terça-feira, 22 de setembro de 2015

O jogo que prolonga a crise – Editorial / O Estado de S. Paulo

A crise econômica em que o populismo petista afundou o País continua sem perspectiva imediata sequer de algum alívio, porque a área política, nomeadamente o Congresso Nacional, do qual depende a viabilização de qualquer estratégia de combate à causa principal dos problemas – o caos que impera nas contas do governo –, não consegue romper o impasse decorrente da dificuldade de conciliar os interesses pessoais e partidários em jogo. Dito de forma mais clara: enquanto os políticos – do governo, da oposição e do muro – não conseguirem se entender a respeito do que é melhor para eles próprios, dificilmente dedicarão parte de seu precioso tempo à busca do entendimento a respeito do que é melhor para o País.

Esse quadro lamentável é produto do fisiologismo predominante, com raríssimas exceções, nas bancadas parlamentares. Afinal, o toma lá dá cá é a matéria-prima do “presidencialismo de coalizão” concebido por Lula. O surgimento, nos últimos dias, de novas hipóteses para o desfecho da crise naquilo que diz respeito ao mandato da presidente parece ter estimulado as diferentes correntes políticas a buscar caminhos em que corram menos riscos.

Ninguém se atreve a fazer uma aposta que pode dar errado.

O PMDB, maior partido do Congresso e teoricamente ainda aliado do governo, é o maior exemplo das incertezas que imobilizam os grupos políticos. Isso quanto à tomada de decisões oficiais pelos partidos, uma vez que nos bastidores os conchavos correm soltos. A grande alternativa em relação à qual mais cedo ou mais tarde as posições serão definidas é clara: se o que vem pela frente virá com ou sem Dilma Rousseff na Presidência da República. E essa alternativa dependerá dos parlamentares, aos quais compete, estabelecidos os pré-requisitos constitucionais, aprovar ou rejeitar o processo de impeachment.

Os peemedebistas estão divididos. Uma ala na qual se destaca o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, aposta no afastamento de Dilma. Outra, que segue a liderança de Michel Temer, permanece numa expectativa cautelosa, até porque o vice-presidente é o mais provável beneficiário do impedimento da presidente. Só não o será se tiver o próprio mandato também cassado, a partir de uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral. E há também os governistas de carteirinha, como a ministra Kátia Abreu, amiga de Dilma.

Para complicar o quadro, ganharam intensidade em Brasília os rumores sobre a possibilidade de Dilma renunciar. É uma hipótese descartada por quem conhece o temperamento e a história política da presidente, mas que ganha plausibilidade quando se leva em conta que o Congresso pode deixá-la sem condições de governar. E há ainda a influência e o posicionamento de Lula. Oficialmente, o PT continuará apoiando a proposta do governo para o ajuste fiscal. Contraditoriamente, porém, na voz de Lula e de lideranças expressivas, continuará também defendendo a mudança da política econômica. Quer dizer: fingirá que aprova as medidas impopulares de austeridade – corte de despesas e aumento de tributos – indispensáveis ao reequilíbrio e à consequente tentativa de retomada do crescimento, mas não abrirá mão do discurso populista de que o ajuste não pode ser feito “nas costas dos pobres”.

Nos últimos dias Lula intensificou suas idas a Brasília para, de acordo com interlocutores habituais, tomar a frente das articulações políticas, principalmente com as lideranças do PMDB e especialmente no Senado, para liquidar qualquer possibilidade de impeachment de sua pupila. Pode ser apenas jogo de cena, no que Lula é mestre. Dentre as três hipóteses de desfecho da crise política – Dilma garantir-se na Presidência até 2018, ser afastada do cargo por um processo de impeachment ou renunciar –, Lula tem sólidos motivos para, na intimidade, tentar evitar a primeira e a última.

A crise econômica é praticamente impossível de ser debelada até 2018, o que significa que a permanência de Dilma no poder faria o PT sangrar até lá, tornando dificílima uma vitória de Lula. A renúncia seria uma confissão de culpa que respingaria no partido e, principalmente, no criador de Dilma.

Com o impeachment, Lula estará livre para assumir oficialmente o comando da oposição, tendo quase três anos para exercer seus dotes de encantador de multidões e tentar recuperar, com as acusações e as promessas de sempre, a aura de salvador da Pátria.

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