quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Sucessão de erros impõe derrotas políticas a Dilma

Por Raymundo Costa - Valor Econômico

BRASÍLIA - Uma sucessão de erros levou a presidente Dilma Rousseff a acumular derrotas que contribuíram para deixar ainda mais fraco seu governo, na primeira semana após a reforma ministerial para recompor a maioria no Congresso. As derrotas da presidente eram esperadas. A ação do governo serviu apenas para ampliá-las. Não era esperado, no entanto, a recusa do Congresso em votar os vetos às medidas do ajuste fiscal e ao aumento de até 78% aos servidores do Judiciário.

Em seu primeiro teste, o novo ministério foi reprovado. A presidente investiu na barganha com os líderes de bancada, mas eles não demonstraram a força esperada sobre os deputados. O líder do PMDB, Leonardo Picciani, não conseguiu segurar o bloco liderado pelo partido na Câmara e no fim do dia de ontem mal se sustentava no cargo. Dilma apostou na negociação direta e perdeu a possibilidade de exigir fidelidade aos comandos dos partidos para "cobrar a fatura".

Na realidade, começou a disputa pelo segundo escalão do governo. Se os vetos forem votados, a tendência é que sejam mantidos. Como o Congresso não quer pagar a conta de um eventual agravamento da crise econômica, prefere não votar e manter essa moeda de troca com o governo federal.

A ação do Planalto para impugnar o relator das contas do governo no TCU, ministro Augusto Nardes, levou o Tribunal a votar em bloco pela rejeição. Antes da ofensiva palaciana, havia chance de um ou dois ministros votarem a favor de Dilma. O TCU reagiu corporativamente. O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, recorreu até ao Supremo Tribunal Federal, mas também fracassou. Assim como a derrota no TCU, era certo também que o Tribunal Superior Eleitoral determinaria a abertura de investigação das contas da campanha eleitoral.

A surpresa ficou por conta da falta de resultados da reforma ministerial feita para barrar o impeachment, mas também com o objetivo de aprovar a manutenção dos vetos. A autoridade de Dilma saiu abalada, num momento em que precisa de uma vitória que tire seu governo da defensiva.

A presidente enredou-se em sua própria teia de erros
A presidente Dilma Rousseff periga ter saudades do ministro Aloizio Mercadante, até outro dia o trapalhão-mór do Palácio do Planalto, segundo a crença disseminada na Praça dos Três Poderes. Nada mudou no coração do governo. Pode-se dizer mesmo que piorou, diante das barbeiragens cometidas desde o último domingo, quando a presidente Dilma Rousseff escalou três ministros de Estado para anunciar uma ofensiva contra o ministro Augusto Nardes, relator no TCU das contas do governo federal de 2016. Bisonho.

Um ex-governador dizia que somente em casos de calamidade pública - enchentes, furacão e terremoto - três ministros convocam uma entrevista coletiva num dia de domingo. No caso, tratava-se apenas da votação de um parecer técnico do Tribunal de Contas da União, notícia para o pé de página de jornal, não fosse a fragilidade política da presidente e sua atual circunstância. Não satisfeito, o Palácio do Planalto ainda recorreu - e perdeu - ao Supremo Tribunal Federal (STF), criando tumulto institucional, quando é obrigação da Presidência cuidar da harmonia entre os Poderes.

Tanto o revés no TCU quanto a decisão da Justiça Eleitoral de investigar as contas da campanha de Dilma eram esperados. O que não se esperava é que a reforma ministerial começasse a fazer água tão cedo. A presidente erra a mão, quando tenta dobrar a Câmara para votar os vetos às medidas do ajuste fiscal. Erra institucionalmente, porque o Congresso é uma das mais antigas instituições brasileiras, vem do Império, e erra por acreditar que a barganha com o baixo clero será bastante para resolver seus problemas de maioria.

A presidente estabeleceu os termos da negociação com a Câmara e agora está enredada na própria teia. Compra de votos era a lógica do mensalão. Dilma prometeu "porteira fechada", ao entregar o Ministério da Saúde ao PMDB do Rio de Janeiro. Agora os deputados e ministros pemedebistas estão empenhados na partilha do segundo escalão do ministério, locais onde se encontram estacionadas as tropas de ocupação do aparelhamento do PT. Quem não foi contemplado na reforma faz corpo mole.

Ninguém move uma peça para ajudar o governo, pois está sub-entendido que Dilma paga qualquer preço para preservar o mandato. A presidente negociou a reforma ministerial no varejo, portanto nem sequer tem como recorrer às instâncias partidárias para cobrar acordos de balcão.

Dilma fez sua parte ao vetar o que era contra o erário nas medidas do ajuste fiscal e nas pautas-bomba do Congresso, como o aumento de até 78% para os servidores do Judiciário. Se o Legislativo não vota, o que está valendo são os vetos da presidente. Bem ou mal as MPs do ajuste foram aprovadas. O problema agora é do Congresso.

Se forem votados, os vetos muito provavelmente serão mantidos. O Congresso não está em condições de pagar a conta por um eventual agravamento da crise econômica. A irresponsabilidade fiscal da Casa nunca é irremediável, está sempre sujeita ao veto da presidente.

Até o topete do líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani, sabe que os deputados não dão quórum para votação dos vetos para não ficarem sem moeda de troca para barganhar com o governo. Importa manter a presidente fraca, refém de seus interesses. A cada dia que Dilma cobra a fatura e o Congresso não responde, é outra derrota para minar a autoridade presidencial. E agora já não há mais Mercadante para ser responsabilizado pela cadeia de eventos que em geral antecede o desastre.

No caso do TCU, a entrevista domingueira dos ministros Luís Adams (Advocacia-Geral da União), Nelson Barbosa (Planejamento) e José Eduardo Cardozo (Justiça) liquidou de vez com a possibilidade de o governo ter um ou mais votos contrários ao parecer do relator Augusto Nardes. Por indução do Planalto, a votação no TCU adquiriu os contornos da 3ª Guerra Mundial. O governo perdeu. Dilma foi derrotada. Nessa marcha, perderá também as próximas batalhas.

Está certo que a presidente sentiu o cheiro do impeachment no cangote e está em guerra para preservar o mandato, mas talvez seja hora de o Palácio do Planalto tentar uma abordagem diferente para a crise. O ministro Jaques Wagner, substituto de Mercadante na Casa Civil, dá sinais de que pretende cumprir uma agenda menos tensionada e conflituosa. Resta saber se chegou a tempo de mudar o jogo e dar condições para Dilma levar seu governo até o fim.

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