sábado, 11 de julho de 2015

Merval Pereira - Comemorando crises

- O Globo

A confusão é tamanha entre os petistas e seus aliados que eles deram agora para comemorar crises internacionais como se elas confirmassem o que a presidente Dilma mais gosta de dizer, que os problemas brasileiros são causados pela má situação econômica e financeira do mundo.

Assim, a crise das bolsas da China, que vai repercutir em toda a economia global e principalmente nos países periféricos como o Brasil, está sendo quase que comemorada pelos estrategistas petistas, esquecendo-se de que, se estamos nessa situação econômica delicada sem que os motivos externos fossem os verdadeiros culpados, agora que existem realmente esses problemas, a situação só tende a piorar.

Durou pouco também a comemoração dos que viram no "Não" do plebiscito grego uma rejeição ao programa de ajuste das contas públicas exigido pela União Europeia. O primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, deu um golpe político nos radicais de seu próprio partido (e nos torcedores de outros cantos do mundo, inclusive brasileiros) e, vencedor do plebiscito, mas sabedor de que a vitória não lhe dava um mandato para sair da zona do euro, apresentou proposta muito semelhante aos termos que a Grécia rejeitara, e em alguns pontos mais dura ainda, na tentativa de conseguir um socorro financeiro de ¬ 53,5 bilhões durante três anos e uma promessa de reestruturação da dívida.

Os petistas e quejandos comemoraram o resultado do plebiscito grego como se ele pudesse indicar que aqui também o povo deveria dizer "não" ao programa de ajuste fiscal da presidente Dilma, que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tenta levar a bom termo. Lá como cá, no entanto, quem tem a responsabilidade de governar sabe que não pode brincar com o desequilíbrio fiscal, embora possa vencer eleições prometendo coisas que não serão cumpridas.

Aqui, Dilma venceu em 2014 vendendo um país que já não existia desde seu primeiro mandato, mas que o governo petista sustentou às custas de "pedaladas fiscais" e emissão de moeda que deu no que deu: inflação já na casa de 2 dígitos em algumas regiões, crescimento negativo, juros na estratosfera.

Na Grécia, o Syriza, partido vencedor das eleições, chegou ao poder depois de defender durante anos a rejeição ao programa de ajuste. Muitos nefelibatas políticos, ou simples populistas, na Grécia e em diversas partes do mundo, inclusive no Brasil, viram a vitória do "Não" como uma virada de mesa contra a União Europeia, o que absolutamente não acontecerá.

O ajuste proposto pelo governo grego prevê corte de ¬ 13 bilhões nos gastos por meio de elevação de impostos, fim de benefícios tarifários para as ilhas gregas, reformas previdenciárias e privatizações, quando o plano anterior previa corte de até ¬ 8 bilhões. O superávit primário que tanta ojeriza causa aos nefelibatas petistas está no plano grego: 1% este ano; 2% em 2016; 3% em 2017; e, finalmente, 3,5% em 2018.

A China, cujos índices de ações recuaram mais de 30% nas últimas semanas, está conseguindo controlar sua crise às custas da força bruta do capitalismo de Estado. O impacto foi tão forte que autoridades chinesas proibiram a venda de ações por grandes investidores, como bancos e fundos de pensão, os mesmos que haviam recebido incentivos governamentais para gerar o que acabou sendo uma bolha.
Os que aqui no Brasil quase chegaram a comemorar a crise chinesa, que vem ao encontro de tese antiga de Dilma, esquecem que ela desborda para a economia real e nos atinge diretamente, e também aos Brics, reduzindo os preços de commodities como o petróleo, desvalorizando nossas reservas e prejudicando as exportações da Rússia; e o minério de ferro, maior produto do comércio exterior do Brasil para a China, derrubando nossa balança comercial.

A situação é tão ridícula que, depois do "Não" grego, esses estrategistas que vivem em outra dimensão chegaram a pensar que a Grécia poderia se livrar da pressão de Angela Merkel e da União Europeia para ser ajudada pelos Brics, cujo novo Banco de Desenvolvimento poderia dar o apoio que a Grécia não receberia dos organismos europeus e do FMI.

Agora, vamos ter que lidar com uma crise verdadeira.

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