terça-feira, 4 de agosto de 2015

Luiz Carlos Azedo - Delírios persecutórios

Correio Braziliense

• O PT nunca aceitou a condenação de José Dirceu no processo do mensalão, cuja legitimidade até hoje é questionada pela legenda e pelos advogados que atuaram no caso

Delírios persecutórios se caracterizam pela crença de ser vítima de perseguição ou conspiração. Quem sofre do distúrbio acredita — e possui explicações coerentes para o fato — que alguém conspira e deseja o seu mal. Na definição clínica, o sujeito acredita que é objeto de uma conspiração, podendo estar relacionada com fraude, espionagem, perseguição, envenenamento, calúnia, assédio ou obstrução nos seus objetivos a longo prazo.

Para sustentar o delírio, exageram-se pequenos acontecimentos. Uma injustiça, por vezes, demanda uma ação judicial. É a chamada “paranoia querelante”, muito comum nos tribunais e órgãos públicos, nos quais a pessoa afetada envolve-se em repetidas tentativas de obter, respectivamente, sentenças ou decisões favoráveis. Delírios persecutórios também podem se manifestar por meio de ressentimento e raiva, às vezes recorrendo a violência.

Na abordagem freudiana, a contradição do delírio persecutório se manifesta no “eu amo” que se transforma em “eu odeio”, e gera uma espécie de bateu, levou: “Ele me odeia e me persegue, o que me dá o direito de odiá-lo”. A partir daí, vem a projeção: os sentimentos são percebidos externamente de maneira oposta, e o sujeito acha que o outro o odeia. Freud associa esse ódio exterior ao afeto ou amor interior, mas aí já é outra prosa mais complicada: entra na roda a discussão sobre desejos reprimidos.

A nova prisão de José Dirceu na 17ª fase da Operação Lava-Jato, batizada de Pixuleco pela Polícia Federal, por suspeita de envolvimento no escândalo da Petrobras, desperta nos militantes petistas um sentimento de frustração e de revolta. No segundo caso, a maioria acredita que está sendo vítima de uma grande conspiração de direita, quiçá, dos Estados Unidos de Barack Obama. Os argumentos dos advogados dos réus e a narrativa da cúpula petista estimulam essa reação, que não deixa de ser uma maneira de mobilizar os quadros do PT para a luta política, cada vez mais dura.

O PT nunca aceitou a condenação de José Dirceu no processo do mensalão, cuja legitimidade até hoje é questionada pela legenda e pelos advogados que atuaram no caso. O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa, relator do processo, que depois presidiu o STF e comandou o julgamento, sofreu ataques diretos dos petistas devido à atuação no caso. Agora, o mesmo ocorre com o juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, que é tratado como um “ferrabrás” que exorbita das funções no caso Lava-Jato, ao pôr na cadeia, preventivamente, os principais acusados.

O procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, em entrevista em Curitiba, disse que o escândalo da Petrobras e o mensalão têm a mesma genealogia: “Nós temos o DNA, realmente, de compra de apoio parlamentar — pelo Banco do Brasil, no caso do mensalão, como na Petrobras, no caso da Lava-Jato”. Segundo ele, “José Dirceu recebia valores nesse esquema criminoso enquanto investigado no mensalão e enquanto foi preso. Seu irmão fazia o papel de ir até as empresas para pedir esses valores”.

Esse foi um dos fatos, segundo o procurador, que motivaram o novo pedido de prisão para Dirceu, que já cumpria pena em prisão domiciliar por condenação no mensalão. Para o advogado dele, a cúpula petista e os amigos do ex-ministro da Casa Civil do governo Lula, a prisão foi arbitrária e desnecessária: ele poderia perfeitamente responder às acusações até que transitasse em julgado o processo da Lava-Jato, cumprindo, em casa, a pena pela qual já foi condenado.

Conspiração
A polêmica sobre Dirceu é uma amostra grátis do que pode ocorrer no país caso as investigações avancem na direção de petistas mais ilustres. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já se articula e mobiliza forças para salvar o PT de uma catástrofe eleitoral irreversível, que inviabilize a candidatura dele em 2018. A volta ao poder de Lula é cada vez mais difícil, por causa do fracasso do governo Dilma Rousseff e do escândalo da Lava-Jato, que desgasta a imagem dele como líder político.

Lula é um craque da comunicação política, sabe utilizar com maestria a emoção dos militantes petistas e dos eleitores cujas vidas melhoraram durante o seu governo. No programa do PT que vai ao ar na quinta-feira, dirá que a legenda sofre uma perseguição odienta.

Vaias à presidente Dilma Rousseff, hostilidades quase físicas a políticos petistas em aviões de carreira e em restaurantes, além de uma bomba caseira lançada contra o Instituto Lula, em São Paulo — um ato tipicamente fascista — servem para corroborar o discurso. O clima pesado nas redes sociais é um exemplo da radicalização que vem por aí, já que grande manifestação contra o governo Dilma e o PT está programada para o próximo dia 16.

As investigações da Operação Lava-Jato contra o PT não são um fato banal, muito menos um delírio. A cúpula petista está à beira de ser tragada pelo escândalo. Rui Falcão, presidente nacional do PT, nega as denúncias: “O Partido dos Trabalhadores refuta as acusações de que teria realizado operações financeiras ilegais ou participado de qualquer esquema de corrupção”, diz.

A nota assinada por Falcão renova a fé dos militantes petistas que não acreditam nas denúncias e imaginam que tudo não passa de perseguição e conspiração golpista, ou seja, uma espécie de delírio persecutório coletivo.

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