terça-feira, 2 de junho de 2015

Luiz Carlos Azedo - Não está pra Temer

• Ao não cumprir os acordos de Temer, Palácio do Planalto enfraquece o dispositivo parlamentar que o vice-presidente da República tenta consolidar no Congresso

- Correio Braziliense

O vice-presidente Michel Temer parece navegar contra o vento numa jangada em meio ao mar proceloso. Assumiu a condição de articulador político do Palácio do Planalto para salvar a presidente Dilma Rousseff de uma grande borrasca, que ameaçava desestabilizar seu governo, por causa da desagregação da base no Congresso e das grandes manifestações de protestos de 15 de março, que pediam seu impeachment.

Sem ele, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, não teria a menor chance de aprovar o juste fiscal. Passado o pirajá, porém, antes mesmo de o ajuste ser aprovado integralmente, o Palácio do Planalto já começa a minar o prestígio de Temer entre os seus próprios pares, ao não cumprir os acordos feitos com os aliados. Essa sempre foi a grande queixa dos políticos da base do governo contra Dilma Rousseff.

O vice-presidente da República, porém, passou recibo de sua insatisfação: na entrevista que concedeu domingo aos repórteres Valdo Cruz e Natuza Nery, na Folha de São Paulo, disse com todas as letras que abandonará a missão se os acordos que fez com os partidos da base não forem cumpridos – leia-se, nomeações para os cargos de segundo e terceiro escalões, que estão emperradas. “Se a burocracia não funcionar, quem não funciona sou eu, aí eu saio”, disparou.

O recado só pode ter sido endereçado à presidente Dilma, porque Temer disse que os ministros petistas da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e das Comunicações, Ricardo Berzoine, têm a memória das nomeações e estão “ajudando muito”. Temer sinalizou também que a ruptura com o PT é inexorável, ao anunciar que o PMDB terá candidato a presidente da República em 2018.

Ao não cumprir os acordos de Temer, Palácio do Planalto enfraquece o dispositivo parlamentar que o vice-presidente da República tenta consolidar no Congresso. Deixa o caminho livre para que os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), apresentem suas próprias agendas e deixem em segundo plano o ajuste fiscal proposto pelo ministro da Fazenda. Apesar de aprovadas pelo Congresso, as Medidas Provisórias nº 664 (auxílio-doença) e nº 665 (seguro-desemprego e abono salarial), por exemplo, ainda não são assuntos resolvidos.

A alternativa ao fator previdenciário, incluída na MP nº 664, deve voltar ao exame do Congresso, já que há expectativa de veto da presidente. Dilma tem 15 dias úteis, contados a partir da data do recebimento do projeto, para sancionar a lei. Caso ocorra na próxima semana, o prazo de sanção será no final de junho. Havendo veto, este será analisado pelos parlamentares 30 dias após seu recebimento pelo Senado. Ou seja, a aprovação vai se estender até setembro, por causa do recesso de julho.

No caso da MP nº 665, a legalidade das mudanças feitas no abono salarial será questionada pela oposição na Justiça, caso não haja veto da presidente. O argumento é que o pagamento proporcional ao tempo de trabalho é inconstitucional. O julgamento no Supremo deve ficar para o segundo semestre, já que o tribunal entrará em recesso em julho e retornará apenas em agosto.

Tudo isso gera expectativas negativas na sociedade e retarda os investimentos. Há, porém, mais problemas. Renan e Cunha resolveram fazer um ajuste do ajuste. Acertaram com 23 governadores um acordo para aprovar uma “agenda federativa”, que já deixa Levy de cabelo em pé.

Trata-se do compartilhamento entre a União, estados e municípios das despesas com segurança e da transferência para o Tesouro das despesas de educação que ultrapassarem os 60% do Fundo Nacional da Educação. O pacto foi firmado à revelia de Temer, que se enfraquece internamente. Ou seja, precisa chegar a um porto seguro, sob pena de ter que escolher entre Dilma e o PMDB. Parece que escolha já está feita.

Mestres dos mares
Uma jangada é feita com seis paus: dois no centro (chamados de "meios"), dois seguintes, dispostos simetricamente (chamados "mimburas", palavra de origem tupi), e dois externos, chamados de "bordos". Os paus mais centrais (meios e mimburas) são unidos por cavilhas de madeira mais dura. Já os paus de bordo são encavilhados nos mimburas, de modo a ficarem um pouco mais elevados.

Sobre essa armação básica, instalam-se 2 bancos de madeira. O banco mais central, ou banco "de vante", apóia o mastro da jangada. O outro, da ré, também é chamado de banco "do mestre". O remo se encaixa entre o mimbura e um dos paus do meio (o meio de boreste). Há ainda uma outra abertura entre os dois paus do meio, para a passagem da "tábua de bolina", que reduz o caimento da jangada quando ela navega contra o vento.

As jangadas surgiram na costa do Nordeste brasileiro em meados do século XVII. Com sua admirável capacidade de navegar contra o vento, e de usar a força do vento para sobrepujar a corrente oceânica, é muito eficiente para a navegação à vela nas condições do litoral nordestino. Mestres do uso das marés, dos regimes de ventos, das correntes, da sazonalidade da pesca, os jangadeiros passavam em média três dias no mar, às vezes uma semana, chegando a 50 milhas da costa.

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