.

Fora a crise enfrentada pela indústria de veículos, com queda tanto nas vendas domésticas como nas exportações, a desativação, em dezembro de 2013, das linhas que produziam a Kombi e o Gol G4 na unidade também contribuíram ao aumento da ociosidade na fábrica.

Entre julho e novembro do ano passado, a montadora negociou com o sindicato uma revisão no acordo trabalhista firmado em 2012 para reduzir custos e a mão de obra excedente no ABC. Contudo, a proposta, que previa medidas como congelamento de salários, programa de demissões voluntárias e incentivos à antecipação de aposentadoria, foi rejeitado pelos trabalhadores em assembleia realizada no dia 2 de dezembro.

A Volkswagen diz que os reajustes salariais estabelecidos no acordo vigente - com aumentos acima da inflação até 2016 - distanciam a companhia de suas principais concorrentes. Argumenta ainda que paga no ABC uma remuneração média mais alta do que as demais marcas.

Balanço da Anfavea, a entidade que representa as montadoras instaladas no país, mostra que 10,8 mil vagas de trabalho foram eliminadas no setor entre janeiro e novembro de 2014. O resultado final do ano passado, incluindo os números de dezembro, será divulgado amanhã pela associação.

Antes da Volkswagen, a Volvo já havia anunciado em dezembro a demissão de 206 operários na fábrica de caminhões em Curitiba (PR). Assim como acontece na Volkswagen, a multinacional sueca enfrentou greve após a decisão. Mas a paralisação durou apenas um dia, sendo interrompida com a definição de uma indenização especial aos demitidos.

Ontem, durante entrevista a jornalistas no Rio de Janeiro, o presidente da Nissan no Brasil, François Dossa, descartou que a montadora tenha intenção de demitir funcionários em sua fábrica em Resende, no Sul Fluminense. Ele explicou que 279 funcionários que estavam com contrato de trabalho suspenso em regime de "layoff" desde setembro já voltaram a trabalhar regularmente. "Não temos intenção de demitir. Pelo contrário, já que vamos lançar o nosso Versa", disse Dossa, referindo-se ao carro sedã que começa a ser produzido neste mês em Resende.

Presente no evento, o presidente mundial da aliança Renault Nissan, Carlos Ghosn, disse que o "layoff" feito no ano passado pela montadora japonesa foi uma medida de curto prazo e não uma mudança estrutural.

"Tem uma grande diferença entre umas montadoras e outras. Umas têm participação no mercado forte, outras são 'challengers' (desafiantes, em inglês). Nós somos 'challengers', com participação de 2,5% no market share brasileiro. Estamos bem abaixo de nossa média mundial, de 6,5%", afirmou Ghosn.

Procuradas pelo Valor, Fiat, General Motors (GM) e Ford também negaram planos de demissão neste momento.

IPCA de janeiro pode ser o maior desde 2003

Arícia Martins e Camilla Veras Mota – Valor Econômico

Além do aumento já contratado das contas de luz, os reajustes de transporte urbano serão outra pressão importante sobre o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de janeiro. Em São Paulo, as passagens subiram ontem, mas outras três capitais que compõem o IPCA já estavam pagando tarifas maiores: Rio, Belo Horizonte e Salvador. Segundo economistas ouvidos pelo Valor, juntas, as quatro correções devem adicionar cerca de 0,2 ponto percentual à inflação oficial do primeiro mês do ano.

Colocando na conta outros impactos além da energia, como a recomposição da Cide, aumentos de táxi em algumas capitais e o encarecimento de cigarros, as previsões para o IPCA de janeiro estão em cerca de 1%. Se confirmada, essa seria a maior alta do indicador para o primeiro mês do ano desde 2003, quando a inflação foi de 2,25% no período.

Segundo Flávio Serrano, economista-sênior do banco Besi Brasil, o principal impacto sobre os preços de transporte público vai partir da capital paulista, onde as tarifas de ônibus municipais, trem e metrô passaram de R$ 3 para R$ 3,50, aumento de quase 17%. No Rio, o ônibus municipal subiu de R$ 3 para R$ 3,40 no dia 3. Em Belo Horizonte, o reajuste de R$ 2,85 para R$ 3,10 em 80% das linhas convencionais entrou em vigor em 29 de dezembro. Em Salvador, a passagem de ônibus passou de R$ 2,80 para R$ 3 no primeiro dia do ano.

Em conjunto, Serrano calcula que os reajustes vão adicionar 0,2 ponto percentual ao indicador oficial de inflação de janeiro, que deve ficar entre 1% e 1,1%. Na média, o item ônibus urbano deve avançar 8,1% no período. Segundo o economista, cinco pontos desse percentual virão apenas da cidade de São Paulo. "O IPCA de janeiro será mais pesado, mas não só por conta disso", diz, acrescentando que, por conta das bandeiras tarifárias, a energia deve aumentar cerca de 10%, principal influência de alta sobre a inflação do período.

A economista Adriana Molinari, da Tendências Consultoria, também projeta contribuição de 0,2 ponto dos reajustes de transporte público para o IPCA de janeiro, com alta de 8,25% nos preços. A estimativa mais alta para o índice fechado - de 1,32%, que levaria o acumulado em 12 meses a 7,22%, patamar bastante superior ao teto da meta, de 6,5% -, leva em conta o risco de recomposição integral da Cide, contribuição sobre os combustíveis.

Se o imposto chegar a R$ 0,28 por litro, a gasolina deve ficar 9,7% mais cara na bomba e elevar a inflação em 0,36 ponto percentual. Caso não se concretize, parte do impacto pode ser compensado pelo aumento de 8,5% nos preços anunciado pela Souza Cruz - uma antecipação à alta do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para o setor de tabaco esperada para este mês - e pelo reajuste de tarifas de transporte em outras capitais.

Para o economista-chefe da Icatu Vanguarda, Rodrigo Alves de Melo, a recomposição da Cide deve ocorrer entre fevereiro e março, mas, por outro lado, mais cidades ainda podem anunciar aumentos de transporte público nos próximos dias. Em sua previsão de alta de 7% para o ônibus urbano em janeiro, Melo inclui reajuste de 15% das tarifas de ônibus municipal no Recife, e de 10% em Fortaleza.

"Outras capitais tendem a ter reajuste mais à frente e outros itens administrados também, mas a concentração desses aumentos ocorrerá em janeiro. É um movimento pontual de recomposição de administrados", diz Melo, para quem o IPCA vai avançar cerca de 1% no mês. Com essa alta, a inflação acumulada em 12 meses começaria o ano em quase 7%. Ele ainda lembra que os preços de táxi, que subiram em São Paulo e no Rio, devem avançar 3% em janeiro, o que vai acrescentar mais 0,1 ponto à inflação mensal do período.

Também entre as maiores pressões esperadas para janeiro, a energia elétrica subirá 8,8% e adicionará 0,26 ponto ao índice, estima Adriana, da Tendências. "Todos os subsistemas estão com bandeira vermelha", afirmou, em referência ao sistema de bandeiras tarifárias vigente desde o dia 1º.

Fabio Romão, da LCA Consultores, espera alta semelhante para a energia e aumento de 8,26% no item ônibus urbano - uma pressão adicional de 0,25 e de 0,21 ponto, respectivamente, no índice de janeiro, que deve subir 1,13%, calcula o economista. "Os administrados voltam com tudo neste começo de ano", comenta.

Os preços dos alimentos, sazonalmente maiores no começo do ano, devem avançar mais do que em janeiro de 2013 (0,84%) e aumentar 0,94%, estima Romão. As principais contribuições para essa alta devem vir de culturas de curto prazo, como hortaliças, frutas e verduras, afetadas pelas chuvas fortes no mês.

Governo fará cortes antes de Orçamento ser aprovado

Da pedalada à tesourada

• Governo fará corte preventivo no orçamento e elevará impostos de aplicações de curto prazo

Martha Beck, Catarina Alencastro – O Globo

BRASÍLIA - Antes mesmo de o Orçamento de 2015 ser aprovado pelo Congresso, a equipe econômica prepara um contingenciamento relevante nas despesas discricionárias - aquelas não obrigatórias, como viagens, diárias de hotéis, compras e outros serviços -, que pode ser anunciado ainda hoje. A ideia é mostrar ao mercado que a meta de superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) fixada para este ano, de R$ 66,3 bilhões, ou 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB), é viável. O corte não será linear e vai variar por ministério.

Segundo fontes do governo, cada pasta terá um limite máximo para gastar, de acordo com sua natureza. Os detalhes estarão num decreto que será publicado no Diário Oficial da União. O corte de despesas é o principal instrumento para o equilíbrio das contas públicas, em um ano que deve ser marcado mais pelas tesouradas do que pelas pedaladas fiscais de 2014 (atrasos de repasses e pagamentos). Mas a equipe econômica também trabalha com ajustes tributários, como sinalizou o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, em sua posse.

O objetivo é direcionar mais recursos para o investimento de longo prazo no país. Segundo técnicos da equipe econômica, uma ideia é mexer em alíquotas de impostos e contribuições que incidem sobre aplicações no mercado financeiro, de forma que seja mais interessante para o investidor deixar seu dinheiro aplicado por mais tempo. O princípio é que o curto prazo seja mais onerado, para incentivar a formação de poupança doméstica, uma das prioridades da nova equipe econômica.

- Foi esse o sinal que o ministro quis dar quando afirmou em seu discurso que "possíveis ajustes em alguns tributos serão considerados, especialmente aqueles que tendam a aumentar a poupança doméstica". Trata-se de uma política para um período mais longo - disse um técnico do governo.

Como o orçamento de 2015 ainda não foi aprovado pelo Congresso Nacional, o governo só pode gastar por mês até 1/12 do orçamento do ano passado. Mas, segundo fontes, a equipe vai informar que o gasto mensal autorizado será bem inferior a esse teto. Os cortes foram discutidos na segunda-feira em reunião da Junta Orçamentária (composta pelos ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Casa Civil). A presidente Dilma Rousseff estava em Aratu (Bahia), mas foi informada das discussões por telefone. Havia uma expectativa de que os cortes fossem anunciados ontem, mas o Ministério do Planejamento informou de noite que não haveria anúncio.

- O número vai ser forte o suficiente para indicar que o governo vai cumprir a meta de superávit primário de 2015 - disse um técnico.

Na reunião, os três ministros também decidiram criar um comitê para gerenciar os gastos públicos. Esse novo órgão vai ser formado pelos ministérios que já compõem a Junta Orçamentária, e também pela Controladoria Geral da União (CGU), órgão do Executivo responsável pelo acompanhamento das contas públicas.

No campo tributário, os técnicos afirmam que o governo também pretende passar um pente fino nos chamados regimes especiais de tributação que hoje valem para diversos setores da economia, como infraestrutura, tecnologia, exploração de petróleo e exportação. Esses regimes preveem reduções ou mesmo isenção de alíquotas para a aquisição de máquinas e equipamentos destinados a investimentos nesses setores. Neste caso, a ideia é avaliar o que tem efetividade e o que precisa ser ajustado de acordo com a necessidade de cada segmento.

Foi isso o que o ministro quis sinalizar ao dizer que as medidas "procurarão eliminar exceções e reduzir tratamentos idiossincráticos, sem deixar de prestar atenção às particularidades setoriais e individuais".

Segundo os técnicos, a maior preocupação de Levy em termos tributários é corrigir distorções que prejudiquem o crescimento ao longo dos próximos anos, e não aumentar alíquotas para garantir o ajuste fiscal de 2015. A preferência do ministro para reequilibrar as contas públicas imediatamente é pelo corte de despesas:

- Aumentar as receitas no curto prazo pode ser feito com aumento das alíquotas de tributos regulatórios como o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), Cide e o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). Isso seria muito mais fácil, mas essa não é a preferência do ministro - disse um intelocutor do Palácio do Planalto, lembrando, contudo, que isso não quer dizer que eventuais aumentos nesses tributos estejam descartados.

Na segunda-feira, o governo federal editou a medida provisória (MP) 667, para assegurar um crédito extraordinário de R$ 74 bilhões para investimentos. Esse total corresponde a um terço do previsto no Projeto da Lei Orçamentária de 2015, para investimentos dos três Poderes e das empresas estatais. Segundo o Ministério do Planejamento, foi necessário editar a MP porque a lei ainda não foi aprovada no Congresso. A não aprovação inviabiliza a execução dos gastos de investimentos. De acordo com o órgão, medidas como esta já foram tomadas anteriormente, como em 2006 e 2013.

"O crédito previsto na MP viabilizará a execução de investimentos e inversões financeiras no exercício de 2015, com destaque para grandes obras de infraestrutura já em andamento ou a serem implementadas pelo governo federal, de forma a evitar atrasos em seus cronogramas de execução que, de outro modo, resultariam em prejuízos financeiros e postergação de benefícios previstos à população de diversas localidades do país", informou a pasta.

No que diz respeito às estatais, o Planejamento esclareceu que o valor liberado visa a permitir a continuidade dos projetos de investimento em diversas áreas, tais como, energia e petróleo e gás: "Frente ao cenário de maior incerteza econômica, a liberação dos novos investimentos ocorrerá de forma a potencializar a retomada do crescimento econômico sem afetar a consolidação fiscal que está em curso".

Oposição quer investigar gastos feitos pela Petrobras com patrocínios

Eduardo Militão – Estado de Minas

BRASÍLIA – A oposição promete investigar os gastos com patrocínio feitos pela Petrobras a pedido do ex-presidente Luiz Inácio Inácio Lula da Silva. O deputado Júlio Delgado (PSB-MG) afirmou que, em geral, as despesas com publicidade da petroleira já podem ser consideradas “abusivas” mesmo em um período em que a estatal enfrenta uma série de denúncias de corrupção.

Ele disse ao Estado de Minas que a nova suspeita estará entre os tópicos da nova CPI da Petrobras, que deve ser articulada pela oposição no próximo mandato parlamentar, que começa em primeiro de fevereiro. Já o presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), afirma que o melhor caminho para os parlamentares é fazer uma representação ao Ministério Público.

De acordo com Delgado, a denúncia de que o então presidente Lula pressionou para que patrocínios fossem feitos a escolas de samba só reflete como são mal administrados os recursos da petroleira. Em março de 2009, o ex-gerente de Comunicação de Abastecimento da estatal Geovane de Morais afirmou que Lula forçou o patrocínio a 12 escolas de samba do Rio de Janeiro em 2008. O negócio rendeu prejuízos milionários à estatal, de acordo com o jornal Valor Econômico. Geovane foi demitido da empresa após a descoberta de envolvimento em irregularidades, parte delas denunciada pela ex-gerente de Abastecimento Venina Fonseca, co-responsabilizada por desvios na estatal por comissões internas da apuração.

Em nota, o Instituto Lula afirmou que o ex-presidente participou de uma reunião pública em 8 de dezembro de 2007 com o então governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), e o ex-ministro da Cultura Gilberto Gil. No encontro, ficou definido que a Petrobras daria R$ 1 milhão a cada uma das 12 escolas de samba. A assessoria de Lula disse que ele pediu patrocínios, não que fossem feitos desvios com os recursos. “A definição final sobre a aplicação dos recursos e a fiscalização das contrapartidas definidas no patrocínio cabe à Petrobras”, afirmaram os auxiliares do ex-presidente na nota.

De acordo com a Petrobras, foram verificadas a execução do projeto e o cumprimento das contrapartidas de imagem. “O projeto Samba Carioca Patrimônio Cultural do Brasil garantiu grande visibilidade na exposição da marca Petrobras, por intermédio de eventos realizados ao longo de todo o ano, nas quadras das escolas, na Cidade do Samba e durante os dias de desfiles. Além da visibilidade da marca, o projeto tinha como objetivo preservar a tradição do samba no Rio de Janeiro.”

Estratégia
O presidente do PPS, deputado Roberto Freire (SP), afirma que o assunto precisa ser apurado, mas com estratégia. “Para essa nova denúncia, que envolve diretamente o Lula, as oposições têm de pedir apuração ao Ministério Público”, defendeu. O deputado afirma que as CPIs estão “empasteladas pelo governo” e uma acusação contra um ex-presidente da República seria facilmente sepultada no Parlamento. Uma CPI só caberia sobre fatos novos além da Operação Lava-Jato. Assunto não faltaria, segundo Freire. “Esse governo é pior que queijo suíço, com furos de corrupção”, criticou o deputado.

O deputado Devanir Ribeiro (PT-SP) tripudiou das intenções da oposição. Para ele, Delgado, pré-candidato à Presidência da Câmara, e outros colegas “não têm o que falar”. “É falta de argumento. Quem não apoia o carnaval no Rio e em São Paulo?”, criticou.

Merval Pereira - Crises anunciadas

- O Globo

A presidente Dilma nomeou um Ministério que pode ser medíocre em seu conjunto, mas tem um conceito por trás em algumas áreas fundamentais. A questão é que o conceito é uma repetição de manobra já realizada pelo ex-presidente Lula, e por isso mesmo Dilma corre o risco de transformar em farsa a repetição de uma estratégia política que depende de um líder com reconhecida capacidade de articulação política, para não provocar crises contínuas.

A nomeação de Joaquim Levy para a Fazenda está sendo digerida com muito custo, mas as pressões maiores estão voltadas para os novos ministros da Agricultura, Kátia Abreu, e do Desenvolvimento, Armando Monteiro, dois dirigentes de associações patronais, exemplares de como o Ministério tem uma tendência nada revolucionária.

O contraponto veio com a nomeação de Patrus Ananias para o Desenvolvimento Agrário, e o choque previsível já aconteceu ontem, quando, na posse mesmo, Patrus respondeu a Kátia afirmando que é preciso "derrubar a cerca dos latifúndios" - que por sinal ela havia dito que já não existem no Brasil.

A linguagem figurada (espera-se) do novo ministro pode incentivar ações mais concretas de movimentos que se consideram revolucionários, como o MST. Foi assim também no primeiro governo Lula, que nomeou Roberto Rodrigues para a Agricultura e Luiz Fernando Furlan para o Desenvolvimento, além de colocar o banqueiro internacional e deputado federal tucano Henrique Meirelles no Banco Central.

Se Dilma seguir à risca o que Lula fez em seu 1º mandato, a situação vai piorar. Lula queria agradar a gregos e troianos, e deu a seus ministros de esquerda a tarefa de nomear integrantes do 2º escalão dos ministérios dirigidos pelos ministros de direita. Quem escolheu o presidente do Incra foi o então ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, e não o da Agricultura, Roberto Rodrigues. Que também não escolheu o presidente da Embrapa, Clayton Campanhola, indicado pelo então titular do Fome Zero, José Graziano.

Lula foi intermediando essa convivência impossível, até que teve de deixar Rodrigues intervir na Embrapa, que, de empresa de excelência estava se transformando em aparelho de esquerda mais preocupado com a agricultura familiar do que com o agronegócio. Preocupação reiterada por Patrus hoje.

Esses conflitos, estabelecidos de saída, ocorrem em momento de crise e de falta de liderança para a mediação. Os sinais da crise começam a aparecer mais concretamente. A greve dos metalúrgicos no ABC é simbólica não só por se originar onde o PT nasceu e se criou como representante da classe trabalhadora, mas porque a região deixou há muito de ser o esteio petista para reagir contra governos e derrotar o partido com frequência.

As demissões que começam a pipocar lá e em outras regiões do país são a demonstração de que a política econômica baseada no consumo popular com incentivos fiscais já não se sustenta. A crise na Petrobras também já causa desemprego na cadeia produtiva do setor.

Caberá a Dilma lidar com sua herança maldita, e, se não der respaldo às medidas duras que a nova equipe econômica terá que tomar, vai só piorar a situação. Não há mágica para trazer de volta os bons tempos das commodities em alta no mercado internacional, nem é verdadeiro o cenário cor-de-rosa que Dilma vendeu na campanha e no seu 1º discurso como reeleita.

Não há chances de reorganizar a economia sem quebrar muitos ovos. É tarefa de Dilma tentar comandar o país sem criar mais turbulências que as que necessariamente virão. Os cortes de gastos, por exemplo, que estão para ser anunciados pela equipe econômica serão severos para não deixar dúvidas da decisão do governo.

Embora a Lei de Diretrizes Orçamentárias ainda esteja para ser aprovada pelo Congresso, os cortes já começarão em cima dos números propostos. Quando o ano começa sem lei orçamentária aprovada, o procedimento de praxe é permitir que gastos obrigatórios, com salários e aposentadorias, sejam feitos normalmente.

Os demais gastos ficam limitados a desembolsos mensais correspondentes ao projetado para o ano, na suposição de que o Orçamento será aprovado. A nova equipe econômica, porém, quer autorizar só desembolsos mensais abaixo do previsto, para começar o corte antes de ter o Orçamento aprovado. É um sinal importante, mas que provocará tumulto na base aliada.

Dora Kramer - Sem querer querendo

- O Estado de S. Paulo

Na observação dos colegas de ministério e de partido do ministro Aloizio Mercadante, nada mais distante de suas negativas de que pretenda pleitear uma candidatura presidencial do que os seus gestos na chefia da Casa Civil.

A sensação ficou mais forte entre petistas e integrantes da nova equipe depois de uma entrevista, há três dias, confirmando apoio a Lula para 2018 e dizendo que essa pretensão (a disputa) não está em seu horizonte.
"Já estou chegando a uma fase da vida em que dediquei tudo o que podia fazer de melhor para a vida pública e para o País", disse, anunciando decisão de se dedicar aos netos. A declaração soou peremptória, extemporânea e desprendida demais para ser verdadeira.

Mas, sobretudo, contraditória em relação aos próprios movimentos. O poder delegado pela presidente Dilma Rousseff ao ministro leva os observadores a se sentirem autorizados a mapear sinais dos preparativos dele para se posicionar na fila da sucessão, caso o ex-presidente não venha a ser o candidato.

Um indício de sua força no governo detectado por um ministro "novo em folha", não petista, embora dilmista até o último fio de cabelo: a presidente está em férias, mas as decisões relativas aos ministérios estão sendo tomadas normalmente no Palácio do Planalto. Conclusão, Aloizio Mercadante é quem está mandando no governo, fazendo as coisas andarem.

Do PT chegam notícias a outro gabinete da Esplanada onde tem assento ministro remanescente e agora remanejado, pertencente a partido aliado, segundo as quais o chefe da Casa Civil está cuidando com muito esmero do partido em São Paulo, sua base eleitoral que saiu machucada da eleição presidencial.
De acordo com relato de petistas, Mercadante tem tratado de atrair as lideranças locais e de isolar Luiz Marinho, prefeito de São Bernardo do Campo, um dos últimos expoentes do PT paulista, visto que a saída de Marta Suplicy é dada como certa.

O ministro-chefe da Casa Civil foi também artífice de uma parte significativa da formação do ministério. Atribui-se a ele a ideia de reduzir a influência do PMDB no governo dando ao partido pastas de menor importância e distribuindo ministérios mais robustos a partidos antes periféricos na base, alterando o perfil da aliança governista.

O argumento é o de que os pemedebistas só operam pela via do fisiologismo e, como o partido é muito grande, o Planalto fica excessivamente refém do método. Os outros, embora atuando pelo mesmo sistema, sendo menores não teriam tanto poder de fogo.

Ocorre que Mercadante pode ter cometido um erro de cálculo com base em seus conflitos antigos principalmente com o PMDB do Senado, justamente ao subestimar a capacidade de articulação e reação do partido no Congresso. A conferir em futuras votações de interesse do governo.

As digitais do ministro foram identificadas também na conformação do Palácio do Planalto e na colocação de possíveis concorrentes na divisão de poder. A equipe palaciana contemplou a presença de pessoas da estrita confiança da presidente junto a ela, como Pepe Vargas e Miguel Rossetto - respectivamente na Articulação Política e na Secretaria-Geral - com a distância de políticos experientes de Dilma.

Jaques Wagner, um habilidoso articulador, foi parar no Ministério da Defesa, uma irrelevância política. Ricardo Berzoini ficou com uma pasta importante (Comunicações), mas seria alguém com experiência, firmeza e coragem para estar ao lado da presidente e ajudá-la a enfrentar o Congresso, ambiente adverso a Mercadante.

Fernando Pimentel, governador de Minas Gerais, que desbancou os tucanos e se credenciou no âmbito nacional, reivindicou - e não levou - a indicação do Ministério da Educação. Ficou para o PROS, no xadrez de Mercadante.

Bernardo Mello Franco - Os amigos do rei

- Folha de S. Paulo

O novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, prometeu "arrancar os traços do patrimonialismo" da gestão econômica. Ao tomar posse, ele criticou o uso do poder público para favorecer interesses privados e defendeu o respeito ao princípio da impessoalidade.

"O patrimonialismo, como se sabe, é a pior privatização da coisa pública", afirmou. "É um mecanismo excludente, ainda que o Estado centralizador possa gerar novos grupos para operá-lo, como foi pela proliferação de viscondes e marqueses no nosso primeiro império", acrescentou, citando Raymundo Faoro.

A se acreditar no ministro, acabou a era dos "amigos do rei". Isso significa que os empresários enturmados com o poder não terão a mesma facilidade para obter empréstimos, isenções e outras benesses.

Nos últimos anos, o governo abriu os cofres para apoiar seus grupos preferidos, com a promessa de formar gigantes brasileiros. A política dos "campeões nacionais" fracassou como seu símbolo, o empresário Eike Batista. Quando ele estava no topo, Dilma Rousseff o chamou de "orgulho do Brasil". Quando foi à lona, o BNDES informou que havia liberado R$ 10,4 bilhões para financiar seus planos megalômanos.

Será curioso ver se os colegas de Levy repetirão suas palavras. O patrimonialismo ainda reina em diversos ministérios --das Comunicações, onde políticos aliados renovam concessões de rádio, à Agricultura, onde donos de terras improdutivas encontram proteção. Assim sobrevive o latifúndio, que Faoro radiografou em "Os Donos do Poder" e a ministra Kátia Abreu diz não existir mais.

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Na política, um ato falho costuma revelar mais que mil discursos. Ao se referir ontem ao "governador Sérgio Cabral", antes de ser corrigido ao vivo pela âncora da GloboNews, o secretário Carlos Roberto Osório (Transportes) deixou claro quem ainda manda no Estado do Rio.

Rosângela Bittar - Caça-fantasma

• O ministério é de defesa e foi formado com meta e objetivo

- Valor Econômico

Algumas peças, poucas, não são definitivas, ficaram no posto para guardar lugar, como já está inclusive anunciado no caso da Integração Nacional, Meio Ambiente e Turismo. A maioria dos ministros nomeados e empossados, porém, não resulta de uma escolha aleatória. Dilma Rousseff fez uma equipe econômica para atuar e vencer a crise a partir da formação de um grupo de orientação oposta ao dos que comandaram o primeiro mandato, e para o restante organizou um ministério de defesa, de forma a começar o seu segundo mandato sem medo de fantasma.

O que mais deveria temer a presidente? A atuação política do segundo governo Dilma, tanto a que será própria do núcleo de cinco petistas que habitarão a Esplanada e o Palácio ao mesmo tempo, orbitando em volta da presidente, quanto a de cada ministro das demais áreas, terá o objetivo de defender Dilma Rousseff do impeachment. Para isso, é preciso antes defendê-la da criação da nova CPI da Petrobras. E precedendo essa decisão, evitar a eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara, um caminho certo para a nova CPI e dessa para o impeachment, fechando-se o círculo. É a equação das alquimias do Palácio.

Outras evidências surgem dessa distribuição dos cargos do Executivo. É um ministério contra o PMDB e sua capilaridade e força numérica. O ministro da Casa Civil articulou mais nomeações do que o vice-presidente da República, representante do partido na chapa da aliança de reeleição. A presidente moveu as peças do ministério, claramente, de forma a que os inimigos do PMDB ficassem bem e o partido ficasse mal.

Uma terceira constatação parte do fato de que a força numérica do PMDB talvez não seja tão fundamental, tendo em vista a estratégia que as nomeações revelam. Os ministros, todos, receberam os instrumentos de poder mas terão que entregar os votos. Foram, teoricamente, escolhidos por partidos, mas sem a preocupação de dilacerá-los, pois o que importa é a bancada de interesses que consegue administrar a bancada partidária.

Kátia Abreu, por exemplo, é amiga da presidente, que não titubeou a convocá-la apesar das reações do PMDB do Senado e do PT e movimentos sociais de um modo geral. Ela pode levar mais votos da bancada do agronegócio da Câmara e do Senado que levaria do PMDB. Patrus Ananias, que ontem mesmo fez discurso de posse com ideias aparentemente contraditórias com as do agronegócio, é garantia de satisfação interna para o MST e outros movimentos representados em vários partidos e não apenas no PT.

Se há algum sentido em levar a Igreja Universal ao Ministério do Esporte, em ano de Olimpíada, com um ministro já flechado por denúncia e processo, flagrado com malas de dinheiro vivo, é que mais do que a bancada do PRB, o que conta mesmo é a boa vontade e satisfação dos evangélicos do Parlamento e sua influência em outras bancadas partidárias.

A experiência de fazer o presidencialismo de coalizão via bancadas temáticas é um reconhecimento à nova correlação de forças que vão muito além dos partidos. Até Dilma já aprendeu, e nesta última campanha houve muito didatismo, que os partidos unem menos que os interesses específicos.

Afif Domingos lidera mais por ser do PSD ou por ser uma espécie de condestável do extenso mercado das associações comerciais que têm uma bancada que extrapola e muito o partido? A capacidade de Gilberto Kassab de fundar e fundir partidos, arregimentar migrações e votos também numa vasta clientela que armou como prefeito e também líder da Associação Comercial de São Paulo tem o reconhecimento da presidente, a quem ele servirá, como tal. O mesmo se pode dizer de Cid Gomes, que atuará mais voltado para a bancada da educação, extensa e intensa, do que ao seu pequeno Pros.

O PMDB está pulverizado em todos esses grupos, talvez parta daí a despreocupação em agradar ao partido como organização. Aos demais foram dados instrumentos de ação, ao PMDB, não. O PMDB está representado pelo baixo clero político, em funções de baixo clero administrativo.

Claro que a presidente, ao convidá-los, não encomendou votos contra o impeachment. Ao contrário, a conversa mais politizada até agora partiu do PT que, por enquanto, está pedindo votos apenas para a primeira etapa, contra Eduardo Cunha na presidência da Câmara.

A presidente, porém, está menos alheia do que se pode depreender a partir do estridente comando do ministro-chefe da Casa Civil. Ao convidar Aldo Rebelo para assumir o Ministério da Ciência e Tecnologia, disse-lhe que esperava uma participação significativa da Ciência, Tecnologia e Inovação no projeto de desenvolvimento do país. O mesmo ouviu Cid Gomes, conversa que incluiu os projetos prioritários em educação que vão se beneficiar dos recursos do pré-sal.

O que é para fazer na política está subentendido.

Dilma terá forças-tarefa, entre as quais a maior é a de coordenação política - Ricardo Berzoini (Comunicações), Jaques Wagner (Defesa), Miguel Rossetto (Secretaria-Geral), Pepe Vargas (Relações Institucionais) e Aloizio Mercadante (Casa Civil), todos frequentarão o Palácio sob a batuta da presidente que, em suas ausências, os deixará à mercê de Mercadante, contra quem já há reações irritadas passados apenas seis dias de novo mandato. Há a força-tarefa ruralista, a dos movimentos sociais, a dos negócios da educação, a das associações comerciais, a da saúde, e é por aí que a flauta vai tocar de ouvido.

Embora um ou outro ministro tenha aberto logo o jogo, condenando no discurso de posse a possível nova CPI da Petrobras - foi o que fizeram Eduardo Braga e Pepe Vargas -, a maioria está tentando tirar de sua atuação o caráter de salvação do mandato contra o já maior escândalo.

Há quem prefira considerar que Dilma montou um governo plural. Outros que o resultado final ficou mais à direita, conceito em desuso em formação de governo pela dificuldade de estabelecer diferenças, por exemplo, entre a Kátia de agora e o Geller de antes, entre Cid e Mercadante, entre Antonio Carlos Rodrigues e Alfredo Nascimento, entre Helder e Crivella, entre Eduardo Braga e Edison Lobão.

Na verdade é um ministério de defesa, em que cada ministro poderá usar seus instrumentos para dominar um grupo maior do que o seu partido. Dilma tem poder imperial. Se o Congresso não lhe dá o que quer para executar seu plano de governo, quando vier a defini-lo, tem a medida provisória, o decreto, a barganha com emendas, o veto. Só não tem como evitar o impeachment.

Maria Alice Setubal - Pátria educadora? A conferir

• O avanço necessário para uma educação de qualidade exige mais do que retórica. Vamos acompanhar de perto o cumprimento das promessas

- Folha de S. Paulo

Em seu discurso de posse, a presidente Dilma Rousseff anunciou o novo lema de seu governo: "Brasil, pátria educadora". Destacou que a educação será a prioridade das prioridades e que buscará em todas as ações de governo "um sentido formador, uma prática cidadã, um compromisso de ética e um sentimento republicano".

O novo ministro da Educação, Cid Gomes, reiterou os compromissos anunciados pela presidente, destacando a reforma do ensino médio e o diálogo com os professores.

Ao mesmo tempo em que aplaudimos o discurso, nós nos perguntamos o porquê do descaso da gestão anterior com a educação.

A falta de credibilidade do governo se expressa também pelas incertezas das regras do jogo, pela falta de transparência dos resultados das políticas, pelo descompasso entre o discurso e sua prática e pela falta de participação da sociedade no acompanhamento e implementação das ações.

A sociedade brasileira tem consciência da importância da educação no mundo de hoje e, por isso, estará atenta para acompanhar o desenho, a implementação e a avaliação das políticas tendo como base as metas estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação.

A presidente Dilma enfatizou que "democratizar o conhecimento significa universalizar o acesso a um ensino de qualidade em todos os níveis --da creche à pós-graduação. Significa também levar a todos os segmentos da população --dos mais marginalizados aos negros, às mulheres e a todos os brasileiros a educação de qualidade". Para sua concretização, ela menciona o aumento de recursos; sem dúvida, condição fundamental, mas insuficiente.

O salto necessário para uma educação de qualidade exige muito mais do que retórica. Recursos sem uma gestão eficaz, democrática e transparente nos seus resultados pode levar a mais uma frustração nacional. Caminhar na direção de um sistema nacional de educação com funções mais claras entre os entes federados poderá dar mais agilidade e eficiência ao sistema.

Para começar precisamos acabar com o analfabetismo absoluto e funcional. O Brasil não pode tolerar ser o país que concentra mais de um terço dos analfabetos da América Latina. Outro fator não mencionado nos discursos oficiais é o das desigualdades visíveis nas diferenças de desempenho em avaliações das regiões Norte e Nordeste e do restante do país.

Trata-se de um enorme desafio. Não superá-lo nos afastará da meta de sermos um país desenvolvido.

Nossas escolas precisam de infraestrutura adequada com bibliotecas, laboratórios e, sobretudo, banda larga que possibilite acesso à internet. Os dados do Censo Escolar mostram que ainda estamos longe de alcançar essas condições.

Precisamos muito mais que um diálogo com os professores. A qualidade da educação está diretamente relacionada com a qualidade dos professores. A valorização dos profissionais da educação passa por sua valorização simbólica, por planos de carreira, salários dignos e, principalmente, formação.

Dado que mais de 80% dessa formação inicial está na rede privada, é fundamental que as políticas abarquem esse segmento de modo a trazer a realidade da sala de aula como eixo estruturante das formações inicial e continuada.

Queremos, sim, uma pátria educadora e vamos reforçar a importância de uma educação integral que possibilite uma visão articuladora dos aspectos físicos, cognitivos e emocionais das crianças e jovens.

Queremos uma educação que supere os problemas básicos não resolvidos do século 20 e aponte para as inovações do século 21, tarefa que exige a mobilização de toda sociedade. Vamos acompanhar o cumprimento de todas as promessas feitas e, principalmente, das metas do Plano Nacional de Educação.

Maria Alice Setubal, a Neca, doutora em psicologia da educação pela PUC-SP, é presidente dos conselhos do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária) e da Fundação Tide Setubal. Foi assessora de Marina Silva, candidata à Presidência da República pelo PSB na eleição de 2014

Míriam Leitão - O mínimo de Barbosa

- O Globo

O desdito do ministro Nelson Barbosa, logo após a posse, foi entendido como o primeiro desencontro, no novo governo, entre um ministro e o temperamento da presidente. Mas o que o ministro avisou é sensato e ajudaria a preparar o futuro. O salário mínimo não terá ganho real no ano que vem, e talvez nem no próximo. Mas quem planeja tem sempre que pensar além do curto prazo.

Barbosa já vinha falando e escrevendo o que muitos economistas pensam. A fórmula de dupla indexação do salário mínimo pode apressar o colapso das contas da Previdência. O salário em si não é o problema, principalmente quando pago pelo setor privado. O problema é que o Brasil terá uma conta de pensões e aposentadorias cada vez mais alta pelo processo demográfico natural de aumento da idade média da população. E essa fórmula cria impasse.

Anos de crescimento forte acabam contratando um aumento real grande do salário mínimo, que pode chegar exatamente em ano em que há alguma dificuldade. Por exemplo, em 2010, o crescimento do PIB foi de 7,5%. Em 2011, a inflação ficou no limite máximo permitido, 6,5%. Isso fez com que no ano de 2012 o salário mínimo e, portanto, as despesas previdenciárias crescessem muito fortemente, porque a fórmula é: o PIB de dois anos antes com o INPC do ano anterior.

Muitos economistas vinham alertando que essa fórmula enrijece a economia e produz crescimento das despesas em época imprópria. Mantida como está, essa dupla indexação pode levar a uma trajetória insustentável no futuro.

Nada mais fez o ministro Nelson Barbosa do que dizer que seria feita uma proposta para alterar isso. Pensar as políticas públicas no longo prazo é a função primeira de quem ocupa o Ministério do Planejamento. O tema é delicado, e sempre será. Não haverá um momento em que mudar fórmulas de cálculo de salário mínimo não provoque controvérsia, mas se não puder ser no começo de um mandato quando será? A fala de Barbosa provocou revolta no governo. O eco chegou à Base de Aratu, e a presidente mandou o ministro recuar do que havia dito. Pode ser que a presidente prefira nem mexer nisto, levando-se em conta que, num primeiro momento, uma nova fórmula pode até elevar mais o salário mínimo do que a atual. Em 2016, os trabalhadores pagarão a conta da estagnação de 2014. O PIB deve ter ficado abaixo de 0,2%. A correção do mínimo será apenas pela inflação deste ano, praticamente sem aumento real.

Mais cômodo é deixar tudo como está e não tocar em temas delicados. Mais correto é ter a coragem de tocar em temos controversos, fazer mudanças necessárias e preparar o terreno para o crescimento sustentado que virá após os ajustes e correções de rumo.

Milhões de benefícios são corrigidos pelo salário mínimo, que tem tido forte valorização desde o Plano Real. Já publiquei aqui na coluna um gráfico que mostrava exatamente como o mínimo subiu em todos os governos desde então. A valorização foi benéfica, mas a rigidez imposta pela fórmula que indexa o salário a dois indicadores terá que ser mudada em algum momento.

O ministro nada disse de errado, e certamente isso foi tratado nos seus encontros com a presidente, até porque ele nunca fez segredo que pensava assim. A bronca de Aratu provocou o adiamento de uma correção que terá que ser feita. Talvez se perca o melhor momento para a mudança. Nos próximos dois anos, o salário mínimo não terá aumento real. Bom momento para se plantar para o futuro uma fórmula sustentável. Isso é o mínimo que se pede a quem assume acreditando no nome do Ministério do Planejamento.

Celso Ming - Mudou o discurso

- O Estado de S. Paulo

Mudou muita coisa na política econômica – e mudou para melhor. Se vai durar e quanto vai durar é uma incógnita à espera de indicações mais sólidas.

Em seu discurso ao assumir o cargo e nas declarações que já deu, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi suficientemente claro no que pretende a nova equipe econômica – e não só ele.

A necessidade do equilíbrio fiscal já foi exaustivamente avaliada. É a base do crescimento econômico sustentado, do combate à inflação e de qualquer política que o governo queira seguir. Nada de errado em distribuir benefícios sociais em abundância, especialmente quando se trata de saúde, educação e segurança, desde que se garanta o equilíbrio nas contas públicas. Nada de errado em aumentar os investimentos do governo na infraestrutura e nos serviços públicos. Só que é preciso ter recursos para isso. Até mesmo pode-se ter uma política industrial, desde que não seja com brutal sangramento do Tesouro, como aconteceu nos últimos quatro anos.

Mas a política industrial do período Dilma 1 não foi errada apenas por ter esgotado o Tesouro. Foi errada, também, porque se baseou em desonerações que, além de custarem mais de R$ 100 bilhões por ano em perdas de arrecadação, foram discricionárias, porque beneficiaram apenas uma fração da atividade produtiva em detrimento do resto, na medida em que criaram condições desiguais de custos e de concorrência. Além do que, não serviram para grande coisa. A indústria continua no estado miserável em que estava antes.

Das isenções tributárias temporárias pode-se dizer praticamente as mesmas coisas. Além de contribuírem para a anemia do Tesouro, as reduções de IPI para veículos, aparelhos domésticos e para meia dúzia de outros setores não fizeram mais do que antecipar o consumo e endividar as famílias. O resultado líquido aí está: os pátios das montadoras estão atravancados de veículos e as produtoras de aparelhos domésticos estão imersas em estoques.

Levy avisou que mudou a política de represamentos de preços e tarifas. O motivo para isso foram as distorções que provoca, principalmente o impacto sobre os Tesouros, incluídos aí os dos Estados e dos municípios, que foram obrigados a arrecadar sobre bases tributárias mais baixas. Mas há outras distorções a enfrentar não mencionadas no discurso de transmissão de cargo nem nas declarações que se seguiram. Depois que os preços do petróleo desabaram mais de 50% em seis meses, os preços internos dos combustíveis estão cerca de 30% mais altos do que os do mercado internacional. Se esse novo desalinhamento não for corrigido, a indústria nacional terá de operar com custos de transporte bem mais altos do que seus concorrentes externos, fator que derruba a competitividade do setor produtivo.

Discursos são palavras, muitas delas dispersadas pelo vento. A confiança, por onde a recuperação pode começar, não se conquista com lógica e frases bem ou mal concatenadas. O que conta aí é o saco de sal compartilhado todos os dias, pitada por pitada.

Se até agora, a presidente Dilma praticou e defendeu a política econômica errada e acabou por removê-la, o que garante que não faça o mesmo com a que começa agora? Para ser realista, nada garante.

Vinicius Torres Freire - Por onde vai passar o facão

• Governo prepara anúncio do talho de gastos; investimento perde muito sem aumento de impostos

- Folha de S. Paulo

Até março, o governo deve trabalhar sem um Orçamento, que tende a ser aprovado depois do Carnaval. O tempo para recuperar o crédito, porém, está tão curto quanto o dinheiro. Assim, o governo vai apresentar o quanto antes um plano de talho de despesas e aumento de receitas que convença credores e passantes de que vai conseguir fazer uma poupança de valor equivalente ao 1% do PIB (o tal superavit primário: receita menos despesa, desconsiderados gastos com juros).

Trata-se do equivalente a R$ 55,3 bilhões. O setor público como um todo, governo federal, Estados e municípios, tem como meta poupar 1,2% do PIB em 2015.

Como se vai fazê-lo é que são elas, pois ainda não está claro nem o tamanho da conta que o governo Dilma 1 deixou para Dilma 2. De menos incerto, como de costume em momentos assim críticos, é que o investimento do governo "em obras" vai passar pelo facão. O corte será tanto maior quanto menor for o aumento de impostos.

Essa conta é toda muito enrolada, mas já é possível especular com menos incerteza de onde virão certos dinheiros e como deixarão de ser gastos alguns outros.

O fim da redução do IPI sobre certos bens (carros etc.), o corte de despesas com pensões e seguro- desemprego e a volta da cobrança do "imposto da gasolina", a Cide, podem render cerca de 0,5% do PIB a 0,6% do PIB (estimando uma Cide a R$ 0,10 por litro de gasolina e diesel).

Faltaria então cerca de 0,45% do PIB para chegar ao 1% do PIB de superavit, se mais nenhum aumento de receita e despesa estivesse em jogo --trata-se de um mero exercício didático-especulativo. Segundo a estimativa inicial para o PIB de 2015, seria o equivalente a uns R$ 25 bilhões, cerca de um quarto do investimento federal previsto para 2015 (excluído o investimento das estatais federais).

Mais imposto
A fim de cortar o mínimo possível de investimento, seria necessário, ressalte-se, aumentar outros impostos. Note-se que o investimento federal "em obras" já é mínimo. Reduzi-lo ainda mais, de resto, atrasa a recuperação da precária infraestrutura do país e deixa muita empresa privada a ver navios, criando problemas em efeito cascata.

De onde viria o resto do dinheiro, portanto?

Há rumor e zum-zum sobre as alíquotas do PIS e da Cofins, impostos ("contribuições") cobrados sobre o faturamento das empresas. Faz algum tempo, o governo Dilma vinha dizendo que unificaria tais impostos e simplificaria sua cobrança, o que de resto beneficiaria as empresas que pagariam também menos impostos (teriam créditos a receber do governo, talvez parcelados a perder de vista). As empresas do setor de serviços querem ficar de fora da reforma desses impostos, pois dizem que vão perder com a mudança.

Bem, o governo talvez aproveite essa conversa a respeito dos ganhos com a simplificação tributária a fim de dar um tapinha para cima na alíquota unificada da PIS/Cofins.

Quanto ao possível aumento de outros impostos, há mistério e vaga especulação sobre tributação adicional de operações financeiras.

Segundo gente do governo que trabalha com o assunto, as primeiras pauladas tributárias devem ser anunciadas na semana que vem.