segunda-feira, 14 de julho de 2014

Opinião do dia: José Álvaro Moisés

Essa Copa está politizada desde o início. Quando o ex-presidente Lula propôs a candidatura do Brasil, atrelou-a ao desempenho do governo.

As pessoas estão mais críticas, mas também não é uma coisa direta. Não é porque a seleção fracassou que a Dilma vai perder a eleição. Mas elas entendem que, a despeito do clima favorável durante a Copa, o país tem muitos problemas que precisam ser encarados de frente.

José Álvaro Moisés, cientista político e professor da USP. O Globo, 14 de julho de 2014.

Copa sai do campo e segue nas eleições

• Planalto e Fifa alteram protocolos para evitar vaias, mas Dilma Rousseff é hostilizada no Maracanã. Com o fim dos jogos, debate sobre o torneio deve se concentrar na reforma do esporte e no saldo das obras para o Mundial

Denise Rothenburg – Correio Braziliense

A Copa da Fifa deixa os gramados para entrar na eleição. A ordem entre os oposicionistas agora, passado o Mundial, é lembrar que os problemas brasileiros ficaram amortecidos, daí, as vaias à presidente Dilma Rousseff ontem no Maracanã. Da parte do governo, entretanto, a estratégia é ressaltar o sucesso da "Copa das Copas", que conquistou os estrangeiros e deixou ao país não só uma boa imagem perante o mundo, como também uma série de obras, tentando assim minimizar as hostilidades à presidente na abertura e no encerramento do evento.

Ontem, Dilma e seus principais assessores, com a colaboração da Fifa, fizeram tudo o que estava ao alcance para evitar desgastes. A presidente, por sua vez, chegou em cima da hora do jogo, perdendo todo o início da festa de encerramento. A justificativa oficial foi a de que ela saiu tarde do Palácio Guanabara, mas o atraso evitou uma exposição presidencial antes do jogo, como ocorreu no Itaquerão durante a abertura.

Da parte da Fifa, o empurrãozinho para evitar o desgaste presidencial se deu em dois momentos. O primeiro foi fechar a cerimônia de passagem da bola ao comandante do próximo país anfitrião do Mundial, Vladimir Putin, da Rússia. Ali, todos puderam discursar longe dos olhos dos torcedores. Ao desejar sorte para os russos, Dilma tratou mais uma vez de separar a sucesso do Brasil nos gramados da organização da Copa: "Nós, brasileiros, guardaremos a emoção e satisfação de ter realizado um evento muito bem-sucedido, uma Copa que só não foi perfeita porque o hexa-campeonato não veio", disse.

A vaia mais forte à presidente veio logo depois do fim da partida, no momento em que ela entregava a taça ao capitão da seleção da Alemanha, Phillip Lahm. Os técnicos de som chegaram a aumentar o áudio para diluir a hostilidade à presidente e à própria Fifa. Dilma rapidamente passou o troféu ao jogador e se recolheu atrás da equipe, deixando a área da frente para os alemães. Ela ficou apenas três segundos com a taça em mãos. Antes desse momento, Dilma havia sido xingada, quando sua imagem foi exibida cumprimentando o técnico da Argentina, Alejandro Sabella.

Equipe rachada
Se nem todos os dribles da Fifa e da assessoria de Dilma conseguiram evitar as vaias, o sucesso da Copa — aeroportos funcionando, segurança a contento e estádios lotados sem registro de graves incidentes — não impediu arestas na equipe de campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff. As divergências internas vieram por aquilo que alguns petistas consideraram "erro de avaliação": misturar o fraco desempenho da Seleção nos gramados às ações do governo.

Alguns integrantes da equipe de campanha afirmam nos bastidores que a "salada" de futebol com política resultou num post do site Muda Mais, capitaneado pelo ex-ministro de comunicação Franklin Martins, um dos coordenadores da campanha. O artigo traz críticas pesadas à Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e seus cartolas. Dilma não gostou. A presidente tem feito todo o esforço para separar a logística da Copa do resultado no futebol. O post, na avaliação de muitos, traz para dentro do governo o desgaste da Seleção e, em sendo a CBF uma instituição privada, não seria de bom tom a campanha se envolver nesse tema.

Franklin, entretanto, não teria gostado de ataques ao artigo, e a relação entre ele e a presidente ficaram estremecidas. Terminada a Copa, a ordem será colocar a eleição em campo assim que terminar a reunião dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) ao longo desta semana. Depois, será hora de colocar os dois pés na campanha, especialmente, nas gravações dos programas de tevê, a maior aposta da equipe de Dilma para esta temporada eleitoral.

Dilma é vaiada na entrega de prêmios na final da Copa

Jamil Chade e Silvio Barsetti - Agência Estado

A presidente Dilma Rousseff foi vaiada e ofendida com intensidade quando sua imagem surgiu nos telões do Maracanã, durante a entrega das premiações aos melhores da Copa do Mundo. Durante e após a decisão da Copa do Mundo, ela foi hostilizada cinco vezes ao todo por parte do público que compareceu ao estádio.

A manifestação se repetiu quando ela apareceu cumprimentando o técnico da Argentina, Alejandro Sabella e foi mais forte no momento em que Dilma entregou o troféu de campeão para o capitão do time alemão, Philipp Lahm. Nesse instante, as vaias se transformaram num cântico ofensivo à presidente.

Ela ficou o troféu em mãos por apenas três segundos. Antes, quando os alemães recebiam apenas as medalhas pelo título, a euforia da torcida alemã abafou outras vaias à presidente. A música alta no estádio também ofuscou os apupos. Os telões evitaram mostrar a presidente sozinha em meio a outras autoridades, durante a cerimônia.

Volta rápida ao trabalho

• Deputados planejam encerrar o semestre com esforço concentrado para derrubar o decreto do Executivo que submete a conselhos populares decisões sobre políticas governamentais

Amanda Almeida – Correio Braziliense

Depois de um mês em que Copa do Mundo virou sinônimo de férias e de tempo para campanha eleitoral — sem desconto no contracheque —, os parlamentares desembarcam hoje em Brasília para uma provável única semana de trabalho, antes de uma nova debandada do Congresso Nacional. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e o do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), marcaram esforço concentrado para votação de propostas. Além da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), a discussão sobre o projeto que anula decreto da presidente Dilma Rousseff sobre participação popular promete dividir os parlamentares.

Com os olhos dos brasileiros voltados para a Copa, os parlamentares aproveitaram o mês de jogos para se dedicarem à corrida eleitoral, como registraram nas redes sociais ao postarem fotos de visitas às bases eleitorais. Além de cancelarem reuniões deliberativas e comissões temáticas, a apuração da CPI do Senado e da CPMI do Congresso sobre supostas irregularidades na Petrobras praticamente estagnou. Mesmo depois da pouca atividade entre a última quinzena de junho e a primeira de julho, os congressistas ainda mantêm marcadas férias nas duas últimas semanas deste mês.

Oposição e parte da base aliada na Câmara têm como uma das principais metas da semana derrubar o decreto da presidente Dilma que criou a Política Nacional de Participação Popular. O texto prevê a formação de conselhos populares com o objetivo de influenciar em decisões sobre políticas governamentais. Para parte do Congresso, o decreto invade as prerrogativas do Poder Legislativo. O presidente da Câmara, que é contra a proposta, traçou como estratégia marcar reunião extraordinária hoje para garantir mais tempo para análise do texto.

"A prioridade (da oposição) é derrubar o decreto dos conselhos. Além de inconstitucional, ele atinge a prerrogativa do Congresso, o que consequentemente afronta o regime de representação", diz o líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy (BA). Do outro lado do cabo de guerra, o PT diz que a briga é eleitoreira. "O decreto em nada fere a Constituição e o Congresso. Muito pelo contrário. Fortalece a relação da comunidade com o Poder Executivo. A oposição não tem o hábito de ver a população participando diretamente do governo, cobrando, sugerindo, acompanhando", ataca o líder do PT na Casa, Vicentinho Alves (SP). Ele admite, porém, que a base dividida facilitará o trabalho da oposição.

Reajuste de juízes
No Senado, o esforço concentrado começa amanhã. A pauta inclui a PEC dos Magistrados, que tem dividido a Casa. O texto estabelece o pagamento de adicional por tempo de serviço a juízes e integrantes do Ministério Público, na proporção de 5% do subsídio a cada cinco anos de efetivo exercício em atividade jurídica, até o máximo de 35%. Há também um projeto de modernização da Lei de Licitações. Elaborado por uma comissão especial de senadores, o texto estabelece punições para empresários envolvidos em irregularidades em licitações.

Outro desafio dos congressistas é ressuscitar a CPI do Senado e a CPMI do Congresso. Na última, há nada menos que 395 requerimentos esperando análise. "(Na volta) Haverá a mesma dificuldade porque todos sabem que não interessa ao Palácio do Planalto apurar as responsabilidades desses fatos que levaram tanto prejuízo à Petrobras", diz Imbassahy.

Para entrar em férias na sexta, os congressistas têm, segundo a Constituição, que votar a LDO, cuja análise está atrasada e não deve ser concluída esta semana. Nos últimos anos, no entanto, eles não têm conseguido cumprir o prazo, mas tiram férias mesmo assim — o chamado recesso branco, quando, embora não estejam oficialmente de recesso, não comparecem ao Congresso.

"A prioridade (da oposição) é derrubar o decreto dos conselhos. Além de inconstitucional, ele atinge a prerrogativa do Congresso, o que consequentemente afronta o regime de representação"
Antonio Imbassahy (BA), líder do PSDB na Câmara

Presidenciáveis não dizem como vão bancar propostas

• Planos de governo têm 'reciclagem' de medidas bem-sucedidas e pouca inovação

• Dilma se apoia em feitos passados; Aécio promete aperfeiçoar quatro programas dos governos petistas

Fernando Canzian - Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Com muitas generalidades e alguns pontos em comum, os programas de governo dos três principais candidatos à Presidência da República na eleição deste ano não esclarecem o principal: de onde virá o dinheiro para implementar suas agendas, sobretudo em um cenário de crescimento medíocre como o atual.

Um exame dos planos de governo de Dilma Rousseff (PT), Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB) registrados no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) mostra que há pouca inovação e boa dose de continuísmo nas propostas dos três candidatos mais bem colocados nas pesquisas eleitorais.

De novidade, a presidente Dilma propõe pouco. Ao contrário, apoia-se fortemente nas realizações dos dois mandatos de Lula e de um seu para pleitear mais quatro anos e evitar "retrocessos". Na média, sob Dilma o Brasil terá crescido à metade do ritmo dos dois governos de Lula.

Programas do PT adotados por Lula e Dilma também ganham destaque nos planos de Aécio Neves. O tucano cita nominalmente e ainda promete aperfeiçoar nada menos do que quatro deles: ProUni, Ciência sem Fronteiras, Mais Médicos e Minha Casa, Minha Vida.

Aécio diz que padronizará a remuneração dos médicos estrangeiros no Mais Médicos, evitando distorções geradas no governo Dilma, em que cubanos recebem menos do que os demais profissionais.

O programa do terceiro mais bem colocado, Eduardo Campos, é o mais genérico. É forte a influência da vice, Marina Silva, na carta de intenções do PSB. Mas o resultado de promessas e "eixos programáticos" com viés "verde" é que sua agenda se torna bastante inespecífica.
Praticamente inexistem nos programas de governo dos três presidenciáveis ideias de como eles irão financiar o que prometem. Fala-se muito, e quase somente, em melhora de gestão e racionalização de gastos.

Como geralmente gastos sociais e investimentos públicos são calculados como proporção do PIB, o fato de a economia estar crescendo pouco tende a inviabilizar mais recursos em áreas como saúde e educação, sobretudo em programas novos que dependam de dinheiro extra.

Economia
Um dos diagnósticos do mercado para o atual estado da economia é o de que Dilma teria sido leniente com a inflação e desorganizado setores produtivos com políticas pontuais. Sondagens especializadas mostram consumidores e empresários pessimistas em níveis históricos.

Em seu programa, Dilma promete um "novo ciclo" assentado em dois pilares: "solidez econômica e amplitude das políticas sociais". Acrescenta um terceiro, novo: "competitividade produtiva".

Ela promete investimentos em "produção e consumo de massa", mas não diz quem fará isso. E que a política do PT é baseada, entre outros pontos, na redução sustentável da taxa de juros e na inflação baixa e estável.

Dilma assumiu o Planalto, em 2011, com a taxa básica de juros em 10,75% ao ano. Hoje, ela está em 11%. Na semana passada, a inflação rompeu o teto da meta de 6,5% ao ano pela 11ª vez desde sua posse.

Nesta área, Aécio promete levar a taxa de inflação a 4,5%, que é o centro da meta do Banco Central. A partir daí, propõe reduzi-la "gradualmente". Diz que manterá a autonomia do BC e que poupará mais para reduzir a dívida pública --na contramão do que Dilma tem feito.

Eduardo Campos ignora aspectos macroeconômicos em seu programa para se concentrar em "políticas de desenvolvimento sustentável" pouco detalhadas.

Mas, em entrevistas, Campos já afirmou que manteria a meta de inflação em 4,5% ao ano em 2015 e forçaria quedas para os anos seguintes, terminando o mandato sinalizando um percentual de 3%.

Campos também promete adotar a independência formal do BC, concedendo um mandato fixo de três anos para o seu presidente.

As promessas de cada um

• O que os principais candidatos à Presidência querem fazer, se eleitos, mas não dizem como

Dilma Rousseff (PT)

Área Social
Usa os dois governos Lula para dizer que o país continuará progredindo. Promete expandir o Mais Médicos, o Minha Casa, Minha Vida e oferecer mais 100 mil bolsas para o Ciência sem Fronteiras
Quer educação em tempo integral em 20% da rede pública até 2018

Economia
De forma vaga, promete redução dos juros, inflação na meta e rigor fiscal. Prega incentivos a investimentos na produção e no consumo de produtos de massa
Também quer reduzir a burocracia para incentivar o empreendedorismo

Aécio Neves (PSDB)

Área Social
Promete continuar e ampliar ao menos quatro programas criados pelo PT:
Mais Médicos, Ciências sem Fronteiras, ProUni e Minha Casa, Minha Vida.
Promete ampliá-los e aperfeiçoá-los
Quer universalizar o acesso à pré-escola até 2016

Economia
Compromete-se a manter a autonomia do BC e a reduzir gradualmente a meta de inflação, hoje em 4,5%, com intervalo de dois pontos, para mais ou menos
Diz que prosseguirá com a atual política de valorização do salário mínimo

Eduardo Campos (PSB)

Área Social
Na saúde, promete aumentar os gastos com ações tendo como base a receita corrente bruta da União. Na educação, quer erradicar o analfabetismo e avançar na superação do analfabetismo funcional
Outra meta é universalizar a educação a todos em idades entre 4 e 17 anos

Economia
Ignora aspectos fundamentais e destaca política industrial voltada à agregação de valor e valorização de pequenas empresas
Em entrevistas, ele diz que sinalizaria a redução da inflação para 3% até 2018 e patrocinaria a independência do BC

De olho na reeleição, Planalto agora quer virar a página da Copa

• Oposição, no entanto, compara Dilma a Felipão e já chama a atenção para o futuro dos estádios do Mundial

Maria Lima, Mariana Sanches, Ana Paula Ribeiro e Catarina Alencastro – O Globo

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Aliados da presidente Dilma Rousseff querem sepultar o tema Copa do Mundo — e também a derrota da seleção — para evitar que o mau humor dos brasileiros contamine seu desempenho na corrida pela reeleição. A solidariedade da presidente com os jogadores encerrou-se na carta que ela enviou ou grupo ontem, e não há nenhuma intenção de recebê-lo no Palácio do Planalto. Quem acompanhou a presidente ao Maracanã ontem disse que Dilma não se deixou abalar pelas vaias que ouviu no estádio. Segundo fontes próximos a ela, a presidente deixou o local tranquila apesar de ter sido hostilizada mais uma vez, repetindo cenário visto no Itaquerão, na abertura do Mundial.

Segundo o deputado José Guimarães (CE), ex-líder do PT na Câmara, se alguém tentar culpar Dilma pelo mau resultado da seleção, dará um tiro no pé. Para ele, Dilma chamou para si a responsabilidade de organizar a melhor Copa da História e não pode ser responsabilizada pela derrota do Brasil.

— O fato de a seleção ter sido humilhada é responsabilidade unicamente dos jogadores e do Felipão. Não tivemos uma seleção à altura do que o governo realizou fora dos campos — afirmou ele. — A solidariedade que a presidente Dilma teve da população anula qualquer efeito de vaia. Apostaram no caos, e não teve isso. A Copa acaba hoje (ontem), e o assunto também. Vamos virar a página e começar a campanha imediatamente. Amanhã, mãos à obra, militância nas ruas para ganharmos a eleição.

Mau humor só no futebol
O deputado Eduardo Cunha (RJ), líder do PMDB na Câmara, aposta que as atenções vão se centrar agora na participação da presidente na reunião dos chefes de estado dos Brics (Brasil, Rússia, Índia China e África do Sul), que acontece esta semana, em Fortaleza. Para ele, a campanha virá logo depois.

— É necessário virar a página. Os registros da grande Copa que fizemos vão ficar. A frustração que ficará é para a história do nosso futebol. Em poucos dias a campanha dará o tom do debate nacional. É possível que haja mau humor em relação à desclassificação do Brasil, mas também o consciente reconhecimento de que tudo funcionou bem na Copa. Dos aeroportos à hospitalidade e alegria do povo brasileiro — ressaltou, por sua vez, o presidente da Câmara, o deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).

Se, por um lado, os governistas querem virar a página e acham que, mais uma vez, a população vai ser solidária com a presidente pelas novas vaias ouvidas ontem no Maracanã, a oposição diz que a candidata do PT gastou sua bala de prata e não terá o resultado eleitoral esperado se tentar misturar Copa do Mundo com votos.

Um dos coordenadores da campanha do tucano Aécio Neves, o ex-governador Alberto Goldman (SP) classificou ontem a presidente como a grande perdedora por ter tentado “faturar” algo que não é dela: o entusiasmo do povo brasileiro pelo futebol.

— A presidente vai amargar a frustração de todos. Mas tudo isso não define as eleições. O que define é o péssimo governo que ela realiza. Inclusive a herança que a Copa deixa, que será explícita nas próximas semanas: estádios caros e vazios e dívidas dos clubes que não serão pagas.

O deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), um dos coordenadores da campanha do presidenciável Eduardo Campos (PSB) e candidato a governador do Rio Grande do Sul, afirmou, por sua vez, que os 80% de brasileiros que queriam mudança antes da Copa seguirão com esse propósito.

— O governo Dilma é um fracasso. Um retrocesso em relação ao de Lula. Dilma e Felipão são iguais: ultrapassados, teimosos e sem comando.

Na mesma linha, o secretário geral do PSB e coordenador da campanha de Campos, Carlos Siqueira, ressaltou que, independente do resultado da Copa, o eleitorado já deu sinais claros de que deseja mudar de governante.

— A frustração com o resultado não é determinante, e todos lamentamos. O eleitor brasileiro tem muitas razões para votar na oposição e por isso creio que a candidata chapa branca retornará a sua casa em Porto Alegre. Agora o jogo eleitoral começa para valer mesmo.

Economia e propostas definem eleição
Apesar do atrito evidente entre governistas e oposição, cientistas políticos ouvidos pelo GLOBO afirmam que ainda não é possível prever se a boa organização e a repercussão internacional positiva que o Brasil teve ao organizar a Copa pesarão a favor da presidente Dilma. Eles destacam que, por outro lado, houve o fracasso da seleção e que ele talvez possa “colar” na imagem dela. A maioria, no entanto, acredita que o assunto Copa do Mundo será logo esquecido e não deve ter impacto nenhum na campanha.

Vera Chaia, professora do Departamento de Política da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), acredita que o assunto será explorado pela oposição, mas diz que ainda é cedo para saber o impacto que terá.

— É possível fazer dois balanços dessa Copa. O positivo tem como ingredientes a boa organização, os estádios funcionando perfeitamente (mesmo tendo sido concluídos em cima da hora, não houve nenhum desastre) e a diminuição dos protestos. Tudo isso gerou um efeito muito positivo para os prefeitos e governadores e também influencia a imagem de Dilma — destaca ela. — O aspecto negativo foi o fracasso da seleção, que despertou uma série de críticas à CBF e à própria Fifa. Agora que o evento terminou, as manifestações de rua tendem a voltar assim como as cobranças com o dinheiro público gasto e os estádios que se transformarão em “elefantes brancos”. Por isso, ainda é cedo para saber qual dos dois aspectos pesará mais.

Especialista vê saldo positivo para Dilma
Para o cientista político Cláudio Couto, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), o saldo para o governo e para a imagem de Dilma será mais positivo do que negativo.

— Havia uma expectativa ruim sobre a realização da Copa, o que acabou não se concretizando. A reversão de expectativa é sempre mais benéfica do ponto de vista de imagem.

Couto não acredita, no entanto, que a avaliação positiva da Copa possa decidir as eleições, já que as pessoas votarão baseadas em outros critérios.

O professor de ciência política José Álvaro Moisés, da Universidade de São Paulo, vê como inevitável que a organização da Copa influencie na imagem do governo e da presidente.

— Essa Copa está politizada desde o início. Quando o ex-presidente Lula propôs a candidatura do Brasil, atrelou-a ao desempenho do governo.

Para o cientista político, desde o ano passado, com os protestos nas ruas, a população se tornou mais crítica, passando a comparar a organização da Copa com serviços considerados essenciais.

— As pessoas estão mais críticas, mas também não é uma coisa direta. Não é porque a seleção fracassou que a Dilma vai perder a eleição. Mas elas entendem que, a despeito do clima favorável durante a Copa, o país tem muitos problemas que precisam ser encarados de frente — acredita.

Já para Fernando Abrúcio, cientista político também da FGV-SP, a derrota da seleção não deverá ter impacto em Dilma ou na oposição.

— A Copa só teria efeito relevante na campanha se tivesse uma desgraça maior do ponto de vista estrutural. E a verdade é que a eleição reage a estímulos clássicos: economia, propostas e aliados. São esses fatores que definirão a eleição. Nenhum outro.

Dilma evita exposição, mas volta a ser vaiada no Maracanã

• Presidente faz passagem simbólica do Mundial em cerimônia fechada e não assiste à festa de encerramento no estádio, mas é novamente alvo de protestos; mesmo assim, Planalto vê com alívio as manifestações, consideradas mais brandas do que na abertura

Jamil Chade e Silvio Barsetti - O Estado de S. Paulo

RIO - Apesar de todo o aparato da Fifa e do Palácio do Planalto para evitar mal-estar e constrangimento na festa de entrega de medalhas e do troféu para os jogadores da Alemanha, a presidente Dilma Rousseff foi hostilizada cinco vezes durante e após a decisão da Copa do Mundo, ontem à tarde, no Maracanã. Dilma também foi alvo de protestos quando entregou a taça de campeão ao capitão da seleção alemã, Philipp Lahm.

A “blindagem” da presidente, candidata à reeleição, foi organizada após as ofensas que recebeu por parte da torcida no jogo de abertura, na Arena Corinthians, em São Paulo. Dilma desistiu de ir aos demais jogos da Copa e existia até mesmo uma dúvida se ela entregaria o troféu. Ontem, mesmo com uma boa parte das cadeiras do estádio ocupada por estrangeiros, as vaias voltaram.
A cerimônia simbólica de passagem para a Rússia do comando da realização da Copa de 2018 foi feita de forma privada entre a petista, o presidente russo, Vladimir Putin, e o presidente da Fifa, Joseph Blatter. A entidade divulgou fotos e um comunicado, mas sem qualquer presença da imprensa ou do público.

Dilma não viu a cerimônia de encerramento da Copa no Maracanã, realizada antes da partida, e não fez o papel de anfitriã na tribuna de honra do estádio, onde estavam Putin e a chanceler alemã, Angela Merkel, além de outros chefes de Estado. Os dois acompanharam por 18 minutos a apresentação de dançarinos que mostravam aspectos da diversidade musical do País. Blatter ficou ao lado de Putin e Merkel, e dirigentes da entidade lamentavam discretamente a demora da presidente.
Dilma entrou na tribuna quando faltavam 10 minutos para o início da decisão, no jogo em que a Alemanha venceu a Argentina por 1 a 0, na prorrogação.

A presidente brasileira ocupou uma cadeira distante da primeira fila e ficou sentada entre Blatter e Merkel. Ao lado do cartola estava Putin. Toda a cúpula da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) também foi colocada bem distante de Dilma.

Os telões do estádio, como já estava combinado, não mostraram a chegada nem nenhuma imagem da petista durante todo o jogo. Durante o segundo tempo da partida, houve as primeiras manifestações contra a presidente, que foi alvo novamente de xingamentos, a exemplo do já havia ocorrido na abertura do Mundial, no Itaquerão. Após o apito final, ela foi vaiada quando sua imagem apareceu nos telões, durante as premiações aos melhores da Copa e à seleção campeã.

Numa atitude que não passou de protocolar, Dilma ficou com o troféu em mãos por apenas três segundos e foi colocada atrás dos atletas alemães. Mas foi o bastante para a volta das ofensas.
Toda vez que Dilma era vista nos telões, uma música alta se misturava às vaias.

Durante o jogo, a presidente evitou ao máximo contato com os dirigentes da CBF José Maria Marin e Marco Polo Del Nero, que também ocupavam a área reservada. Antes, durante e após a decisão, ela preferiu manter contato com os ex-jogadores Cafu, Bebeto e Dunga e a atacante da seleção feminina Marta. O assunto das conversas era um só: como reformular o futebol brasileiro a partir de agora?
Se de um lado a presidente brasileira evitava exposição, a chanceler alemã Angela Merkel passou boa parte do jogo se exibindo, dando entrevistas e acenando a todos os alemães no estádio.

Alívio. No Palácio do Planalto, porém, a manifestação da torcida ontem no Maracanã foi recebida com alívio. A avaliação é de que as hostilidades, já esperadas, em nada se assemelharam ao que aconteceu no jogo de abertura do Mundial.

Na cerimônia reservada de passagem do comando da organização da Copa para Putin, Dilma exaltou a organização do torneio. “Só não foi perfeita porque o hexacampeonato não veio”, disse a presidente, em discurso. / Colaboraram Tânia Monteiro e Lisandra Paraguassu

Copa não tem a ver com voto, diz oposição

• Aloysio Nunes, vice na chapa de Aécio, diz que eleitores não serão influenciados pelo Mundial

Lígia Formenti - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Candidato a vice na chapa do tucano Aécio Neves, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) disse ontem que o "legado da Copa" - candidata à reeleição, a presidente Dilma Rousseff tem dito que o Brasil realizou "uma das melhores Copas" - não terá influência na eleição. "Ganhar ou perder o campeonato não decide eleições e a história mostra isso", disse o senador.

"O que as pessoas querem é qualidade nos serviços, economia estável", afirmou o candidato a vice, que repetiu o discurso que tucanos vêm apresentando nas duas últimas semanas, o de que Copa não influencia eleição. "São coisas distintas." Aloysio disse não ter visto a carta da presidente endereçada à seleção brasileira, divulgada ontem, na qual ela volta a defender mudanças no esporte, "dentro e fora dos estádios", e exalta a Copa no Brasil. "(Não vi), mas, claramente, é uma jogada de marketing: ela já quis explorar a vitória, apareceu naquela foto estranha, imitando o gesto do Neymar", afirmou. Para o candidato a vice, nenhuma dessas estratégias terá resultado prático.

"Aeroportos que eram ruins melhoraram, mas ainda estão longe de ter um bom padrão. O atraso das obras foi considerável e isso não será esquecido."

Para ele, o sucesso da Copa não está relacionado à organização. "Foi o clima da qualidade dos jogos, das torcidas."

A candidata do PSOL à Presidência, Luciana Genro, avaliou que o legado da Copa é a demonstração de que foi feito um uso indevido do futebol para grandes negócios, beneficiando algumas empresas. "O PSOL foi o único partido contra a lei da Copa e isso agora se mostra correto."

'Rejeição'. Questionado sobre as hostilidades à presidente ontem, no Maracanã, Aloysio Nunes disse não ter ficado surpreso. "É um sinal claro de rejeição. Se ela é vaiada em locais onde há um controle absoluto do público, o que esperar num estádio?".

Até a conclusão desta edição, os principais adversários de Dilma na corrida presidencial, Aécio Neves e Eduardo Campos, não tinham comentado o término do evento nem as hostilidades à presidente. / Colaborou Ayr Aliski

Com reajuste de até 17% energia pesa no bolso do brasileiro

• Depois da redução de 2013, conta de luz tem reajuste de até 17% e traz riscos para a inflação

Ramona Ordoñez / Bruno Rosa – O Globo

RIO - Os consumidores brasileiros estão pagando um preço muito alto pela redução de 20% nas tarifas de energia elétrica feita pelo governo federal no ano passado. O desequilíbrio financeiro no setor provocado pelas medidas impostas para forçar a queda nas tarifas, somado à operação a plena carga das termelétricas em decorrência da forte estiagem, está batendo nas contas de luz, cujos reajustes já chegam a dois dígitos. De acordo com cálculos feitos pelas consultorias especializadas em energia Safira e Thymos, os aumentos médios nas contas de energia dos consumidores residenciais neste ano devem ficar entre 16% e 17%, o que praticamente anula a redução do ano passado. E em 2015 será pior: o reajuste ficará entre 21% e 25%.

O mapa dos aumentos no Brasil
Alguns analistas consideram que esses reajustes podem servir para pôr mais combustível na inflação e fazer com que ela feche 2014 acima do teto da meta perseguida pelo Banco Central (BC), ou seja, superior a 6,5%. Segundo a MB Associados, as contas residenciais de luz devem acumular avanço de 17,4% neste ano, o que faria o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado pelo BC, fechar 2014 com alta de 6,7%. Até junho, as contas de luz acumulam aumento de 4,98% e, nos últimos 12 meses, de 8,01%.

Até agora, 27 altas de dois dígitos
Segundo o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, a energia se tornou o grande vilão dos preços no ano. Ele também endossa a avaliação das consultorias do setor e diz esperar aumentos ainda mais significativos ao longo de 2015.

— Nós estamos com IPCA de 6,7% este ano porque os alimentos devem ajudar um pouco no segundo semestre, o que tem sido a grande sorte do governo depois do choque da seca no começo do ano. Contamos ainda com uma piora no câmbio caso a presidente Dilma Rousseff seja reeleita, o que deve pressionar no último trimestre de 2014. Para o ano que vem, mantemos nossa projeção de IPCA de 6,8% — explica Vale.

Já para o banco ABC Brasil, o IPCA deve terminar este ano em 6,4%, abaixo da meta. Porém, são esperados mais reajustes nas tarifas em 2015, o que deverá elevar o impacto da energia residencial no índice de preços. Pelos cálculos do banco, se a alta ficar em torno de 21% no ano que vem, as contas de luz devem pesar 0,6 ponto percentual no índice de preços. Este ano, a contribuição das tarifas deve ficar em 0,4 ponto.

E o consumidor já sente no bolso o custo da energia mais cara. De acordo com levantamento feito pelo GLOBO na base de dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), das 34 concessionárias que já tiveram os seus reajustes autorizados entre janeiro e 4 de julho deste ano, 31 aumentaram seus preços. 

Desse total, 27 distribuidoras tiveram altas acima de dois dígitos, com percentuais que variam de 11% a 36,54%. Isso significa que, até agora, cerca de 43,2 milhões de residências já pagam mais caro pela conta de luz. Até dezembro, ainda haverá reajuste em outras 30 distribuidoras de energia. A Light só deve divulgar seu reajuste em novembro.

Segundo a Aneel, os aumentos concedidos às distribuidoras estão atrelados aos “custos com compra de energia”. Por causa do baixo nível dos reservatórios, as usinas térmicas — que têm um megawatt/hora (MWh) mais caro em relação às hidrelétricas — vêm sendo acionadas desde o ano passado. Além disso, como algumas empresas de geração (Celesc, Cesp, Copel e Cemig) não aderiram ao processo de renovação das concessões, previsto na medida provisória 579, as distribuidoras ficaram com parte de sua energia descontratada, sendo obrigadas a recorrer ao mercado à vista, no qual os preços chegaram R$ 822 o MWh.

— A desaceleração, tanto da economia como do setor de serviços, pode minimizar esse choque tarifário que vamos ter — afirma Luis Otavio de Souza Leal, economista-chefe do ABC Brasil.

Fábio Cuberos, gerente de Regulação da Safira, destacou que, apesar dos elevados aumentos que estão sendo concedidos pela Aneel neste ano — o reajuste médio entre as 31 distribuidoras está em 15,43% até julho —, as tarifas ainda estão represadas. O executivo explicou que os custos adicionais com as usinas térmicas em 2013, que seriam repassados ao consumidor neste ano, foram diluídos em quatro anos a partir de 2015. Além disso, o impacto nas tarifas do empréstimo de R$ 11,2 bilhões, feito por meio da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), via consórcio de bancos, para as distribuidoras em abril, só será repassado às tarifas em 2015 e 2016.

— Os reajustes que vêm por aí a partir do próximo ano serão bem mais salgados, porque já vão partir de uma base muito elevada, fora o reajuste normal que seria dado — ressalta Cuberos.

O executivo da Safira considera, no entanto, que o mais preocupante é o fato de que os problemas do setor continuam. As distribuidoras ainda têm dificuldades no fluxo de caixa e já usaram todos os R$ 11,2 bilhões disponibilizados pelo consórcio de bancos. Para arcar com os contratos de maio, as empresas não tiveram recursos suficientes, o que levou o governo a postergar para o fim deste mês o pagamento de R$ 1,3 bilhão.

E já se pensa em um novo financiamento, no valor de R$ 2 bilhões. Cuberos ressalta que, apesar de as distribuidoras terem reduzido sua exposição ao mercado livre, ainda estão sendo obrigadas a comprar no mercado à vista cerca de 700 megawatts (MW) médios.

— Um dos motivos das dificuldades financeiras das distribuidoras é o fato de comprarem essa energia no mercado à vista por um preço muito elevado, por causa dos reservatórios baixos. O custo da energia tem ficado alto no mercado livre — afirma Cuberos.

Tarifa em patamar de 2014, só em 2020
Apesar de o preço no mercado livre ter caído para R$ 674 o MWh atualmente, os preços tendem a se manter em patamares elevados devido à falta de chuvas. Essa é a avaliação de Ricardo Savoia, diretor da Thymos, que lembra que haverá reajustes até 2018, já que o pagamento dos empréstimos foi escalonado para os próximos anos. Para 2015, Savoia diz que o aumento nas tarifas pode chegar a 25%.

— A evolução das tarifas é crescente. Só entre 2019 e 2020 voltaremos para o patamar de preços de 2014. Nos próximos cinco anos estimamos um aumento de R$ 80 bilhões no custo de energia, com a falta de chuvas, os atrasos das obras e o processo de renovação das concessões. Mas os custos podem ser ainda mais significativos se as condições climáticas continuarem adversas, e as térmicas permanecerem operando a pleno vapor a partir de 2015 — afirma Savoia.

No ano, taxa de investimento deve cair até 5%

Vanessa Jurgenfeld e Tainara Machado – Valor Econômico

SÃO PAULO - O fraco desempenho do setor industrial e a deterioração da confiança dos empresários desde janeiro está levando economistas a revisar suas projeções para o investimento em 2014. Algumas estimativas, que no início do ano eram de uma alta de até 4% para a Formação Bruta de Capital Fixo (medida das contas nacionais do que se investe em máquinas e equipamentos e na construção civil), se transformaram que prognóstico de queda significativa, próxima de 5%, e ajudam a explicar a piora do cenário para crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano.

No ano passado, a taxa de investimento do país apresentou crescimento de 5,2%, segundo dados revisados do IBGE. Confirmada a expectativa para este, será a pior retração do investimentos no Brasil desde 2009. Uma redução nos investimentos neste ano também significará que 2015 vai se iniciar em ritmo lento.

Para alguns economistas, além do aumento do pessimismo entre os empresários, o fim de incentivos para aquisição de bens de capital também contribui para piorar os prognósticos para o investimento neste ano. Apenas entre janeiro e maio, a produção de bens de capital caiu 5,8%, enquanto a atividade industrial como um todo encolheu, em média, 1,6%. As compras de bens de capital do exterior também caíram significativamente: até maio, o país reduziu esse tipo de importação em 3,32%, segundo a Funcex.

Até agora são decepcionantes Tanto o desempenho da construção civil quanto a performance do ramo de bens de capital - e as previsões para o restante do ano continuam pouco animadoras. Nas estimativas do Bradesco, o setor de construção deve mostrar queda de cerca de 3% no 2º trimestre, seguindo uma queda de 2,3% já ocorrida no 1º trimestre do ano, nos dados para elaboração do PIB.

Já o nível de produção do ramo de bens de capital se encontra próximo ao de 2012 e, em relação ao mesmo período do ano passado, a queda atinge 7,6%. Em parte, essa retração é influenciada pelo desempenho ruim de caminhões e ônibus, que mostram recuo de 27,7% em relação ao mesmo período do ano passado. Mas existem outros fatores, como o ritmo menos acelerado adotado pela Petrobras nos seus investimentos neste ano.

"No Brasil não há terceira via em eleição presidencial"

Entrevista
Cesar Romero Jacob. Cientista político da PUC-Rio

"Nas eleições presidenciais, não existe a terceira via. O que existe é o terceiro colocado", sentencia o cientista político da PUC-Rio Cesar Romero Jacob, para explicar o motivo de PT e PSDB terem protagonizado a disputa eleitoral nas últimas eleições. Um dos motivos da polarização deve-se ao fato de os dois partidos estarem fortemente enraizados em São Paulo, maior colégio eleitoral do país. "Quem não tem base eleitoral em São Paulo, tem muita dificuldade de compensar fora do Estado", argumenta Jacob, que pesquisa a geografia do voto nas últimas eleições. Apesar da força tucana, o cientista político adverte que Aécio Neves só conseguirá chegar ao segundo turno se o ex-presidente Fernando Henrique conseguir aparar as arestas entre o senador mineiro, Geraldo Alckmin e José Serra, retomando a política do café com leite. Sobre a Copa do Mundo, Jacob diz que ela não influenciará as eleições, já que não houve grandes problemas no evento. "A Copa deu certo, não houve problema em aeroportos e estádios. O desastre veio de dentro do campo", analisa.

Eduardo Miranda – Brasil Econômico

O sr. acha que pode haver uso eleitoral e algum benefício nas urnas em função dos resultados da Copa do Mundo?

Todo mundo tentou usar a Copa nos últimos meses, inclusive a oposição. Aécio Neves disse, há alguns dias, que o governo tentou usar o Mundial, mas ele também fez isso. A crítica que vimos era em relação ao gerenciamento e à administração diante das pressões da Fifa. Mas a Copa deu certo, não houve problema nos estádios nem nos aeroportos. O desastre veio de dentro do campo. Havia uma descrença em relação à seleção, mas uma derrota como a sofrida para a Alemanha não era esperada.

O atual cenário aponta, mais uma vez, para a polarização entre PT e PSDB nas eleições presidenciais. Por que isso acontece?

São Paulo tem um terço do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro e um quarto do eleitorado. Quem não tem base eleitoral em São Paulo, tem muita dificuldade de se compensar fora do estado. PT e PSDB têm bases fortes ali, por isso polarizam. Numa eleição, não se pode ter votos só em São Paulo, mas não se pode ter votos apenas fora do estado. Maluf só tinha votos em São Paulo, Brizola não tinha votos em São Paulo, mas tinha fora.

São exemplos de dois casos que não foram adiante, não venceram eleições presidenciais. São fortes as chances de segundo turno?

Depende do sucesso de Fernando Henrique, padrinho político de Aécio Neves em São Paulo, em conseguir fazer com que José Serra e Geraldo Alckmin virem a página do ressentimento e entrem na campanha presidencial. Se isso acontecer, a vida da Dilma ficará muito difícil. Os tucanos mineiros estão dizendo aos paulistas que essa é a vez de Minas Gerais assumir o poder, depois de o PSDB ter perdido a eleição presidencial com candidatos paulistas nas três últimas eleições (Serra em 2002; Alckmin em 2006; e, novamente, Serra, em 2010).

Aécio já tem um candidato a vice paulista, o senador Aloysio Nunes...

Mas a história nos mostra que duas vezes o pacto das elites políticas do país, a chamada política do café com leite, entre Minas e São Paulo, foi rompido pelos paulistas. Em 1929, quando esperávamos, pela lógica da alternância no poder, que os mineiros comandassem o país, Washington Luís rompeu esse acordo e lançou o paulista Júlio Prestes. Getúlio Vargas se aproveitou dessa briga, associou-se aos mineiros e o resultado foi a Revolução de 30. Daí até 1945, o governo de Vargas foi um condomínio entre mineiros e gaúchos. Os paulistas só voltaram ao poder em 1994, com Fernando Henrique, justamente pelas mãos de Itamar Franco, um mineiro. No meio do caminho, quando Itamar esperava pela sua indicação, retomando a política do café com leite, Fernando Henrique surge com a emenda da reeleição. Depois de 1929, essa é a segunda rasteira na elite política mineira.

Diante da situação de polarização, como o PT entra nessa história?

Em 2002, Lula repete Getúlio, buscando aliança com os mineiros, tendo José Alencar, seu vice, de Minas Gerais. É o operário e o empresário, o dono da força paulista e o mineiro. Lula faz a política do café com leite. O PSDB está fazendo agora, e com atraso, o que Lula fez com Dilma, a mineira radicada no Sul e que teve um paulista como vice. Ele estava mandando um recado às elites dos respectivos estados. Aécio está fazendo o mesmo. Ele repete a estratégia do Lula de 2010.

Ter um vice paulista significa que Aécio está deixando o Nordeste para Dilma?

Para ele, o fundamental é ganhar em Minas e São Paulo. Se ele ganhar bem nesses lugares, o grau de energia necessária nas outras regiões será menor.

E como fica a situação de Eduardo Campos nesse cenário?

Costumo dizer que no Brasil não existe a terceira via, o que existe é terceiro colocado das eleições presidenciais. E não há nada em comum entre os terceiros lugares nas últimas seis eleições. Tivemos Leonel Brizola (PDT) em 1989; Enéas Carneiro (Prona) em 1994; Ciro Gomes (então no PPS) em 1998; Anthony Garotinho (então no PSB) em 2002; Heloísa Helena (PSol) em 2006; e Marina Silva (PV) em 2010. Não são iguais, não há nada em comum entre eles — nem partidariamente, nem no ponto de vista político, nem nas bases territoriais. Não é como a extrema-direita francesa, em que Marine Le Pen tem votos em determinada região do país, ou como os verdes na Alemanha. Não é assim que funciona aqui. Por outro lado, em vez de alavancar, Marina está atrapalhando Eduardo Campos. Tudo o que ele quer fazer, ela quer o contrário. Além disso, há uma disputa entre as três principais elites nordestinas: a baiana, a pernambucana e a cearense. O que significa que Campos pode não ter boa votação na Bahia e no Ceará.

Marina, então, não agrega?

Os votos de Marina em 2010 não eram de Marina. Aliás, cada terceiro colocado tem uma conjuntura diferente. No caso de Marina, ela reuniu os insatisfeitos com José Serra, que escondeu Fernando Henrique de sua campanha (agora temos Aécio exaltando os 20 anos do Plano Real); os insatisfeitos com o governo do PT, que não foi suficientemente radical; os verdes, que tinham Marina como candidata; e os evangélicos, para quem ela não fez campanha voltada para eles, mas que votaram na ambientalista. Marina é a vice que nenhum presidente quer ter. É diferente de Marco Maciel com Fernando Henrique; de José Alencar, que criticava os juros altos para os empresários, mas certamente combinado com Lula; de Michel Temer, que é um bombeiro e ajuda a apagar os problemas do PMDB para se manter na base aliada do governo. Se Campos vai negociar com o agronegócio, ela diz que com o agronegócio não pode.

Eduardo Campos tem em seu programa de governo a proposta de candidaturas avulsas.

Num cenário em que temos mais de 30 partidos, uma proposta como essa só faz fragmentar ainda mais. A história mostra que isso não deu certo. Candidatura avulsa foi a de Fernando Collor, em 1989, tendo o PRN como partido de aluguel. A candidatura do Collor foi uma aventura. Essa medida do Campos pode ser uma tentativa de deixar Marina contente, até para uma eventual candidatura dela, que ainda não tem partido legalizado. Mas ela vai se eleger e montar seu partido depois?

O Pastor Everaldo (PSC), em algumas pesquisas de intenção de voto, tem se aproximado de Eduardo Campos. Ele pode forçar o segundo turno?

Ele pode conseguir atrair um bom número de evangélicos, já que é o único candidato religioso à Presidência da República. Mas evangélicos candidatos a cargos majoritários tem piso alto e teto baixo, ou seja, uma rejeição muito grande do eleitorado não-evangélico. Se ele fizesse a política pelo partido, e não pelas igrejas, não significa que não teria o apoio delas. Quando a questão da religião é de foro íntimo, não há problema. Fernando Henrique Cardoso é agnóstico, mas não fez proselitismo do ateísmo em sua campanha. O problema é quando isso se mistura com a máquina das igrejas.

Em que medida o Pastor Everaldo pode ser uma alternativa a Dilma, Aécio e Campos?

Dilma, Aécio e Campos são muito próximos. Os três têm compromissos com as agendas dos últimos 30 anos. Na ordem cronológica, a saber: a proposta da democracia durante a ditadura; a estabilização da economia na década de 90 — os três candidatos são formados em economia e defendem meta de inflação, taxa de câmbio flutuante e superávit primário — e, por fim, a redução da miséria, que aconteceu mais agudamente nesses últimos 12 anos. Eles podem fazer isso de forma diferente, mas têm o mesmo compromisso. Dilma foi presa política, Aécio e Campos são de famílias cujos avôs lutaram contra a ditadura. Isso acaba abrindo espaços e agendas à esquerda e à direita. Na direita, temos o Pastor Everaldo. Mas ele está a serviço de quem? É claro que ele está a serviço da construção de seu partido. Mas pode estar, também, a serviço de Dilma ou Aécio, para enfraquecer Marina. Há espaço para uma campanha de perfil conservador. Ele tentará demarcar essa posição.

No Rio de Janeiro, é possível que o governador Pezão abra espaço para o pastor em seu palanque. Ele se beneficia disso?

Sim, porque ele provoca uma fragmentação dos evangélicos no Estado, que tem mais dois candidatos evangélicos ao governo do Rio. Everaldo é da Assembleia de Deus, o deputado federal Anthony Garotinho (PR) é presbiteriano e o senador Marcelo Crivella (PRB) é da Igreja Universal do Reino de Deus. Presbiterianos tendem a não fazer esse vínculo da religião com a política, o famoso "irmão vota em irmão". No caso do Garotinho, como político, ele sempre transitou no mundo evangélico pentecostal, e estes estão na teologia da austeridade, que é também típica da Assembleia de Deus, onde está Everaldo. Já na Igreja Universal, do Crivella, é o contrário, é a teologia da prosperidade. A Assembleia está presente na área mais pobre da região metropolitana do Rio. Ali, é mais difícil, inclusive para o candidato, defender a teologia da prosperidade. A teologia da prosperidade significaria uma certa visão de consumo que a Igreja Universal não condena.

Há uma possibilidade de junção dessas vertentes evangélicas em segundo turno, tanto no Rio quanto no cenário nacional?

Sempre. É novamente a ideia de que "irmão vota no irmão" e não na política, se é que ainda é possível falar de programas partidários, diante da chamada "bacanal eleitoral" que estamos vivendo no Estado. Quando não há o "irmão", os evangélicos se dividem entre os diversos candidatos. Pelo menos a partir da eleição do Lula, em 2002, foi assim. Eles foram para o colo de Fernando Henrique, porque achavam que o PT era o partido da Igreja Católica, já que havia integrantes da legenda com origem na Teologia da Libertação.

Há uma relação do discurso petista de ascensão da classe média coma teologia da prosperidade da Igreja Universal?

Não existe esse vínculo. O Brasil transitou nos últimos 30 anos com agendas não da política, mas da sociedade. A transição da ditadura para a democracia não era uma agenda política, mas social, que foi aproveitada por Tancredo Neves. Mas não há também democracia consolidada com inflação alta, agenda que pertenceu aos anos 90, porque, numa economia muito desorganizada, é difícil não ter tentações revolucionárias ou golpistas, pelo grau de desespero das pessoas — essa foi a agenda de Itamar e Fernando Henrique. Em seguida, pelos anseios sociais, veio a constatação de que de nada adiantaria democracia e economia estável num país desigual, e aí temos os programas de Lula e Dilma, no sentido de reduzir a desigualdade acentuada. São três etapas, quase em processo, das exigências da sociedade. A redução da miséria e o aumento real do salário mínimo, agendas do PT, permitem que a classe C vá ao shopping. É aí que a Igreja Universal está focada.

Candidatos evangélicos, em geral, têm rejeição entre os eleitores que não são religiosos?

Não necessariamente. Marina Silva e a deputada Benedita da Silva (PT-RJ) conseguem fazer uma campanha mais ampla, mesmo sendo evangélicas, porque não fazem política com esse viés. Elas podem não ter feito campanha voltada apenas para o segmento, mas não significa que o segmento não fez campanha para elas. Importante ressaltar que estamos falando de evangélicos pentecostais, porque os evangélicos históricos pensam na mesma linha da Igreja Católica, que tanto pode ser tucana, petista ou socialista, e que acha que é melhor não levar para a igreja uma divisão que está fora dela.

A Igreja Católica não orienta o eleitor religioso, então?

Na eleição, o que a Igreja Católica faz é defender princípios. Pontualmente, ela pode se colocar contra algo. E, ainda assim, há diferenças entre a igreja de João Paulo II e Bento 16, papas conservadores, e a igreja do Papa Francisco, que é mais progressista.

Há chances de temas como aborto e casamento gay entrarem no debate presidencial, como aconteceu em 2010?

Aborto, sim. Casamento gay, acredito que não, na medida em que o Papa Francisco defende mais tolerância com os gays e, consequentemente, não haveria respaldo do Vaticano para uma demonização do tema. Quanto ao aborto, ele atinge setores da Igreja Católica, mas nenhum dos três candidatos (Dilma, Aécio e Campos) são a favor do aborto, quando a discussão não é relacionada à saúde pública. Aborto pode aparecer de forma mais polêmica na campanha do Pastor Everaldo.

Há outros temas polêmicos na esfera moral e religiosa que podem aparecer?

Acredito que não. Eutanásia, células-tronco e pena de morte não estão na pauta da campanha eleitoral no Brasil.

Mas a religião entra em pauta no caso de uma disputa mais acirrada de segundo turno entre Dilma e Aécio?

Isso é difícil de prever, porque pode ser provocado por terceiros. Em 2010, o assunto foi provocado pelo processo eleitoral, por manifestações do bispo de Guarulhos. Com exceção de uma resposta mal dada num debate, acredito que a religião pode aparecer mais em decorrência do apoio que os candidatos podem vir a ter de tal ou qual igreja. Em princípio, os candidatos não abordarão temas polêmicos. Percalços de campanha sempre podem existir, claro. E essas polêmicas podem vir mais das redes sociais, com temas constrangedores para todos os candidatos.

Voltando à Copa, a oposição e a população podem querer responsabilizar o governo pela derrota da seleção brasileira?

Ainda não está claro que interpretação irá prevalecer por parte da população em relação a essa derrota. No momento, ela está tentando entender o que aconteceu. Depois, ela vai querer respostas e soluções. A crítica à CBF (Confederação Brasileira de Futebol) e ao futebol brasileiro vem bem antes desse resultado e é suprapartidária. O que pode acontecer — e isso vai além do pleito de outubro, já que a Alemanha levou 10 anos para reformular seu futebol — é o governo ser capaz de dar início à reformulação do futebol brasileiro. Isso, sim, pode ter algum tipo de influência na eleição.

O governo pode exercer alguma influência nas mudanças da CBF?

O ministro do Esporte, Aldo Rebelo, está tendo o cuidado de que essa questão não seja apenas do governo e está tornando esse debate suprapartidário. A Dilma não tem relações com o Marin (José Maria Marin, presidente da CBF) e não há como colocar a responsabilidade da CBF no colo dela. As forças, tanto no governo quanto no Congresso, tendem a empurrar o problema para a CBF, sobretudo diante do fato de que o Felipão (Luiz Felipe Scolari, técnico da seleção) não assumiu o erro e credita tudo à "pane dos seis minutos", coloca a culpa nos jogadores e se exime do problema.

A falada CPI da Copa na oposição perde a força diante do bom resultado fora de campo e do mau resultado da seleção?

A CPI da Copa, assim como a CPI da Petrobras, não passa de um factóide. Os parlamentares irão para as campanhas, haverá um esvaziamento do Congresso nos próximos meses. Além disso, muitos dos estádios estão em estados governados pelo PSDB. CPI demanda tempo, e os deputados e senadores estão, neste momento, preocupados em salvar a própria pele e se eleger em outubro.

Diante do resultado da seleção, o slogan Copa das Copas ainda faz sentido?

A Copa das Copas faria sentido caso a seleção tivesse conquistado o hexacampeonato. Mas Felipão e a CBF não fizeram o dever de casa. Não foi por outro motivo que Dilma tirou de circulação esse slogan. Do ponto de vista do futebol, a Copa das Copas virou o "Desastre dos Desastres". Apesar de a história recente do país mostrar que não existe relação entre o desempenho da seleção no Mundial e o resultado da eleição, o que acontece agora é que tivemos uma Copa em casa. E a Dilma teria se beneficiado, sim, de um resultado positivo no futebol.

O governo se beneficia como fato de a Fifa ter sido exposta a partir do desvendamento da máfia da Match, responsável pela venda de ingressos dos jogos?

Isso não vira voto. O grande legado poderá ser a reformulação do futebol brasileiro. Se o legado for a reformulação do que é criticado há muito tempo, isso pode se tornar benefício. Por outro lado, tem gente dizendo que um dos legados terá sido desmascarar a Fifa. Mas isso foi a Polícia Civil do Rio de Janeiro. Esse conluio entre dirigentes da Fifa e a empresa associada desmonta a arrogância do "Padrão Fifa". É o padrão "Pifa". Problema com a venda de ingressos, agora explicado, problemas com a comida nos estádios... a Fifa sai arranhada. Mas Dilma não tem como faturar em cima disso.

Ricardo Noblat: Dilma deixou de ganhar

- O Globo

“Meu governo é padrão Felipão”. Dilma, no último dia 1º

Juscelino Kubistchek foi um presidente da República “pé quente”. No seu período de governo entre 1956 e 1961, o saltador Adhemar Ferreira da Silva sagrou-se bicampeão olímpico, a tenista Maria Esther Bueno celebrou o seu primeiro título no torneio de Wimbledon, o Brasil foi campeão mundial de basquete, Éder Jofre conquistou o título de campeão mundial de boxe, e a Seleção ganhou a Copa do Mundo.

O que quero dizer com isso? Nada. Lembrei de Juscelino ao ver uma fotografia onde ele acompanha pelo rádio a Copa do Mundo de 1958. A televisão ainda não transmitia os jogos. Getúlio Vargas, a quem Juscelino sucedera no cargo, costumava fazer comícios em estádios de futebol no Rio. Foi o primeiro presidente a aproximar a política dos esportes na tentativa de obter maior apoio popular.

Coube a Juscelino inaugurar o hábito de presidentes receberem em palácios a Seleção que voltasse vitoriosa de uma Copa do Mundo. Além de condecorar os jogadores, Juscelino posou para fotografias ao lado da taça batizada de Jules Rimet em homenagem a um antigo presidente da FIFA. A seleção que fosse tricampeã ficaria com a taça em definitivo. Isso levou 41 anos para acontecer.

O Brasil foi bi em 1962 durante o governo do presidente João Goulart. E tri em 1970 quando o país atravessava a fase mais violenta da ditadura militar de 1964. O então presidente, general Garrastazu Médici, frequentava o Maracanã em dias de clássicos. O Brasil crescia a taxas elevadas. A Seleção visitou Médici em Brasília. A taça Jules Rimet acabou roubada da sede da CBF em 1983. Nunca mais apareceu.

Fernando Henrique Cardoso tirou casquinha duas vezes de vitórias da Seleção. A primeira em 1994 quando se elegeu presidente e a Seleção foi tetracampeã. A segunda em 2002 quando recepcionou a Seleção pentacampeã no último ano do seu segundo governo. O atacante Vampeta deu uma cambalhota na rampa do Palácio do Planalto. Fernando Henrique levantou a atual taça ao lado de Cafú e Felipão.

Seleção derrotada jamais foi admitida no endereço mais importante da República. Nem sequer para ser consolada. É possível que uma mulher presidente tenha a sensibilidade que faltou aos seus antecessores. Quando nada porque se orgulha, e com razão, de ter ganhado a Copa travada fora dos campos. Tudo funcionou a contento. A Copa está sendo reconhecida como a melhor da História. E Dilma não joga futebol.

Logo, não pode ser culpada pelo mais vergonhoso desempenho da Seleção desde que o Brasil virou uma pátria de chuteiras.É verdade que lhe faltou a prudência demonstrada por Lula. Alguém por aí viu Lula em algum estádio? Oito novos estádios bastavam. Atraído pela ideia de dividir a taça com Dilma, Lula bancou a construção de 12. Alguém por aí viu alguma foto de Lula torcendo em casa pela Seleção? Nem isso.

Dilma foi obrigada a se expor. Poderia ter feito isso somente duas vezes – na abertura da Copa e na entrega da taça ao novo campeão. Mas caiu na tentação de tirar proveito político de uma Seleção que capengou feio desde o seu primeiro jogo. Agora, acende velas para que as próximas pesquisas de intenção de voto não lhe tragam más notícias. Aposta na capacidade do brasileiro de separar o que ela ensaiou juntar.

A verdade é que o destino foi ingrato com Dilma. Mesmo que nada perca com a Copa alguma coisa ela deixa seguramente de ganhar. Abrem-se as cortinas e começa um novo espetáculo – dessa vez o das eleições gerais.

José Roberto de Toledo: Volta às aulas

- O Estado de S. Paulo

A Copa acabou e, com ela, o recreio dos candidatos. Hora de separar quem fez a lição de casa de quem, como o time de Felipão, quer ganhar no grito, no choro ou na improvisação.

Não adianta ter sido o melhor do jogo de queimada, ou ter marcado todos os gols na pelada do intervalo das aulas. Quem não estudou para a prova vai repetir de ano - ao menos dois, até a próxima eleição. O que acontece no pátio fica no pátio. E o que acontece no estádio fica no estádio.

A Copa nunca influenciou uma eleição presidencial brasileira. Nem ajudou nem atrapalhou. Mas agora é diferente, dizem uns. "Foi 7 a 1 em casa". "Dilma foi vaiada sei lá quantas vezes". "Suprema humilhação, entregou a taça para o Messi." Ops! Essa parte não houve. Como não houve a catástrofe anunciada.

Primeiro, a desorganização da Copa iria mostrar ao mundo toda a incompetência dos brasileiros.

Depois, multidões iriam queimar o País por causa dos 7 a 1 para a Alemanha. Nada disso. O mundo veio, viu e se convenceu de que, além da fazenda, o Brasil pode ser também seu salão de festas.

O discurso de que um evento extraurna como a Copa é determinante para o voto supõe que o eleitor seja suscetível ao mesmo grau de infantilização com que os pretensos professores de vestiário tratam os seus jogadores. Como se nem jogador nem eleitor fossem capazes de discernir, por si próprios, o que deve ser feito em campo ou na urna.

Àqueles que torcem, em público ou em privado, pelo impacto da Copa na eleição vale lembrar que o Brasil foi campeão do mundo cinco vezes apesar dos seus técnicos, não por causa deles. Ou alguém acredita que Felipão foi mais importante que Ronaldo/Rivaldo, que Feola foi mais determinante do que Pelé/Garrincha, que Parreira fez mais do que Romário/Bebeto?

O eleitor é pragmático, egoísta e cada vez mais maduro. Por isso, assim como Copa se ganha em campo, com jogadores suando e craques brilhando, eleição se ganha com estratégia, discurso afinado com a vontade do eleitorado e candidato amassando barro, beijando criancinha - além de muito dinheiro e algum tempo de propaganda na TV.

A Copa foi um intervalo. Mudou o humor do País? Sim, para melhor, enquanto durou. Foi um carnaval de um mês. Mas todo folião sabe: a vida é o que volta na Quarta-feira de Cinzas. No Brasil, todo torcedor soube, sabe e saberá diferenciar futebol de política - com exceção de quem torce por partido.

Acabou a Copa, começa a eleição.

O campo é favorável à oposição. O desejo de mudar predomina em pelo menos dois terços da arquibancada. É tão insuperável que até a campanha da situação incluiu a palavra "mudança" no slogan de Dilma. O "Mais Mudança" é uma espécie de gerúndio político-marqueteiro. Sugere que mudança já há. E joga na confusão com os motes adversários. O de Aécio Neves é "Muda Brasil". O de Eduardo Campos, "Coragem para Mudar".

A combinação aleatória do verbo mudar nos cartazes das campanhas de situação e oposição mostra que discurso, sem prática, é vazio. Por isso o desafio dos candidatos e seus marqueteiros nesta eleição será mais difícil do que em eleições anteriores. Não basta conhecer, é preciso convencer.

Em 2010, bastou Lula mostrar que Dilma era sua candidata para elegê-la. Desta vez isso não será suficiente - nem para ela, nem para Aécio, nem para Eduardo. Não basta aparecer e se tornar conhecido da grande maioria. O vencedor será aquele que conseguir convencer o eleitor de que ele ou ela é o mais apto a promover as mudanças que o País precisa e deseja.

Isso pressupõe interpretar o que é esse desejo de mudança. Não é mais emprego, apenas. É emprego de qualidade. Não são mais médicos, apenas. É atendimento eficiente em hospitais e postos de saúde.

Não é mais educação, apenas. É um ensino que qualifique e dê vantagens competitivas para quem aprende. Ou seja, não basta trocar Daniel Alves por Maicon.

Valdo Cruz: Padrão Copa

- Folha de S. Paulo

A Copa acabou e com ela o sonho de sermos hexa dentro de casa. Ganhou a Alemanha, prêmio ao planejamento, ao melhor time. Agora, como dizem dez entre dez brasileiros, tudo volta ao normal.

Gostaria que acontecesse exatamente o contrário. Prefiro a anormalidade da Copa do Mundo, que deveria ser nosso estado natural e, para alguns setores e pessoas, é.

Durante 32 dias, o Brasil encantou estrangeiros e brasileiros. Tudo funcionou bem melhor do que antes. Aeroportos, segurança, estádios, recepção, tudo num ritmo que não deixou nada a desejar.

Claro que houve incidentes, um viaduto caiu, a segurança falhou em alguns jogos, filas em estádios, mas, no balanço geral, o país ganhou com estilo o jogo fora das arenas.

Ou seja, quando queremos e precisamos, sabemos fazer bem. Agimos como um bom anfitrião. Que pinta a casa, reforma o quarto de hóspede, reforça a geladeira e melhora o astral para receber aquela visita tão esperada, que vem de longe e que queremos tanto que volte.

Aí, fica a pergunta. Por que não deixar a casa arrumada para seus habitantes diários e não só para visitantes ocasionais? Que tal tratar o vizinho da mesma forma que encantou os turistas estrangeiros?

Que tal nossos governantes dedicarem, todo santo dia, o mesmo zelo pelos serviços públicos demonstrado durante a Copa para dizer ao mundo que, sim, somos capazes?

Esse é o desafio. Tornar o "padrão Copa" vivido nas últimas semanas em algo normal, símbolo brasileiro para todos brasileiros. Acabar com os soluços de excelência provocados por eventos extraordinários.

Para isso, temos de aprender com nossos erros e não ficarmos embriagados com o sucesso momentâneo. No final, tudo funcionou bem, mas no sufoco, aos trancos e barrancos.

Aí está a queda do viaduto de Belo Horizonte como exemplo negativo da correria. Na Olimpíada do Rio, tudo pode ser melhor. Sem sofrimento.

Renato Janine Ribeiro: Vai ter Copa nas eleições?

• Depois da queda, uma eleição sem entusiasmo

- Valor Econômico

A pergunta que estes dias mais se ouviu foi se nossa derrota na Copa influirá nas eleições. Traduzindo: se Dilma será prejudicada pela performance da seleção. A maioria das respostas que li não é racional, só eleitoreira. Mas, para melhorar a discussão, devemos colocar a questão da mudança no poder sob a perspectiva de nossas primeiras três décadas de ininterrupta vida democrática.

Cada vez que o Brasil passou por uma mudança política significativa, estes trinta anos, foi uma epopeia. Em vários sentidos da palavra: um empreendimento enorme e difícil, comparável talvez à guerra de Troia ou à aventura portuguesa dos Descobrimentos; um momento de fortes emoções, dúvidas, questionamentos; uma discussão sobre os destinos nacionais e de cada um; o uso de recursos literários, como na Ilíada ou nos Lusíadas, consagrando uma coletividade. Desta vez, não. Desde junho de 2013, vivemos na incerteza. O que parecia garantido - a reeleição de Dilma - já não o é. Nenhum dos três candidatos entusiasma, ao contrário dos dois grandes líderes épicos que foram Fernando Collor e Lula (as virtudes de Fernando Henrique são outras, estão na moderação, na prosa).

Passamos por uma temporada épica, a mais forte de todas, no final da ditadura. Durante meses, manifestamos nas ruas nossa repulsa ao regime de força, à imoralidade que é privar o povo do direito de decidir. Em 1984, não passaram as Diretas-Já, mas elas produziram uma democracia de alta qualidade, que em poucas décadas se mostrou capaz - dentro da lei - de afastar um presidente acusado de corrupção, de vencer a inflação, de promover uma maciça inclusão social e de ampliar o alcance dos direitos humanos.

Em 1989, os três candidatos mais votados, Collor, Lula e Brizola, propunham mudanças radicais na política que vivíamos, e não por acaso o governo Collor começou e terminou na elevada linguagem da quase-tragédia, com vastas emoções e pensamentos imperfeitos. Já FHC foi eleito em 1994 no bojo da menos épica das epopeias, que foi o triunfo do real sobre a inflação, da moderação sobre a inflamação, da prosa sobre a exaltação; mas essa foi uma tarefa difícil, quase hercúlea. Na eleição de Lula, em 2002, tivemos a fala belíssima do menino pobre, que na propaganda televisiva terminava gritando "Viva o Brasil!", depois de expor uma agenda inteira de mudanças no país.

Nada comparável se vislumbra hoje. E no entanto pode ser que vivamos a quarta mudança de direção política do Brasil, em três décadas. Se um candidato de oposição ganhar, será, ao contrário de Collor em 1989 ou Lula em 2002, "sem emoção", para usar as palavras dos pilotos de buggy nas dunas perto de Natal, quando perguntam se você quer descê-las com ou sem emoção, berrando de medo ou em estado semi-zen. Ou pior, será com emoções negativas: não a grande paixão da esperança, mas a medíocre do ódio.

Esta parece ser mais uma eleição contra, do que a favor. Uns votam contra o PT, outros contra o PSDB ou o PSB. Não sabemos ainda quem vencerá, porque tudo pode mudar. O exemplo mesmo da influência da Copa na campanha é significativo. Mentes calmas mostraram que a eleição de 1994, que o candidato governista venceu, teria o mesmo resultado sem o tetra, porque o grande cabo eleitoral de FHC foi o Real, não a Taça; que em 2002, quando Lula venceu pela oposição, o penta não ajudou em nada o postulante pelo lado do governo; mais para trás, que em 1962 a conquista do bicampeonato tampouco salvou João Goulart, e que - único exemplo de manipulação bem sucedida - o tricampeonato de 1970 nada alterou no panorama eleitoral, porque estávamos no pior tempo da ditadura e eleições, bem, eleições...

Este ano, porém, vivemos por um fio: qualquer acidente pode afetar tudo. Ou seja, "não vai ter Copa" nas eleições; elas podem afetá-las assim como qualquer fagulha pode atear fogo numa plantação seca: o problema não é a fagulha, é a seca. Nosso problema não é se a Copa, um desastre natural ou um imprevisto humano causará mudanças políticas: nosso problema é que nossa paisagem não tem horizonte, pelo menos horizonte límpido.

O Brasil não enxerga hoje rumos claros, nem projeto dominante. Em 1984, estávamos fartos de ser tratados como crianças. Conseguimos, feito notável, transformar o fim da ditadura numa grande expectativa de melhora, de festa, lamentavelmente frustrada pela tragédia curta e altamente simbólica da morte de Tancredo Neves e pela tragédia longa e fortemente material da hiperinflação. Em 1989 e 1994, fartos da inflação, apostamos no seu fim, épico na promessa descumprida de Collor, prosaico na mudança efetivada por FHC. Já 2002 foi o ano da festa quase pura, em que preservaríamos o real associando-lhe o social. E agora? Se tivermos a mudança, qual será o projeto, a proposta, o programa? A cada mudança havida, vivemos um sonho, quatro ao todo - Diretas-Já, Collor, o Real e a inclusão social. Hoje nenhum dos postulantes acena com um sonho. É tão significativo que Marina, a "sonhática", seja apenas coadjuvante...

Mudaremos, agora, sem projeto? Mudaremos, sem entusiasmo? Mais me parece que esta eleição, seja qual for seu resultado, marque um fim do que um começo. E não penso em fim do governo do PT, porque a exaustão marca todas as candidaturas. Isso não é ruim, porém. Quase toda mudança histórica de realce passa por aquele momento que Oliver Cromwell, líder da mais radical revolução ocorrida na Inglaterra, definiu em 1650 ao dizer: "Quando começamos, não sabíamos o que queríamos; sabíamos, apenas, o que não queríamos". Este é um trajeto longo, mas que pode ser rico.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

Eleições presidenciais e a plataforma econômica

Não importa o próximo governante, a economia brasileira não deve retomar rapidamente a rota de crescimento

Luiz Fernando de Paula – Valor Econômico

Este artigo analisa a plataforma econômica dos principais candidatos presidenciais. Para tanto, examino brevemente as perspectivas recentes da economia brasileira e avalio a plataforma dos candidatos.

Quanto às perspectivas da economia, há sinais de um certo esgotamento do crescimento puxado pelo consumo, em função da desaceleração na renda, do impacto dos juros elevados sobre serviço da dívida e do comprometimento da renda das famílias. Uma questão central é que os estímulos dados à demanda "vazaram" para o exterior, em função da persistente apreciação da taxa de câmbio, de modo que a indústria não se beneficiou do crescimento do mercado interno, dando origem a um processo de "desindustrialização prematura".

Nossa avaliação é que a desaceleração econômica recente foi resultado de uma política econômica confusa e mal coordenada e ainda de um conjunto de fatores: ameaça de aprofundamento da crise do euro, desaceleração econômica mundial em 2011/12; declínio no crescimento do consumo, atrofia do setor manufatureiro, etc. A adoção de uma política fiscal anticíclica se justificava face ao baixo desempenho da economia, mas veio atrasada e privilegiando isenções fiscais ao invés de gastos públicos. Para completar, não foi comunicada de forma adequada: o governo prometeu que cumpriria integralmente a meta de superávit primário em 2012, mas acabou utilizando artifícios contábeis para alcançá-la.

Há que se ressaltar que houve ganhos sociais importantes nos últimos anos, devido em parte aos efeitos dos ganhos reais do salário mínimo, com evidente melhoria no padrão de vida da população e na concentração de renda.

O desafio para o próximo governo será combinar maior crescimento econômico com equidade social. Contudo, a incorporação social não deve se dar apenas pela renda (via consumo), mas também por meio do acesso aos serviços públicos de qualidade (educação e saúde). A sociedade brasileira impôs suas preferências, tal como expresso nas últimas eleições e em manifestações populares: continuidade do processo de inclusão social e provimento de serviços públicos em "padrão Fifa".

Analisemos agora as plataformas dos candidatos, ainda que não tenham definido formalmente seus programas. Nos concentraremos em Aécio Neves e Dilma Rousseff, por entendermos não haver muita diferença de Eduardo Campos em relação a Aécio, com exceção do seu compromisso de não fazer alteração na legislação trabalhista.

Aécio se apresenta como herdeiro de Fernando Henrique Cardoso, e sua plataforma econômica parece incluir uma política macro convencional - concedendo independência ao Banco Central (BC) - com uma gestão econômica que inclui inflação no centro da meta, superávits primários elevados (cerca de 3% do PIB) e taxa de câmbio flutuante; redução do papel do Estado na economia e concentração de suas atividades nas áreas sociais; maior abertura da economia; redução no papel do BNDES no financiamento da economia; política industrial menos ativa; manutenção da política de valorização do salário mínimo mas desvinculando as transferências previdenciárias do mesmo; e, reforma trabalhista com flexibilização do mercado de trabalho.

A plataforma sugere uma combinação de choque de oferta com políticas de restrição de demanda. Tal como no período do Plano Real, o objetivo é forçar o setor industrial a aumentar sua produtividade via competição externa. Há dúvidas quanto aos efeitos da tal política sobre a continuidade do processo de desindustrialização, mas essa parece que não seria uma preocupação do governo, já que seu objetivo seria ter um setor industrial mais competitivo, ainda que enxuto.


Quanto a Dilma, é difícil avaliar sua plataforma desconsiderando seu primeiro mandato, que teve uma estratégia confusa e vacilante. Acredito que não será um simples "mais do mesmo", mas tampouco haverá mudanças radicais. Possivelmente teríamos políticas monetária e fiscal ortodoxas, mas não tão austeras em relação a Aécio, com superávits primários da ordem de 2,0% e gradualismo na busca da meta de inflação. 

A vinda de um novo ministro, possivelmente mais "market-friendly", favoreceria em tese a melhoria na credibilidade da autoridade econômica. Haveria uma redução no endividamento do Tesouro para financiar o BNDES, busca de maior transparência fiscal, mas o governo não daria independência ao BC. A política industrial deverá continuar ativa. Quanto ao salário mínimo não deverá haver uma desvinculação das transferências previdenciárias, mas alguma mudança na regra de reajuste do salário (PIB per capita mais taxa de inflação). Enfim, a aposta parece ser que o crescimento viria pelo deslanche dos investimentos em infraestrutura combinado com algum crescimento no consumo.

Há contradições na plataforma dos candidatos: a combinação da regra atual de reajuste do salário mínimo com políticas mais austeras indica que Aécio daria com uma mão e tiraria com a outra; em Dilma, a combinação de política macroeconômica ortodoxa com política industrial ativa teria, de novo, resultados pouco efetivos.

A combinação de baixo crescimento com demandas pela melhoria nos serviços públicos tornou a eleição disputada e polarizada entre Dilma e Aécio. Este se favorece do (parcial) esquecimento por parte da população do governo de seu mentor (FHC), marcado pelo sucesso na estabilização de preços, mas também por crises externas, crise do apagão, etc.

Dada a opção por políticas mais ou menos ortodoxa pelos candidatos não creio que haverá uma mudança maior na política cambial, buscando-se uma taxa de câmbio mais competitiva, o que é preocupante dado que o déficit em transações correntes está ao redor de 3,5% do PIB. O contexto de baixo crescimento tem empurrado a pauta econômica em uma direção mais conservadora. A não ser que o cenário internacional surpreenda positivamente, não acredito, qualquer que seja o próximo governante, que a economia brasileira retome rapidamente a rota de maior crescimento.

Luiz Fernando de Paula é professor titular de economia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).