quarta-feira, 22 de abril de 2015

Com atraso no balanço, Petrobras perde US$ 27 bi

Tombo no vazio do balanço

• Petrobras tem maior queda na Bolsa entre as 15 maiores petrolíferas globais: us$ 27 bi

Rennan Setti – O Globo

Escândalos em série

RIO E SÃO PAULO - O desgaste com o atraso na divulgação do balanço auditado da Petrobras fica claro quando se compara os papéis da petrolífera com os de seus pares. Empresas de todo o mundo sofreram nesse período com a queda de um terço no preço do barril do tipo Brent, mas a estatal brasileira sofreu muito mais. Desde que a auditoria da PricewaterhouseCoopers (PwC) se recusou a assinar o balanço, no fim de outubro, a Petrobras registrou, com muita folga, a maior queda entre as 15 maiores companhias do setor no mundo.

As ações da Petrobras, em dólar, caíram 36,3% entre 31 de outubro e o dia 13 deste mês - quando os papéis começaram a subir forte após o anúncio de que a companhia divulgaria o balanço. No mesmo período, os American Depositary Receipts (ADRs, recibos de ação negociados em Wall Street) recuaram 31,62%. Ao todo, evaporaram da estatal US$ 27,1 bilhões em capitalização de mercado, mais do que um Banco do Brasil.

O tombo da Petrobras superou, em muito, qualquer uma das outras 14 gigantes de óleo e gás com ações negociadas em Bolsa. O GLOBO levantou as variações dos papéis dessas companhias em dólar para que elas pudessem ser comparadas entre si. A valorização do dólar no período explica parte da queda da Petrobras, mas o declínio das ações continua sendo o maior quando analisado em real: recuo de 19,70% nos papéis preferenciais (PN, sem direito a voto).

Depois da Petrobras, o segundo pior resultado nesse grupo de 15 empresas é o da gigante russa Gazprom, que registrou recuo de 13,70% na cotação dos seus papéis no mesmo período. Além da queda nos preços do petróleo, a russa amargou a desvalorização do rublo em meio às sanções impostas ao país. Em terceira e quarta posições estão Exxon e Chevron, com perda de 11,76% e 11,21%, respectivamente.

Estrangeiros venderam Petrobras em peso
O "balanço fantasma" também provocou estragos nos preços dos títulos da petrolífera brasileira negociados no exterior, um importante termômetro da confiança dos investidores em uma empresa. Os títulos com vencimento em 2024 da Petrobras caíram 7,94% no período, para US$ 98,50; os com prazo terminando em 2019 recuaram 6,47%, para US$ 91,84. Enquanto isso, os da Chevron com vencimento em 2023 subiram 2,13%, e os da Exxon vencendo em 2019 tiveram alta de 0,61%.

Embora os problemas tenham começado com o escândalo de corrupção, o atraso na divulgação do balanço prejudicou muito o mercado para os papéis, explica Marcelo Lima, gerente de renda fixa da consultoria INTL FC Stone baseado em Miami.

- A incerteza sobre qual seria o tamanho do rombo preocupou muito os investidores externos, desencadeando a venda das ações e, em consequência, dos Bonds (títulos) - diz. - Também aceleraram a venda o fato de os grandes fundos não poderem investir em papéis que não tenham grau de investimento e a iminência de as agências de Rating rebaixarem a Petrobras.

Para Lima, o anúncio de divulgação do balanço já melhorou a expectativa dos investidores porque, independentemente do resultado, ele dará "uma ideia do tamanho do prejuízo e de qual é a necessidade real de recuperação, se ela precisará de ajuda do governo ou se conseguiria acessar as linhas de crédito recém-adquiridas com bancos e com a China". Mas o mercado de dívida, meio tradicional de captação pelas empresas, permanece fechado para a empresa, diz:

- Hoje seria inviável para a Petrobras acessar o mercado de Bonds . Primeiro porque ela teria de pagar um prêmio bem maior, segundo, porque não há apetite para isso no momento.

O desgaste que teve origem no uso político da estatal pôs em questão sua credibilidade e, por isso, o custo de capital aumentou para a Petrobras, afirma Daniela da Costa-Bulthuis, gestora na Robeco, sediada em Roterdã, Holanda, e porta-voz de um grupo de 14 fundos internacionais com participação na petrolífera. Ela considera a divulgação do balanço apenas um passo e diz que a empresa precisa mudar urgentemente sua gestão.

- A Petrobras é uma empresa de capital misto e tem que ser gerenciada por um Management independente. A constante interferência do governo na gestão da empresa foi o que criou essa crise. É preciso que se aprenda com esse momento difícil. A empresa precisa de mecanismos de blindagem contra usos políticos futuros - observa Daniela.

Moody"s pode até elevar nota de estatal
Para Álvaro Bandeira, da distribuidora de fundos Órama, o balanço da Petrobras será mais importante pelas notas de rodapé do que pelos números em si:

- O que será divulgado vai ser meio imponderável. Mais do que os números em si, os investidores vão querer saber mesmo se terá ressalvas ou não da auditoria, como serão calculada as perdas etc. Será um balanço para ler nas entrelinhas.

Segundo Bandeira, o volume de baixas contábeis que o mercado financeiro espera para o balanço, entre R$ 6 bilhões e R$ 8 bilhões, será pequeno frente às notícias já divulgadas pela imprensa e pode frustrar investidores.

- Além daquela conta citada na delação premiada que considera o percentual superfaturado nos contratos, temos notícias de uma série de irregularidades, no Comperj, em Abreu e Lima etc. Há muitas coisas a serem acertadas. Ficará pouco crível se o número for mesmo aquele. Vai parecer que nem todos os esqueletos foram tirados do armário.

O mercado também espera recuperação do valor das ações após a publicação do balanço. Afinal, desde que a Petrobras anunciou uma data para a divulgação de seus resultados, os papéis acumulam valorização de 10,74% (PN) e 11,91% (ordinários, com voto), segundo dados da CMA.

A Moody"s, que rebaixou a nota da Petrobras em janeiro, afirmou em relatório que a publicação do balanço será positiva para a companhia e para o Brasil. Assim, a agência diz que "pode elevar seu Rating do atual Ba2, embora provavelmente não para o grau de investimento, já que esperamos que a companhia continue enfrentando estresses com as investigações sobre corrupção". Hoje, a estatal está dois níveis abaixo do grau de investimento.

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