segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Governo do Rio quer mais R$ 2 bi

Em crise fiscal, estado prevê arrecadar R$ 2 bilhões a mais de royalties de petróleo e gás no próximo ano graças a mudança ainda em estudo na Agência Nacional do Petróleo.

Petróleo como fiel da balança

• Estado do Rio quer arrecadar mais R$ 2 bi em ‘ royalties’ para garantir equilíbrio fiscal em 2016

Marcello Corrêa - O Globo

Em crise fiscal, o governo do Estado do Rio espera arrecadar ao menos R$ 2 bilhões a mais no ano que vem com royalties e participações especiais de petróleo e gás natural. A esperança, no entanto, não é de recuperação do setor — cujo mau momento foi uma das decepções para as contas estaduais neste ano. A aposta é em uma mudança na forma como a Agência Nacional do Petróleo ( ANP) define os preços que servem de base para o cálculo das contribuições sobre a produção de óleo e gás. Em pedido formal à agência, que conta com o apoio de Espírito Santo, o governo argumenta que a metodologia subavalia o que é extraído no país. Para analistas, porém, há risco de insegurança jurídica em uma alteração desse porte, o que pode afastar investidores.

A proposta se baseia em estudo preparado pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviços ( Sedeis) do Rio e é peça importante nos planos da Secretaria de Fazenda ( Sefaz) para fechar de forma equilibrada o Orçamento de R$ 79 bilhões enviado à Assembleia Legislativa no início do mês. Com a nova regra, a previsão é que a arrecadação com royalties e participações especiais suba de R$ 5,25 bilhões para R$ 7,49 bilhões, uma alta de 42%.

ANP: nova metodologia não afetaria contrato
Segundo a nota técnica, a ANP avalia o petróleo produzido no país sem considerar o potencial de produção de derivados leves a partir do óleo pesado que é extraído da região. O governo argumenta que a agência usa a mesma fórmula há pelo menos 30 anos e que, por isso, é preciso atualizá- la.

— O cálculo está defasado desde os anos 1970. Levamos isso à ANP — disse o secretário da Fazenda, Julio Bueno, em entrevista ao GLOBO.

O valor atribuído ao petróleo nacional faz toda a diferença na conta de royalties e participações especiais. A base de cálculo para as contribuições é resultado de uma fórmula que inclui a diferença entre o preço do barril do tipo Brent, referência internacional, e o preço mínimo do óleo nacional ( mais pesado e barato), além da taxa média de câmbio. A secretaria defende que, no ano passado, o petróleo nacional deveria ter sido avaliado a US$ 92,94 o barril. A ANP definiu um valor inferior: US$ 85,85. Segundo o governo, o Rio deixou de arrecadar R$ 1,5 bilhão em 2014 por causa dessa diferença.

A forma de avaliação do gás natural também é contestada. Nesse caso, a ideia é mudar o preço de referência. Hoje, a ANP usa o padrão internacional Henry Hub, cuja cotação está na casa de US$ 2,50 por um milhão de BTUs, menor que o padrão nacional, acima de US$ 6, segundo valores indicados no estudo. O governo pede que sejam considerados os preços praticados pela Petrobras e afirma ter deixado de ganhar, no ano passado, R$ 1,1 bilhão, o que, somado à suposta subavaliação do petróleo, leva a perdas de R$ 2,6 bilhões.

— É uma metodologia puramente técnica. Não se trata de querer aumentar arrecadação. É fazer o que é correto. Vimos que o estado poderia, através de um sistema moderno, conseguir que os royalties sejam pagos num valor que realmente reflete o que se faz no mercado — diz Marco Capute, secretário de Desenvolvimento.

Procurada, a ANP confirma que a revisão da metodologia de valoração, tanto do petróleo, como do gás natural, está prevista em sua agenda regulatória. A agência informou, no entanto, que “ainda é precipitada qualquer conclusão no sentido de alterar o valor da arrecadação, tendo em vista as inúmeras variáveis envolvidas nas metodologias de valoração do petróleo e do gás natural, além do alto grau de dinamismo da indústria”. A agência informou que, em caso de mudança de metodologia, contratos não seriam quebrados.

Para David Zylbersztajn, ex- diretor da ANP, a alteração de regras pode gerar insatisfação entre as empresas que já têm contratos de concessão em vigor:

— O que não pode é cobrar mais da empresa em relação ao que está estabelecido no contrato de concessão.

Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura, alerta para a insegurança jurídica causada por mudanças na metodologia:

— É uma discussão que tem que ser feita com muito cuidado. Hoje, com o petróleo barato, para atrair investimentos e produzir mais petróleo, tem que deixar as regras claras. Se subir os royalties, acaba afastando o investidor. O Rio precisa de dinheiro, mas isso pode dar um sinal ruim para o mercado.

Parte da alta da contribuição sobre a produção petrolífera viria de um cenário otimista para o mercado. O governo estadual espera que o preço do Brent suba para US$ 65 em 2016. Isso é mais que o previsto pela Administração de Informação de Energia dos EUA, que projeta o barril a US$ 58.

A proposta de Orçamento conta com uma forte retomada da economia em 2016. No texto enviado à Alerj, o governo trabalha com projeção de alta de 1% do Produto Interno Bruto ( PIB) do país no ano que vem. Segundo o boletim Focus, do Banco Central, a expectativa do mercado é que a atividade econômica encolha 1% em 2016. O Fundo Monetário Internacional ( FMI) prevê retração de 1%.

Com isso, a previsão para a arrecadação do ICMS — principal tributo da economia fluminense — para 2016 ficou em R$ 37 bilhões, montante 17,5% superior ( alta nominal, sem considerar a inflação) ao esperado para este ano. De janeiro a junho, o governo arrecadou R$ 15,6 bilhões.

— Não dá para contar com royalties de petróleo, que decepcionaram muito este ano. Outra coisa que ajudou foram depósitos judiciais. Todos os estados fizeram uso dessa estratégia, que não será mais fonte de caixa no próximo ano. É incerto. Vai ser um ano difícil — avalia o economista Mansueto Almeida, especialista em finanças públicas.

O secretário de Fazenda, Julio Bueno, vê chances de as projeções se concretizarem:

— Há otimismo, mas é possível que as expectativas se revertam.

Mesmo assim, o governo precisará de R$ 14 bilhões em receitas extras em 2016. A principal contribuição, nos planos do governo, será da securitização da dívida ativa. Essa operação prevê que o governo transforme R$ 66 bilhões que estão na dívida ativa em papéis, que serão administrados por instituição financeira. Com isso, receberá antecipadamente parte do débito, conseguindo R$ 4 bilhões em 2016. O restante das contribuições virá via concessão de terminais de ônibus ( R$ 2 bilhões), operações no mercado com recursos do Rioprevidência ( R$ 2,5 bilhões), concessão de linhas de ônibus intermunicipais ( R$ 1,5 bi), venda de terrenos ( R$ 1,15 bi) e venda da folha de pagamento dos servidores ( R$ 300 milhões). Há a previsão ainda de uma operação de crédito, ou seja, tomada de dinheiro emprestado, que renderia R$ 2,5 bilhões.

O governo vem tomando medidas para fechar as contas deste ano. O déficit, que começou o ano em R$ 13,5 bilhões, está em R$ 2,5 bilhões. Bueno admite que pode chegar ao fim de 2015 no vermelho. A maior aposta para evitar isso é a securitização da dívida, que pode gerar R$ 1 bilhão em receitas.


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