sexta-feira, 13 de março de 2015

Merval Pereira - Congresso contra Executivo

- O Globo

As ameaças que os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros, estão fazendo ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, são repetições da estratégia que já foi adotada pelo senador Fernando Collor, que também está na lista de investigados, contra o antecessor de Janot, Roberto Gurgel.

Desqualificar o procurador é uma defesa barata, e ameaçar boicotar sua eventual candidatura à recondução ao cargo e até mesmo usar os poderes do Senado para destituí-lo são um abuso de poder em causa própria que não pode ter o apoio da sociedade. A defesa da corporação sempre foi o que de melhor o Eduardo Cunha soube fazer desde antes de sua campanha para a presidência da Câmara. Ele é visto como o protetor dos parlamentares, aquele que vai dar autonomia à Câmara. Dizer que a culpa é do Executivo e que o Palácio do Planalto quer jogar a crise no colo do Congresso fazem parte de posição de defesa, assim como desqualificar o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. O grande problema para a aliança governista é que, nessa linha, o Congresso continua contra o Palácio do Planalto. O fato de Eduardo Cunha ontem na CPI ter dito que Janot fez política não tem a menor importância, porque quem vai decidir isso é o Supremo Tribunal Federal, e as investigações mostrarão quem tem culpa no cartório.

Mas enquanto ele tiver que atacar o Executivo para se defender, o Palácio do Planalto está com um problema. A briga entre o PMDB e o governo permanecerá, a crise vai se estender enquanto as investigações prosseguirem, e vão demorar bastante, numa visão otimista até o fim deste ano no mínimo. O PT, que fez elogios a Cunha através de seu líder Sibá Machado, vai ficar entre a cruz e a caldeirinha. O elogio ontem foi até certo ponto , pois teve que discordar de Cunha quanto à responsabilidade ser "do outro lado da rua" , isto é, do Palácio do Planalto . Fiel defensor do PT, mas um político nada brilhante, Sibá Machado ter á dificuldades de se equilibrar nessa linha tênue que separa sua fidelidade ao partido da solidariedade com os aliados acusados na Operação Lava-Jato. Já Eduardo Cunha trafega com tranquilidade por essas águas turvas, pois já percebeu que para se defender tem que defender sua corporação e atacar o Executivo.

Está longe a fórmula que pacifique o PMDB e o Palácio do Planalto. O próprio presidente do Congresso, Renan Calheiros, segue a mesma linha. Fez o acordo para a aprovação da nova ta bela do Imposto de Renda diretamente com o ministro da Fazenda Joaquim Levy e logo em seguida criticou o governo, dizendo que ele "envelheceu" e que o acordo foi feito graças ao Congresso. A aliança partidária está sob crítica permanente do PMDB, que quer mais espaço nas decisões e não sossegará enquanto não obtiver. Mas se se convencer de que o governo realmente envelheceu com menos de três meses, o PMDB se afastará cada vez mais. Tanto Renan Calheiros quanto Eduardo Cunha precisam fechar acordos dentro do Congresso, e não com o governo. Porque se não tiverem o apoio da corporação, acabarão sendo pressionados para renunciar às presidências que exercem.

Na verdade, essa deveria ser a atitude correta dos investigados, e alguns deputados já deixaram as comissões em que atuavam justamente por não encontrar em ambiente para continuar atuando enquanto estão sob o crivo da Justiça. A linha de defesa que escolheram, afirmando que a lista do procurador Janot tem conotações políticas, faz com que se protejam com o apoio do Congresso, e o PT é que vai ficar com dificuldades para tratar do assunto. O senador Renan Calheiros deu uma demonstração de força ao conseguir que o veto da presidente Dilma ao aumento de 6,5% da tabela do Imposto de Renda não fosse derrubado. A oposição, mais os dissidentes da base aliada, tiveram mais votos no plenário do que os governistas, mas não o suficiente para derrubar o veto. Isso significa que o governo continua em minoria no Congresso, e dependendo cada vez mais da boa vontade de Calheiros e Cunha, o que é uma situação no mínimo desconfortável para o Palácio do Planalto

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