segunda-feira, 27 de abril de 2015

Que partido é esse? – Editorial / O Estado de S. Paulo

Duas das três mais destacadas lideranças políticas do País, os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, desentenderam-se na quinta-feira, a propósito da tramitação do projeto da terceirização das relações trabalhistas, numa pancadaria verbal que compromete os dois e a imagem do Parlamento e, considerando o fato de pertencerem ao mesmo partido, o PMDB, levanta a questão: afinal, que partido é esse?

O PMDB é o maior partido brasileiro e seu presidente licenciado, Michel Temer, é o vice-presidente da República e também o principal articulador político do governo. No começo, era o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), partido criado pela ditadura para abrigar a oposição consentida ao governo militar e conferir uma aparência democrática ao regime autocrático imposto, já sem disfarce, a partir da edição do Ato Institucional n.º 5, de dezembro de 1968. A partir de 1965 o MDB congregou os opositores do regime, uma ampla aliança que reunia de democratas liberais a radicais de esquerda, e liderou a resistência política, até que, por meio de uma abertura "lenta e gradual", os militares deixaram o poder, mais de 20 anos após o golpe de 1964.

Na década de 80, novos partidos começaram a se formar no antigo campo oposicionista. Os dois exemplos mais significativos são o PT e o PSDB. Na ampla diversificação do quadro partidário, o MDB, que em 1980 se tornou Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), transformou-se na maior legenda política do País, condição que mantém até hoje e que tem tudo a ver com sua vocação de aderir ao poder central, do qual sempre desfrutou, cobrando bom preço para garantir a governabilidade aos poderosos de turno.

Produto e melhor exemplo da mentalidade patrimonialista que sempre dominou a política brasileira e foi levada a extremos pelo presidencialismo de coalizão patrocinado pelo populismo lulopetista, o adesista PMDB vive hoje um momento de excepcional fastígio graças à absoluta incompetência política da presidente Dilma Rousseff e seu círculo íntimo de colaboradores. Ao conquistar o domínio das duas Casas do Congresso, o PMDB logrou a façanha de reequilibrar a balança dos Poderes da República, que na última década pendeu pesadamente para o lado do Executivo. Mas esse equilíbrio pode não beneficiar o aperfeiçoamento institucional do País, pois está sendo ostensivamente colocado a serviço de interesses menores representados, por exemplo, pelos projetos políticos pessoais tanto do presidente do Senado como do comandante da Câmara. E nenhum dos dois revela muita compostura quando trata de defender seus projetos. É só ver como trataram o caso da terceirização.

O projeto da terceirização, que o governo e as entidades sindicais rejeitam, depois de tramitar por mais de 10 anos na Câmara, foi aprovado na quarta-feira passada graças ao empenho de Eduardo Cunha. Precisa ser apreciado agora pelo Senado. Mas Renan Calheiros, que jamais se destacou como defensor de causas populares, anunciou que não permitirá que progrida, ora vejam, uma iniciativa que a seu ver prejudica os interesses dos trabalhadores. E proclamou, sem corar: "Não vamos permitir 'pedaladas' contra o trabalhador. Não podemos permitir uma discussão apressada de modo a revogar a CLT". E enfatizou que o tema será analisado "sem pressa" pelos senadores.
Calheiros e Cunha, ao que tudo indica, estão de mal desde que o afilhado de um teve de ceder lugar ao afilhado de outro no Ministério do Turismo. Em vez de acertarem suas diferenças com uma boa conversa - como devem agir políticos responsáveis diante de assunto como esse, de vital importância para o futuro do País -, Calheiros e Renan preferiram se atacar mutuamente, armados dos poderes de que dispõem para comandar o Parlamento, onde deveriam estar em jogo, muito acima de seus interesses pessoais, aqueles que dizem respeito aos destinos do Brasil.

Eduardo Cunha, em sua tosca réplica a Calheiros, prometeu revidar na mesma moeda - ou seja, rejeitando na Câmara projetos aprovados no Senado: "Pau que dá em Chico dá também em Francisco. Engaveta lá, engaveta aqui". Admirável critério para legislar em benefício do bem comum! Esse é o PMDB.

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