domingo, 5 de abril de 2015

De fiador do Planalto a aliado imprevisível

• Homem de confiança no 1º mandato agora é uma das principais fontes de preocupação do governo

Isadora Peron - - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Peça fundamental na sustentação do governo no primeiro mandato de Dilma Rousseff, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), é agora um dos principais motivos de preocupação do Palácio do Planalto. Desde que foi reconduzido ao comando do Congresso, em fevereiro, o alagoano não esconde o seu descontentamento com o governo. Tampouco tem se esforçado para manter uma boa relação com a presidente. Para desespero da petista, a nova postura mais beligerante de Renan não prece ser uma fase passageira. Aliados do peemedebista dizem que isso veio para ficar.

Na semana passada, após a elevação do clima de tensão com o governo, Renan resolveu ceder aos apelos do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e adiar a votação de dois projetos que colocavam em risco o ajuste fiscal de Dilma. Mesmo assim, o presidente do Senado hoje pouco lembra a figura de fiador número um das propostas do governo que, no fim de 2014, enfrentou uma oposição fortalecida nas urnas para aprovar a mudança das regras no superávit primário que beneficiaria Dilma.

De lá para cá, uma série de acontecimentos tem implodido as pontes que existiam entre Renan e o Planalto. O desgaste começou com o apoio tímido que o PT deu à sua reeleição à presidência da Casa. Pelas contas de Renan, pelo menos 6 dos 13 senadores da bancada petista não votaram nele.

Foi no mês passado, porém, que a relação com Dilma azedou de vez. Para Renan, o governo quis transferir para o PMDB a culpa pelas irregularidades na Petrobrás e usou a chamada “lista do Janot" para tirar o Palácio do Planalto do centro do escândalo revelado pela Lava Jato. Além de Renan, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), passou a ser formalmente investigado após citações dos delatores da operação, segundo as quais os dois peemedebistas foram beneficiários de desvios do esquema.

Desde então, Renan tem patrocinado uma série de derrotas políticas a Dilma e levado ao plenário uma extensa pauta de votações antigoverno. Em um gesto pouco comum na relação entre os Poderes, ele chegou a devolver à Presidência uma medida provisória que revia as desonerações da folha de pagamento de vários setores da economia.

Sem conversa. Renan também já recusou ao menos dois convites para conversar com Dilma. Mas seus recados continuam chegando ao gabinete presidencial. O senador alagoano não aceita que o seu afilhado político, Vinícius Lage, seja substituído no Ministério do Turismo pelo ex-deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). A nomeação já deveria ter ocorrido. A escolha do novo ministro do STF também não avançou porque Renan trabalha para emplacar um nome de sua confiança e já avisou ao Planalto que nenhum indicado com digital petista passaria pela sabatina do Senado.

Na avaliação de aliados do peemedebista, sua nova postura não é impulsionada apenas pela mágoa. Faz parte de uma estratégia de sobrevivência política. Não há como defender, dizem, um governo desaprovado por 64% da população. Também foi preciso mudar o tom para que Cunha, que sempre foi apontado como desafeto de Dilma, não colhesse sozinho os frutos de adotar um discurso mais agressivo contra o Executivo.

Há também quem diga que a eleição do filho dele para o governo de Alagoas no ano passado teria reduzido sua dependência política da máquina federal. Com isso, ele teria o suporte do aparato estadual. Por outro lado, há também insatisfação com o governo porque, com os cofres públicos vazios, dificilmente haverá recursos federais em abundância para alavancar a gestão de Renan Filho no Estado.

O presidente do Senado, no entanto, nega estar em pé de guerra com o governo. Quando questionado sobre o assunto, diz que o Congresso precisa ser cada vez mais independente. Afirma também que, em tempos de crise econômica, a população espera que o Legislativo dê respostas. Ele já sugeriu, por exemplo, que o governo reduza o número de ministérios. Também voltou a levantar a bandeira da independência do Banco Central. Nenhuma das propostas conta com a simpatia de Dilma.

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