quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Relator contraria TCU e pede aprovação das contas de Dilma

• Para senador aliado, ‘pedaladas fiscais’ não configuram crime

• Contas da presidente, que serão analisadas pelo Congresso após o recesso, são a base
do pedido de afastamento; Jaques Wagner fala em ‘renascimento do governo’

Contrariando orientação do Tribunal de Contas da União (TCU), o senador Acir Gurgacz (PDT-RO) apresentou parecer pela aprovação com ressalvas das contas da presidente Dilma em 2014, usadas como base para o processo de impeachment. Para Gurgacz, aliado do governo, as “pedaladas fiscais” não configuram crime. As contas serão apreciadas pela Comissão Mista de Orçamento após o recesso parlamentar. O ministro Jaques Wagner (Casa Civil) disse que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de dar ao Senado o poder de rejeitar o afastamento de Dilma é o “renascimento do governo”.

Sim, apesar das ‘pedaladas’

• Relator vota pela aprovação das contas de Dilma de 2014, contrariando decisão do TCU

Cristiane Jjungblut - O Globo

-BRASÍLIA- Numa vitória do Palácio do Planalto e contrariando a recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU), o relator das contas da presidente Dilma Rousseff de 2014, senador Acir Gurgacz (PDT-RO), apresentou ontem seu parecer pela aprovação, mesmo com as “pedaladas fiscais". A recomendação do TCU em relação às “pedaladas” foi o principal argumento da oposição desde o início do ano para pedir o impeachment da presidente. O parecer de Gurgacz foi apresentado na Comissão Mista de Orçamento, que deverá votá-lo até 11 de março.

Gurgacz refutou o parecer do TCU e recomendou em seu relatório a aprovação, com “ressalvas”, como em outros anos. O senador afirmou que “não pensou na presidente Dilma”, e sim nos futuros governantes.

Ele ainda defendeu a legalidade dos decretos assinados ano passado por Dilma e pelo vice-presidente Michel Temer, com a liberação de créditos extraordinários, afirmando que todos têm previsão na legislação orçamentária. Quando o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afirmou que não aceitaria pedidos de impeachment baseados em atos ocorridos no mandato anterior, decretos iguais a esses, mas firmados neste ano, passaram a ser a base do novo pedido, aceito por Cunha.

Oposição diz que vai obstruir votação
A oposição classificou o parecer de “vergonhoso” e promete obstruir a votação.

— É uma anistia pontual para a Dilma, é jogar com a Dilma. Uma página repugnante da nossa história — reagiu o representante tucano na comissão, deputado Domingos Sávio (PSDB-MG).

— É uma vergonha que um senador contrarie o pleno do TCU. Vamos obstruir — acrescentou o líder da oposição na Câmara, deputado Pauderney Avelino (DEM-AM). Gurgacz fez críticas ao TCU, que recomendou a rejeição das contas de Dilma, devido às chamadas “pedaladas fiscais", no valor de R$ 57,013 bilhões. O senador disse que seu parecer foi técnico, e não político. Cabe ao Congresso, pela Constituição, aprovar as contas presidenciais. O TCU emite um parecer que, primeiramente, é analisado pela comissão de orçamento e, depois, pelo plenário do Congresso.

— Meu relatório é técnico e está menos politizado do que o do TCU, quando deveria ser o contrário. O TCU é um órgão assessor, quem vota é a Comissão Mista de Orçamento e o Congresso. A prerrogativa é do Congresso — disse o senador.

Perguntado sobre as consequências de seu parecer para o processo de impeachment, Gurgacz disse que a presidente poderia ficar inelegível com a rejeição das contas, mas não perderia o mandato.

— Tenho boa relação com a presidente Dilma e com a oposição. Não fizemos o relatório pensando na presidente, e sim no país. Além disso, a rejeição de contas causa inelegibilidade, e não perda de mandato, segundo a própria OAB — afirmou o senador.

Gurgacz é vice-líder do bloco de apoio ao governo no Senado, formado por PT e PDT. Seu partido tem seis senadores, e apenas dois são críticos ao governo. Ele também é líder do PDT no Senado e costuma frequentar o Palácio do Planalto. O senador disse que não foi ao jantar de Dilma com os líderes, na noite de anteontem, porque era aniversário de seu filho. O senador foi a Brasília ontem apenas para apresentar seu parecer, conforme tinha acertado com a senadora Rose de Freitas (PMDB-ES), presidente da comissão de orçamento.

Parecer deverá ser votado até 11 de março
O Palácio do Planalto já deflagrou uma estratégia para aprovar o parecer de Gurgacz, assim que o Congresso retomar os trabalhos após o recesso, na primeira semana de fevereiro. Os ministros mais próximos a Dilma avaliaram se haveria vantagem de se votar as contas ainda na atual formação da comissão, já que a sua composição será mudada no final de março, e concluiu que a atual formação é confiável — já aprovou as metas fiscais de 2015 e 2016 e o Orçamento da União de 2016.

Aliada do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e próxima da própria presidente Dilma, Rose de Freitas disse ontem que o parecer será votado até 11 de março. Rose estava ao lado do senador Gurgacz na apresentação do relatório.

— Vamos votar o parecer até 11 de março e antes de encerrar essa gestão, dia 30 de março — disse Rose.

O senador disse que o parecer teve o objetivo de não “engessar” a gestão dos governantes.

— Já há 14 estados que não cumpriram a meta fiscal em 2014, de vários partidos — afirmou o relator.

Integrantes da base festejaram a decisão de Gurgacz:

— O senador Acir restabeleceu a isenção necessária à análise dessa matéria, diferente do ministro José Augusto Nardes, no TCU, que politizou a análise das contas. Isso afetou a estratégia golpista da oposição — afirmou o líder do governo na comissão, deputado Paulo Pimenta (PT-RS).

Técnicos da comissão dizem que o principal ponto do parecer desconsidera as “pedaladas fiscais" junto a bancos públicos como operações de crédito, reproduzindo o argumento de defesa do governo. 

O TCU dizia que o atraso do repasse do Tesouro aos bancos públicos era considerada operação de crédito e que isso descumpriria a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O parecer discorda: “como não encontramos o vínculo de responsabilidade da presidente, e como os argumentos apresentados pelo TCU não são relevantes o suficiente para levar à rejeição das contas, nosso relatório conclui pela aprovação das contas, porém com ressalvas”.

Três ressalvas foram sugeridas: falta de aderência do planejamento econômico-fiscal do governo com o que ocorria na economia; compromissos vencidos e não pagos (as “pedaladas”); e restos a pagar em soma vultosa de R$ 227 bilhões em estoque no ano passado.

— Não está de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, mas não é crime, porque não houve contratação de crédito pela União. O governo não é o ordenador de despesas. Esses decretos assinados pela presidente ou pelo vice estão autorizados pela LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e pela LOA (Lei Orçamentária Anual). Não há ilegalidade, irregularidade — disse o relator, acrescentando: — Foram as questões econômicas que aconteceram no meio do ano, o que provocou uma readequação do Orçamento.

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