domingo, 1 de fevereiro de 2015

Miriam Leitão - Mês quente

- O Globo

Um mês para ser esquecido, este janeiro. Um calor do Sahel esquentou nossas cabeças. Chegaram muitas contas de erros e omissões dos governantes. A água está acabando e faltou luz. A chuva não veio reduzir as aflições. A Petrobras afunda de forma dolorosa num mar de sal, e o Governo Federal anunciou déficits sequenciais. Foi uma avalanche de más notícias. Bem vindo fevereiro.

Uma das notícias que agitou a última semana de janeiro foi a do balanço da Petrobras, que nos informou que 31 ativos da empresa estão com um valor R$ 88,6 bilhões acima do preço justo. E isso é apenas uma parte da verdade que ainda está sendo prospectada na empresa, principalmente nas decisões da diretoria de Abastecimento. Ela abastecia mais do que os nossos tanques, como se sabe hoje.

Esse demonstrativo derrubou as ações e deixou tanto o governo quanto o mercado mal humorados. O governo porque não queria que aparecesse o número que foi divulgado, apesar da sua notória relevância. O mercado porque quer saber exatamente quanto será abatido do valor dos ativos.

Mas, olhando bem, o balanço trouxe boas notícias: várias maluquices serão encerradas. O Brasil vai parar de perder com obras que não faziam sentido e que foram decididas por razões políticas e não econômicas:

— As refinarias de Premium I e Premium II seriam duas potenciais Abreu e Lima — disse-me uma pessoa que participou da decisão de que as obras no Maranhão e no Ceará fossem encerradas, apesar de já se ter gasto nelas R$ 2,7 bilhões.

O que ele quis dizer é que elas poderiam virar fábricas de aditivos e sobrepreços como foi a refinaria de Pernambuco. A imprensa especializada, os analistas de mercado, os especialistas em petróleo cansaram de dizer, durante anos, que os empreendimentos não faziam sentido econômico e que a interferência do Planalto na gestão da empresa era prejudicial. Uma das razões é simples: a atividade de produção de petróleo é mais lucrativa do que a de refino. Basta olhar as margens de lucro de cada etapa produtiva. Portanto, fazer quatro refinarias ao mesmo tempo era uma aventura arriscada. 

Depois, quando começaram os aditivos temeu-se pelo pior. O final da história superou os cenários pessimistas.

A dívida bruta do Tesouro subiu 6,6 pontos do PIB em apenas um ano. Houve déficit primário pela primeira vez em 18 anos. Só esses dois dados divulgados em janeiro confirmam todos os alertas feitos pelos especialistas em contas públicas de que o governo estava gastando além das suas possibilidades, como se não houvesse amanhã.

Foram ofendidos e atacados pelos avatares governamentais todos os que alertaram para a crise de energia. Estamos caminhando para o desconhecido exatamente porque no ano passado deveriam ter sido tomadas medidas de redução de consumo que poupasse água nos reservatórios e reduzisse o passivo que seria transferido para a conta do consumidores.

Neste janeiro da nossa desesperança, os reservatórios das hidrelétricas caíram 2,5 pontos percentuais em apenas 16 dias. Está em 16,82%. O ministro alertou que 10% é o limite tolerável. E janeiro é a temporada em que os reservatórios sobem, porque é o mais molhado dos meses nas regiões Sudeste e Centro-Oeste. A água nas hidrelétricas não se eleva, mas crescem os cálculos sobre a conta de luz em 2015.

O erro não é monopólio de um governo ou de um partido. São Paulo deu uma lição do risco de se ignorar os apelos dos fatos. A maior cidade da América do Sul está diante de um perigo enorme de colapso do abastecimento de água. São Paulo agora é que fala de fazer um plano de contingência. Esse é o tipo de plano que se faz antes da crise, para evitá-la. O Rio vai pelo mesmo caminho. Ele será São Paulo amanhã, mas as autoridades têm a mesma atitude: avisam que, se não chover, tomarão providências.

A eloquência dos números não é suficiente para demover governantes da sua atitude defensiva e discurso publicitário. Para a presidente Dilma, basta transformar seu ministério num pelotão da batalha da comunicação que tudo estará resolvido. Nos estados, os governadores pedem por chuvas ou vão a Brasília. Janeiro foi o mês em que recebemos as contas dos erros passados e os sinais dos riscos do futuro imediato.

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