quinta-feira, 14 de maio de 2015

Míriam Leitão - Ajuste? que ajuste?

- O Globo

Que ajuste é este que nada ajusta? A MP 664, para ser aprovada, produziu a reabertura do balcão de nomeações e trouxe de volta o risco de aumento das despesas. Ela faz apenas uma pequena economia. Se for aprovada, a emenda do fim do Fator Previdenciário será, na opinião de Fábio Giambiagi, uma contrarreforma da Previdência. O preço a pagar fica muito maior do que o ganho.

Pelos cálculos do economista especializado em contas públicas, se a emenda que será votada hoje na Câmara for aprovada, o custo com as aposentadorias por tempo de serviço vai aumentar em 18% para os homens e em 43% para as mulheres. Seria um enorme risco fiscal, diz Fábio. A MP 664 estabelece mudanças tímidas na pensão por morte de cônjuges jovens. Se a emenda do fim do Fator for aprovada, o custo será altíssimo. A MP economizaria apenas R$ 2 bilhões, com a mudança da pensão por morte e auxílio-doença, mas perdeu 25% desse ganho no projeto final.

Na semana passada, foi aprovada a primeira medida do ajuste, a que aumenta de seis meses para 12 meses a exigência de tempo trabalhado para se pedir o seguro-desemprego, e de um mês para três meses trabalhados para se pedir o abono salarial. Essa pequena mudança, em um gasto que dobrou em 10 anos, custou mais de 70 nomeações políticas. Além disso, o ex-presidente Lula critica a medida tornando mais incerta a sua aprovação no Senado.

Vamos falar sério. O governo está fazendo mudanças pequenas diante do muito que precisa ser feito para corrigir o enorme estrago feito, no primeiro mandato da presidente Dilma, nas contas públicas. O setor público terminou com um déficit de 0,6% do PIB, quando havia prometido superávit. A luta da atual equipe é para chegar a 1,2% do PIB de superávit, mas quem entende de contas públicas faz e refaz os cálculos e acha que os ministros Joaquim Levy e Nelson Barbosa não vão conseguir chegar a esse valor.

Este é um ajuste pequeno que não resolve o problema e ainda está saindo caro, porque cada votação tem sido precedida de uma leva de nomeações políticas para cargos onde deveriam ser escolhidas pessoas por sua capacidade técnica e gerencial. Que ajuste é este que pode sair mais caro do que a economia que porventura fará? Afinal, tudo o que aconteceu na Petrobras foi resultado de nomeações políticas para a empresa. Como é que, diante disso, o governo continua distribuindo diretorias de estatais?

Se a equipe econômica quer realmente organizar as contas do país tem que parar de vender a ilusão de que duas medidas provisórias, que foram enfraquecidas ainda mais no Congresso, salvarão a pátria fiscal. O país está com um ritmo de aumento das despesas muito maior do que as receitas. As duas MPs não vão resolver o problema.

Que ajuste é este que não ataca o ponto mais emblemático: o fato de o governo ter tanto ministério que a presidente Dilma confunde seus ministros e diz que é dos transportes o ministro que é dos esportes. E mais, diante da gafe, diz que ela "promoveu" o ministro de uma pasta para outra, revelando que na sua visão existem ministérios de segunda.

O FMI pediu que o Brasil aumente em mais meio ponto percentual a meta de superávit fiscal de 2016, saindo de 2% do PIB para 2,5% do PIB. Nem isso, se fosse atingido, resolveria o problema, porque não é meio ponto a mais ou a menos que fará o Brasil atingir o equilíbrio das contas. Não é caso de pequenas mudanças incrementais. O Brasil precisa de reformas, várias delas, se quiser ter uma economia realmente forte.

Que ajuste é este que impede que os ministérios saibam, em pleno mês de maio, o que terão para investir e alguns não investiram um centavo sequer para manter os gastos de custeio? Investimento é o que o Brasil mais precisa, principalmente os que podem reduzir as despesas. O ajuste está sendo feito na paralisação de empreendimentos já iniciados, o que acaba produzindo um gasto muito maior.

Acabar com a pensão vitalícia para viúvas e viúvos jovens é necessário, já foi adotado em outros países, mas está longe de ser aquilo que nos levará ao equilíbrio. A equipe não pode vender ilusões, tem que dizer a verdade, por mais dura que seja. O buraco feito pelo governo foi fundo demais e exige mudanças mais radicais.

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