sexta-feira, 7 de agosto de 2015

César Felício - Ofensiva contra o vácuo

- Valor Econômico

• Sucessão já começou, com ares de reprise

O agravamento da crise política que torna rarefeito o ar em Brasília produz um paradoxo: 2018 torna-se um ano mais próximo, ainda que projete um forte indicativo da falta de renovação política no país. Não é impossível que tenhamos quatro candidaturas de densidade eleitoral já testadas em todas as eleições anteriores desde a redemocratização.

Enquanto Aécio (2014) e Alckmin (2006) protagonizam a disputa pela candidatura dentro do PSDB, com José Serra (2002 e 2010) tentando entrar no jogo; Luiz Inácio Lula da Silva (1989, 1994, 1998, 2002 e 2006) continua sendo a única opção do PT; e Ciro Gomes (1998, 2002), mais uma vez, deixa em aberto a possibilidade de se apresentar como terceira via; faixa ainda ocupada por Marina Silva (2010 e 2014).

Um impeachment de Dilma e um eventual governo Temer favorece de maneira clara apenas um destes presidenciáveis: José Serra. São duvidosos os benefícios que os demais teriam com a substituição de Dilma por Temer. Aécio lucraria apenas com a antecipação das eleições e não é de outro modo que deve ser lido o movimento de seus aliados a favor da queda da presidente e de seu vice.

Presidente da Transnordestina, uma subsidiária da CSN, Ciro Gomes negocia a filiação no PDT e seu reingresso no debate nacional, embora afirme entrar sem apetite na reprise. Ele enxerga um vácuo a ser ocupado no campo da centro-esquerda, diante da debacle do PT, em um movimento de dupla face: contra o impeachment de Dilma e o fortalecimento do PMDB como alternativa de poder e contra uma nova candidatura de Lula.

Para Ciro, uma saída da Esplanada do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e da Justiça, José Eduardo Cardozo, seria o sinal da "capitulação total" do governo a uma base que transaciona com a oposição. Alerta que o coordenador político do governo, o vice-presidente Michel Temer "não tirou os trilhos de um impeachment".

O elogio a Mercadante e Cardozo, "dois políticos que são pontos fora da curva", mostra que Ciro critica o governo por um alegado convencionalismo na política e na economia, mas não joga na oposição.

O ex-governador diz que não há itinerário válido para o impeachment, que estaria se desenhando como uma aventura de elites "que permitirá a lei da selva". Ciro diz que a discussão política de hoje pode aproximar o Brasil do Paraguai, que em 2012 destituiu o então presidente Fernando Lugo em um processo de afastamento sumário votado pelo Congresso. Ao mesmo tempo, afirma que o PT deixou de representar os que votaram pela reeleição presidencial no ano passado.

"Dilma precisa entender porque o povo brasileiro quis a sua permanência depois de um governo que não foi bom", afirma. Frequente interlocutor de Dilma, Ciro ainda vê na presidente capacidade de reação. "Não se deve subestimar o poder da Presidência. O fundo do poço tem grandes possibilidades", disse.

Lula ganhou um adversário público. "Ele virou uma figura perniciosa à República. Faz um esforço cíclico para tutelar a Dilma, se atribui poderes de semi-deus e malversa o bem querer imenso que a população tem pela sua figura. Faz parte central do problema, e não da solução, ao não esconder que quer ser candidato em 2018".

É uma crítica que busca se estruturar distante das sequelas da Operação Lava-Jato. "O discurso contra a corrupção não resolve tudo, temos aí um problema de competência. Precisamos desfazer o casamento da picaretagem com a burrice. Reações moralistas beneficiam a imoralidade de forma transversa", diz.

Nas palavras de Ciro, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, "um homem de bem", resulta ser tão perigoso para o Brasil quanto o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. A equipe econômica estaria aprofundando um processo de desindustrialização e contratando inflação para o futuro, ao permitir o câmbio flutuar com força.

Cunha, "um calhorda", em sua classificação, pode ser o aríete que destrua de vez o governo Dilma de uma maneira ou outra. Seja promovendo um impeachment a toque de caixa, ou sendo o instrumento para uma reforma administrativa que entregue ao PMDB o coração do governo.

A trajetória política de Ciro descarrilou em 2010, quando não disputou as eleições, depois de transferir o seu título eleitoral do Ceará para São Paulo, em uma manobra de difícil compreensão e que ele não se esforça para esclarecer. Diz que foi levado à transferência a pedido de Lula e de Eduardo Campos. "Transferi com a condição de ser candidato a presidente. Eles mentiram para mim. O Campos me estimulou e depois vendeu a minha cabeça. O Lula garantiu que eu era o candidato a sucedê-lo, mas eu sabia que ele não tinha condições de bancar aquilo. Não sou inocente, não posso dizer que fui enganado. Política é assim", resume.

Sua saída de cena abriu caminho para Marina. "Vi todos os meus votos passando para ela", disse. Para Ciro, "existe uma classe média pulsante que está a caminho da descrença e a Marina é a representação desta negação da política". Na eleição de 2014, o protagonismo em seu grupo político foi do irmão, Cid Gomes, que fez uma arriscada aliança eleitoral com o PT para enfrentar o PMDB no Ceará e foi premiado com o ministério da Educação, onde demorou dois meses e meio antes de ser expelido por imposição de Eduardo Cunha.

O partido com quem Ciro conversa está se retirando da base governista, depois de anos imerso na divisão entre a cúpula, liderada pelo ex-ministro do Trabalho, Carlos Lupi, e a bancada na Câmara. Cid deve acompanhar o irmão caso a migração se concretize. Será acompanhado ainda de 76 prefeitos e uma considerável quantidade de deputados federais.

É um jogo de conveniência, em que as duas partes ganham densidade para suas negociações. Ciro, Cid e seus liderados estão abrigados no nanico Pros, um partido liderado por um obscuro político do entorno de Brasília que ruma para o desmanche. O PDT precisa de algo para botar na mesa. Assim como Ciro, o partido saiu do primeiro plano e deixou de figurar nas chapas presidenciais em 2010 e 2014.

Mas Ciro é comedido ao falar de seu possível novo destino. "Não tenho ilusões. O sistema partidário é uma tragédia brasileira e tenho sofrido com ele", comentou. Desde 1982, o ex-governador já fez parte do PDS, PMDB, PSDB, PPS e PSB.

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