sexta-feira, 22 de maio de 2015

Míriam Leitão - Deixa cair a 664

- O Globo

A Medida Provisória 664, do ajuste fiscal, perdeu grande parte do que economizaria e passou a carregar um enorme risco de aumento de gastos. Como está, é preferível o governo deixar cair e não aprovar. O Congresso, em vez de aprovar o ajuste fiscal, está criando desajustes, e isso porque o governo tem demonstrado total incapacidade de liderança política.

Era para diminuir o gasto com pensão por morte das viúvas jovens — reduzindo o valor e o tempo que a pessoa receberia o benefício — mas a MP foi tão alterada que perdeu grande parte do ganho. Além disso, recebeu a emenda que muda a aposentadoria pela fórmula 85/95 pontos. Isso, na prática, aumentará o custo com a Previdência Social. Este é o entendimento de dois especialistas que ouvi ontem na Globonews sobre a reforma da Previdência. Tanto Paulo Tafner, do Ipea, quanto Fábio Giambiagi escreveram livros sobre o assunto. O de Tafner sairá no mês que vem com o título: "Reforma da Previdência. A visita da velha senhora. " Fábio acha que é preferível não aprovar a MP 664: —Se é para deixar a MP 664 do jeito que está, é melhor não aprovar. Porque o principal componente, que era a redução do valor das futuras pensões, acabou naquela noite numa negociação do relator. Esse item das viúvas jovens começou a pesar mais nas estatísticas há pouco tempo, mas não é a causa do grande rombo da Previdência.

A MP, como está, faz um pequeno ajuste e em compensação produz um grande desajuste por conta da alteração do fator previdenciário. Como cidadão brasileiro, preocupado com o futuro dos nossos filhos, olhando para 30 anos à frente, definitivamente eu preferiria que essa medida 664 não fosse aprovada. Paulo Tafner fez um cálculo que mostra o enorme peso que pode recair sobre o país se a ideia de alterar a Previdência para a fórmula 85/95 for mantida. —Fiz as contas. Se essas mudanças passarem, e nada mais for alterado, nós exigiremos das próximas gerações que elas produzam uma riqueza no país a uma taxa de 4% ao ano. Ou seja, o Brasil terá que crescer a 4% ao ano daqui até 2050 para não aumentar o gasto previdenciário em proporção ao PIB. Como o aumento da Previdência limita o potencial de crescimento, vamos legar para nossos filhos e nossos netos uma tragédia econômica.

Os dois especialistas no assunto disseram que o país tem muito pouco tempo para fazer as mudanças necessárias para nos preparar para o envelhecimento da população. — A próxima década é crucial. Até 2030, o país passará por muitas transformações. A população em idade ativa atingirá seu máximo, e o percentual de idosos aumentará drasticamente. Hoje, são 10% com mais de 60 anos e, daqui a 25 anos a 30 anos, seremos 30% — diz Tafner . —Nós temos hoje o perfil etário que o Japão tinha em 1970. Nós seremos, no futuro, o Japão de hoje, sem as vantagens que eles têm — acrescentou Giambiagi. —Envelhecer pobre é muito difícil. Teríamos que aumentar muito a capacidade produtiva desses jovens para sustentar a Previdência Social amanhã.

Se não fizermos a reforma, estaremos condenando a geração seguinte à pobreza — diz Tafner . Como é que o país chegou ao ponto de fazer o oposto do que deveria fazer? Está aumentando o custo da Previdência, em vez de reduzir. Tafner acha que o governo é o responsável: — Cabe à Presidência, principal agente político do país, sinalizar o que pode e o que não pode acontecer . E isso não foi feito. Se empurrarmos esse problema para a frente, vamos chegar ao ponto em que terão que ser cortados benefícios de qualquer maneira, como aconteceu com a Grécia, Portugal e Espanha, Irlanda.

Com corte na carne. O curioso é que, no primeiro momento, se essa medida for aprovada, ela pode postergar os pedidos de aposentadoria, na opinião de Fábio: —Algumas pessoas podem ter a chance de ganhar até 40% a mais se esperarem um pouco para receber uma previdência sem a incidência do fator , que reduz o ganho. Uma pessoa, por exemplo, que teria um fator de 0,75 e passará a ter fator igual a um. Essa informação vai se difundir e, se a medida for aprovada, o que o pode acontecer é que nós vamos ter um certo represamento das aposentadorias por um ano, ano e meio e dois, e depois ter um fluxo muito grande.

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