quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Opinião do dia – Rubens Bueno

O senhor encerrou a CPI de forma vergonhosa após receber uma ordem do líder do PT (Wellington Dias). Trata-se de uma farsa, de uma desmoralização completa da CPMI. Primeiro espalharam um versão estapafúrdia de acordo do governo com a oposição. Agora a base da presidente Dilma não dá quórum para votação e conta com sua ajuda para encerrar uma reunião. Isso é inadmissível.

Rubens Bueno, deputado federal (PR) e líder do PPS na Câmara dos Deputados, protestando contra o presidente da CPMI da Petrobras, Vital do Rêgo , pela não votação de requerimentos da oposição.

Governo quer eliminar a meta de superávit primário para 2014

• Projeto enviado ao Congresso propõe liberdade para abater da meta todo o volume de investimentos do PAC e de desonerações que for feito até o final do ano

Ricardo Della Coletta – O Estado de S. Paulo

O governo vai ganhar grande flexibilidade para administrar a meta de superávit primário das contas do setor público, caso seja aprovado o projeto de lei enviado nesta terça-feira, 11, ao Congresso Nacional. Ou seja, nessas condições, eliminaria a meta fiscal. O documento altera, de última hora, as regras da política fiscal brasileira em 2014.

Apesar da mudança de última hora, o governo insiste em afirmar que o resultado do ano será positivo. O ministério do Planejamento afirma, por meio de nota, que, apesar da mudança na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014 para retirar o limite para abatimento da meta fiscal com despesas com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e com as desonerações tributárias, "o Executivo está comprometido a realizar o máximo de superávit primário e ao mesmo tempo garantir a execução de investimentos prioritários e a manutenção dos incentivos à economia nacional, por meio de desonerações de tributos".

O projeto acaba com o limite fixo de R$ 67 bilhões para o abatimento das desonerações tributárias e dos investimentos do PAC. Portanto, o governo ganha liberdade para abater da meta todo o volume do PAC e das desonerações que for feito até o final do ano.

Até setembro, as desonerações e os gastos com o PAC somam R$ 122,9 bilhões. As desonerações somam R$ 75,69 bilhões, e o PAC mais R$ 47,2 bilhões. Esse valor deve aumentar substancialmente até dezembro, o que pode garantir margem para o governo trabalhar até mesmo um resultado desfavorável nas contas públicas. Até setembro, as contas do setor público acumulam um déficit de R$ 15,3 bilhões.

O governo resolveu enviar o projeto de lei antes do anúncio das medidas fiscais para 2015 porque há uma preocupação com o tempo curto para a sua aprovação até o final do ano. Com a mudança, o governo garante o cumprimento da meta, mesmo sem fazer esforço fiscal prometido para 2014.

Margem para déficit. Na prática, a presidente Dilma Rousseff criou condições para absorver um déficit primário na contas públicas, sem que o resultado ficasse desenquadrado na legislação que trata da política fiscal.

Cálculos feitos pelo Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, com base nos dados mensais ocorridos até setembro, indicam um potencial de aumento de cerca de R$ 25 bilhões do volume de desonerações entre outubro e dezembro. O cálculo foi feito com base na projeção de renúncia fiscal de R$ 8,3 bilhões com as desonerações que a Receita Federal tem computado todos os meses.

Já a média mensal de despesas do PAC até setembro é de R$ 5,3 bilhões, valor que, projetado para os próximos três meses, dá um volume de mais R$ 15,9 bilhões de gastos com investimentos até o final do ano.

Com os investimentos e as desonerações já feitas até setembro (R$ 122,9 bilhões) e as projeções até o final do ano, o volume potencial de abatimentos soma R$ 163,8 bilhões. Por esses cálculos, há margem para um déficit de cerca de R$ 50 bilhões nas contas do governo federal.

Tramitação. O presidente da República em exercício, Michel Temer, afirmou que a revisão de superávit primário tem como objetivo garantir os investimentos do PAC e as desonerações fiscais concedidas pelo governo para setores da economia. Na avaliação de Temer, o superávit não é "questão de governo, mas de Estado".

Temer convocou na manhã desta terça-feira reunião com lideranças do PT e do PMDB, além dos presidentes do Senado, da Câmara dos Deputados e dos ministros da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e da Secretaria de Relações Institucionais, Ricardo Berzoini.

Nas palavras do próprio presidente em exercício, o encontro serviu para "construir" um acordo em torno da questão. Mais tarde, haverá uma reunião com líderes de outros partidos da base aliada. Questionado sobre se haverá diálogo com a oposição, Temer sinalizou que chamará "todos que quiserem falar conosco".

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse que haverá empenho da base aliada para a aprovação do projeto. O relator da proposta, tanto na comissão mista de orçamento quanto no plenário do Congresso Nacional, será o senador Romero Jucá (PMDB-RR).
"Nós queremos dar rapidamente parecer, porque esta é uma questão de Estado.

Independentemente da questão política, eleitoral, partidária, nós temos de ter responsabilidade com a política fiscal do País, temos de sinalizar claramente a situação econômica do País, a situação fiscal, não só interna, mas externamente", disse Jucá.

(Colaboraram: Adriana Fernandes, Lu Aiko, Nivaldo Souza, Rafael Moraes Moura, Renata Veríssimo, Victor Martins)

Base do governo defende fim do ‘dogma’ fiscal

• Para vice-presidente Michel Temer, mudança da meta de superávit não é uma questão de governo, e sim de uma questão de Estado

Nivaldo Souza, Ricardo Della Coletta e Rafael Moraes Moura - O Estado de S. Paulo

As negociações políticas conduzidas pelo vice-presidente Michel Temer nos bastidores em defesa da alteração da meta do superávit primário unificaram o discurso da base governista no Congresso.

A presidente Dilma Rousseff viajou para a reunião do G-20, na Austrália, deixando a missão para Temer e os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil) e Ricardo Berzoini (Relações Institucionais).

Ao longo do dia, Temer fez uma série de reuniões com os principais líderes aliados. Reuniu lideranças do PMDB e do PT e convidou o chamado “baixo clero” parlamentar para costurar apoio ao projeto de lei que altera a meta de economia para pagamento dos juros da dívida. O resultado foi um discurso uníssono, cujo tom foi dado por Temer: “Não é uma questão de governo, mas de Estado.”

O lema do vice foi incorporado pelos governistas. “Queremos dar rapidamente um parecer. Esta é uma questão de Estado”, repetiu o relator da proposta, senador Romero Jucá (PMDB-RR).

Ele integrou o pelotão peemedebista formado pelos presidentes da Câmara, Henrique Alves (RN); do Senado, Renan Calheiros (AL); o líder do governo no Senado, Eduardo Braga (AM); e os líderes do partido no Senado, Eunício Oliveira (CE); e na Câmara, Eduardo Cunha (RJ). “Da parte do PMDB, não há obstáculo com relação a tratar do tema”, disse Cunha. “Sabíamos que isso ia acabar acontecendo.”

Dogma. O líder do PP no Senado, Francisco Dornelles (RJ), que já foi ministro da Fazenda, afirmou que a mudança no superávit primário não pode ser “um dogma” diante da queda de arrecadação pela União. “Você teve problema de queda de arrecadação e o governo não teve outro caminho. Acho que o governo está certo.”

O líder do PTB no Senado, Gim Argello (DF), considerou que a aprovação do novo modelo de superávit será a primeira grande vitória do governo reeleito. “O superávit pode ser superado”, concluiu.

Cotado para comandar a Câmara em 2015, Eduardo Cunha colocou como “pedágio” a análise de vetos presidenciais pelo Legislativo. O objetivo seria “limpar” a pauta de vetos acumulados no Congresso antes de debater, no plenário, a alteração proposta pelo governo. O principal veto de interesse do PMDB é o que proibiu a criação de novos municípios.

Diante da necessidade e da urgência do governo em aprovar o projeto, o PT deve aceitar a derrubada do veto, segundo apurou o Estado.

Com contas no vermelho, governo tenta brecha para descumprir meta

• Projeto prevê descontar do superavit todos os gastos com PAC e com desonerações tributárias

• Como esses dispêndios superam a economia prevista para pagar juros, na prática a medida 'cancela' a meta fiscal

Valdo Cruz, Márcio Falcão e Eduardo Cucolo – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Diante do estouro das contas públicas, no vermelho no ano eleitoral, o governo Dilma preparou uma brecha para descumprir a meta de economia de gastos para pagamento de juros da dívida pública (o chamado superavit primário) neste ano, abrindo até a possibilidade de fechar 2014 com deficit primário.

Por meio de projeto de lei enviado nesta terça-feira (11) ao Congresso, a equipe de Dilma pede autorização para descontar do superavit do setor público todos os gastos com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e com as desonerações tributárias, antes limitados a no máximo R$ 67 bilhões.

A decisão foi tomada porque o governo federal, que até setembro registrava deficit de R$ 15,4 bilhões, não conseguiria cumprir o superavit de 2,15% do PIB em 2014 usando o artifício de descontar apenas R$ 67 bilhões da meta original aprovada no Congresso.

A medida é classificada por assessores como a última manobra para fechar as contas deste ano feita pela equipe econômica, em que foi criticada por fazer sucessivas "pedaladas fiscais" para postergar despesas e esconder a real situação do caixa do Tesouro.

Desconto automático
A alteração proposta transforma em automático o desconto dos pagamentos feitos com o PAC e as desonerações concedidas em 2014. Segundo a ministra Miriam Belchior (Planejamento), até outubro o governo realizou R$ 52,4 bilhões em pagamentos do PAC e deve fazer desonerações de R$ 78 bilhões, totalizando R$ 130,4 bilhões.

Se o mecanismo já estivesse em vigor, esse desconto de R$ 130,4 bilhões (até outubro) superaria inclusive a meta de economia de R$ 116 bilhões (equivalente a 2,15% do PIB) aprovada na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2014.

Na prática, analistas de mercado dizem que o Planalto, com a nova regra, tem condições de fazer um abatimento superior a 3,1% do PIB no final do ano, cobrindo tanto a meta de superavit do governo federal como de Estados e municípios.

Teria condições até de cobrir eventual deficit primário --situação em que o governo não economiza o suficiente para pagar juros, sendo obrigado a elevar sua dívida.

Em audiência no Congresso, Belchior afirmou: "O compromisso do governo é fazer superavit neste ano. O maior possível. O que está na LDO não é possível".

Dentro do próprio governo, porém, a avaliação é que há risco de fechar o ano com deficit e que essa última manobra do governo na área fiscal visa evitar o descumprimento oficial da meta de superavit primário, que na prática não será obedecida.

No texto em que encaminhou o projeto de ajuste da LDO, o governo atribuiu a medida à desaceleração da economia brasileira e mundial, que afetou "as receitas necessárias aos investimentos e políticas públicas".

Segundo técnicos do Congresso, se descumprir a meta fiscal, a equipe econômica poderá responder por infração administrativa e caberia discussão sobre crime de responsabilidade fiscal

Governo envia ao Congresso proposta que permite descumprir meta fiscal de 2014

• Texto permite abatimento total das despesas do PAC e desonerações. O teto hoje é de R$ 67 bilhões

Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA - O governo enviou nesta terça-feira ao Congresso projeto de lei que altera a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014 e permite o abatimento da meta de superávit primário ( economia para o pagamento dos juros da dívida) de todas as despesas com o Programa de Aceleração do Crescimento e desonerações. Na prática, a mudança desobriga o governo de fazer superávit este ano, já que essas despesas e desonerações já superam a meta prometida de R$ 99 bilhões. Segundo dados da Comissão Mista de Orçamento (CMO), as despesas com o PAC já somam R$ 51,5 bilhões e as desonerações estariam hoje, conforme a Receita Federal, em R$ 84 bilhões, no total de R$ 135,5 bilhões.

O texto atual da LDO de 2014 permite o abatimento de R$ 67 bilhões entre recursos do PAC e desonerações. Por meio de nota, o Ministério do Planejamento afirma que o governo continua comprometido em fazer superávit. O Planejamento diz que "a mudança proposta preserva o conceito de abatimento do superávit primário, restrito exclusivamente aos recursos executados pelo PAC e pelas desonerações realizadas com impacto em 2014".

A proposta altera o caput do art. 3º da Lei no 12.919, de 24 de dezembro de 2013, que é a LDO de 2014. A nova redação do artigo terceiro da lei é:

"Art. 3º A meta de superávit a que se refere o art. 2° poderá ser reduzida no montante das desonerações de tributos e dos gastos relativos ao Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, cujas programações serão identificadas no Projeto e na Lei Orçamentária de 2014 com identificador de Resultado Primário previsto na alínea "c" do inciso II do § 4o do art. 7° desta Lei."

O texto anterior do artigo terceiro dizia que o abatimento poderia ser, de no máximo, R$ 67 bilhões.

"A meta de superávit a que se refere o art. 2o pode ser reduzida em até R$ 67 bilhões, relativos ao Programa de Aceleração do Crescimento - PAC, cujas programações serão identificadas no Projeto e na Lei Orçamentária de 2014 com identificador de Resultado Primário previsto na alínea “c” do inciso II do § 4o do art. 7° desta Lei, e a desonerações de tributos.

Desaceleração do PIB afetou receitas, diz governo
Na exposição de motivos encaminhada ao Congresso, segundo o Planejamento, o Executivo ressalta que a previsão de crescimento da economia brasileira foi revisada ao longo deste ano em relação à utilizada no início de 2013. O governo diz ainda que outros países também estão revisando "para baixo a estimativa de crescimento da economia mundial para este ano de 2014".

"A redução do ritmo de crescimento afetou as receitas necessárias aos investimentos e políticas públicas previstas. O Executivo está comprometido a realizar o máximo superávit primário e ao mesmo tempo garantir a execução de investimentos prioritários e a manutenção dos incentivos à economia nacional, por meio de desonerações de tributos, diz a nota do Planejamento.

Ao justificar a redução da meta do superávit primário, o governo diz que "a redução do ritmo de crescimento da economia brasileira afetou as receitas orçamentárias de forma que se faz necessário garantir espaço fiscal para preservar investimentos prioritários e garantir a manutenção da competitividade da economia nacional por meio de desonerações de tributos". A área econômica explica que a proposta encaminhada consiste em "ampliar a possibilidade de redução do resultado primário no montante dos gastos relativos às desonerações de tributos e ao PAC".

O governo diz ainda que "as políticas de incentivos fiscais e a manutenção do investimento tornaram-se imprescindíveis para minimizar os impactos do cenário externo adverso e garantir a retomada do crescimento da economia nacional".

Mudança na meta de superávit é confissão da irresponsabilidade de Dilma, diz Aloysio

• Líder do PSDB no Senado atacou proposta da presidente encaminhada ao Legislativo e disse que a oposição não vai apoiar a iniciativa

Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP), afirmou nesta terça-feira, 11, que a alteração na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014, flexibilizando a meta de superávit primário, é a "confissão" de que a presidente Dilma Rousseff foi "irresponsável na gestão das finanças do Estado". O tucano disse que a atuação do governo na política fiscal aumentou o "buraco" nas contas públicas.

Candidato derrotado a vice-presidente na chapa de Aécio Neves (MG), Aloysio Nunes afirmou nesta terça-feira novamente que os oposicionistas não vão apoiar a alteração proposta pelo Poder Executivo no final de 2014. "A oposição não vai colocar a impressão digital nessa anistia que a presidente nos pede para perdoar essa irresponsabilidade", destacou.

O tucano disse que, se o governo não poupa e gasta mais do que arrecada, é preciso ir ao mercado financeiro para captar recursos. Isso acaba, segundo ele, por elevar a taxa de juros para o cidadão e compromete a vida das famílias com o aumento dos preços, por tabela.

Aloysio Nunes disse que, em vez de cumprir a meta de superávit primário de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB), que seria de R$ 116 bilhões, o governo teve um déficit primário do setor público da ordem de R$ 15 bilhões entre os meses de janeiro e setembro deste ano. "Essa é a triste realidade, a herança maldita que a candidata Dilma Rousseff lega à presidente reeleita Dilma Rousseff", criticou.

O líder do PSDB citou como fatores para essas dificuldades nas contas públicas, segundo ele, o "baixíssimo" crescimento da atividade econômica do País este ano, que vai ficar abaixo de 1%, e a política de desoneração fiscal "indiscriminada".

"Agora, não há dúvida de que a campanha eleitoral, da maneira como foi conduzida, contribuiu para esse resultado", afirmou o tucano, ao justificar a afirmação com o fato de que a presidente ficou 31 dias sem despachar no Palácio do Planalto.

Em carta de demissão, Marta critica economia

• Ministra ressalta avanços alcançados pelo Ministério, mesmo com baixo orçamento e sugere equipe econômica mais independente

- O Estado de S. Paulo

A ministra da Cultura, Marta Suplicy, enviou na manhã desta terça-feira, 11, sua carta de demissão à presidente Dilma Rousseff, conforme antecipou a colunista doEstado, Sonia Racy. "Volto para o Senado Federal para representar o Estado de São Paulo, por mais quatro anos, com muito vigor, energia e com o firme propósito de fazê-lo com amplitude, seriedade e grandeza", afirmou a ex-ministra no documento protocolado na Casa Civil.

A ex-ministra também desejou sorte a Dilma e 'sugeriu' que a presidente escolhesse uma equipe econômica mais independente, experiente e comprovada. "Todos nós, brasileiros, desejamos, neste momento, que a senhora seja iluminada ao escolher sua nova equipe de trabalho, a começar por uma equipe econômica independente, experiente e comprovada, que resgate a confiança e credibilidade ao seu governo e que, acima de tudo, esteja comprometida com uma nova agenda de estabilidade e crescimento para o nosso país. Isto é o que hoje o Brasil, ansiosamente, aguarda e espera.

Marta também ressaltou os avanços alcançados pelo ministério apesar do baixo orçamento destinado à pasta. "Em meio a inúmeras demandas e carências orçamentárias do Ministério da Cultura, focamos nosso trabalho em valores que nos são preciosos: inclusão da população na produção de cultura e ampliação do acesso aos bens culturais", afirmou.

Como antecipou o Estado, a não continuidade de Marta já tinha sido decidida no primeiro turno das eleições, quando a ministra encampou um movimento pela substituição da candidata Dilma Rousseff pelo ex-presidente Lula, o chamado 'Volta, Lula'. O movimento não vingou e Dilma se reelegeu, o que a colocou em xeque no cargo.

Substitutos. Para o lugar de Marta, já estão sendo cogitados alguns nomes. O ex-ministro Juca Ferreira, que foi convocado às pressas no final de agosto pela presidente para ocupar cargo de comando na campanha, agora é um dos principais nomes para voltar a ocupar a pasta. Um sinal da recuperação de seu prestígio ocorreu ontem: um de seus antigos auxiliares, o roteirista e diretor Orlando Senna (que foi Secretário do Audiovisual) também recebeu a comenda da Ordem do Mérito Cultural.

Há um porém: Ferreira, que é secretário de Cultura de São Paulo, está empenhado em ajudar a fazer da gestão de Fernando Haddad um modelo de administração moderna (muito das próximas eleições depende disso no PT). Ele pode decidir permanecer, ocupando-se de indicar um nome e articular uma filosofia de trabalho na pasta.

Outro nome que surge com força é o do atual presidente do Instituto Brasileiro de Museus, Ângelo Oswaldo de Araújo Santos. A presidente gostou da forma habilidosa, diplomática porém firme, como Angelo Oswaldo conduziu a nova legislação de museus do País, sancionada há um ano. Ele também já foi secretário de Estado da Cultura de Minas Gerais no Governo de Itamar Franco (1999-2002) e dirigiu o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, IPHAN.

Contra Oswaldo, pesa o fato de que tem ideias predominantemente liberais, e Dilma se comprometeu, com o grupo que a ajudou a recuperar a confiança entre a classe artística, a retornar a inclinação do MinC para um esfera de participação popular e arcabouço vanguardista, mais ousado.

A deputada federal Jandira Feghali (PC do B), aliada importante do governo nas questões culturais, voltou a ter seu nome lembrado. O retorno do próprio Gilberto Gil é uma das soluções que estão sendo mencionadas, como forma de aproximar opostos.

Em recado duro, carta de demissão provoca mal-estar no Planalto

• Tom de carta de demissão da ministra da Cultura surpreendeu ao governo e provocou mal-estar com o Palácio do Planalto

Marcelo Moraes – O Estado de S. Paulo

Na difícil temporada de reformulação de sua equipe ministerial para o segundo mandato, a presidente Dilma Rousseff acaba de receber um ingrediente extra para ampliar suas dificuldades. Na sua carta de demissão, entregue hoje ao governo, a ministra da Cultura, Marta Suplicy, deixou o cargo cobrando o resgate da “credibilidade e confiança” na escolha da próxima equipe econômica.

O conteúdo da carta, revelado pelo Blog da Sonia Racy, mostra uma Marta Suplicy disposta a reassumir sua cadeira no Senado com um discurso bem distante de um natural alinhamento ao governo do PT, seu partido. A futura ex-ministra mira diretamente na direção da condução da economia do País e cobra da presidente que seja “iluminada” para escolher os próximos integrantes da equipe econômica do governo.

O tom da despedida de Marta pegou o Palácio do Planalto de surpresa. Especialmente, porque a presidente está fora do País, em viagem que passará hoje pelo Catar e seguirá até Brisbane, na Austrália, onde acompanhará a reunião do G20. Também está sendo considerado por interlocutores da presidente Dilma como bem acima do amistoso e provocou um claro mal estar.

“Todos nós, brasileiros, desejamos, neste momento, que a senhora seja iluminada ao escolher sua nova equipe de trabalho, a começar por uma equipe econômica independente, experiente e comprovada, que resgate a confiança e credibilidade ao seu governo e que, acima de tudo, esteja comprometida com uma nova agenda de estabilidade e crescimento para o nosso país. Isto é o que hoje o Brasil, ansiosamente, aguarda e espera”, diz Marta em sua carta de demissão.

Durante a fracassada campanha petista pelo governo de São Paulo, o PT e o Planalto investiram todas as fichas na tentativa de eleger o ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha. O candidato não decolou e teve um desempenho muito abaixo do esperado. Petistas influentes reclamam que uma das razões de Padilha ter ido tão mal foi o fato de o partido e o governo terem praticamente deixado de lado a ajuda política que Marta poderia dar a essa campanha. Ex-prefeita de São Paulo, Marta ainda é um dos principais nomes do PT em São Paulo e poderá ser novamente candidata na eleição de 2016, embora a tendência clara do partido seja apoiar a reeleição do prefeito Fernando Haddad.

Demissão de Marta Suplicy precipita saída de ministros do governo Dilma

Catia Seabra – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - A saída de Marta Suplicy do Ministério da Cultura precipitou em uma semana o processo de saída coletiva dos ministros do governo Dilma Rousseff.

A pedido da Presidência, a exoneração coletiva dos ministros estava prevista para a terça-feira que vem (18), quando eles entregariam seus pedidos de demissão. A intenção de Dilma é ter liberdade para o redesenho da Esplanada.

Hoje, no entanto, a assessoria da Casa Civil telefonou para os chefes dos ministérios pedindo que entreguem seus cargos já. Essa é uma tentativa de neutralizar o impacto da renúncia da ministra da Cultura, que enviou uma ríspida carta de demissão para a presidente, que está no exterior.

Dilma foi pega de surpresa. A presidente e seus assessores desembarcaram em Doha, no Qatar, por volta de 16h (11h, horário de Brasilia), pouco depois de Marta oficializar em Brasília sua saída.

O Qatar foi a parada escolhida para a presidente dormir antes de seguir, nesta quarta-feira (12), para o encontro do G20 (grupo das maiores economias do mundo) na Austrália.

Membros de sua comitiva em Doha relataram à Folha que só souberam da carta de demissão de Marta quando desembarcaram.

Não se sabe se Marta ao menos telefonou para Dilma, de maneira privada, durante o voo. No entanto, assessores lembram que a presidente estava em Brasília até esta segunda (10), quando a carta de demissão poderia ter sido entregue pessoalmente –como costuma ser a praxe neste tipo de caso.

Economia
No pedido de demissão, Marta afirmou que espera que a presidente escolha uma equipe econômica independente e experiente para resgatar a credibilidade do governo e garantir o crescimento do país.

"Todos nós, brasileiros, desejamos, neste momento, que a senhora seja iluminada ao escolher sua nova equipe de trabalho, a começar por uma equipe econômica independente, experiente e comprovada, que resgate a confiança e credibilidade ao seu governo e que, acima de tudo, esteja comprometida com uma nova agenda de estabilidade e crescimento para o nosso país", afirmou a ministra em sua carta de demissão, encaminhada nesta terça ao Palácio do Planalto.

Marta divulgou a carta em sua conta no Facebook.

A presidente só deve começar a definir os nomes de sua futura equipe na próxima semana. A definição mais esperada é o nome do substituto de Guido Mantega no comando do Ministério da Fazenda. A escolha pode sinalizar mudanças na condução da política econômica.

Entre os cotados para assumir a pasta estão o ex-presidente do Banco Central no governo Lula, Henrique Meirelles, e o ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda Nelson Barbosa. Dilma tem sido orientada a escolher de forma rápida, ainda em novembro, um nome com boa interlocução com a iniciativa privada para atenuar as resistências do setor.

Dilma prometeu divulgar o nome do futuro ministro da Fazenda depois que voltar da reunião do G20.

Senado
Marta retomará sua vaga como senadora por São Paulo, cujo mandato vai até janeiro de 2019.

"Volto para o Senado Federal para representar o Estado de São Paulo, por mais quatro anos, com muito vigor, energia e com o firme propósito de fazê-lo com amplitude, seriedade e grandeza", disse a ministra em sua carta de demissão.

Ela tomou posse na pasta da Cultura em setembro de 2012, no lugar da então ministra Ana de Hollanda. Já foi prefeita de São Paulo (2001 a 2004), deputada federal (1995 a 1998) e ministra do Turismo (2007 a 2008).

Sua substituta imediata na pasta é a secretária executiva Ana Cristina Wanzeler, que também já foi superintendente nacional de repasses da Caixa. Ainda não há nome para ser efetivado ao cargo de ministro.

A saída de Marta da equipe de Dilma já era esperada para as próximas semanas após as eleições.

Contra ela, pesava um jantar que ofereceu a partidários do lançamento da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência. Marta foi porta-voz do "volta Lula".

Ela exonerou os petistas do Ministério para dar lugar ao PC do B. Um incidente, porém, foi decisivo para selar seu destino.

Durante uma carreata na zona sul de São Paulo, Marta se irritou ao saber que seu suplente no Senado, o vereador Antônio Carlos Rodrigues (PR-SP), era quem ocuparia o caminhão reservado à presidente Dilma Rousseff. Para Marta, estava destinado uma vaga no segundo carro alegórico.

O incidente ocorreu em setembro, em Santo Amaro, reduto de Antônio Carlos. Marta subiu no carro de Dilma mesmo assim. Antes bateu boca com o presidente do PT, Rui Falcão, dizendo que ela é quem tem voto na região. Não o presidente do partido.

Falcão -que já foi fervoroso aliado de Marta- levou o caso ao conselho da campanha de Dilma. Disse que a situação era insuportável.

Os petistas se queixavam ainda da tímida participação de Marta na campanha eleitoral. Segundo eles,uma atuação mais apaixonada poderia ter ajudado Dilma em São Paulo, Estado em que perdeu para o então candidato Aécio Neves (PSDB).

Serra
De volta a seu gabinete no Senado, Marta deverá ser vizinha de José Serra(PSDB), senador eleitor por São Paulo, em uma das alas mais nobres da Casa.

O tucano herdou o escritório de Eduardo Suplicy (PT), que perdeu a cadeira na Casa para Serra após 24 anos de mandato. Nos últimos anos, o petista dividiu os corredores da Ala Dinarte Maris com Marta Suplicy.

Estatal expõe ‘maior escândalo’ já visto por TCU, diz ministro

• Presidente do tribunal afirma que os desvios apurados pelo órgão em diversos contratos já passam de R$ 3 bilhões

• Em 2010, órgão colocou a refinaria Abreu e Lima e a Comperj na lista de obras que não deveriam mais receber recursos

Dimmi Amora – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente do TCU (Tribunal de Contas da União), ministro Augusto Nardes, disse nesta terça-feira (11) que as apurações de irregularidades na Petrobras são "o maior escândalo da história do TCU".

Nardes afirmou em entrevista coletiva que os desvios apurados pelo órgão já passam de R$ 3 bilhões em diversos contratos assinados pela companhia petrolífera estatal para a aquisição de empresas, bens ou a construção de novas unidades.

Segundo Nardes, que está deixando a presidência do órgão em dezembro, ele pessoalmente avisou ao governo federal sobre os desvios apurados pelo órgão há alguns anos, mas os alertas do órgão não foram ouvidos.

Segundo Nardes, ele informou os problemas à ex-ministra da Casa Civil Gleisi Hoffmann, que retomou sua cadeira no Senado Federal. Além disso, as conclusões dos relatórios de auditoria também foram mandadas para outros órgãos de controle.

A ex-ministra Gleisi nega que tenha tratado com o presidente do TCU sobre irregularidades na Petrobras: "Conversamos sobre o programa de concessões do governo, conforme foi divulgado à época. Penso que, se o ministro Nardes sabia de algo a respeito da Petrobras, ele deveria, como presidente do TCU, ter tomado as providências cabíveis", afirmou a senadora.

Alertas
Desde 2010 o TCU está alertando o governo sobre contratos problemáticos na estatal, mas os alertas foram ignorados. Em 2010, o tribunal colocou as obras da Refinaria Abreu e Lima (PE) e Comperj (RJ) na lista de obras que não deveriam receber recursos federais em razão da existência de irregularidades.

O Congresso aprovou o dispositivo, mas o ex-presidente Lula vetou a medida e determinou que as obras prosseguissem. Na época, Lula declarou: "O TCU investiga, manda seus engenheiros e seus técnicos, eles constatam algumas coisas e nem sempre o que constatam é verídico", disse em Moçambique.

Agora, o TCU já apontou que os custos dessas duas obras (Abreu e Lima e Comperj) estão pelo menos R$ 2 bilhões acima do valor que deveria ser pago.

Outra irregularidade apontada pelo TCU está na compra da Refinaria de Pasadena (Estados Unidos), em que o prejuízo passa dos R$ 1,7 bilhões. A estatal não concorda em prejuízo nessas operações e está recorrendo das decisões do tribunal.

Nardes revelou que pediu ao novo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) que seja resolvida de vez uma questão jurídica entre o TCU e a Petrobras, que se arrasta há quase uma década.

Segundo ele, a companhia faz concorrências simplificadas por convite, praticamente escolhendo as empresas que vão trabalhar para ela, sem disputa, baseada num decreto. Para o TCU, a estatal só poderia fazer isso se uma lei fosse aprovada pelo Congresso Nacional. Mas a Petrobras conseguiu 19 liminares permitindo que ela realize as concorrências simplificadas.

De 2011 a 2013, a Petrobras assinou R$ 90 bilhões em contratos sem licitação. Levantamento da Folha em extratos de contratos aponta que em 71% dos casos a forma de controle é mais branda, como carta-convite. Concorrências e tomadas de preços respondem por menos de 1% do total.

PT esvazia sessão da CPI da Petrobras, que termina em gritaria

• Sem quórum, não foi possível aprovar requerimento algum nesta terça-feira

Gabriel Mascarenhas - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Numa estratégia para evitar convocações de quadros caros ao partido, o PT esvaziou a sessão da CPI da Petrobras desta terça, que terminou em gritaria e acusações.

Cinco senadores do bloco governista e dois deputados petistas não marcaram presença, frustrando os planos da oposição. PSDB, DEM e PPS queriam tentar limpar suas próprias imagens, depois de revelado na semana passada que a oposição havia feito um acordo com a base aliada para impedir a ida de políticos à comissão.

Carlos Sampaio (PSDB-SP), que confirmara ter presenciado o trato, dessa vez falou ter havido um acordo de procedimento, não um acerto político.

"O relator (deputado Marco Maia, do PT-RS) mentiu, dizendo que tinha um acordo", acusou, dizendo-se favorável à convocação de personagens incômodos tanto para seu próprio partido como para o PT.

A divulgação pela imprensa do compromisso entre opositores e governistas gerou uma crise no PSDB. Aécio Neves chegou a soltar uma nota negando o acordão.

Sem o quórum mínimo --resultado da estratégia do PT-- não foi possível aprovar requerimento algum nesta terça-feira. A reunião terminou em gritaria.

O gerente de Contratos da Petrobras Edmar Diniz de Figueiredo respondia aos questionamentos de Afonso Florence (PT-BA). A oposição anunciou que não faria perguntas a Figueiredo por considerá-lo hierarquicamente distante do processo decisório da cúpula da estatal.

Os opositores pediram a Vital do Rêgo (PMDB-PB), presidente da comissão, para pôr em votação um requerimento determinando a abertura de uma reunião extraordinária. O objetivo era conseguir aprovar convocações.

Neste momento, porém, estava se iniciando a sessão do plenário do Senado. Alertado por senadores do PT e argumentando que comissões não podem funcionar enquanto houver votação no plenário da Casa, Vital encerrou a reunião.

A oposição solicitou que o presidente retomasse a sessão depois de concluídos os trabalhos em plenário. Vital não cedeu e se retirou da sala. Os deputados Julio Delgado (PSB-MG), Rubens Bueno (PPS-PA) e Onyx Lorenzoni (DEM-RS) levantaram-se e, aos gritos, acusaram o presidente da CPI de desrespeitá-los. Os protestos continuaram fora da sala.

Vital do Rêgo estava dando uma entrevista quando foi interrompido por Bueno, Onyx e Carlos Sampaio. Atrás de Vital, o trio voltou a gritar. "Isso é a desmoralização do Congresso, uma vergonha que o senador Vital tem que assumir. Uma farsa que está sendo montada", dizia Bueno.

Na reunião, o deputado Enio Bacci (PDT-RS) disse, sem citar nomes, que foi pressionado por colegas a faltar à sessão sob pena de perder a cadeira que ocupa na CPI.

Se não dá para cumprir a meta, mude-se a regra

• Projeto enviado ao Congresso recorre a "truque" para liberar Executivo da obrigação de cumprir meta de superávit fiscal deste ano. Economistas criticam falta de transparência

Sonia Filgueiras – Brasil Econômico

Incapaz de cumprir a meta de superávit fiscal prevista para este ano, o governo enviou ontem ao Congresso Nacional um projeto de lei que, na prática, o libera dessa obrigação. Levada ao limite, a proposta permite que o governo não faça economia alguma para pagar os juros da dívida pública neste ano (a função do superávit), ou mesmo feche 2014 com um déficit primário, algo que não ocorre desde 1997, início da série histórica do Tesouro Nacional. O projeto elimina o limite de abatimento de R$ 67 bilhões na meta de superávit primário com despesas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e desonerações tributárias, existente hoje na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2014. Pela proposta federal, a totalidade dos gastos do PAC e das desonerações poderá ser descontada da meta.

Até o momento, considerando apenas dados parciais oficiais, PAC e desonerações já somam R$ R$ 127 bilhões, volume muito superior à meta estabelecida, de R$ 80,8 bilhões para o governo central, que inclui os resultados do Tesouro, do Banco Central e da Previdência (correspondentes a 1,55% do PIB) ou R$ 99 bilhões (1,9% do PIB), incluindo estados e municípios. Em nota, o Ministério do Planejamento afirma que o governo entregará algum superávit primário neste ano, mas não define o valor a ser alcançado. O projeto foi mal recebido por especialistas em contas públicas de diversos matizes. O Ministério informa que o Executivo "está comprometido a realizar o máximo superávit primário e ao mesmo tempo garantir a execução de investimentos prioritários e a manutenção dos incentivos à economia nacional, por meio de desonerações de tributos".

A mesma nota informa que a flexibilização foi necessária porque a redução do ritmo de crescimento, experimentada pelo Brasil e por outros países, afetou as receitas necessárias aos investimentos e políticas públicas previstas. Em outro documento — a exposição de motivos que acompanha o projeto enviado ao Congresso — o governo declara que "as políticas de incentivos fiscais e a manutenção do investimento tornaram-se imprescindíveis para minimizar os impactos do cenário externo adverso e garantir a retomada do crescimento da economia nacional". Assim, foi necessário criar "espaço fiscal" para acomodar esses gastos. "A proposta encaminhada consiste em ampliar a possibilidade de redução do resultado primário no montante dos gastos relativos às desonerações de tributos e ao PAC", afirma o texto.

Para o economista Raul Veloso — um dos críticos mais contundentes da "contabilidade criativa" realizada pelo Tesouro nos últimos anos—o que houve agora foi falta de transparência. "É uma estratégia errada de lidar como Congresso. Por que não reduzir a meta claramente, se o governo tem uma justificativa para isso? Um desgaste à toa por falta de transparência", disse. André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, que costuma assumir um tom mais moderado em suas análises, também não poupou o projeto. "O governo, mais uma vez, tenta tapar o sol com a peneira", afirmou. "A presidente Dilma ganhou as eleições com um projeto que inclui preservar a classe média. É legítimo que ela queira preservar determinadas políticas, mas é preciso assumir os custos e lutar abertamente", afirmou.

O custo, no caso, é a produção de um resultado fiscal menor. "A solução não foi clara. Agora, abre-se uma janela de vidro, cria-se um ruído que pode prejudicar o país nas análises das agências de risco", apontou. O ministro da Fazenda, Guido Mantega e o secretário do Tesouro, Arno Agustín, sustentaram que tentariam cumprir o resultado positivo até o mês passado, quando o superavit do setor público transformou-se em um deficit de RS 15,3 bilhões. "A medida retira a restrição para abatimento dos R$ 67 bilhões o que, na prática, libera para que seja abatido qualquer valor. É uma decisão discricionária, tal qual uma série de outras adotada desde a eclosão da crise internacional", aponta o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da FGV-RJ, Gabriel Leal de Barros.

"Ela abre a possibilidade de o governo central acumular um esforço fiscal efetivo (sem descontos de PAC e Desonerações) negativo e, ainda assim, "cumprir a meta". Ou seja, ela é inegavelmente ruim. É uma forma de contornar a restrição orçamentária do setor público", complementou. A discricionariedade excessiva é também apontada pelo economista Mansueto Almeida, integrante da ala mais crítica: "Posso descontar tudo e cumprir a meta. É um truque". Ele critica a falta de transparência. "Na Inglaterra, o setor público está com déficit primário, mas isso foi planejado e previamente explicitado, não é surpresa", exemplificou.

Sessão é encerrada sem votar convocação de Machado

Isadora Peron – O Estado de S. Paulo

Sob os gritos de protesto de parlamentares da oposição, o presidente da CPI mista da Petrobras, senador Vital do Rêgo, encerrou a reunião desta terça-feira sem colocar em votação os requerimentos para convocar o presidente licenciado da Transpetro, Sérgio Machado, e o ex-diretor de Serviços da estatal Renato Duque. Assim que a sessão começou, o peemedebista disse que não poderia votar os requerimentos porque o quórum mínimo de 17 integrantes não havia sido alcançado e determinou que a comissão passasse a ouvir o depoimento de Edmar Diniz de Figueiredo, gerente de contratos da Petrobrás.

Parlamentares da oposição pediram para que, após a oitiva, a CPI convocasse uma sessão extraordinária ainda hoje para que os requerimentos fossem votados, mas Vital do Rêgo encerrou a reunião sem levar o pedido em consideração alegando que os parlamentares precisavam participar das votações nos plenários da Câmara e do Senado.

Para afastar o mal estar causado pela revelação de que membros da comissão haviam feito um acordo para não convocar políticos suspeitos de envolvimento no esquema na semana passada, a oposição veio à reunião desta terça disposta a fazer pressão para levar as investigações adiante.
Logo no início da reunião, o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) pediu a palavra para negar que tenha havido acordo e disse que o PSDB estava disposto a convocar todos os citados nos depoimentos da Operação Lava Jato, inclusive Leonardo Meirelles, laranja do doleiro Alberto Youssef que disse à Justiça que parlamentares tucanos também receberam propina do esquema.

Além de Meirelles, Sampaio defendeu que fossem votados os requerimentos de convocação de petistas, como o tesoureiro da sigla, João Vaccari Neto, a senadora Gleisi Hoffmann e o seu marido, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo.

Quórum
Esvaziada por parlamentares da base aliada, que não compareceram à sessão, as votações dos requerimentos tiveram que ser adiadas para a próxima semana. A manobra foi criticada pelos presentes. O deputado Enio Bacci (PDT-RS) chegou a dizer que sofreu pressão para não comparecer à reunião. "Se na semana que vem eu não estiver aqui é porque resolveram me tirar da comissão porque eu vim aqui dar quórum e votar todos os requerimentos, doa a quem doer", relatou durante a reunião. Sem citar nomes, Bacci afirmou que recebeu "7 ou 8 ligações" até a hora da sessão para que desistisse de participar da reunião da CPI.

Ação do governo terá sequelas, diz Cunha

Raphael Di Cunto – Valor Econômico

BRASÍLIA - Candidato à presidência da Câmara dos Deputados, o líder do PMDB na Casa, Eduardo Cunha (RJ), afirmou ontem que não concorre como candidato de oposição, mas que o governo não deve interferir na eleição do Legislativo sob o risco de causar atritos futuros. "Quando o governo se intromete, assume o ônus das sequelas", afirmou.

Em almoço com deputados do Solidariedade (SD), o pemedebista subiu o tom contra o Executivo, que nos bastidores articula a eleição de outro candidato, do PT ou da base aliada, para derrotá-lo. "Querendo ou não querendo, o PMDB é um partido da base. Querendo ou não querendo, sou o líder do partido. Então à medida que o governo se intromete, não está se intrometendo contra uma candidatura, está contra toda a bancada do PMDB", disse.

Cunha discordou do Palácio do Planalto em projetos sensíveis desta legislatura, como a medida provisória (MP) dos portos e o marco civil da internet, e liderou rebeliões contra as propostas do governo. O desentendimento chegou até ao vice-presidente da República, e presidente nacional do PMDB, Michel Temer, que tem demonstrado publicamente desconforto com a possibilidade de o aliado ser eleito com apoio da oposição.

No almoço, parte do esforço para consolidar o apoio dos partidos do "blocão", o líder do PMDB respondeu a perguntas dos deputados por pouco mais de uma hora, prometeu não travar a tramitação de projetos e pregou a independência dos poderes. "Queremos o equilíbrio para que a Câmara não seja governista a ponto de ser submissa nem que vire palanque para a oposição que inviabilize o país", afirmou.

O blocão é um grupo informal criado no começo do ano para pressionar a presidente Dilma Rousseff na reforma ministerial. O governo atendeu parte dos pedidos e desidratou o grupo, em que restam PR, PSC, SD, PTB e PMDB. Na semana passada, os líderes destes partidos, que elegeram juntos 152 deputados, aderiram à candidatura de Cunha para a presidência da Câmara, e agora consultam suas bancadas para confirmar o apoio.

O governo avalia que é possível reverter o apoio do PR. O líder da bancada, Bernardo Santana (MG), não tentou a reeleição e por isso não terá mandato em 2015, quando ocorrerá a eleição, e a bancada da sigla no Rio de Janeiro, que tem seis dos 34 deputados eleitos, é ligada ao ex-governador Anthony Garotinho, adversário regional do pemedebista. Além disso, o PR ocupa hoje o Ministério dos Transportes e espera continuar com o posto no próximo mandato.

Aliados de Cunha afirmam, contudo, que o apoio já está selado com consentimento do principal líder do PR, o ex-deputado Valdemar Costa Neto, que mesmo enquanto estava preso - foi liberado ontem -, continuava a dar as cartas no partido. A pressão do governo também teria pouco efeito, dizem, porque o voto para presidente da Câmara é secreto.

O grupo do pemedebista aposta na rejeição ao PT para elegê-lo. Entendem que há um desgaste dos petistas devido à defesa intransigente do governo, que é bastante criticado pela falta de diálogo com o Legislativo, e que a postura mais independente de Cunha levará a oposição a desistir de lançar candidato próprio para apoiá-lo.

O PT, por sua vez, aguarda a reforma ministerial para fortalecer uma candidatura própria ou de outro partido da base. "O Eduardo Cunha não é imbatível. Assim como já ganhou votações, também já perdeu em tantas outras", afirma o deputado Pepe Vargas (PT-RS), ex-ministro do Desenvolvimento Agrário. "A Casa tem que ser independente, mas harmônica com o Executivo. Uma candidatura construída no confronto com o governo causa instabilidade", diz.

A bancada petista se reunirá amanhã com os deputados eleitos para decidir a postura no próximo governo da presidente Dilma e discutir um candidato de consenso no partido. Os mais citados no momento são os ex-presidentes da Câmara Marco Maia (RS) e Arlindo Chinaglia (SP), e do líder e vice-líder do governo, Henrique Fontana (RS) e José Guimarães (CE), mas todos já tiveram desgastes com os partidos aliados.

Ricardo Noblat- Tiro ao alvo em Dilma

- O Globo

Desconstruindo o episódio da saída de Marta Suplicy do Ministério da Cultura:

Ela e Dilma nunca se deram bem. Dilma tolerava Marta, indicada para o cargo por Lula. Marta tolerava Dilma porque não tinha outro jeito. Ou melhor: tinha, caso ela quisesse retornar ao Senado, para onde foi eleita. Mas ela não queria retornar. Retorna porque não tem outro jeito.

Marta foi uma das estrelas do PT que mais se bateram pela candidatura de Lula a presidente, este ano. Não escondeu seu empenho. Dilma viu e não gostou. Se Marta não tivesse pedido demissão, acabaria demitida.

Por que Marta não esperou para sair junto com outros ministros que sairão do governo? Porque não queria que sua saída se misturasse com as deles. Saindo antes, ganharia mais espaço na mídia.

Marta mandou sua carta de demissão depois que Dilma viajou ao exterior para não ter que entregá-la pessoalmente. Queria evitar o último contato com a presidente na condição de sua subalterna. E marcar publicamente sua insatisfação.

Para completar, Marta incluiu um parágrafo venenoso em sua carta de demissão. Nele, deseja que Dilma escolha uma equipe econômica independente e de experiência comprovada. Isso quer dizer que a atual não é. E por que não é? Por culpa de Dilma, que não delega poderes.

De resto, uma equipe econômica independente ajudará o governo a resgatar a confiança e a credibilidade que lhe faltam, sugere Marta na carta. Quer crítica mais direta a Dilma? Anteontem, foi outro ministro, Gilberto Carvalho, quem criticou Dilma. De forma mais direta.

Líder acusa presidente da CPMI da Petrobras de ceder a farsa armada pelo governo do PT

Por: Assessoria do PPS

A base do governo Dilma Rousseff (PT), com a ajuda do presidente da CPMI da Petrobras, senador Vital do Rego (PMDB-PB), protagonizou nesta terça-feira um dos mais tristes episódios do Parlamento brasileiro ao impedir, por meio de diversas manobras, a votação de requerimentos de quebras de sigilo de empreiteiras e convocação de políticos, dirigentes partidários, ex-diretores da estatal e operadores do esquema do petrolão. A crítica foi feita pelo líder do PPS na Câmara, deputado federal Rubens Bueno (PR), após a interrupção abrupta da sessão da comissão que ouviu o gerente de contratos da Petrobras Edmar Diniz de Figueiredo, nesta terça-feira (11).

A trama governista para impedir qualquer investigação começou na primeira etapa da reunião, quando o senador Vital do Rego cancelou a votação de requerimentos sob a alegação de falta de quórum. Aos poucos, enquanto o gerente da Petrobras negava qualquer tipo de irregularidade na estatal, a oposição conseguiu viabilizar a presença de 17 parlamentares, o que seria suficiente para a votação. Entre eles, o deputado Enio Bacci (PDT-RS), que denunciou ter sofrido pressão da cúpula de seu partido e do governo para não comparecer à reunião e ajudar a assegurar quórum.

Mais uma vez, o governo agiu para derrubar a sessão. Numa questão de ordem das mais inusitadas já apresentadas no Congresso Nacional, o líder do PT, senador Wellington Dias (PI), acompanhado do líder do governo, senador Humberto Costa (PT-PE), conseguiu do presidente da CPMI a concordância para encerrar a sessão sob a alegação de votação nominal no plenário do Senado. Regimentalmente, a ordem do dia no plenário não impede a oitiva de testemunhas em comissões.

Atropelamento e fuga
Após atropelar abruptamente o andamento da reunião, sob os protestos da oposição, Vital do Rego saiu do plenário da CPMI apressado, e foi seguido pela imprensa e por parlamentares do PPS, PSDB, DEM e PSB. “O senhor encerrou a CPI de forma vergonhosa após receber uma ordem do líder do PT (Wellington Dias). Trata-se de uma farsa, de uma desmoralização completa da CPMI. Primeiro espalharam um versão estapafúrdia de acordo do governo com a oposição. Agora a base da presidente Dilma não dá quórum para votação e conta com sua ajuda para encerrar uma reunião. Isso é inadmissível”, protestou o líder do PPS de frente para o presidente da CPMI. Vital não quis dar explicações e rumou para o plenário do Senado.

Oposição quer votar todos os requerimentos

Em entrevista para a imprensa, os líderes da oposição afirmaram que querem ir até o final com as investigações e pretendem colocar em votação, na próxima terça-feira, todos os requerimentos pendentes, inclusive os que envolvem parlamentares do próprio campo oposicionista e o advogado Leonardo Meirelles, que citou o envolvimento de membros do PSDB no esquema.

“Vamos convocar todos. De nossa parte não há qualquer acordo para blindar A ou B. O governo é que está dando um exemplo de que quer impedir todo tipo de investigação. A presidente Dilma, um dia após ser eleita, afirmou que defendia a investigação ‘doa a quem doer’. Agora, mobiliza sua base para impedir votações e instalar uma farsa na CPMI”, protestou Rubens Bueno.

Os ausentes
O líder do PPS disse ainda que a ausência de parlamentares do PT e de partidos aliados do governo na reunião CPMI da Petrobras foi consequência “da farsa do acordo que se anunciou na semana passada”. O deputado se referia a versão divulgada pelo relator da comissão, Marco Maia (PT-RS), de que políticos seriam poupados das investigações de corrupção na petroleira. Hoje, nem Maia nem o vice-líder do PT da Câmara, Sibá Machado (PT-AC), autor do requerimento para a audiência pública compareceram à reunião.

“Deixamos de deliberar sobre a convocação do senhor João Vaccari Neto, tesoureiro do PT, o homem que reúne a grana da propina na Petrobras e em todas as outras (estatais) para distribuir a seus apaniguados que gastam milhões e milhões em campanhas eleitorais do seu PT pelo Brasil afora”, lamentou Rubens Bueno. “Esse é o Partido dos Trabalhadores, da militância com cifrões aguerridos”.

Outro requerimento a ser votado era o da convocação do ex-diretor de Serviços da Petrobras, Renato Duque, que foi indicado para o cargo pelo PT, partido que, segundo o delator Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da companhia, ficava com 2% dos contratos superfaturados.

A CPMI deliberaria ainda a respeito da convocação de Sérgio Machado, presidente da Transpetro que pediu licença da estatal após seu envolvimento com os desvios ter sido revelado por Costa. Machado era o homem forte do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, na empresa.

Além destes, a oposição queria votar o requerimento de convocação de Leonardo Meirelles e todos os outros pendentes de apreciação, como os pedidos de quebras de sigilo das empreiteiras Odebrecht, OAS, Mendes Júnior, Camargo Correa, Queiroz Galvão, entre outros de autoria do líder do PPS.

Lulopetismo desconstrói Dilma - O Estado de S. Paulo / Editorial

A coisa está pior do que parece para Dilma Rousseff, agora que o PT se garantiu por mais quatro anos no poder. Os graves problemas políticos que ela terá pela frente no segundo mandato que conquistou com escassa margem de votos não moram apenas do outro lado da Praça dos Três Poderes, no Congresso Nacional, mas também a poucos metros de seu próprio gabinete no Palácio do Planalto, onde está instalada, pelo menos até o fim do ano, uma ardilosa quinta coluna comandada pelo ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho.

Em longa entrevista à BBC Brasil, Gilbertinho - como Lula o chama - detonou o desempenho de Dilma, a partir de uma perspectiva petista, mais particularmente a do próprio ex-presidente.
Os petardos de Gilberto Carvalho: "O governo praticou o diálogo nesses anos, mas, para o padrão da sociedade brasileira hoje, há muito que fazer. Sobretudo no diálogo com os principais atores na economia e na política, o governo da presidenta Dilma deixou de fazer de maneira tão intensa como era feito no tempo do Lula esse diálogo de chamar os atores antes de tomar decisões". Quer dizer: a chefe do governo não ouve ninguém para tomar decisões.

Não seria exatamente o ministro encarregado de coordenar os contatos do governo com os movimentos sociais que admitiria a falta de diálogo com eles. Mas a versão de Carvalho sobre o comportamento da presidente é pior do que a da simples falta de diálogo: "Não faltou diálogo, o que faltou no caso dos movimentos sociais foi o atendimento das demandas. A reforma agrária e a questão indígena avançaram pouco. A reforma urbana - as estruturas de funcionamento das cidades, a mobilidade urbana - também não foi o que os movimentos esperavam". Quer dizer: ele, o ministro, cumpre sua parte, mas contrariando o discurso de Lula e do PT, a presidente não prioriza o "atendimento das demandas" populares.

Tratando em particular da questão indígena e da queixa de movimentos ligados à área de que algumas alianças feitas pelo governo comprometeram os avanços, Carvalho foi categórico: "Em nenhum momento foi por conta da Kátia Abreu (senadora do PSD, porta-voz do agronegócio) que deixamos de avançar. Não avançamos porque faltou competência e clareza". Quer dizer: na questão indígena, tão cara ao PT, o governo Dilma foi incompetente e confuso.

É claro que as declarações de Gilberto Carvalho foram extraídas do contexto mais amplo de uma longa entrevista em que, no geral, ele apresenta um balanço positivo do primeiro mandato de Dilma. Mas, ao contrário do que seria de esperar quando se trata de um ministro pelo menos fisicamente próximo à chefe do governo, as declarações selecionadas de Gilberto Carvalho encaixam-se perfeitamente no contexto mais amplo em que foram feitas, são absolutamente categóricas, falam por si. E o que revelam?

Revelam que, obcecado por seu projeto de poder e já de olho em 2018, o lulopetismo está articulado em torno de um duplo objetivo político-eleitoral. O primeiro: partindo do princípio sensato de que uma administração desastrada de Dilma Rousseff nos próximos quatro anos pode botar a perder as possibilidades de Lula se tornar seu sucessor, a facção lulista, inquestionavelmente majoritária, faz pressão sobre a presidente para que corrija os rumos do governo, especialmente o daquele em que se situa a raiz de todos os males - a política econômica. Não é por outra razão que Lula defende a nomeação de um ministro da Fazenda com maior autonomia do que Dilma concedeu a Guido Mantega, para restabelecer a confiança do mercado no governo e o crescimento da economia.

Em segundo lugar, a tarefa de desconstruir Dilma Rousseff - que é exatamente a que Gilberto Carvalho cumpre, agora sem nenhum constrangimento - tem a intenção de estabelecer claramente entre Lula e sua criatura uma comparação favorável ao Grande Chefe, o herói de origem humilde, o único e verdadeiro defensor dos fracos e oprimidos, sempre disposto a abrir os braços e os ouvidos para as reivindicações da massa popular oprimida pela elite perversa. Se Dilma tivesse barba, como seu criador, estaria mais do que na hora de colocá-la de molho.

Merval Pereira - Ecos do "Volta, Lula "

- O Globo

Foi no conforto de uma suíte presidencial em Doha, no hotel The St. Regis, em frente ao Golfo Pérsico, uma cortesia do governo do Qatar ao custo de R$ 30 mil a diária, que a presidente Dilma Rousseff digeriu as secas linhas da carta de demissão de Marta Suplicy do Ministério da Cultura.

Surpreendida, segundo relatos de membros de sua comitiva, com a indelicadeza da ex-ministra, que deixou que viajasse para consumar seu ato, a presidente deve ter juntado na mesma hora o gesto inesperado à crítica do dia anterior de um quase ex-ministro, Gilberto Carvalho, que se queixou da falta de diálogo do governo com os movimentos sociais. Não por acaso os dois, Marta e Gilberto, foram protagonistas do movimento "Volta, Lula", que em meio à campanha presidencial tentou tirar Dilma do páreo para colocar em seu lugar o ex-presidente, temendo o que quase aconteceu, uma derrota para a oposição.

Os dois falam por Lula, mesmo que não tenham sido autorizados expressamente por ele, que quer tocar violino, que é o que sabe fazer: uma guinada à direita na economia, com a nomeação de Henrique Meirelles para a Fazenda, e maior atuação à esquerda com os movimentos sociais. Marta deseja na carta o que diz que "o Brasil, ansiosamente, aguarda e espera", isto é, escolher "uma equipe econômica independente, experiente e comprovada, que resgate a confiança e credibilidade ao seu governo e que, acima de tudo, esteja comprometida com uma nova agenda de estabilidade e crescimento para o nosso país".

Parece até que essa parte foi escrita pelo candidato de oposição Aécio Neves. O fato é que a presidente reeleita Dilma Rousseff nem bem encerrou seu primeiro mandato e se vê cercada de pressões políticas, não apenas da oposição, mas também de sua base de sustentação no Congresso, aí incluído o próprio PT. Nunca se viu no país nos últimos anos de predomínio petista tamanha gana oposicionista, no Congresso e nas ruas. A acirrada campanha eleitoral não teve trégua, e nada indica que terá.

Mas não só de crises com a oposição vêm as aflições da presidente que, como bem definiu o ex-ministro Rubens Ricupero, mais parece uma aluna que passou de ano (mandato) raspando, cheia de dependências a cumprir. Também a base aliada parece disposta a vender caro, figurativamente em alguns casos, na literalidade do termo em outros, o apoio a um segundo mandato que pode levar à derrota em 2018. O PMDB, dividido desde a eleição, quer manter o comando das duas Casas do Congresso, na Câmara com um adversário explícito do Palácio do Planalto, o deputado Eduardo Cunha.

Já o PT se entrega aos radicais que querem responder ao quase empate nas urnas com uma guinada à esquerda, para emparedar o Congresso com uma Constituinte Exclusiva, e a imprensa livre com o controle social da mídia. É interessante como os petistas são capazes de apresentar os que não votaram neles como "representantes do atraso" e "verdadeiros fantasmas do passado", sem admitir que dos que votaram, 48,5% escolheram o candidato que representava a oposição, ao mesmo tempo em que outros 28% optaram por não votar, o que garantiu ao governo uma vitória eleitoral, mas não política. Não é à toa, portanto, que a dita base aliada do governo está em pedaços.

Pressentiam antes da eleição, e constataram na abertura das urnas, que o modelo petista de governar está fazendo água, com problemas agravados pela centralização excessiva e falta de capacidade de negociação da presidente Dilma. Tanto Lula e os petistas que pressionam Dilma para uma mudança de equipe econômica quanto os da base aliada que também querem mudanças, querem mesmo é viabilizar um novo governo, pois sabem que mais do mesmo só levará à derrota eleitoral, que se avizinha a cada quatro anos. Há, subjacente a esse tremor de terra em Brasília, o tsunami que se forma com o processo do petrolão, chegando a sua fase derradeira, que vai mudar a face atual da política brasileira.

Dora Kramer - Ardida como pimenta

- O Estado de S. Paulo

A serem verdadeiras - e devem ser, pois não foram desmentidas - as histórias que circulam há meses sobre a animosidade da presidente Dilma Rousseff em relação à sua ministra da Cultura devido ao engajamento dela no movimento "Volta, Lula", as seis linhas em que Marta Suplicy deseja sucesso a Dilma na formação da nova equipe foram incluídas na carta de demissão como revide. No modelo e estilo escolhidos por ela.

A ministra demissionária simplesmente faz votos de êxito à ex-chefe ressaltando as razões de seus fracassos. Isso de forma sucinta. Nenhuma palavra desperdiçada em parágrafo que soa à ironia daquelas frias, bem pesadas e medidas para serem lançadas no momento em que o (a) remetente considera mais adequado.

Já havia passado o "frisson" inicial da oposição, as atenções voltadas para a formação do ministério do segundo mandato, o clima de pouca confiabilidade na disposição de corrigir o que anda errado, muitas críticas pelos atos que desmentiram as palavras de campanha, a Casa Civil falando em renúncia coletiva para a próxima semana a fim de deixar a presidente à vontade e Marta surpreende o Planalto apresentando antes sua demissão.

Esperou Dilma embarcar para a reunião do G-20. A notícia a alcançou numa escala no Catar. O que não quer dizer que a decisão tenha sido repentina. Marta sabia que o dia D seria esta terça-feira pelo menos desde sábado.

Nas seis linhas que incluiu na carta de despedida, a senadora que agora reassume a cadeira no Congresso diz estar unida "a todos os brasileiros" nos votos para que a presidente "seja iluminada ao escolher sua nova equipe de trabalho, a começar por uma equipe econômica independente, experiente e comprovada, que resgate a confiança e credibilidade ao seu governo e que, acima de tudo, esteja comprometida com uma nova agenda de crescimento e estabilidade para nosso país. Isto é o que o Brasil hoje, ansiosamente, aguarda e espera".

Nada que não se diga todos os dias em toda parte. Certamente tudo o que a presidente não gostaria de ouvir de um integrante de seu governo. Uma coisa é Gilberto Carvalho dizer que ela "falhou no diálogo com atores da política e da economia" ou que o governo não avançou na "questão indígena, na reforma agrária" e deixou a desejar na "reforma urbana" (qual?). Discurso para a militância petista.

Outra é uma senadora do partido, ex-prefeita de São Paulo, ao que consta com pretensões de disputar mandato executivo no Estado em que o PT precisa readquirir forças, sair do governo fazendo questão de deixar registrado o seu aval às críticas que tanto desagradam a Dilma.
Trocando em miúdos os votos de sucesso, temos o seguinte: Marta deseja que a presidente escolha uma equipe econômica independente, experiente e comprovada. Portanto, está dizendo que a atual ao juízo dela é submissa, inexperiente e de legitimidade insuficiente. Logo, quem trabalha com gente assim é autoritário e incompetente.

Em seguida, a ex-ministra lista entre os atributos que considera necessários à futura equipe econômica, a capacidade de recuperar a confiança e a credibilidade ao governo da presidente. Marta Suplicy disse a Dilma o mesmo que a oposição e tantos mais vêm dizendo, contra os quais a presidente reage: que o governo não é digno de confiança nem anda a merecer crédito.

Por fim e, segundo ela, "acima de tudo", Marta vê como imprescindível o comprometimento com o crescimento e a estabilidade na economia. Compromisso este que, por mais que a presidente reafirme, pelo visto a senadora forma fileiras entre a enorme quantidade de brasileiros que não acreditam nas palavras dela.

Muito bem. Que Marta Suplicy tem um plano político está evidente. Resta saber se a divergência limita-se a Dilma ou se estende ao PT.

Igor Gielow - O recado de Marta

- Folha de S. Paulo

A execução pirotécnica da previsível saída de Marta Suplicy do governo Dilma retrata o momento delicado em que a presidente se encontra na relação com o PT e seu mentor, Luiz Inácio Lula da Silva.

Uma ministra da Cultura deixa o cargo com a chefe fora do país e faz críticas à política econômica. Mesmo descontando o voluntarismo de Marta e seus recentes movimentos por espaço próprio, ela vocaliza o recado partidário para uma mandatária que há pouco afirmou não ser influenciada pela opinião do PT.

Se carta de demissão tem um tom de "mimimi", para usar um termo moderninho, o que fica ao fim é a esperança na "iluminação" de Dilma.

Intencionalmente ou não, Marta agiu como garota de recados do lulismo e do combalido PT paulista aos quais é associada. Só estava no governo por Lula, que precisava da máquina associada a ela na periferia paulistana em favor de Fernando Haddad na disputa de 2012.

Ironicamente, ela se firma como opção caso Haddad continue com sua gestão em pandarecos em 2016.

Marta em si é um caso curioso. "Grande dame" do petismo, estranha no ninho na esfera simbólica do partido, ela fez uma gestão elogiada na Prefeitura de São Paulo, mas fracassou nas tentativas de reter o cargo e voltar a ele depois.

No governo federal, o quadro é pálido. Sua marca no Turismo sob Lula foi eternizar a frase "relaxa e goza", bem ao gosto de seu quadro no antigo "TV Mulher" e tão deplorável no contexto da crise aérea de 2007.

Da atual gestão, ficam o populismo paternalista do Vale-Cultura, política fundamentalmente equivocada, e a indisposição com Dilma por entoar o "Volta, Lula" neste ano.

Dilma passou horas recentemente ouvindo conselhos de Lula. Será que ele e seu entorno, a julgar representativo o arroubo de Marta, não se convenceram de que ela foi "iluminada"? É um embate interno, mas central para o futuro imediato do país.

Rosângela Bittar - Governo novo, brigas velhas

• A crítica de Marta à economia é Lula em estado puro

- Valor Econômico

Crises saltam dos armários aos magotes, números ruins, registros de desempenhos sofríveis. É o que dá substância hoje a um quadro confuso, em que o governo novo não começa e o velho vai acertando suas contas de forma atabalhoada. Podem até achar que está, os parâmetros são a própria conveniência, mas não está começando bem o segundo governo Dilma.

Ou é boa medida agendar um encontro com o governador do maior Estado da federação, Geraldo Alckmin, para oferecer-lhe ajuda na solução do problema de abastecimento de água que afeta milhões de pessoas, e tudo fazer para humilhá-lo ao fim da reunião? Foi a presidente Dilma quem avisou que não havia recebido demandas do governo paulista, por isso não se oferecera para socorrê-lo. Diante de quase uma dezena de projetos que lhe foram então enviados pelo governador, reeleito em primeiro turno apesar da exploração do gravíssimo problema da água na campanha, inclusive pela agência federal, Alckmin foi chamado a conversar.

Ao fim do encontro, porém, viu-se que o governador, do PSDB, continuava sendo tratado como adversário agudo. Enquanto ele informava, em entrevista, sobre a reunião com a presidente, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, do PT, convocava a imprensa para dar sua versão da conversa na sala ao lado. A única diferença de conteúdo foi que Miriam Belchior falou sem poupar críticas diretas e indiretas ao governador, mantendo a tensão da disputa eleitoral no Estado onde foi minoritária a votação na reeleição.

Está bem intencionado um governo retomado há 15 dias que dá sinais sucessivos de retaliação, de ironia e de autoritarismo? É o que está acontecendo a todo momento, e muitos do PT, e do governo, agem como se tivessem perdido a eleição.

Na última quinta feira, ao sair de um encontro de celebração da vitória com a presidente Dilma, no Palácio da Alvorada, liderando um grande grupo de eleitos do PT, o presidente do partido, Rui Falcão, mostrou o nível de adrenalina em que ainda mantém a disputa. Ao responder a uma pergunta sobre alhos, veio com bugalhos, para dar mais uma vez sua estocada à imprensa que o partido almeja enquadrar à sua imagem projetada.

Quando convidado a comentar o vídeo que mostrava os gestos do aliado senador José Sarney na cabine de votação, no qual parecia estar votando um 4 como primeiro número (45 era do candidato oposicionista Aécio Neves) o presidente do partido que ganhou o quarto mandato para comandar os brasileiros afirmou que está preocupado mesmo é com as demissões de jornalistas e é por isso que o PT quer fazer o controle da mídia. Resposta tão fora de contexto quanto sem sentido em si mesma, mas um bom exemplar do jeito dos vitoriosos tripudiarem, como se a guerra, inclusive contra a imprensa, fosse moto contínuo.

O governo começou, também, ao ensaiar seus primeiros novos passos pós eleitorais, a divulgar dados represados durante a campanha, e vai-se tomando conhecimento do aumento das contas secretas com gastos de cartão corporativo, aumento do desmatamento, aumento de juros, aumento dos combustíveis, aumento dos preços da energia elétrica, aumento da desigualdade e congelamento da queda da miséria.

A educação, então, que seria uma das vitrines do governo, fez malabarismos para adaptar seus dados à campanha. Só divulgou o Ideb, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, quando as pressões já estavam insuportáveis, pois Minas Gerais, o Estado que foi governador pelo adversário do segundo turno, estava bem situado. Só se conheceu também, depois de passado o perigo, o fato de que o ensino médio não havia atingido as metas mínimas.

Em novo truque contábil, o governo anunciou ontem a solução para outro grande problema da economia: se não dá para cumprir a meta de superavit, elimina-se a meta. Foi o que anunciou, assumindo mais uma vez o papel de encarregada da explicação da má notícia, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior.

Muito presente já nos maus resultados que não conseguiu reprimir antes das urnas, a ministra havia liderado um grupo de quatro ministros de Estado para, num workshop de sábado, no auge da campanha eleitoral, tentar explicar incongruências em dados do IBGE: o governo fez com rigor a correção em décimos da queda da desigualdade.

Na economia, apesar de promessas de mudança, o novo governo apenas radicalizou nos artefatos. Não se pode dizer que começa bem um governo que, enquanto se espera cumprimento de promessas transformadoras, elimina a meta de superávit por lei, empurrando goela abaixo de sua base aliada, pressionada ontem pelo vice-presidente Michel Temer, a votação de mais um truque contábil da política econômica.

Até no PT e no Instituto Lula há alas contrárias aos meios e modos da presidente da República recém eleita para mais quatro anos, como deixa clara a carta de demissão ontem apresentada pela lulista doente, ministra Marta Suplicy (Cultura). Divórcio litigioso.

O diálogo, se é mesmo que vai existir, não começou, nem internamente. A situação parece caótica, e está. A presidente age como se fosse entregar o governo a uma oposição. Estava fora do cargo há quatro meses, reassumiu, nada decidiu, viajou, ficando o Brasil pelo Deus dará. O único empenho registrável é o cuidado em levar adiante o propósito de ter sob controle o Judiciário e o Legislativo, bem como a corte de contas. Seus executivos que ficaram agem provando a intenção de dominar.

O ministro Miguel Rossetto, atualmente na pasta do Desenvolvimento Agrário, que deve ter atuação mais abrangente no segundo mandato, compatível com sua influência na campanha, disse-nos, numa cordial conversa na semana passada, que "as eleições terminaram, mas a disputa política não".

Essa, continua. Como ficou evidente no discurso da vitória da presidente Dilma, nas declarações do PT e suas resoluções de Executiva, como nas reiteradas manifestações do ex-presidente Lula, bem como dos ministros petistas do governo. Governar será um detalhe.

Almir Pazzianotto Pinto - E que postes!

- O Estado de S. Paulo

Encerrado o último ato do drama eleitoral, diante da Nação dividida descortinam-se dois cenários: para os petistas, estamos no melhor dos mundos, como diria dr. Pangloss, o imortal personagem de Voltaire em Cândido, o Otimista. Para os vencidos, o panorama é outro: a crise é geral e profunda. Mas o governo, enquanto puder enganar, se recusará a reconhecê-la em nome de uma política surrealista que, como escreveu Giulio Carlo Argan, "é a maneira de iludir a realidade dos problemas, mediante a ambiguidade e o paradoxo".

Em tediosos debates televisionados, a presidente Dilma Rousseff tentou mostrar o Brasil feliz e sem problemas, semelhante ao jardim do Éden, onde tudo se passaria de maneira ideal, não havendo pecado. A oposição, reduzida no segundo turno à figura de Aécio Neves, em momento algum foi incisiva. Deixando de lado o episódio dispensável da acusação de leviana, do qual prontamente se arrependeu, não demonstrou vigor para ganhar apoio de alienados e indecisos.

Sobre o programa Bolsa Família, a mais desavergonhada de todas as modalidades de corrupção jamais praticadas, Aécio limitou-se a dizer que o apoiava e iria aperfeiçoá-lo.

O resultado do pleito revela, todavia, que o Partido dos Trabalhadores (PT) deixou de ser hegemônico, que é possível derrotá-lo, que o País se encontra exausto após 12 anos de mandarinato petista. Mostrou que mero ensaio de contestação bastou para abalar as estruturas do poder. E isso porque o Brasil que labuta de sol a sol voltou a entrar em recessão, observa o recrudescimento da inflação e percebe a aceleração do desemprego.

Estão à mesa os ingredientes necessários para que novamente conheçamos períodos de instabilidade. A insensata manobra de jogar pobres contra a classe média rachou a sociedade, e a primeira de todas as necessidades consiste no esforço pela reconciliação.

A presidente Dilma e seus conselheiros devem compenetrar-se de que vencer é apenas o último ato do momento eleitoral; no próximo mês de janeiro teremos a abertura de nova temporada. Resta apurar se assistiremos, como plateia, a tragédias, comédias, tragicomédias, dramas, melodramas, farsas, espetáculos de marionetes ou fantoches.

A quem não comunga com as ideias e práticas do petismo cabe a tarefa de se organizar ou reorganizar em partidos atuantes, combativos, incansáveis. Não se deve insistir nos erros cometidos desde o fim do regime militar, quando se iniciou a decadência do velho PMDB, seduzido e envolvido pelo emaranhado de fios desencapados em que se converteu a política dominada pelo fisiologismo, e do qual não se salvaram tradicionais siglas oposicionistas.

Reconhecida a vitória de Dilma Rousseff pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), inócua e ridícula a proposta de auditoria da votação. A presidente venceu e Aécio Neves foi derrotado; caiu com valentia e honra, não tendo motivos para se envergonhar, e bater em retirada.

Disputou em desigualdade de condições e com apoios rarefeitos dentro das suas fileiras, mas não deve depreciar-se. É necessário, porém, reconhecer que a diferença de 3,5 milhões de sufrágios não pode ser creditada à manipulação das urnas eletrônicas, ou a outro expediente ilícito. Ganhou o PT. Assim como para governos estaduais, Câmara dos Deputados e Senado Federal, a vitória nem sempre sorri para os mais bem qualificados.

Já afirmava o sábio padre Antonio Vieira, no Sermão da Epifania: "Dizem que os que governam são o espelho da república; não é assim, senão o contrário, a república é o espelho dos que a governam". De uma forma ou de outra, o governo é o reflexo da sociedade. No passado, em outras eleições, ocorreu semelhante fenômeno, pois na América Latina a derrota do demagogo só consegue demagogo maior. Não disse Ruy Barbosa na Oração aos Moços: "Se o povo é analfabeto, só os ignorantes estarão em termos de o governar. Nação de analfabetos, governo de analfabetos"?

A caudalosa torrente de escândalos ocorridos durante o mandato da presidente Dilma, entre os quais o da Petrobrás, por ora, o maior, indica que a Nação, além de analfabetos e iletrados, possui assustador número de corruptos, identificados e desconhecidos, investigados e por investigar, processados e por processar e - milagre dos milagres - alguns poucos condenados e encarcerados.

De nada adianta chorar pelo leite derramado. Assim como se deve organizar para impedir que venhamos a sofrer golpe branco, na forma de plebiscito destinado a validar a convocação de nova Assembleia Nacional Constituinte, é inadiável que a oposição se mobilize para cumprir o papel que o Brasil lhe reserva nos próximos quatro anos: travar incessante e aguerrida luta contra o petismo.

Quatro anos, entremeados pelas próximas eleições municipais, se passarão num piscar de olhos. O PSDB sempre foi reticente em atitudes e raquítico em militantes voluntários. Caracteriza-se como partido de intelectuais desacostumados ao contacto permanente com as massas. Sem elas, entretanto, jamais terá chances de vencer.

Urge planejar as próximas campanhas, em todo o País. Em 2016 o tucanato será testado. Nesta última eleição presidencial foi derrotado porque lhe faltaram líderes populares, organização, propostas convincentes e, é óbvio, apoio popular. Se pretende vir a ser vitorioso, procure decifrar o enigma norte-nordestino. Política é para profissionais habilitados. Como registrou Edward Hallet Carr: prática, não teoria; treinamento burocrático, não brilhantismo intelectual.


Desconheço faculdade melhor de política do que o movimento sindical. Ali o aluno é graduado, pós-graduado e doutorado. Ali se aprende, praticando, como conquistar e se manter no poder. Que o diga Lula, que confirmou ser capaz de eleger postes. E que postes!

Almir Pazzianotto Pinto é advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST)