sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Deputado muda tom sobre impeachment

Um dia após dizer que as “pedaladas” do governo Dilma viraram “motocicletas”, Cunha ontem afirmou que elas podem não ser motivo para impeachment.

‘Pedalada não significa ato da presidente’

• Um dia após receber novo pedido de impeachment, Cunha diz que fato, por si só, não é razão de afastamento

Júnia Gama, Evandro Éboli - O Globo

- BRASÍLIA- Um dia após posar para fotos com líderes da oposição e representantes de movimentos que pedem a derrubada da presidente Dilma Rousseff ao receber novo pedido de impeachment, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), fez ontem gestos de aproximação com o governo e deixou a oposição ainda mais descrente de que ele dará prosseguimento ao pedido. Em entrevistas durante o dia, Cunha disse que as “pedaladas fiscais”, mesmo que ocorridas no atual mandato, podem ter existido sem necessariamente existir responsabilidade da presidente Dilma — um balde de água fria na principal tese do pedido de impedimento. Anteontem, Cunha dissera que as pedaladas estão se transformando em “motocicletas”.

O presidente da Câmara, que vem dando sinais trocados sobre sua posição em relação ao governo, especialmente depois de descoberto seu envolvimento na Lava- Jato, também adiou mais uma vez o prazo para dar uma resposta sobre o pedido formulado pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal. No dia em que recebeu o documento, disse à oposição que pretendia decidir sobre ele até o dia 15 de novembro. Ontem, afirmou que não quer “assumir compromisso” com uma data específica.

— Estão dizendo que há indícios disso ( das pedaladas em 2015), tanto que o governo procura forma de consertar até o final do ano e pagar o que está pendente. Outra coisa é o efeito do pedido de impedimento. Ali, tem que ter a tipificação do ato que possa ter gerado o descumprimento da lei. O fato de ter existido a pedalada não significa que pode ter havido ato da presidente. Pode ser feito por vários motivos, por outras circunstâncias — defendeu, complementando em seguida:

— O fato por si só não significa que isso seja razão de pedido de impeachment. Tem que configurar a atuação da presidente no processo, de que descumpriu a lei. Pode existir a pedalada e não a motivação do impeachment.

Unido ao PT em CPI
Outra mostra da aproximação de Cunha com o governo ontem foi a ação conjunta do PT e do presidente da Câmara na CPI dos Fundos de Pensão, que evitou a votação de requerimentos de convocação do lobista Fernando Baiano, operador de propinas do PMDB na Petrobras, e do pecuarista José Carlos Bumlai, acusado por Baiano de pedir propina de R$ 2 milhões para uma nora do ex- presidente Lula.

Os requerimentos de convocação de Baiano e Bumlai foram apresentados pelo deputado Marcus Pestana ( PSDBMG) e incluídos na pauta pelo presidente da CPI, Efraim Filho ( DEM- PB). Cunha foi alertado por peemedebistas, ficou “irritadíssimo” com a manobra, e passou a agir junto a aliados para barrar a convocação de Baiano. Efraim Filho é o presidente da comissão graças a Cunha, que, à época da escolha, mantinha estreita relação com a oposição.

À noite, porém, Cunha voltou a cutucar Dilma. Disse que, antes de cobrarem sua renúncia do cargo, por causa da LavaJato, deveriam cobrar da presidente:

— A presidente da República foi eleita pela maioria absoluta dos votos e, hoje, não tem apoio de um dígito da população. Nem por isso estão cobrando que ela renuncie. Não é o meu caso, do ponto de vista de apoiamento. Antes de falar de mim, cobrem também da presidente, que está sem apoio popular nenhum, digam que ela deveria renunciar.

Aliados de Cunha acreditam que, para se manter no cargo, ele fará movimentos pendulares, hora em direção ao governo, hora a favor da oposição. No momento, o peemedebista teria optado por acenos ao governo por encontrar no Planalto um terreno menos instável.

— A ordem no governo é tentar estabelecer o máximo de normalidade na Câmara para avançar nas pautas econômicas. A tendência é que o governo fique neutro em relação a Cunha no Conselho de Ética. Começa a existir um sentimento de que Cunha não vai resistir, mas o timing ainda não está claro. Enquanto isso, o melhor é manter a cautela — disse um interlocutor do o Planalto.

A pessoas próximas, Cunha tem demonstrado insatisfação com a oposição, que começa a planejar uma agenda para se desvincular do peemedebista. A tentativa de convocar Baiano foi vista por Cunha como uma prova de que não poderá contar com os antigos aliados. Ontem, deputados da oposição decidiram fazer uma “reflexão” sobre a necessidade de abandonar a agenda do impeachment e se descolar de Cunha.

— A moeda dele é outra, é a vida dele. E o governo tem mais condições de prolongar a vida dele do que a oposição — afirmou um líder oposicionista.

Cunha, por sua vez, deixou em aberto a data para decisão sobre o mais novo pedido de impeachment contra Dilma.

— Não quero assumir compromisso com dia e hora.

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