quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Opinião do dia – Pedro Simon


Bem-aventurado Joaquim Barbosa! Bem-aventurado Sérgio Moro! Bem-aventurados todos aqueles que, abnegados, gritam e lutam contra a corrupção e contra a impunidade! Bem-aventurados os que, apostolados, empunham a bandeira da ética na política. Bem-aventurados sejam todos os que, por meio de assinaturas e da pressão sobre o Congresso Nacional, alcançaram êxito na aprovação da Lei da Ficha Limpa.”



Pedro Simon, senador (PMDB-RS), discurso de despedida do Senado, em 10 de dezembro de 2014.

CPI aquece o forno

• Relatório de comissão mista da Petrobras poupa políticos acusados de corrupção na estatal

Eduardo Bresciani – O Globo

BRASÍLIA - O deputado Marco Maia (PT-RS) apresentou seu relatório na CPI mista da Petrobras sem pedir indiciamentos nem apontar o envolvimento de políticos com o esquema de corrupção na estatal. O petista fez ainda uma defesa da tese de que a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, teria sido um bom negócio, apesar do prejuízo sofrido pela Petrobras. A votação do texto final da comissão acontecerá na próxima semana, e a oposição já prepara um relatório paralelo.

O texto apresentado ontem recomenda ao Ministério Público Federal o aprofundamento das investigações e traz uma lista de nomes sobre os quais se deve "apurar a efetiva responsabilização". A lista é majoritariamente formada por pessoas que já foram presas na Operação Lava-Jato, como executivos de empreiteiras e os ex-diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa e Renato Duque.

Marco Maia diz que "corrobora e ratifica os procedimentos de indiciamentos e as denúncias adotadas na esfera judicial". Entre os principais personagens citados no relatório, o único que ainda não é alvo de inquérito é o ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró.

Crimes listados de forma genérica
Maia diz que, na sua visão, o pedido de apuração tem o mesmo peso de um indiciamento. Afirmou que seria "ridículo" repetir a lista de crimes já relacionados aos principais operadores do esquema, como o doleiro Alberto Youssef. Afirmou que não fez uma individualização dos crimes por não ter conseguido tipificá-los em relação a alguns dos citados, como Cerveró. Somente em relação à Operação Lava-Jato, foram apontados 52 nomes e uma lista de 20 empreiteiras. Os crimes são listados de forma genérica.

"Podem os agentes ser condenados por diversos crimes como corrupção ativa, corrupção passiva, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, fraude à licitação, formação de cartel, associação criminosa, além de outros que porventura surjam no fluxo das investigações e atos de improbidade administrativa", registra Maia, em trecho do relatório.

A polêmica compra da refinaria de Pasadena é defendida. Para Marco Maia, nem a admissão de Paulo Roberto Costa de que teria recebido propina pode macular a lisura do negócio. Maia usou, para sustentar seu posicionamento, argumentos similares aos apresentados pelo ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli, um dos poupados no relatório. Maia afirma que a compra foi feita na expectativa de uma modernização que não foi realizada. Diz ainda que o preço pago foi compatível, mesmo reconhecendo em seu texto que a Petrobras acabou pagando US$ 1,25 bilhão à Astra pela refinaria. Um ano antes de iniciar o negócio, a Astra pagara US$ 42,5 milhões.

"Mesmo que tenha havido pagamento de propina a diretores da Petrobras, conclui-se que a aquisição de Pasadena ocorreu dentro das condições de mercado da época, e que a empresa conta, hoje, com um bom e lucrativo ativo, compatível com o seu custo", afirma Maia.

Irregularidades em Abreu e Lima
O relator reconheceu irregularidades na Refinaria Abreu e Lima, que está no foco das investigações da Operação Lava-Jato. Levando em conta os custos para construção de refinarias no exterior, estimou em US$ 4,2 bilhões o sobrepreço na obra. Abreu e Lima foi projetada com orçamento inicial de US$ 2,3 bilhões, e o custo com sua construção já ultrapassa US$ 20 bilhões.

Maia lista como problemas a utilização excessiva pela Petrobras do decreto que lhe permite flexibilizar concorrências, a permissão para convocar as empresas através de convites independentemente do valor do contrato, a decisão de avocar para a estatal riscos que deveriam ser das construtoras e os aditivos de reajuste e prorrogação de prazos.

A suspeita de pagamento de propina pela SBM Offshore a funcionários da Petrobras também está no relatório. Maia diz haver "fortes indícios" da veracidade da denúncia. Maia propõe em relação à Abreu e Lima e à SBM a abertura de investigações em diversos órgãos de controle, como a instauração de processos disciplinares pela Controladoria Geral da União (CGU) contra gerentes e os ex-diretores Costa e Duque.

Em todo o parecer, Maia fez 13 menções à presidente Dilma. Em nenhuma delas há qualquer acusação contra ela. A maior parte das citações está na transcrição de trecho do depoimento de Costa à comissão. No caso do ex-presidente Lula, são oito citações, todas também relativas ao depoimento. Em relação ao ex-presidente Fernando Henrique, a única menção é em uma frase de Costa de que as nomeações políticas na Petrobras acontecem desde o governo José Sarney.

Como saída para evitar novos escândalos na companhia, Maia propõe uma nova legislação para as contratações feitas pelas empresas estatais. Atualmente a Petrobras usa um decreto que permite a ela adotar procedimentos mais simplificados, sem ter de aplicar a Lei de Licitações. A alternativa proposta é a criação de um novo sistema que teria como base o Regime Diferenciado de Contratações (RDC), desenvolvido para as obras da Copa do Mundo e ampliado posteriormente para a maioria dos investimentos do governo federal.

Oposição critica relatório
A oposição não ficou satisfeita com o texto. Além de não haver novos indiciamentos, a oposição questiona o fato de integrantes da atual diretoria da Petrobras não terem sido nem sequer mencionados como responsáveis pelas irregularidades. Será alvo de debate também a conclusão de Maia de que Pasadena foi bom negócio. Para a oposição, a compra da refinaria provocou prejuízos, e a responsabilização poderia recair até sobre Dilma, que estava à frente do Conselho de Administração da estatal na época.

- É um relatório chapa-branca, produzido pela Petrobras e pelo governo. Vamos fazer relatório paralelo e não vai ter só indiciamento de bagrinhos - disse o líder do PPS, Rubens Bueno (PR).

Pizza com macarrão

Enquanto isso...

• Às vésperas da entrega do relatório da CPI da Petrobras, Dilma sanciona lei que cria dia especial para massa

Washington Luiz – O Globo

BRASÍLIA - Conhecido como o lugar onde muita coisa acaba em pizza, o Congresso agora aprovou uma lei que institui o dia de outra massa: o macarrão. Sancionada pela presidente Dilma Rousseff, a Lei 13.050/2014 determina o dia 25 de outubro como o Dia do Macarrão. A nova lei foi publicada anteontem no Diário Oficial da União, apenas um dia antes de o relator da Comissão Parlamentar de Inquérito da Petrobras, deputado Marco Maia (PT-RS), apresentar o relatório final sem apontar políticos envolvidos no caso de corrupção. Para a oposição, mais uma "pizza" apresentada no Legislativo.

O projeto instituindo o Dia do Macarrão, criado pelo deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), levou dez anos para ser transformado em lei. A proposta foi apresentada em 2004. Somente em 2009, ela foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara e encaminhada para o Senado.

Na justificativa para apresentar o texto, Hauly afirmou que a intenção é "transformar essa data num verdadeiro compromisso de responsabilidade das empresas do setor para divulgar amplamente a importância do macarrão na cadeia alimentar". O deputado também lembrou que a data já é comemorada em outras partes do mundo, como Itália e Estados Unidos, e que no Brasil ela já era comemorada desde 1998, com o evento Macarrão Gourmet Fashion.

A aprovação de projetos que instituem datas comemorativas não precisa passar pelos plenários do Congresso, e são tradicionalmente sancionados pela presidente da República. Além do Dia do Macarrão, outras datas comemorativas inusitadas já foram aprovadas pelo Congresso. Entre elas, estão o Dia do Milho, a Semana do Feijão e Arroz e o Dia do Quilo, que foi sancionado em 2012 pela presidente. Só em 2009 foram aprovados na Câmara 60 projetos de lei instituindo datas comemorativas como o Dia do Tambor de Crioula, o Dia do Paisagista e o Dia do Frevo.

Na Câmara, a criação do Dia do Macarrão não passou despercebida.

- A presidenta Dilma sancionou uma lei, emanada desta Casa, que instituiu o Dia do Macarrão. É uma data em função de uma série de benevolências que produtores fazem em todo dia 25 de outubro. Bom, macarrão, em geral, costuma ser enrolado. Espero que a gente não tenha esse tipo de inspiração e, muito menos, que transitemos do macarrão para pizza. É o alerta - brincou o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), durante discurso no plenário da Casa.

Governo quer que Petrobrás pague dívidas trabalhistas de fornecedores

• Prestadores de serviços à estatal, que têm problemas de caixa ou estão enroladas na operação Lava Jato, demitiram milhares de trabalhadores e não pagaram benefícios legais; plano prevê que a Petrobrás assuma a conta e desconte pagamento dos fornecedores

João Villaverde, Lu Aiko Otta - O Estado de S. Paulo

O governo Dilma Rousseff costura um acordo com a Petrobrás e o Ministério Público Federal para fazer a estatal arcar com o dinheiro devido por fornecedoras da companhia que fizeram demissões recentes por causa das dificuldades de caixa e a insegurança jurídica após a operação Lava Jato.

A proposta em estudo é que a Petrobrás pague os direitos devidos pelas empresas fornecedoras aos trabalhadores como uma espécie de adiantamento e depois desconte esse montante dos valores que tenha de pagar às empresas. O universo de terceirizados da Petrobrás é de cerca de 300 mil trabalhadores, segundo os sindicatos.

O ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, convocou uma reunião para segunda-feira à tarde no Palácio do Planalto com a participação do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, e os representantes das seis maiores centrais sindicais do País. O convite foi enviado ontem.

Segundo apurou o Estado, a presidente Dilma Rousseff deu sinal verde para a discussão sobre um acordo na segunda-feira, após encontro no Planalto com os sindicalistas.

Dilma e Mercadante foram cobrados pelo presidente da Força Sindical, Miguel Torres, sobre o caso dos mais de 10 mil demitidos em Pernambuco por empresas fornecedoras da Petrobrás e que estão sem receber as verbas previstas na legislação trabalhista. As empresas alegam que a estatal, que sofre dificuldades de caixa, atrasou pagamentos e, por isso, é a responsável.

Quando os demais líderes sindicais reforçaram o coro, citando casos semelhantes em outros Estados, como Rio Grande do Sul, Bahia e Rio de Janeiro, Mercadante afirmou que não cabia ao governo e à Petrobrás simplesmente decidir pagar - era preciso costurar um acordo envolvendo o Ministério Público Federal. Após o encontro, Dilma liberou a formulação de uma saída pelo governo.

Fogo cruzado. “A sugestão é que a Petrobrás pague, mas se ela fizer isso sem um acordo, estando sob fogo cruzado, pode caracterizar má gestão, pois ela estaria assumindo um risco que não é dela”, disse o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, também presente na reunião. “Então, é preciso buscar um acordo para o trabalhador não sair prejudicado.”
Hoje, em Salvador (BA), o sindicato que representa os 5,5 mil trabalhadores que constroem o estaleiro em Maragogipe, que servirá para formar navios-sonda para a Petrobrás, vai promover uma grande manifestação.

A empresa Enseada Indústria Naval, responsável pelo empreendimento, demitiu 600 funcionários. Outros 1,1 mil trabalhadores seriam desligados ontem. A empresa não tem quitado os direitos trabalhistas, segundo o sindicato, colocando a culpa na Petrobrás, que tem atrasado pagamentos.

Caso um acordo seja fechado pelo governo, operários de diversas obras serão beneficiados. Entre elas, a Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, tocada por um conjunto de construtoras chamado de “clube VIP” por um dos delatores em depoimento à Justiça, em regime de delação premiada na operação Lava Jato. Manifestações sindicais têm sido realizadas em Pernambuco por causa da falta de pagamento.

Segundo o depoimento do executivo Augusto Mendonça, da empreiteira Toyo Setal, um grupo de 16 companhias formava um clube que fraudava as licitações para obter os contratos de obras da Petrobrás. Dentro deste clube havia um grupo ainda mais seleto - o tal “clube VIP” -, que detinha maior “poder de persuasão”.

Esse clube, que segundo Mendonça era formado por Odebrecht, Camargo Correa, UTC, Andrade Gutierrez e OAS, conseguiu os contratos da Abreu e Lima. Parte das demissões na refinaria referem-se ao andamento da obra, que está próxima de ser concluída. O problema, segundo os sindicatos, é que as empresas não pagaram a rescisão contratual e outros custos trabalhistas.

Na mira dos trabalhadores

• Força Sindical entrará na Justiça por perdas no FGTS-Petrobras. Nos EUA, já são 6 escritórios

Lino Rodrigues, Ronaldo D"Ercole e Rennan Setti – O Globo

SÃO PAULO e RIO - A Força Sindical anunciou ontem que ingressará na Justiça com uma ação coletiva contra a Petrobras, cobrando o ressarcimento de possíveis perdas causadas a pelo menos 300 mil trabalhadores que usaram recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para adquirir papéis da estatal. Para isso, a central sindical está criando um grupo técnico para levantar os prejuízos dos acionistas decorrentes do esquema bilionário de desvio de recursos dentro da Petrobras. A ideia é dar entrada com a ação até meados da próxima semana.

Embora analistas recomendem que este não é o momento certo para se desfazer da aplicação, já que os papéis da empresa estão sendo negociados no menor patamar desde 2005, o investidor pode retirar o dinheiro e voltar para a conta do fundo. Só poderá sacar os recursos, porém, nos casos previstos em lei, como demissão sem justa causa, compra da casa própria, aposentadoria ou doença grave. Procurada, a Petrobras não comentou a iniciativa da Força Sindical.

Para o presidente da Força, Miguel Torres, o que aconteceu na Petrobras supera os riscos que qualquer investidor corre no mercado de capitais. Um grupo técnico já trabalha para estimar o quanto os trabalhadores teriam perdido com o esquema de propina montado na estatal.

Encontro com 45 investidores
Segundo Mario Avelino, presidente da ONG Fundo Devido ao Trabalhador, desde agosto de 2000, quando foi realizado o leilão das ações da Petrobras, até ontem os trabalhadores tiveram ganho de 132,2% com os papeis.

- Na verdade, eles deixaram de ganhar porque a Petrobras foi muito mal gerida. A ação é válida no sentido de despertar o trabalhador para a situação da empresa - afirma Avelino.

Em outra frente, em apenas três dias, ao menos seis escritórios de advocacia brigam para liderar a ação coletiva movida contra a Petrobras na Justiça dos Estados Unidos em nome de investidores da companhia. Depois das firmas Wolf Popper e Rosen Law Firm, os escritórios Pomerantz, Kahn Swick & Foti, Brower Piven e Glancy Binkow & Goldberg tentam atrair o maior número de donos de ADRs (recibos de ações) da Petrobras negociados nos EUA.

Segundo Lewis Kahn, sócio da Kahn Swick & Foti e ex-procurador-geral de Louisiana, vários escritórios estão anunciando a potenciais clientes a ação coletiva na tentativa de serem escolhidos para liderar o processo em nome de todas as vítimas.
- Isso porque apenas um escritório será escolhido daqui a dois meses, quando é a data limite para entrar na ação coletiva - afirmou, por telefone, de Los Angeles. - É como se fosse uma competição. Uma vez que um seja escolhido, os outros estão fora.

Segundo Kahn, mesmo que outras ações coletivas sejam abertas contra a Petrobras nos EUA, o caso será reunido em apenas um processo:

- Até agora existe apenas uma ação coletiva, mas é preciso entender que, para a Justiça americana, o número é irrelevante. Mesmo que novos processos surjam, eles serão aglutinados em um só e a decisão valerá para todos.

Segundo Robert S. Willoughby, representante do Pomerantz, tem sido grande a procura de donos de ADRs da Petrobras, por e-mail e telefone, para saber mais detalhes da ação. O escritório está convidando todos os investidores que compraram os papéis da empresa negociados nos EUA entre 20 de maio de 2010 e 21 de novembro deste ano.

Ele avalia que um acordo pode ser alcançado entre um e dois anos, mas não quis estimar o valor das indenizações.

"A Petrobras divulgou comunicados com informações falsas e imprecisas ao deturpar fatos e não ser transparente com relação à cultura de corrupção dentro da companhia que consistiu de uma esquema bilionário de lavagem de dinheiro e de propina atrelado à empresa desde 2006", afirmou o escritório, em comunicado.

No Brasil, o escritório Almeida Advogados, parceiro do Wolf Popper LLP na ação americana contra a estatal brasileira, marcou encontros hoje e amanhã com 45 grandes e pequenos investidores interessados em engrossar o processo aberto no mercado americano.

- A decisão de agrupar os investidores foi tomada para evitar que todos os profissionais do escritório passassem o dia todo só esclarecendo dúvidas de investidores - disse um porta-voz do escritório brasileiro.

O advogado Fernando Zilveti considera as ações procedentes e já são parte de "um efeito dominó".

- Eles (os acionistas) foram enganados, porque o risco de ganhar ou perder existe, mas o de má gestão poderia ser evitado - diz o advogado, lembrando que os precedentes no mercado de capitais são favoráveis aos acionistas.

Pierre Moreau, do escritório Moreau Advogados, alerta que as ações só serão válidas se comprovada a responsabilidade dos gestores da empresa nas fraudes. Nesse caso, eles serão obrigados a ressarcir aos cofres da empresa e aos acionistas todos os prejuízos causados durante o período de desvio dos recursos.

TRF nega habeas corpus a presidente de empreiteira

• Ricardo Pessoa, da UTC, é acusado de ser um dos integrantes do cartel de empreiteiras alvo da Operação Lava Jato, que investiga corrupção e propina na Petrobrás

Julia Affonso, Fausto Macedo e Ricardo Brandt – O Estado de S. Paulo

O Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região negou, nesta quarta-feira, 10, habeas corpus ao presidente da UTC Engenharia,

Ricardo Ribeiro Pessoa, preso, na Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba (PR). O executivo é acusado de ser um dos integrantes do cartel de empreiteiras alvo da Operação Lava Jato, que investiga corrupção e propina na Petrobrás.

O executivo está preso desde o dia 14 de novembro, quando foi deflagrada a sétima fase da operação, batizada de Juízo Final, que teve como alvo o braço empresarial e financeiro do esquema que pagava propina de 1% a 3% nos contratos com a Petrobrás. O esquema seria comandado pelo PT, PMDB e PP e serviu também para abastecer o caixa-2 de PSDB e PSB, segundo apontam os delatores do processo.

Pessoa é acusado de ser um dos “coordenadores” do chamado “clube” - grupo de empreiteiras que atuava em cartel, segundo as investigações, loteando obras públicas, com regras e normas de torneio de equipes. Para ratear entre si as obras da Petrobrás, o suposto cartel elaborou um regulamento semelhante às normas de um “campeonato de futebol”. A revelação foi feita pelo executivo Augusto Ribeiro de Mendonça, em sua delação premiada, e depois confirmado em documentos apreendidos das empresas.

A defesa de pessoa buscou o TRF-4, que em decisão unanime da 8ª Turma, denegou o pedido. O relator do caso foi o desembargador João Pedro Gebran Neto.

Câmara cassa ex-petista ligado a doleiro da Lava-Jato

• Por 359 votos a 1, André Vargas foi punido por relação com um dos pivôs do escândalo na Petrobras

• Ex-deputado deixou a cúpula da Câmara após a Folha revelar que ele fez uma viagem em jato bancado por doleiro

Márcio Falcão, Andréia Sadi - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Acusado de envolvimento com um dos pivôs do escândalo de desvio de dinheiro da Petrobras, André Vargas (ex-PT-PR) teve seu mandato cassado nesta quarta-feira (10) pela Câmara dos Deputados e fica inelegível até 2022.

A perda do mandato foi aprovada, em votação aberta, por 359 votos --eram necessários 257-- contra 1, o do petista José Airton (CE). Seis deputados se abstiveram.

Dos 87 parlamentares da bancada do PT, 53 participaram da votação. O presidente da sigla, Rui Falcão, orientou o voto pela cassação.

Vice-presidente da Câmara na época em que veio à tona seu envolvimento com o doleiro Alberto Youssef, Vargas era um dos principais defensores no Congresso dos petistas presos no mensalão.

Após o resultado da votação, Vargas disse à Folha que "ceifaram um pedaço" de sua vida. Ele afirmou que a sua cassação será "mais um parâmetro para os demais julgamentos que virão com a delação premiada" de Youssef e também do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa.

O ex-petista, que não compareceu à sessão, disse ter sido cassado por causa da "patrulha da mídia" e que recebeu tratamento diferenciado ao de Luiz Argôlo (SD-BA), que trocou mais de mil mensagens de texto com Youssef.

O processo do deputado baiano ainda está na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e corre o risco de não ter desfecho antes do Congresso entrar em recesso.

Vargas deixou a cúpula da Câmara e o PT após a Folha revelar que ele fez uma viagem com a família em um jato bancado por Youssef.

Em agosto, o Conselho de Ética considerou que ele quebrou o decoro parlamentar por esse episódio e por intermediar, no Ministério da Saúde, negócios do doleiro.

A vaga de Vargas será ocupada pelo peemedebista Marcelo Beltrão de Almeida (PR).

Manobra
A votação ocorreu apesar de uma operação deflagrada por Vargas e por colegas do PT para tentar derrubar a sessão. Após destituir seu advogado de defesa, o petista enviou atestado médico ao comando da Câmara alegando que, por um procedimento cirúrgico, não poderia estar presente para se defender, e solicitou que a votação fosse adiada para depois do dia 16.

Aliado de Vargas, o deputado José Mentor (PT-SP) chegou a encerrar a sessão por falta de quorum.

O gesto irritou o relator do processo, Julio Delgado (PSB-MG), o presidente do Conselho de Ética, Ricardo Izar (PSD-SP), e líderes da oposição, que cobraram do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) a reabertura dos trabalhos.

Com a ausência de Vargas, Eurico Júnior (PV-RJ) leu sua defesa em plenário e ponderou os argumentos usados pelo ex-petista de que o conselho cerceou seu direito de defesa e baseou-se em provas ilícitas, entre outros pontos.

Construtora apostava que seria poupada

• Anotações apreendidas na Engevix mostram que construtoras estavam dispostas a pagar r$ 1 bi para escapar de punição

Francisco Leali, Eduardo Bresciani e Vinicius Sassine – O Globo

BRASÍLIA - Oito dias antes da deflagração da sétima fase da Operação Lava-Jato, que levou à prisão executivos das principais empreiteiras do país, os dirigentes das construtoras tentavam articular uma linha de defesa conjunta, mas ainda se achavam imunes a uma ação policial de grandes proporções. Documentos com anotações a lápis apreendidos pela Polícia Federal na sede da construtora Engevix em 14 de novembro mostram que a direção da empresa estava convencida de que nem o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, nem o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), teriam coragem de partir para cima das empreiteiras. "Janot e Teori sabem que não podem tomar a decisão. Pode parar o país", diz a anotação, de 6 de novembro.

A mesma anotação esboça o que as empreiteiras estavam dispostas a entregar: um pagamento de R$ 1 bilhão (de multa) e acordo para reconhecer a prática de cartel. E também o que elas não poderiam fazer. Abaixo da palavra "proibido" está anotado: "Delação, depoimento, mérito". No pé da página está escrito Cade, numa referência ao órgão do governo que apura a prática de cartel. As anotações ainda contém iniciais que podem ser de empreiteiras envolvidas: C (Camargo Corrêa), O (Odebrecht), U (UTC), Q (Queiroz Galvão), O (OAS). Ao lado, há a referência ao R$ 1 bilhão.

Os papéis contém comentários feitos em reuniões numa espécie de ata informal das conversas entre os donos da Engevix. Boa parte dos documentos começa com os nomes de GMA (Gerson de Mello Almada, vice-presidente da Engevix, que permanece preso em Curitiba), JAS (José Antunes Sobrinho) e CK (Cristiano Kok), os donos da Engevix, envolvida no esquema de corrupção em contratos da Petrobras. As reuniões começaram em abril, depois da deflagração da Operação Lava-Jato.

As primeiras anotações são de abril deste ano e ainda mostram um cenário de "certa tranquilidade". "Talvez na Laja-Jato saiamos fora provavelmente, mas teremos um outro inquérito específico. Tomar uma ação pró-atividade, se apresentar ou aguardar a chamada no inquérito", diz o documento. Já há referência ao "risco alto" envolvendo o lobista Fernando Baiano, ligado ao PMDB. No mesmo documento, há registro de que oficialmente a Engevix deveria atestar que os serviços foram prestados, numa referência aos recursos que a empreiteira repassou a empresas de fachada do doleiro Alberto Youssef. Sete dias depois, em 30 de abril, uma anotação sugere que a empresa tinha informação sobre grampos feitos pela PF. O autor da anotação recomenda cuidado. "Escuta telefônica continua, e conversas mínimas".

Engevix fora das "prioridades"
Em outubro, o registro de uma nova reunião indica que advogados da empresa foram a Curitiba e que um dos delegados da PF teria comentado que a Engevix não estava entre as "prioridades" dos investigadores. O documento encerra com a falta de notícias sobre reuniões com Rodrigo Janot: "Nenhuma noticia sobre as conversas com a PGR". Em 22 de outrubro, os manuscritos da Engevix registram que o procurador-geral deveria cuidar dos "grandes" e que o acordo de leniência, na verdade, "não existe". Seria só para fazer "uma confusão". Procurada, a Engevix informou por meio de nota que "prestará os esclarecimentos necessários à Justiça".

As investigações da Lava-Jato reuniram diferentes provas sobre o suposto cartel montado pelas empreiteiras para fatiar contratos da Petrobras. Diante desse cenário, as empresas montaram uma estratégia para tentar escapar dos efeitos dos indiciamentos da PF e das denúncias do Ministério Público Federal, previstas para esta semana. No último sábado, em nota oficial, Janot afirmou que "não permitirá que prosperem tentativas de desacreditar as investigações e os membros desta instituição". Na rede interna dos procuradores da República, no mesmo dia, Janot adotou um tom ainda mais crítico e reativo: "Para profunda tristeza dos brasileiros honestos e cumpridores de seus deveres, o País convulsiona com o maior escândalo de corrupção da nossa história."

Mídia irá julgar investigados na Lava Jato antes do STF, diz Lula

• Segundo ex-presidente, isso já ocorreu no caso do mensalão

Andréia Sadi - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta quarta (10) que os investigados no escândalo da Petrobras serão condenados pela mídia antes mesmo de o STF (Supremo Tribunal Federal) analisar as delações premiadas da Operação Lava Jato.

"Quando esse processo chegar na Suprema Corte, que o ministro Teori [Zavascki] for analisar a delação premiada, criada por nós, a imprensa já condenou os nossos companheiros ou já condenou aqueles que não são companheiros e estão sendo citados", afirmou o ex-presidente.

Segundo ele, todos os vazamentos da operação são contra o PT. "Não importa que não seja verdade. É preciso dizer que é o PT. A ponto de usarem uma mentira descarada como instrumento de propaganda de campanha com a capa daquela revista que não vou dizer o nome por respeito a mim mesmo."

Lula se referiu à capa da revista "Veja" divulgada na véspera do segundo turno. A reportagem dizia que o doleiro Alberto Youssef afirmou, durante depoimento, que Dilma Rousseff e Lula sabiam dos desvios na Petrobras.

O ex-presidente disse que, no mensalão, "os companheiros que foram julgados já estavam condenados".

Lula participou em Brasília da segunda etapa do 5º Congresso Nacional do PT. Ele pediu à militância do partido que saia às ruas e compareça à posse de Dilma, no dia 1º de janeiro.

Lula quer 'dedo na cara' da oposição

• Ex-presidente discutiu reforma ministerial com Dilma Rousseff

Fernanda Krakovics, Simone Iglesias e Maria Lima - Globo

BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva discutiu ontem, em uma série de reuniões com as bancadas do PT no Congresso e com a presidente Dilma Rousseff, a composição ministerial e as estratégias de reação aos ataques da oposição por causa da Operação Lava-jato, da Polícia Federal. Lula cobrou mobilização e reclamou que não está havendo uma defesa à altura.

Em um café da manhã que durou quatro horas com deputados e senadores, a ordem foi endurecer o discurso.

- É para responder tudo e botar o dedo na cara dos tucanos que não apuram nada - contou um dos presentes.

O ex-presidente teve que acalmar parlamentares que reclamaram da falta de diálogo com a presidente Dilma. Os mais exaltados eram o deputado Arlindo Chinaglia (SP), e os senadores Walter Pinheiro (BA) e Jorge Viana (AC).

Reforma ministerial
Sobre a reforma ministerial, houve reclamação especialmente em relação ao papel do ministro chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante. Depois do café com os 15 parlamentares mais próximos, Lula almoçou com Dilma para tratar das trocas na Esplanda. A presidente deverá finalizar as conversas sobre o espaço do PT no governo na semana que vem. As principais tendências do partido já apresentaram suas reivindicações ao presidente nacional da legenda, Rui Falcão.

Dilma deve anunciar até 12 nomes do novo ministério nos próximos dias, segundo interlocutores do Planalto.

Mensalão
Lula comparou o escândalo na Petrobras ao processo do mensalão e disse que, quando a investigação chegar ao Supremo Tribunal Federal (STF), a imprensa já terá condenado o PT. Segundo ele, há uma tentativa de "difamar" e "destruir" o partido, que estaria sendo atacado "de todos os lados", com "artilharia leve e pesada".

Em outro evento da legenda, preparatório para o Congresso do PT no ano que vem, Lula, Falcão e o governador da Bahia, Jaques Wagner, conclamaram a militância a dar uma demonstração de força na posse de Dilma, fazendo uma grande festa popular em Brasília.

- Eu perdi 1989, e todo mundo sabe como perdi, entretanto não fiquei na rua protestando, fui me preparar para a outra - disse Lula.

Com o pedido de demissão de Jorge Hage da Controladoria-Geral da União (CGU), O GLOBO apurou que o secretário-executivo da Casa Civil, Valdir Simão, irá para a pasta. Mas, por meio de nota, ele disse que não recebeu ainda nenhum convite para assumir o ministério e que continua "desempenhando normalmente" suas atividades na Casa Civil.

- Continuo desempenhando normalmente minhas atividades de secretário - disse.

Lula mobiliza partido em defesa da presidente

• Ex-presidente diz que PT é a ‘bola da vez’ por ser alvo preferido da oposição e conclama militância a revidar

Vera Rosa, Daniel Carvalho e Daiene Cardoso - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva conclamou nesta quarta-feira, 10, o PT a sair da defensiva e ajudar a presidente Dilma Rousseff, que, na sua avaliação, enfrenta uma tentativa de golpe. Na abertura da segunda etapa do 5.º Congresso do PT, em Brasília, Lula disse que o partido é a “bola da vez”, previu tempos difíceis pela frente e afirmou que ninguém deve pensar agora na eleição de 2018.

Lula criticou a elite e os meios de comunicação e pediu aos petistas que não aceitem a pecha de corruptos. “Agora, a bola da vez somos nós”, afirmou ele, ao mencionar o escândalo da Petrobrás, desvendado pela Operação Lava Jato. Sob aplausos, Lula foi irônico ao falar sobre a arrecadação da campanha do PSDB. “Parece que os tucanos arrecadam dinheiro como se fosse Criança Esperança. Não tem empresário.”

A crise na Petrobrás e a necessidade de reação aos ataques também compuseram o cardápio do almoço oferecido por Dilma a Lula, no Palácio da Alvorada, cinco horas antes da abertura do congresso do PT. À mesa também estavam o presidente do PT, Rui Falcão, o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e o governador da Bahia, Jaques Wagner – cotado para ocupar o Ministério das Comunicações.

Diante de um cenário de turbulências na política e na economia, Lula deu sinais de que terá papel de mais protagonismo no segundo mandato de Dilma. Na passagem por Brasília, ontem, ele se reuniu, pela manhã, com deputados e senadores do PT. Tentou pôr um freio de arrumação na crise e elogiou a nova equipe econômica. Ao ouvir queixas sobre a articulação política do governo, garantiu que tudo vai melhorar, mas cobrou dos correligionários respostas mais duras à ofensiva da oposição.

Mensalão. À noite, na abertura do Congresso do PT, Lula comparou o escândalo na Petrobrás ao mensalão e disse que, quando o ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki for analisar a delação premiada, a imprensa já terá condenado o PT. Ao sustentar que a delação premiada foi aperfeiçoada no governo do PT, ele reclamou da interpretação dada às investigações feitas na Lava Jato. “Daqui a pouco vão querer saber a cor e a qualidade do papel higiênico que se usa no Palácio”, afirmou.

Lula admitiu que filiados do PT podem ter cometido erros, mas fez um discurso exaltando o partido e todas as realizações nos quase 12 anos de governo.

Com estocadas na direção do PSDB do senador Aécio Neves, Lula disse que, para os tucanos, a campanha ainda não acabou. “Eles começam a ficar apavorados com a perspectiva de quinto mandato. Mas ninguém tem de pensar em 2018, mas, sim, na posse da Dilma, no dia 1.º de janeiro, e no sinal que ela vai dar do ponto de vista econômico, das políticas sociais, de desenvolvimento, de crescimento”, insistiu o ex-presidente, interrompido pelo coro de “Lula, Lula”, ao citar a eleição de 2018. “Não podemos permitir que os coxinhas ocupem a Avenida Paulista e a gente não mostre a nossa presença”, emendou Falcão, numa alusão aos tucanos.

Apesar do discurso sob medida para animar a plateia, formada por 500 pessoas, Lula admitiu que é preciso “repensar” o partido. Não foi só: comparou o PT a um filho “que cresce e começa a dar problema”. Para ele, no entanto, a sigla que fundou tem mais virtudes do que defeitos. “Eu não sou melhor do que ninguém, mas, se enfiar todos eles um dentro do outro, eles não são mais honestos do que eu.”

Na despedida, Lula pediu que cada correligionário se transforme em “uma Dilma” para defender a presidente e o governo. “Ninguém aguenta uma passeata um dia sim e outro também. Deixem a mulher trabalhar, gente!”, exclamou.

Delação de doleiro chega ao procurador-geral

• Janot encaminhará ao STF parecer sobre políticos citados por Youssef

Vinicius Sassine – O Globo

BRASÍLIA - O gabinete do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, recebeu ontem os depoimentos do doleiro Alberto Youssef em que ele cita diversas autoridades com foro privilegiado como participantes do esquema de desvio de recursos da Petrobras. Youssef aceitou fazer a delação premiada para tentar se livrar das pesadas penas previstas por conta de seu protagonismo no esquema de pagamento de propinas, investigado na Operação Lava-Jato.

Agora, Janot vai analisar os depoimentos - prestados em outubro e novembro ao Ministério Público Federal (MPF) no Paraná - e encaminhá-los ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, que decidirá se homologa ou não os termos da delação.

O encaminhamento do material da delação de Youssef ao procurador-geral da República é um passo importante para que o esquema de corrupção descoberto na Petrobras seja finalmente investigado no STF, onde tramitarão os processos relacionados aos deputados, senadores e ministros citados.

Costa citou 35 políticos
Os governadores citados são processados no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os depoimentos do doleiro já foram analisados previamente pela equipe que trabalha diretamente com Janot. O procurador-geral fará a análise final e o parecer para, então, encaminhá-los ao STF.

Uma prioridade de Janot será cruzar o teor da delação do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, que citou 35 políticos supostamente envolvidos com o esquema, com as informações do doleiro. As informações de Costa e de Youssef estão protegidas por sigilo. A partir do cruzamento dos dados, Janot vai pedir a abertura dos primeiros processos no STF. Não há previsão de quando isso ocorrerá.

A depender do andamento da produção das provas e da conveniência para as investigações, alguns desses processos poderão tramitar sem sigilo.

'Saio como um aprendiz', diz Pedro Simon

Despedida emocionada

• Após quatro mandatos de oito anos, Pedro Simon faz discurso de 4h30m e diz adeus ao Senado cobrando o fim da corrupção e da impunidade

Cristiane Jungblut – O Globo

Sem descer da tribuna, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) fez ontem um discurso de 4h30m para se despedir do Senado e de seus mais de 60 anos de vida pública. Emocionado e sem conter o choro, ele destacou a atuação do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa no julgamento do mensalão e do juiz federal Sérgio Moro, no caso da Operação Lava-Jato. O senador gaúcho disse que os dois foram "abnegados" na luta contra a corrupção, e afirmou que ainda sonha com a ética na política.

Além disso, citou os escândalos da Petrobras e ressaltou que eles são "como uma punhalada traiçoeira em quem tem, de fato, coração valente", numa alusão à presidente Dilma Rousseff.

Ao longo de seu discurso, Simon foi aplaudido diversas vezes e não conseguiu conter o choro. Ele completará 85 anos em 31 de janeiro, dia em que chega ao fim seu quarto mandato de oito anos - os últimos três consecutivos. Simon ficou na tribuna das 14h50m às 19h16m e, ao final, ganhou de presente dos senadores e funcionários uma réplica do microfone que tanto usou.

No plenário, estavam presentes sua mulher, Ivete, os dois filhos e a neta. Todo assistiram às dezenas de apartes que foram feitas por diversos parlamentares em sua homenagem.

Em seu longo discurso, Simon citou São Francisco e chegou fazer uma adaptação da oração dele. Em seguida, recitou versos dos poetas Mário Quintana, seu conterrâneo, e do chileno Pablo Neruda.

- Bem-aventurado Joaquim Barbosa! Bem-aventurado Sérgio Moro! Bem-aventurados todos aqueles que, abnegados, gritam e lutam contra a corrupção e contra a impunidade! Bem-aventurados os que, apostolados, empunham a bandeira da ética na política. Bem-aventurados sejam todos os que, por meio de assinaturas e da pressão sobre o Congresso Nacional, alcançaram êxito na aprovação da Lei da Ficha Limpa - disse Simon, repetindo o movimento de braços que sempre marcou seus discursos.

"votar sem ser votado"
Para o parlamentar, o STF deu "um enorme passo" ao combater o que ele diz sempre ter defendido como sendo "o maior de todos os males brasileiros: a impunidade". Em suas palavras: "o julgamento do mensalão pode ter sido um divisor de águas".

Depois de lembrar suas origens, o deputado gaúcho falou sobre o futuro:

- Em seis décadas, vou experimentar, pela primeira vez, uma vida sem o meu nome nas urnas. Votar, sem ser votado. Escolher, sem ser escolhido. No meu primeiro minuto daquele dia (31 de janeiro), terei 85 anos e minha querida neta Isabela, presente de Deus que veio ao mundo exatamente no dia do meu aniversário, completará três anos - enfatizou Simon, emocionado: - Quis Deus que a minha presença nos acontecimentos mais importantes da História de nosso país acontecesse. Foram seis décadas de vida pública. Saio daqui como entrei: ainda um aprendiz.

Simon foi, então, aplaudido de pé.
Neste ano, ele enfrentou o desgaste de ter uma derrota avassaladora no Rio Grande do Sul. Simon havia desistido de disputar eleição, mas voltou atrás quando o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS) foi alçado a vice na chapa de Marina Silva (PSB) à Presidência da República.

PPS, PSB, Solidariedade e PV fecham bloco parlamentar e fazem ato político no dia 16

• Nova força política do país reunirá 67 deputados federais na próxima legislatura. Bloco também atuará nas assembleias e nas câmaras municipais. Em 2016, partidos marcharão juntos.

Assessoria do PPS

Os presidentes e líderes do PPS, PSB, Solidariedade e PV fecharam nesta quarta-feira (10), durante almoço em Brasília, a formação de um bloco parlamentar para atuar no Congresso Nacional, nas assembleias legislativas e câmaras municipais. O ato oficial de lançamento da nova força política do país será realizado na próxima terça-feira, 16 de dezembro , na Câmara dos Deputados, em local ainda a ser definido.

Na próxima legislatura, a federação de partidos vai contar, por exemplo, com 67 deputados federais (34 do PSB, 15 do SD, 10 do PPS e 8 do PV). Sem a formação de outros blocos, seria a segunda força política da Câmara, atrás apenas do PT, que contará com 69 parlamentares em 2015. Atualmente os quatro partidos contam com 61 deputados, sendo a terceira força da Casa.

Participaram do almoço que selou a aliança o presidente do PPS, deputado Roberto Freire (SP); o líder do partido na Câmara, deputado Rubens Bueno (PR); o vice-líder, deputado Arnaldo Jardim (SP), o presidente do PSB, Carlos Siqueira, o líder Beto Albuquerque (SP), o deputado e vice-governador eleito de São Paulo Márcio França (PSB-SP); o presidente do Solidariedade, deputado Paulo Pereira da Silva (SP), o deputado Arthur Maia (SD-BA), o deputado Augusto Coutinho (SD-PE) e o presidente do PV, deputado José Luiz de França Penna (SP).

Unidade de ação
O presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), explicou que o bloco funcionará não apenas no Congresso Nacional, nas assembleias legislativas e câmaras municipais, mas no cotidiano da sociedade e também nas eleições de 2016. “Com a institucionalidade a ser criada, de uma federação de partidos, haverá unidade de ação como se um partido só fosse”, disse.

Para Freire, o novo bloco “muda o cenário e claramente começa a aglutinar as forças de esquerda democrática do país, de oposição ao governo que aí está”. De acordo com o deputado, a unidade estará valendo a partir da próxima terça e abarcará a eleição da nova Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e composições das comissões da Casa, assim como as próximas eleições municipais.

O líder do PPS na Câmara, deputado federal Rubens Bueno, ressaltou ainda que o bloco é formado por partidos que saem das eleições preocupados com o atual cenário político e econômico do país.

“O bloco nasce como uma alternativa e com certeza terá grande peso na política brasileira, hoje tomada pelo fisiologismo e pela corrupção. Vamos não só ter atuação conjunta nos parlamentos, mas marcharemos unidos nas eleições municipais de 2016 e também construiremos um projeto novo para o Brasil na corrida presidencial de 2018”, destacou Rubens Bueno.

Para o vice líder do PPS, deputado federal Arnaldo Jardim (SP), o bloco dá sequência a estratégia adotada pelos partidos nas eleições de 2014, quando atuaram no campo da oposição, com as candidaturas de Eduardo Campos/Marina Silva (PSB) e Aécio Neves (PSDB).

“Ficaremos firmes no campo da oposição, alertando para os desmandos do atual governo do país. A federação dos partidos veio para ficar e terá atuação nos parlamentos, na sociedade e nas eleições. É o surgimento de um novo polo alternativo na política brasileira”, resumiu Arnaldo Jardim.

Fórum de Davos exclui Petrobras

Assis Moreira - Valor Econômico

GENEBRA - A Petrobras não é mais signatária da Iniciativa Contra Corrupção, do Fórum Econômico Mundial, e isso ocorre como uma das consequências do escândalo de corrupção que atinge a petroleira brasileira.

Em entrevista ao Valor na semana passada, o fundador do Fórum, Klaus Schwab, foi indagado se a Petrobras continuava sendo uma das 200 companhias internacionais que integram a iniciativa de Davos. Sua resposta foi de que "não estamos na situação de ser ativos de nosso lado, por causa de acusações que não se tornaram caso legal".

Mas hoje o Fórum informou ao Valor PRO que na verdade a Petrobras não é mais integrante da chamada Iniciativa de Parceria Contra a Corrupção (Partnering Against Corruption Initiative), que combate corrupção, requer transparência nas operações e trata de riscos em mercados emergentes.

O que aconteceu é que todos os participantes foram convocados a renovar até maio a assinatura e portanto os compromissos da iniciativa. A Petrobras não fez isso no prazo e ainda assim o Fórum de Davos esperou a reação da companhia até setembro, sem sucesso.

Mas em outubro, quando o escândalo de corrupção na Petrobras aumentava de dimensão, a companhia enfim procurou o Fórum dizendo que gostaria enfim de renovar sua assinatura na Iniciativa Anticorrupção.

Dessa vez, porém, foi o próprio Fórum que disse que, com o escândalo no Brasil, não havia espaço para assinar mais, sinalizando que preferia esperar o desenvolvimento da situação no Brasil.

A postura e o esclarecimento do Fórum são mais um golpe para a imagem da Petrobras no exterior. Isso ocorre apesar de a companhia brasileira ser uma das "parceiras estratégicas" do Fórum de Davos, o encontro anual da elite econômica e política do planeta, para o qual paga US$ 510 mil (R$ 1,3 milhão).

No momento a empresa continua como parceira de Davos. Mas não registrou até agora nenhum diretor para participar do encontro de 2015, na terceira semana de janeiro, nos Alpes suíços.

Merval Pereira - Um passo adiante

- O Globo

A Comissão Nacional da Verdade, apesar da denunciada falta de boa vontade da área militar para dar informações e da impossibilidade ideológica de lidar com os crimes também praticados pela esquerda revolucionária no período da ditadura militar brasileira, acabou produzindo um relatório importante, embora incompleto, denunciando como funcionava a máquina de re pressão militar, definindo a responsabilidade de cada um e dando os seus nomes quando foi possível a identificação acima de quaisquer dúvidas.

A pretensão de re ver a Lei da Anistia para punir os acusados de crimes contra a Humanidade, que nessa visão são imprescritíveis, esbarra na definição do Supremo Tribunal Federal a favor de sua validade para todos os lados em disputa. Resta, no momento, como lembrou o ministro do STF Luís Roberto Barroso, analisar se a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, posterior à do STF, de que o país está obrigado a investigar e punir os crimes da ditadura militar se impõe diante da Constituição e à decisão da nossa mais alta Corte. Por enquanto, como salientou outro ministro do STF, Marco Aurélio Mello, o que vale é a decisão de 2010 de que a Lei da Anistia não pode ser revogada. Mudança de posição devido a uma alteração de componentes — só quatro dos sete ministros que votaram a favor da manutenção da anistia estão no plenário hoje — provocaria uma in segurança jurídica inaceitável numa democracia.

A retomada da questão diante do fato novo da Corte Interamericana ser á inevitável, mas o mais prudente será que a legislação em vigor, fruto de uma negociação política ampla na ocasião, seja mantida, e os eventuais processos civis que forem gerados pelo relato da comissão fiquem a cargo dos parentes e amigos das vítimas. A comissão passou por crises e impasses até chegar ao rela tório final. Em alguns momentos, promoveu uma catarse nacional em busca da superação dos traumas causados pela ditadura militar, como alguns de seus membros imaginavam ser sua missão, mas soube preparar um rela tório que deixará registrado para a História o que foram os tempos da ditadura, além de documentos que poderão ser consultados.

Cumpriu a missão de levar à opinião pública o maior número possível de informações sobre as atrocidades cometidas pela re pressão, localizou desaparecidos, confirmou hipóteses oficializando crimes que eram mantidos nas som brase, sobretudo , tornou uma verdade oficial que "a s graves violações de direitos humanos ocorridas entre 1964 e 1985 decorreram de modo sistemático da formulação e implementação do arcabouço normativo e repressivo idealizado pela ditadura militar com o expresso objetivo de neutralizar e eliminar indivíduos ou grupos considerados como ameaça à ordem interna" . Se a verdade é, por definição inatingível, uma verdade oficial fica mais longe ainda do objetivo.

A comissão identificou cadeias de comando "solidamente estruturadas", ordenadas em escalões sucessivos, "por vínculo de autoridade, até o comando máximo da Presidência da República e dos ministérios militares". É fato que "verdades oficiais" não são nunca completas, e a busca da verdade, se limitada por questões ideológicas como foi a da comissão, acaba revelando só um dos lados em conflito. Por isso, a anistia para os dois lados parece ser a solução mais harmoniosa, principalmente depois que parte desse re lato se torna público para registro histórico , ajudando a que não se repita. No momento em que minorias radicais vão às ruas pedindo a intervenção dos militares para interromper o jogo democrático, é saudável que os crimes cometidos naquele período sejam re velados.

Tanto o rela tório da Comissão da Verdade quanto o da Comissão de Inteligência do Senado dos EUA, que detalhou os métodos de torturas utilizados pela CIA a pretexto de combater o terrorismo depois dos ataques aos EUA de 11 de setembro, fazem parte da história dos países, e têm a função de denunciar os crimes contra a Humanidade perpetrados pelas máquinas governamentais , para que sejam rejeitados e não se repitam. A condenação e proibição formal da tortura por parte de Barack Obama é um passo adiante para super ar esse trauma, embora tenha preservado seu antecessor George Bush e a CIA como instituição do Estado. Aqui, seria uma vitória da democracia se as Forças Armadas emitissem um sinal, mesmo que indireto, de que essas práticas não são aceitáveis em nossas instituições militares.

Dora Kramer - Antes que o mal cresça

O Estado de S. Paulo

Quanto mais se conhecem os fatos, menos chance há de repeti-los. E para aqueles - de todos os matizes ideológicos - que de alguma maneira flertam com o autoritarismo, o trabalho da Comissão Nacional da Verdade é uma fonte imprescindível de conhecimento.

Penso nisso quando vejo uma gente enfurecida sair às ruas ou frequentar as redes de internet pedindo a volta dos militares ao poder, acreditando piamente que é por aí, pelo comando da mão forte e do braço firme, da interdição do debate político, que se enquadra o Brasil aos bons costumes.

Mas penso também quando ouço outro tipo de gente enraivecida a defender um cala boca geral na imprensa independente, acreditando piamente que é das notícias que decorrem os problemas sem notar que com isso chocam o ovo da serpente.

A CNV lista uma série de providências, sendo a de maior impacto a recomendação para que as Forças Armadas se responsabilizem, juridicamente inclusive, pelos crimes contra a vida cometidos nos governos militares. Dificilmente ocorrerá, como é remota a hipótese de revisão da Lei de Anistia, embora nesse passo venham se abrindo caminhos para reparações na Justiça.

Aqui e agora, depois desses dois anos e sete meses de levantamento de dados, tomada de depoimentos e construção de um documento histórico o legado primordial para o País é a divulgação das informações. Se os militares assumem ou não a responsabilidade, isso não apaga os fatos. A vigência da Lei da Anistia não inclui cláusula pétrea de condenação na Nação à perda de sua memória. Perdoar não é sinônimo de esquecer.

O que virá daqui em diante, as consequências, as reações, impossível prever. Vale o que está feito: o registro da identificação de 377 militares, policiais e agentes públicos responsáveis por torturas, a revelação de centros onde eram cometidas as barbáries, a listagem de 435 casos de mortes de desaparecimentos, o relato pormenorizado de episódios que derrubam versões inventadas pela ditadura e repõem a verdade sobre um período em que o Estado capturou para si o poder de vida ou morte de cada um dos brasileiros.

O resultado do trabalho não agradou aos que esperavam algo mais contundente. Reclamou-se de "termos amenos" de "superficialidade", falou-se até em frustração. Já do outro lado manifestações de um ou outro personagem da época carregavam conteúdo oposto, enxergando revanchismo no relatório.

Se os mais diretamente envolvidos ficaram insatisfeitos, os demais cidadãos - principalmente os que não viveram aqueles tempos - ganharam acesso a um pedaço da História.

De berço. O deputado Jair Bolsonaro impressiona pela rudeza de modos. E o mais impressionante é que exatamente por isso tem imenso eleitorado.
Poderia defender suas posições sem recorrer a expressões violentas, mesmo sendo em reação a exageros verbais de adversários. Mas talvez não obtivesse tanto sucesso.

Em seus vários mandatos tantas o parlamentar já fez equivalentes em grosseria a essa última em que usou a tribuna para dizer que só não estupraria uma colega porque ela "não merecia", que a falta de decoro já está contabilizada no voto de quem se sente por ele representado.

Cerimonial. "Playboyzinho" de fato não é a maneira mais adequada de um ministro de Estado se referir a um senador da República, como fez Gilberto Carvalho em cerimônia no Palácio do Planalto para (des) qualificar o adversário Aécio Neves.

Mas, mais impróprio ao cargo e ao ambiente é o uso de termos chulos, conforme este trecho do discurso feito na ocasião: "...todo tipo de acusação de bolivarianismo, de chavismo, de mais um monte de m.... que os caras falam".

Bernardo Mello Franco - Uma trilha para o Supremo

- Folha de S. Paulo

Integrantes da Comissão Nacional da Verdade vislumbram uma trilha para que o Supremo Tribunal Federal comece a julgar autores de crimes da ditadura militar. A ideia seria abrir caminho com a denúncia contra os autores do atentado do Riocentro, em 1981.

O plano, um exemplo clássico de terrorismo de Estado, foi tramado para frear o processo de abertura política. Militares saíram de um quartel do Exército para detonar bombas durante um show que reunia milhares de jovens na zona oeste do Rio.

A tragédia só foi evitada por acidente: um dos artefatos explodiu no colo de um sargento, que morreu no local. Os órgãos de repressão ainda tentaram atribuir o atentado a grupos de esquerda, mas a farsa foi desmontada rapidamente. Mesmo assim, até hoje ninguém foi punido.

Em fevereiro, o Ministério Público reuniu novas provas e denunciou seis agentes da ditadura. A ação foi trancada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região porque o caso estaria prescrito depois de 33 anos.

Os procuradores sustentam que os crimes contra a humanidade nunca prescrevem --ou seja, seus autores podem ser obrigados a responder por eles enquanto estiverem vivos. Como a Lei da Anistia é de 1979, anterior ao atentado, bastaria aceitar este argumento para permitir que os acusados se sentem no banco dos réus.

A tese tem fragilidades, como o fato de o atentado não ter feito vítimas inocentes, mas deve chegar logo ao Supremo. Se for aceita, criará condições políticas e jurídicas para o julgamento de outros casos.

Sem antecipar seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou ontem que uma nova ação sobre a validade da Anistia deve ser votada em breve pelo Supremo. A declaração animou o coordenador da Comissão Nacional da Verdade, Pedro Dallari.

"Argentina, Chile e Uruguai já julgaram quem praticou crimes de Estado em suas ditaduras. É difícil defender que o Brasil seja o único país a preferir a impunidade", diz ele.

Luiz Carlos Azedo - Eu sou você amanhã

• Como naquela velha propaganda de vodca, nada impede que alguns dos que votaram pela cassação de André Vargas possam ir para a guilhotina amanhã

Correio Braziliense

Sem dó nem piedade a Câmara dos Deputados cassou o mandato do deputado federal André Vargas (sem partido-PR) por quebra de decoro parlamentar. No placar eletrônico do plenário, foram 359 votos favoráveis e somente um contrário, do deputado José Airton (PT-CE), além de seis abstenções. O líder do PT, Vicente Paulo da Silva (SP), o Vicentinho, encaminhou a votação a favor da cassação do ex-petista, depois de meses de manobras da sua bancada e dos aliados para evitar esse desfecho.

Vargas era o vice-presidente da Câmara, primeiro na linha de sucessão do deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) no comando da Casa, mas meteu os pés pelas mãos e teve que renunciar ao cargo. Notabilizou-se ao posar de punho fechado e braço erguido ao lado do então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, num protesto contra a condenação dos líderes petistas José Dirceu, José Genoino e João Paulo Cunha no processo do mensalão. De símbolo do inconformismo petista com o julgamento da Ação Penal 470 pelo STF, tornou-se um renegado político da própria legenda, após o escândalo da Petrobras.

O ex-petista é suspeito de envolvimento com o doleiro Alberto Youssef, acusado de comandar o esquema de corrupção que atuava na Petrobras. A votação que cassou o mandato do parlamentar foi aberta. Eram necessários apenas 257 votos a favor da cassação; tentou-se uma manobra regimental para evitar a decisão, mas a oposição pôs a boca no trombone e o presidente da Câmara deu sequência à sessão.

A cabeça de Vargas rolou para purgar os pecados da Câmara, num ritual que se repete a cada legislatura, desde 1993, quando houve o escândalo dos Anões do Orçamento. À época, foram cassados seis parlamentares, entre os quais o então presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro (PMDB-RS). Quatro congressistas renunciaram, inclusive o poderoso líder do PMDB, Genebaldo Corrêa (BA), para evitar a própria cassação. Oito deputados foram absolvidos.

O escândalo do Orçamento nem chega perto do desnudado pela Operação Lava-Jato, cujo montante de desvios chega a R$ 20 bilhões. Os envolvidos roubaram cerca de R$ 100 milhões, com esquemas de propina, para favorecer governadores, ministros, senadores e deputados. Em 2000, o Supremo Tribunal Federal arquivou o processo contra Ibsen Pinheiro, já falecido, que retornou à política em 2004, ao eleger-se vereador em Porto Alegre. Em 2006, conquistou uma vaga para a Câmara dos Deputados, na qual foi recebido como grande injustiçado, pois nada foi provado contra ele.

Sem mandato, Vargas poderá ser enquadrado na Lei da Ficha Limpa, ficando inelegível por oito anos. Como não se reelegeu, Vargas deixaria a Câmara no fim de janeiro, mas a maioria dos líderes resolveu orientar as bancadas a votar pela perda do mandato. Somente o PMN e o PEN liberaram seus parlamentares . Vargas não compareceu à sessão. Estava licenciado até ontem e acreditava piamente que não haveria a votação.

Efeito Orloff
Como naquela velha propaganda de vodca, nada impede que alguns dos que votaram pela cassação de André Vargas possam ir para a guilhotina amanhã. É assim que as coisas funcionam na Câmara dos Deputados, onde não existe cadeira vazia, pois há uma fila de suplentes à espera de um lugar no plenário e o maior interessado na cassação quase sempre é um colega do próprio partido.

Ontem, o relator da CPI mista da Petrobras, deputado Marco Maia (PT-RS), apresentou o relatório final. É um documento pautado pelo cinismo, pois não recomenda o indiciamento de nenhum dos envolvidos nas denúncias de corrupção. Sugere somente o “aprofundamento” das investigações na Operação Lava-Jato, que foram obstruídas pela bancada governista na própria comissão. Com 903 páginas, o relatório deverá ser votado no próximo dia 17. O prazo de funcionamento da comissão termina no dia 22, o último antes do recesso da atual legislatura. A oposição pretende apresentar um relatório paralelo para marcar posição.

Como prêmio pelo desempenho na tarefa, o presidente da CPI mista da Petrobras, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), foi indicado para o Tribunal de Contas da União (TCU). O escândalo parece assunto morto e enterrado no Congresso, mas isso é um autoengano dos envolvidos. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, recebeu ontem o conteúdo da delação premiada do doleiro Alberto Youssef, apontado pela Polícia Federal como um dos chefes do esquema de corrupção investigado na Operação Lava-Jato.

Com a delação em mãos, Janot solicitará ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de inquérito para investigar políticos citados por delatores do esquema de corrupção que atuava na Petrobras. O que se comenta nos bastidores do Congresso é de que a maioria já frequenta o rol de processos no STF sob sigilo de Justiça. Quando os nomes se tornarem públicos, novos processos por quebra de decoro serão abertos na Câmara e no Senado.

Raquel Ulhôa - Chumbo grosso

• Oposição acha que clamor popular pode levar a impeachment

- Valor Econômico

Às 3h da madrugada da votação do projeto de lei que permite o descumprimento da meta de superávit primário pelo governo, o deputado Jutahy Júnior (PSDB-BA) recebeu, pelo Facebook, a pergunta: "Você ainda está aí?" Entendendo a mensagem como cobrança de um eleitor que acompanhava a longa sessão pela televisão e não o enxergava no plenário, Jutahy tratou de pedir a palavra rapidamente e fazer um discurso, para ser visto e mostrar que estava presente.

Pelas redes sociais ou manifestações presenciais, setores antipetistas da população cobram cada vez mais da oposição atuação mais firme contra o governo Dilma Rousseff. Mobilizados ou não por partidos políticos, pequenos grupos começam a ocupar galerias e a se manifestar na porta do Congresso com uma pauta meio confusa, mas um protesto comum: contra o PT e o governo.

"Se, anteriormente, a oposição não tinha o apoio popular, porque existia uma certa anestesia por parte da sociedade em relação ao governo do PT, agora que tem é lógico que vamos poder reverberar com muito mais capacidade. Não é que fomos omissos. É que hoje a sociedade acordou", diz o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), um aguerrido líder da oposição, que em fevereiro assume mandato de senador.

Caiado começa, em janeiro, a estudar o regimento do Senado, para conhecer bem todos os instrumentos legais dos quais a oposição dispõe na Casa para atrasar votações de interesse do governo e forçar o debate. O senador eleito quer acabar com o acordo de líderes em torno da pauta. Defende que todas as matérias sejam debatidas e que o Senado não seja "cordeirinho" do Planalto. "Se a sociedade hoje está nesse processo quase que de erupção, não é justo que a Câmara dos Deputados e o Senado não reflitam essa realidade", afirma.

O PSDB, por sua vez, está estruturando o grupo técnico de acompanhamento das ações do governo, das execuções de programas e projetos e dos indicadores sociais e econômicos. A estrutura vai funcionar no Instituto Teotônio Vilela (ITV), órgão de estudos e formação política ligado ao PSDB. A expectativa do presidente do partido, senador Aécio Neves (MG), é que comece a funcionar em fevereiro, já com o novo mandato de Dilma em andamento.

O próprio Aécio tem demonstrado disposição maior do que a habitual de bater no governo. Um exemplo recente foi a resposta dada a uma declaração do ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência), que o chamara de "playboyzinho". O senador disse que a declaração confirma a "baixa estatura política" de Carvalho e que, apesar de estar há 12 anos no governo, "a principal marca da sua biografia será sempre o seu envolvimento com a as graves denúncias de corrupção na Prefeitura de Santo André (SP), que culminaram com o assassinato do prefeito [Celso Daniel], ainda não esclarecido".

Se ensaia uma atuação mais combativa em 2015, a oposição tem dificuldade de traçar estratégias, por estar sempre sendo surpreendida pela profusão de denúncias, especialmente no caso Petrobras. "Estamos diante de uma situação sem controle. É tanta associação de mal-feitos, que isso pode gerar um clamor das ruas por um 'Fora Dilma'", diz o líder e presidente do DEM, senador José Agripino (RN).

Da Operação Lava-Jato da Polícia Federal surgem, a cada dia, novas revelações sobre o esquema de corrupção na Petrobras. As ações da empresa caem e investidores movem ação coletiva contra a empresa nos Estados Unidos, buscando ressarcimento pelas perdas.

Em duro discurso, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, fala em "assalto à Petrobras" e em substituição da diretoria. Técnicos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) recomendam a desaprovação das contas de campanha da presidente. E, reforçando o desgaste do PT, surge a notícia de que a empreiteira Camargo Corrêa, investigada na Lava-Jato, mantinha contrato sigiloso com o ex-ministro José Dirceu, condenado por corrupção no mensalão.

Tudo isso quando o Congresso está encerrando o embate em torno do projeto do superávit, cuja tramitação já havia se tornado mais tensa com a publicação do decreto da presidente condicionando a liberação de recursos de emendas de parlamentares à aprovação à aprovação da proposta. Tudo isso deu força para a atuação da oposição nas últimas semanas. internamente, Dilma também sofre as consequências da briga entre "lulistas" e "dilmistas". "Ela está prisioneira do que o PT fez. Não tem como se livrar. Ela está dormindo com o inimigo", diz Jutahy.

Para lideranças petistas - que têm sido consideradas tímidas na defesa do governo -, a oposição está "patrocinando" o "impeachment" de Dilma. Embora digam que, neste momento, o objetivo não é esse, dirigentes tucanos e do DEM já não tratam o assunto como "algo exótico", como faziam até pouco tempo.

O argumento é que o conjunto de evidências de irregularidades no governo pode crescer tanto e chegar tão perto da presidente, que a oposição será obrigada a defende o afastamento. Para o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), ainda não existem as condições jurídicas e políticas para haver o impeachment, mas elas podem se concretizar.

Oposicionistas com inserção no meio empresarial apontam um novo problema que Dilma pode enfrentar a partir de 2015: a desobediência civil por parte do setor produtivo. Grandes empresários já teriam aventado a hipótese de deixar de recolher impostos, alegando corrupção, mau gasto do governo e a perspectiva de perdão, por meio de um programa de refinanciamento qualquer.

Jarbas de Holanda - Um começo de governo bem diferente dos três anteriores do lulopetismo

O segundo mandato de Dilma Rousseff vai começar em meio a forte incerteza sobre as ações a serem definidas e efetivamente implementadas na condução da economia, bem como gerando grandes complicações e insegurança no plano propriamente político. No primeiro, a incerteza, persistente e crescente, é se o ministro da Fazenda Joaquim Levy terá a autonomia e as condições operacionais necessárias para enfrentar e começar a reverter um enorme descontrole das contas públicas. Num contexto, interno, de inflação e juros elevados, queda generalizada das atividades produtivas, ampla desconfiança dos investidores, desencadeamento do desemprego na indústria, redução do consumo. Fatores negativos que se combinam a outros de caráter semelhante ligados às relações externas do país: déficits recordes da balança comercial, baixa competitividade dos produtos e serviços brasileiros, queda do valor das commodities (após vários anos de desperdício e manipulação populistas da bonança de receita por elas propiciada). E aos quais se juntam os efeitos restritivos e inibidores de investimentos, públicos e privados, na infraestrutura (peça-chave para uma retomada do crescimento), decorrentes dos vultosos prejuízos sofridos pela Petrobras, desde o primeiro governo Lula com os bilionários desvios de recursos do megaescândalo do petrolão, e pela Eletrobras. Ambas estatais afetadas nos últimos anos pela manipulação eleitoreira dos preços da energia elétrica e dos combustíveis.

Quanto à possibilidade de autonomia da equipe econômica encabeçada por Joaquim Levy, o otimismo inicial do mercado financeiro e dos investidores não tem resistido, ao longo de dezembro, a medidas do atual governo e a propósitos do próximo antecipados pela imprensa. Como a Medida Provisória (já encaminhada ao Congresso) com novo aporte de R$ 30 bilhões
para o BNDES. E escolha pela própria Dilma de nomes de sua confiança pessoal para as presidências do BNDES, do Banco do Brasil e da Caixa Econômica. Ações que apontam para a persistência, ou retomada o mais rápido possível, do papel inflacionário dos bancos públicos, bem como do aparelhamento partidário deles.

Configuram-se igualmente complicadas (inclusive institucionalmente) as perspectivas políticas do segundo mandato de Dilma Rousseff. O principal ingrediente negativo são os desdobramentos da operação Lava-Jato. Para a presidente (e para o seu antecessor). Já para a composição de um governo com quadros do PT, do PMDB e de outros partidos “aliados”, alguns dos quais podem ter que ser substituídos. Para as relações de um Executivo enfraquecido com um Congresso predominantemente empenhado em recobrar e afirmar independência e sob pressões de uma oposição revigorada política e socialmente, em contraponto a um petismo com representação diminuída e deslegitimada na opinião pública. Cabendo assinalar que o debate e as deliberações em torno dos desdobramentos do petrolão – em nova e efetiva CPI e sobre esperados processos de cassação de mandatos – vão desenvolver-se num cenário de economia estagnada e de reações populares, bem como de governos estaduais e municipais e de vários segmentos empresariais, a projetos e medidas de caráter restritivo exigidos pelas respostas à crise fiscal.

Deve ser levando em conta tais perspectivas e este cenário (reforçados, ontem, com a antecipação por Rodrigo Janot dos desdobramentos que a Procuradoria Geral da República dará às investigações da Lava-Jato) que o ex-presidente Lula está tentando forçar o Palácio
do Planalto e o PT da Câmara a “engolir o sapo” de uma rendição à candidatura de Eduardo Cunha à presidência da Casa. Como parte de um acordo que envolveria dois compromissos básicos dele: bloqueio à constituição pelo próximo Congresso de nova CPI da Petrobras e rejeição à abertura de um processo de impeachment da chefe do governo. Numa negociação que, incluindo prévia desistência de candidatura governista ao cargo, provavelmente não interessará ao peemedebista. Que centra sua campanha na contraposição ao petismo e na independência diante do Executivo.

Jarbas de Holanda é jornalista

Eugênio Bucci - Duas notas para o dia seguinte

- O Estado de S. Paulo

Ontem a Comissão Nacional da Verdade (CNV) entregou à presidente Dilma Rousseff o resultado de seus dois anos e meio de trabalho, com destaque para as investigações sobre os crimes de tortura, assassinato e ocultação de cadáver praticados por agentes públicos, sob o comando direto e indireto de chefes militares (às vezes usurpando funções do Poder Executivo federal), contra cidadãos brasileiros indefesos, já imobilizados. Ontem não foi um dia comum.

Instalada em 16 de maio de 2012, a CNV trabalhou por dois anos e meio e deixa um saldo impossível de esquecer, desprezar ou ignorar. As violações de direitos humanos e os crimes contra a humanidade comprovadamente perpetrados em instalações do Estado ou a seu serviço, ainda que já fossem sabidas (mas não nos detalhes apurados pela CNV), agora ganham registro no âmbito de um órgão de Estado da mais alta representatividade, que apresentou suas conclusões diretamente à pessoa a quem as Forças Armadas devem obediência. No dia de ontem, o semblante do Estado brasileiro mudou. O País tomou posse oficial de sua memória mais traumática e não tem mais como fingir que não sabe.

As marcas da Comissão Nacional da Verdade ficarão. A começar, pelos descontentamentos que gerou, descontentamentos que pedem novas formas de reconciliação e revogam definitivamente o silêncio opressivo. Os primeiros contrariados, os mais óbvios, usam farda e batem continência. Embora alguns tenham colaborado, com má vontade, resignação e corpo mole, queriam mesmo é que essa comissão sumisse do mapa. As Forças Armadas resistiram o quanto puderam (ou mesmo mais do que poderiam) e pouquíssimo fizeram para expor os esqueletos que ainda são inquilinos de seus muitos armários. Ciosas demais de condutas que veem como heroicas no passado, não deram sinais claros de que compreenderam o papel que lhes cabe no presente e no futuro.

Os descontentamentos, porém, não se restringem à caserna. A CNV também desagradou a setores de esquerda, tanto os que esperavam a localização milimétrica dos restos mortais dos desaparecidos como os que queriam revogar sumariamente a Lei da Anistia e mandar prender o generalato de uma vez por todas. Como os cadáveres não se levantaram do chão e as altas patentes não foram transferidas da reserva para o presídio, haverá quem diga que o relatório final pouco veio acrescentar. Esses também não entenderam bem por onde passou o fio da História nesse caso. E ele passou.

Por fim, a CNV tirou o sono de alguns dos mais respeitados e experientes políticos do País, uns na oposição, outros na situação. Alarmados com a elevação da temperatura e das tensões, uns e outros tentaram jogar água na fervura, como gostam de dizer. De sua parte, o Planalto fez o que pôde para baixar a visibilidade da cerimônia de ontem, mas, a dois dias do ato final, Dilma recuou um pouco e admitiu a presença de alguns convidados numa solenidade que seria totalmente fechada.

Tanto mal-estar serve agora como indicador de um fato que não se mostra a olho nu: a comissão mexeu em algo de muito, muito profundo. O barulho na imprensa - nos meios eletrônicos de ontem e nos jornais impressos de hoje - atesta de forma branda o custoso deslocamento subterrâneo cujos efeitos serão de longo prazo. O juízo que o Brasil faz de si mesmo foi alterado.

Isso tudo no dia de ontem. Hoje, dia 11 de dezembro de 2014, é apenas o dia seguinte. Para esse dia seguinte, que é hoje, valem duas notas breves.

1) Os desejos de que uma quartelada nos redima são anacrônicos. Os manifestantes que vão às ruas pedir um golpe militar pelo amor de Deus podem pôr suas barbas (eventualmente brancas) de molho. Por maior que seja a justa fúria da classe média contra a intolerável, estratosférica e inflamável roubalheira na Petrobrás, não há sustentação ética, política e econômica para um golpe. Nem sustentação prática.

Nem a direita quer saber disso. Os oficiais que se julgam ultrajados com as denúncias da CNV não terão como pegar carona nas passeatas de matinê lideradas por fascistinhas de outlet de Miami, loucos para terceirizar a própria liberdade e a dos seus compatriotas. Terão de mudar sua atitude. Ou terão de fingir que mudaram. O País resolveu esclarecer os crimes selvagens da repressão política da ditadura militar e essa resolução não vai arrefecer. Ao contrário, vai crescer, e isso vai fazer-nos bem, a todos nós, sejamos de esquerda ou de direita.

2) A tese dos "crimes do outro lado" já não se sustenta. Ninguém nega que as organizações políticas que patrocinaram a guerrilha eram autoritárias e não tinham um projeto democrático. Ninguém nega que os guerrilheiros praticaram crimes, receberam treinamento militar em Cuba e dinheiro estrangeiro financiou tiros aqui dentro. É claro que quanto mais esclarecimentos surgirem sobre as brutalidades praticadas pelos militantes de esquerda, melhor. Mas, registre-se, quase todos eles pagaram por seus delitos - e muitos pagaram caro demais.

Já os crimes praticados por torturadores e assassinos de presos indefesos em instalações a serviço de agentes do Estado brasileiro - imprescritíveis como são os crimes contra a humanidade - são de outra ordem. Essas nódoas devem ser removidas pela luz para que a Nação se reconcilie. Se não se livrar das manchas do passado que o maculam por dentro, o Estado não estará limpo para o futuro. É justo acreditar que, mais cedo ou mais tarde, mesmo os setores mais resistentes dos quartéis sentirão que não têm o direito de trancafiar a história em seus domínios.

Por amor à Pátria e por boa-fé, haverão de rever sua atitude, e isso será um dos resultados mais fecundos da coragem e do desprendimento dos membros da Comissão Nacional da Verdade, que, no dia de ontem, entregaram seu legado nas mãos da presidente da República.

Eugênio Bucci é jornalista e professor da ECA-USP