sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Barganhas políticas trazem mais riscos para a economia – Editorial / Valor Econômico

O governo segue prisioneiro das circunstâncias, sem capacidade de influenciá-las em seu benefício. Não está sozinho na forte correnteza das crises política e econômica. As pedaladas fiscais que motivaram a admissão do pedido de impeachment e os desdobramentos da Operação Lava-Jato tornaram vulneráveis todos os substitutos legais em caso de vacância da Presidência da República. Enquanto isso, a crise econômica está cavando um buraco cada vez mais fundo, diante da incapacidade de reação da equipe econômica, dividida e paralisada.

A sequência de erros do Planalto é incrível. Primeiro, o Brasil perdeu o grau de investimento da Standard & Poor's, tendo como fato desencadeador imediato o envio de Orçamento com déficit ao Congresso. Mais de quatro meses depois, na metade de dezembro, o governo ainda discutia a meta de ajuste fiscal e enviou ao Congresso uma peça que permite superávit zero. A Fitch rebaixou a nota do país em seguida.

Esse jogo já estava perdido, mas o fato de que o governo, mesmo sabendo das consequências de evitar um ajuste duro nas contas públicas, não tenha reagido mostra que ele não tem uma política alternativa à que levou a economia ao beco sem saída de agora. Na verdade, o Planalto nunca se convenceu de que precisaria conter gastos, apesar de dar essa impressão ao escolher Joaquim Levy para a Fazenda.

A missão de Levy era muito difícil em um governo que perdeu sua base de apoio parlamentar e tornou-se impossível quando grandes obstáculos a suas ações se erigiram dentro do próprio governo. Levy brigou até o fim pela meta de superávit primário de 0,7% do PIB, levando sua posição diretamente ao Congresso, contra a do ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, e da própria presidente Dilma Rousseff.

O episódio pode ser o último em que o ministro da Fazenda sai derrotado ou com meia vitória. Levy pode deixar o governo ou nele permanecer, uma questão está perdendo importância: o maior risco que ele corre, na prática, é o de tornar-se irrelevante.

A discussão sobre a meta fiscal é um sintoma de deterioração adicional da política econômica de um governo sitiado. Diante da ameaça de impeachment, o Planalto indicou que o momento agora é outro e é preciso fazer mais mesuras aos parlamentares aliados, que não concordariam com nova rodada de aperto de gastos. A mesma toada, para arregimentar governadores contra o impeachment, levou a presidente a abrir a autorização de empréstimos com aval do Tesouro para os Estados, que estavam parados pela resistência sensata da Fazenda. Na defensiva, o governo indica que deverá se contentar com qualquer coisa que lhe permita manter-se à tona enquanto persistir o maremoto político, que parece sem fim.

A crise política também se intensificou, não só pela aceitação do pedido de impeachment, cujo desfecho é nebuloso ou, pelas decisões do Supremo Tribunal Federal ontem, até mesmo reversível. Mas há a sensação de que mesmo o desenlace não colocará fim ao impasse. As pedaladas envolvem o vice-presidente Michel Temer, cuja popularidade é quase tão baixa como a de Dilma. Temer pode até ganhar pontos na disputa política ao se aliar ao mais que suspeito Eduardo Cunha, embora isso piore muito sua imagem e a torne incompatível com a de um líder capaz de conduzir o Brasil durante uma crise de imensa gravidade.

Ainda que legal, a admissão do pedido de impeachment pelas mãos de Cunha retirou parte da legitimidade da bandeira, o que pode ter influenciado na redução do número de participantes das manifestações de rua organizadas pela oposição. Mais alguns meses de ardis e golpes baixos por parte do Planalto e do Jaburu podem cristalizar uma sensação já latente de que ambos não estão à altura de resolver os principais problemas do país.

É uma questão de tempo até Eduardo Cunha perder o mandato e talvez a liberdade. Renan Calheiros bandeou-se para o governo, passou a atirar em Temer nas disputas domésticas do PMDB e pode ter papel relevante no processo de impeachment, já que o STF decidiu que o Senado pode rejeitar o pedido nesse sentido que vier da Câmara. Isso, se durar até lá. As acusações de corrupção se avolumaram contra ele e a Operação Catilinárias colheu pistas nas imediações de Renan.

A incerteza é extrema. O sistema político parece afundar, sem sinais de que um novo esteja surgindo e dessa angústia nasce a impressão de que 2015 é um ano interminável.

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