terça-feira, 15 de setembro de 2015

Luiz Carlos Azedo - Impostos demais, cortes de menos

• As chances de o ajuste fiscal se tornar um novo fiasco não são pequenas, pois ao Congresso caberia o trabalho sujo de aumentar os impostos, quando se sabe que eles já estão num patamar muito elevado

- Correio Braziliense

O resumo da ópera do ajuste fiscal anunciado ontem pelo governo, durante entrevistas dos ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, é o seguinte: o governo espera arrecadar R$ 28 bilhões com aumentos de novos impostos e a recriação da CPMF, e pretende cortar apenas R$ 26 bilhões de gastos. O problema é combinar com os beques, ou seja, o Congresso Nacional. A maioria das medidas propostas dependerá de medidas provisórias, que precisam ser aprovadas pelo Legislativo.

A reforma administrativa com redução de ministérios, que o governo promete e não faz, não entrou no pacote anunciado ontem. Durante dois dias, a presidente Dilma Rousseff e o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, discutiram as medidas com Levy e Barbosa. Os cortes de gastos empacaram nos programas sociais do governo e no Minha Casa Minha Vida, que a presidente da República pretende manter. O dinheiro do Fundo de Garantia do Tempo de serviço (FGTS) substituirá o Tesouro nos subsídios para as habitações de baixa renda.

As chances de o ajuste fiscal se tornar um novo fiasco não são pequenas, pois ao Congresso caberia o trabalho sujo de aumentar os impostos, quando se sabe que eles já estão num patamar muito elevado — 37% do Produto Interno Bruto (PIB) — e a arrecadação pode diminuir em vez de subir. Para muitos analistas, o aumento da carga tributária para um patamar mais elevado do que já está pode provocar mais recessão, o que frustraria as receitas estimadas com base no novo imposto.

Além de não mexer em programas sociais, como o Bolsa Família (programa que passa por um pente-fino), Dilma optou por adiar o aumento e não congelar os salários dos servidores federais (o reajuste será em agosto de 2016). A medida mais importante quanto aos gastos com o funcionalismo é a supressão do abono de 10% para 110 mil servidores que deveriam estar aposentados e continuam trabalhando. Mas tudo passará ainda pelo Congresso, onde o lobby das corporações é fortíssimo.

Nada garante o apoio das bancadas do PT e dos movimentos sociais ao pacote. Isso complica a adesão das bancadas do PMDB na Câmara e no Senado, refratárias a aumentos de impostos. Dilma pedirá apoio aos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), mas ambos relutam endossar as propostas para aumentar as receitas. Cunha disse que aplaudia a iniciativa do governo, mas criticou o pacote: “75% dos cortes são dependentes de terceiros. São pseudocortes. A parte do governo, os 25%, são sobre as despesas discricionárias. Não vejo um corte efetivo”.

Um ajuste que busca arrecadar mais impostos do que reduzir gastos está na contramão de tudo o que vem sendo discutido entre políticos e empresários sobre a crise. A ideia de que basta um encontro de contas entre receitas e despesas para tirar o país do sufoco não é robusta o suficiente para garantir o ajuste. A opinião pública considera o governo gastador e avalia negativamente o desempenho do Planalto. O Congresso sinaliza na mesma direção.

Recado
Em Moscou, o vice-presidente Michel Temer deu declarações de apoio à presidente Dilma Rousseff. Ao ser questionado por um jornalista sobre se Dilma está tendo uma “última chance” no governo, o peemedebista contestou essa avaliação: “A presidente está se recuperando cada vez mais e tenho certeza que terminará o mandato”, disse. Temer considerou os cortes um “bom passo”, mas nada disse sobre aumento de impostos.

As primeiras manifestações da oposição foram contra os aumentos de impostos. Já governistas, tanto do PT como do PCdoB, criticaram o caráter do ajuste. Parece conversa pra boi dormir. A maioria do Congresso pensa o contrário. De cada 10 parlamentares, sete consideram a relação com o governo péssima e desaprovam a maneira de Dilma governar.

É nesse ambiente que prosperam as articulações para abertura do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff, cuja contenção estaria hoje muito mais fora do parlamento do que dentro, principalmente graças aos grandes grupos empresariais do país.

Esse apoio empresarial começa a ser fragilizado pelas vacilações e ziguezagues da presidente da República quanto ao ajuste. A repercussão inicial do pacote junto aos agentes econômicos ontem foi negativa. A maioria dos analistas criticou o aumento da carga tributária, principalmente a recriação da CPMF, o antigo imposto do cheque, que teria uma alíquota de 0,2.

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