quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Dilma enfrenta dia de derrotas na Câmara

Base desgovernada

• Congresso aprova orçamento impositivo, e comando da reforma política fica com oposição

Júnia Gama e Isabel Braga – O Globo

BRASÍLIA- Na abertura da segunda semana de trabalhos, o Congresso impôs ontem sucessivas derrotas à presidente Dilma Rousseff. O dia ruim para o Palácio do Planalto terminou ontem à noite com a aprovação, na Câmara dos Deputados, da proposta de emenda constitucional (PEC) do orçamento impositivo, que obriga a execução das emendas parlamentares. Isso reduz o poder de barganha do governo na hora de negociar apoio para aprovação de projetos. Outro revés atingiu diretamente o PT: o partido foi excluído do comando da comissão da reforma política, que ficará nas mãos da oposição. O colegiado será presidido pelo deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) e relatoria ficará com o rebelde PMDB. O governo também terá outra provável fonte de aborrecimentos : a liderança do maior partido aliado na Câmara, o PMDB, caberá a um aliado do senador e presidente do PSDB Aécio Neves (MG).

A disputa pelo posto está polarizada entre Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) e Leonardo Picciani (PMDB-RJ), fortes defensores da candidatura do tucano em seus estados nas eleições presidenciais de 2014. Outras ameaças ainda rondam o Planalto em sua relação com a Câmara, onde a base ainda está ressentida com à interferência do Planalto durante a campanha para a presidência da Casa : a descaracterização das medidas de ajuste fiscal, a CPI da Petrobras, que começará a trabalhar após o carnaval, e a possibilidade de aprovação da chamada PEC da Bengala, que tiraria de Dilma a prerrogativa de escolher cinco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), neste segundo mandato — isso porque a PEC prevê que os servidores públicos poderão trabalhar até os 75 anos, e não até os 70, como hoje.

Cunha critica articulação política
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), insiste em dizer que o principal problema está na articulação política do governo. Cunha acredita que o Congresso percebeu, com sua eleição, que é possível derrotar o governo e fazer prevalecer , cada vez mais, a vontade da maioria dos parlamentares. Além disso, ele avalia que os gestos aos aliados vindos do Palácio do Planalto, depois de sua eleição, não foram suficientes para recuperar a credibilidade do governo junto à Câmara.— Vai ter que arrumar essa articulação política. Fizeram uma opção errada no início da legislatura e agora vão ter que se arrumar. Tem que mudar a forma — afirmou Cunha. O líder da minoria na Câmara, Bruno Araújo (PSDB-PE), frisa que a articulação política do governo não está funcionando. Para o tucano, os movimentos rebeldes na base, que têm custado uma série de derrotas ao Planalto, são fruto das posições antagônicas sobre a forma de lidar com os desafios econômicos e políticos e do pouco diálogo com o Congresso.

— Essa situação é resultado do descrédito do governo com o povo e com os parlamentares, que não acreditam mais no que é dito pelo governo. A articulação do governo é feita olhando apenas para o próprio umbigo. A sociedade enxerga que foi enganada pelo discurso eleitoral de Dilma Rousseff e reage com indignação, que se reflete aqui dentro também. A estabilidade depende mais da conduta de quem governa do que dos governados — disse o tucano. O líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), levou ontem um boneco de Pinóquio à Casa para ilustrar o discurso. Segundo ele, não há imagem melhor que simbolize o governo Dilma, por ter mentido durante a campanha, ao prometer não aumentar tarifas, impostos, nem ferir direitos trabalhistas.

O deputado José Guimarães (PT-CE), líder do governo na Câmara, procurou negar que haja crise. Preferiu tratar a série de problemas que o Planalto está enfrentando no Congresso como questões pontuais: — Não tem crise nenhuma. Na comissão da reforma política, o DEM pegou a presidência, mas o PT ficou com uma vice; sobre as MPs do ajuste fiscal, o governo está disposto a fazer mudanças, desde que seja mantida a espinha dorsal do que foi editado. Orçamento impositivo tem desde o ano passado, só porque agora vai ser definitivo, não muda muita coisa — disse. Com uma dose maior de autocrítica, o líder do PT na Câmara, Sibá Machado (AC), vê a situação com cautela. Ele admitiu serem necessários reparos na relação com os parlamentares para que a base de Dilma se reagrupe e auxilie no enfrentamento da crise econômica e política, inclusive distribuindo cargos no segundo escalão.—Tem que falar a verdade. Não tem deputado que não queira indicar, do ministro ao porteiro. Se ajudou a eleger o governo, vai querer indicar , e isso é natural. E tem que aprovar esse orçamento impositivo e tirar esse jabuti da sala, todo parlamentar quer ter direito a suas emendas — disse Sibá.

Dilma deve se reunir com partidos da base
Além de tentar uma reaproximação com Cunha, Sibá disse ter pedido a ajuda do ex-presidente Lula para melhorar o diálogo com a base. O deputado contou ainda que ele e Guimarães estão tentando viabilizar um encontro de Dilma comas bancadas dos partidos da base. O primeiro partido a ser recebido pela presidente, segundo Sibá, será o PT , logo após o carnaval.Em um gesto de reconhecimento das dificuldades que vem enfrentando , o governo criou ontem uma força-tarefa para negociar a aprovação do pacote anticorrupção que será enviado ao Congresso nos próximos dias. Ontem, o ministro Luís Inácio Adams (AGU) se reuniu com Cunha e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para uma primeira conversa sobre o tema. O Planalto quer desvincular essas medidas da votação da medida provisória que restringe a liberação de benefícios aos trabalhadores.

Além de Adams, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e a assessoria jurídica da presidente estão atuando. A entrada de Adams e Cardozo nas negociações com o Congresso visa a ajudar a articulação política do Planalto, que enfrenta resistência entre parlamentares. Para tentar uma reaproximação com os parlamentares, os ministros Pepe Vargas (R elações Institucionais) e Miguel Rossetto (Secretaria-Geral), além de Nelson Barbosa (Planejamento), Manoel Dias (Trabalho) e Carlos Gabas (Previdência) marcaram uma reunião com os líderes da base aliada dia 24. Quer em negociar a MP de ajuste fiscal e garantir que nenhuma medida provisória ser á enviada ao Congresso sem discussão prévia. (Simone Iglesias e Chico de Gois).

Dor de cabeça para Dilma
Reforma política.
A comissão que apreciará a PEC da reforma política será presidida por um deputado da oposição: Rodrigo Maia (DEM-RJ). Propostas defendidas pelo PT, com o fim do financiamento privado nas campanhas, deverão serão derrotadas.

Líder do PMDB.
A disputa pela liderança do PMDB na Câmara está entre os deputados Leonardo Picciani (RJ) e Lúcio Vieira Lima (PMDB). Os dois defenderam abertamente o voto no tucano Aécio Neves nas eleições presidenciais de 2014.

Ministros no Congresso.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), quer, a partir de março, convidar um ministro por semana para dar explicações sobre sua pasta na Casa. Se algum recusar, poderá haver convocação.

CPI da Petrobras.
A Câmara aguarda a instalação de nova CPI da Petrobras, cujo pedido já foi aprovado.

PEC da bengala.
A base do governo decidiu pelo adiamento, por 30 dias, da chamada PEC da Bengala, que amplia de 70 para 75 anos a idade máxima de permanência no serviço público. Se aprovada, a presidente Dilma perderá o direito de indicar cinco ministros do STF em seu segundo mandato.

MPs de ajuste fiscal.
O governo terá dificuldades para aprovar as medidas provisórias que endurecem o acesso a seguro-desemprego, pensões por morte e abono salarial. Há mais de 600 emendas.

Orçamento impositivo.
A Câmara aprovou ontem a PEC do Orçamento Impositivo, que obriga o governo a executar as emendas individuais dos parlamentares. Ela vai a promulgação.

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