quinta-feira, 5 de março de 2015

Derrota tira poder de Dilma para indicações no STF

Governo perde mais uma

• Câmara aprova PEC da Bengala, que tira de Dilma direito de indicar 5 novos ministros para o STF

Simone Iglesias, Cristiane Jungblut e Catarina Alencastro – O Globo

Crise com o congresso

BRASÍLIA - A lista de políticos envolvidos no escândalo de corrupção na Petrobras ampliou o descompasso entre o governo e o Congresso. O dia de ontem foi marcado por reuniões no Palácio do Planalto, no Senado e na Câmara, com troca velada de acusações entre os dois poderes. Nenhum esforço do governo foi suficiente para evitar mais uma derrota: a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) da Bengala, que amplia a idade máxima para a aposentadoria dos ministros de tribunais superiores de 70 para 75 anos, foi aprovada em primeiro turno por 318 votos a favor, 131 contra e 10 abstenções. Pela regra atual, a presidente Dilma Rousseff teria direito de indicar cinco ministros para o Supremo Tribunal Federal até o fim de seu mandato. Caso a medida seja aprovada em dois turnos, a presidente só fará novas indicações - além do substituto de Joaquim Barbosa - caso ministros se aposentem voluntariamente.

O governo vinha se mobilizando desde a legislatura passada para evitar a votação, mas desde que assumiu a presidência da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) anunciou que votaria a emenda. Deputados do PT encaminharam contra a aprovação da emenda, acusando-a de casuística.

A votação da PEC da Bengala levou inclusive ao cancelamento da reunião que a bancada de deputados do PT teria com os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Joaquim Levy (Fazenda), Nelson Barbosa (Planejamento) e Pepe Vargas (Relações Institucionais). O encontro tinha o objetivo de debelar a rejeição dos petistas às medidas provisórias do ajuste fiscal.

As tentativas de melhorar a relação com o Congresso foram ainda dificultadas por declaração do ministro da Educação, Cid Gomes, de que há "uns 400 deputados que quanto pior melhor para eles", que querem o governo fragilizado para "achacarem mais". Pronunciada em Belém, na semana passada, a frase veio à tona ontem e levou a Câmara a decidir convocar o ministro para prestar esclarecimentos. Irritado com o que Cid disse, Eduardo Cunha anunciou que não votaria projetos da área do ministro até que ele explicasse suas declarações.

- Essa casa não é um prostíbulo que esse ministro acha que é - protestou o deputado Pauderney Avelino (DEM-AM), líder da minoria.

A nova retaliação do Congresso ao governo ocorreu em meio ao recrudescimento da insatisfação dos presidentes da Câmara e do Senado, com o Planalto. Cunha e Renan Calheiros (PMDB-AL) culpam o governo, mais especificamente o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, por serem alvo de abertura de inquérito pelo STF e pela tentativa de desidratação do PMDB. Renan disse ontem que não tem envolvimento com a Lava-Jato e que, se foi citado, foi de forma indireta e por "terceiros". A aliados, lembrou que já enfrentou processo de cassação e "coisas muito piores".

O governo nega qualquer gestão para incluir ou retirar citados na lista de investigados da Lava-Jato. Segundo um ministro do núcleo político, o governo não tem poder para influenciar a Procuradoria Geral da República:

Numa demonstração do clima tenso, Renan deixou o ministro de Relações Institucionais, Pepe Vargas, esperando por mais de meia hora em seu gabinete na presidência do Senado. Na conversa com Vargas, Renan avisou que a próxima bomba para o governo no Congresso será o veto da presidente Dilma Rousseff à correção de 6,5% da tabela do Imposto de Renda. Renan avisou que é preciso uma solução negociada, ou a derrota é certa. Na saída do encontro, Vargas disse que "distensionou" o ambiente entre Renan e o Planalto.

- O presidente nos colocou a sua visão de que seria importante o governo encontrar uma saída negociada em torno do veto do Imposto de Renda, negociada com as duas Casas. Vamos trabalhar nos próximos dias para ver o que é possível.

Sobre a devolução da medida provisória que anulava os efeitos da desoneração sobre a folha das empresas, ocorrida na véspera, Vargas disse que Renan quis deixar claro que o governo precisa conversar mais. A presidente Dilma tentou evitar a devolução da MP na tarde de terça-feira, mas não conseguiu conversar com Renan a tempo. Ela telefonou para o presidente do Senado, mas ele já estava anunciando sua posição no plenário do Senado e sendo cumprimentado pela oposição. Desde então, Dilma e Renan não se falaram.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, conversou com Renan por telefone, mas também não teve sucesso. Senadores disseram ao GLOBO que Levy lembrou a Renan que ele é pai de um governador, Renan Filho, de Alagoas.

- Sou presidente do Congresso e não do governador - respondeu Renan, segundo senadores.

A decisão de Renan de devolver a MP da desoneração foi vista no Planalto como uma "jogada de marketing" para dividir as manchetes com a citação de seu nome pela PGR. Apesar da troca de farpas, o fontes do governo acreditam numa "reconstrução" de ponte com o presidente do Senado.

Pela manhã, Dilma fez reuniões para tratar das medidas de ajuste fiscal com líderes dos partidos aliados no Congresso. Não convidou para as conversas o vice-presidente Michel Temer, com quem tinha se comprometido a chamar para as discussões políticas com a base. Diante do incômodo causado, no fim da tarde Dilma chamou o vice ao seu gabinete para conversar. (Colaboraram Júnia Gama e Fernanda Krakovics)

As derrotas de Dilma
Orçamento impositivo.
A Câmara aprovou a PEC que obriga a execução das emendas parlamentares

Reforma Política.
O PT foi excluído do comando da comissão, que ficará nas mãos da oposição

Líder do PMDB na Câmara
O deputado Leonardo Picciani (RJ) se tornou o líder. Nas eleições de 2014, ele defendeu o voto em Aécio Neves (PSDB)

Partidos.
A Câmara aprovou projeto que altera a criação de partidos. Se for aprovado no Senado, o ministro Gilberto Kassab (Cidades) não poderá criar uma nova sigla para que o Planalto tenha uma alternativa ao PMDB

MP da desoneração.
O presidente do Senado, Renan Calheiros, devolveu ao governo a MP 669, que anula o programa de desoneração da folha de pagamento das empresas

CPI da Petrobras.
Presidente da Câmara, Eduardo Cunha defendeu que a investigação seja a partir de 2005, quando Lula já era presidente, e não desde o governo FH, como desejava o PT

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