quinta-feira, 2 de abril de 2015

Vinicius Torres Freire - Chuva, suor e menos cerveja

• Produção de cerveja cai no primeiro trimestre, um sintoma da crise da economia da vida cotidiana

- Folha de S. Paulo

No verão de 2015, o Brasil produziu menos cerveja. Para ser preciso, a produção de cerveja caiu mais de 4% no primeiro trimestre deste ano, na comparação com 2014. E daí, cerveja? Também ontem a gente soube que a produção de máquinas e equipamentos, bens de capital, caiu 21% no primeiro bimestre de 2015 sobre 2014. A indústria caiu 7%. Etc. Desastres.

A numeralha da crise é vasta, mas a recessão da cerveja causa uma impressão vívida, ainda que impressionista, de que o caldo entornou. Quer dizer, que a gente parou de entornar.

Dados mensais precisos sobre a produção existem faz pouco tempo. Mas, de 2002 a 2012, a produção crescia no ritmo de uns 6% ao ano. Houve a caída de 2013, segundo ano da inflação forte do preço da cerveja. Em 2014, alta de quase 5%, raridade em meio à estagnação. Portanto, 2015 por ora está com jeito de ser o pior também até na mesa de bar, em uma década ou década e meia. No caso dos refrigerantes, a queda foi maior no trimestre, 5,5%.

Há crise nas gôndolas também, para ficar na economia da vida cotidiana. No primeiro bimestre, as vendas nos supermercados cresceram menos de 2% sobre 2014. No ano passado de estagnação do PIB, nesta época as vendas cresciam 3,7%.

A Confederação Nacional do Comércio, por sua vez, crê que o crescimento do número de empregos nas lojas será zero neste ano, conforme estimativa divulgada ontem. Zero.

A empresa do governo encarregada de pesquisar e planejar o setor elétrico estimava que o consumo de eletricidade cresceria 3,2% neste ano. Nesta semana, a projeção virou para queda de 0,5%. Tivemos a sorte de um pouco mais de chuva no Sudeste, com o que irresponsavelmente passamos a prestar menos atenção à escassez de água. Mas o que talvez deve nos livrar mesmo do racionamento de energia é a recessão combinada ao tarifaço da conta.

A confiança do consumidor é a menor desde janeiro de 2009 e teve o maior colapso desde o final de 2008, dado da FGV.

A venda de carros deve ter caído 18% no trimestre. A produção da indústria paulista caiu uns 6% nos últimos 12 meses (dado da Fiesp). A capacidade ociosa da indústria não era tão grande desde fevereiro de 2009 (dado da CNI), quando havia demissões em massa e queda brutal da produção porque se disseminava o pânico da crise de 2008.

Verdade que a produção da indústria nacional mergulhou rapidamente no abismo no final de 2009, chegando a baixar 10% em outubro daquele ano (no acumulado de 12 meses). Agora, o tombo ainda está na casa dos 6%.

Os indicadores de produção e vendas despencam, portanto, quase como em 2009, ano da recessão mundial. No entanto, o mergulho de 2009 foi breve. Agora, nem começamos a viver os efeitos da recessão que virá com o arrocho, necessário para consertar o estrago de Dilma 1.

Em 2009, de resto, havia crédito aos borbotões, estímulos de gastos do governo, dinheiro baratinho nos bancos públicos; agora, o governo corta mais de 30% do seu investimento "em obras".

Enfim, apesar do pessimismo econômico momentâneo, embora agudo, havia alguma gordura para queimar instrumentos para lidar com a crise, econômicos e políticos.

Agora, o povo está cortando até a cerveja.

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