segunda-feira, 14 de abril de 2014

Opinião do dia: Roberto Freire

Ao contrário do que os petistas querem fazer crer, Vargas não era um militante qualquer no partido. Ex-secretário nacional de Comunicação da legenda e entusiasta declarado do famigerado “controle social da mídia”, o vice-presidente da Câmara se notabilizou pelo apoio aos mensaleiros condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em fevereiro, durante a sessão de abertura do ano legislativo, o petista provocou o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, ao erguer os braços, de punhos cerrados, como fizeram seus correligionários no momento em que foram presos. O gesto foi historicamente utilizado como símbolo de resistência política das esquerdas durante todo o século XX, mas acabou enxovalhado pelo PT.

Roberto Freire, deputado federal (SP) e presidente nacional do PPS. “O doleiro e o deputado nas asas da corrupção”, Brasil Econômico, 11 de abril de 2014.

Ex-diretor da Petrobras receberia até 50% por contratos assinados

Consultoria de Paulo Roberto Costa cobrava taxa por negócios fechados com a estatal

Germano Oliveira – O Globo

CURITIBA E SÃO PAULO — A Polícia Federal apreendeu na casa do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, que está preso em Curitiba desde o último dia 20 por conta da Operação Lava-Jato, uma extensa planilha de negócios da Costa Global — empresa de consultoria de sua propriedade que prestava serviços para centenas de fornecedoras da Petrobras. A maioria das consultorias, assinadas depois que ele se aposentou da estatal, em 2012, envolve taxas de sucesso com percentagens que variam entre 5% e 50% dos valores dos contratos assinados pelas empresas com a petrolífera. A PF acha que Costa fazia uso de sua influência política para fechar os contratos de consultoria.

Entre as empresas listadas, está, por exemplo, a empreiteira Camargo Corrêa, que pagaria, segundo a planilha, uma mesada de R$ 100 mil a Costa, num contrato que, até setembro de 2015, vai render R$ 3 milhões ao ex-diretor da Petrobras. A PF suspeita que ele receba o pagamento mensal da empreiteira como uma espécie de contrapartida pelo fato de Costa ter contribuído com a empresa enquanto era diretor da estatal. A Camargo Corrêa é responsável pelas obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, com um contrato de R$ 8,9 bilhões. Esse contrato é citado na Operação Lava-Jato.

As centenas de contratos de consultoria de Costa com fornecedoras da Petrobras atingem volumes vultuosos. Só da Iesa, ele recebe R$ 100 mil por mês, num contrato que terminaria agora em abril. Da Queiroz Galvão, recebeu, segundo a PF, R$ 100 mil por mês. Já a Equador Log pagaria a Costa, até agosto, mais R$ 135 mil por mês.

Na planilha apreendida pela PF, Costa anotava o número do contrato, o nome da empresa da qual recebia mesadas, os valores recebidos e também o nome do diretor da empresa pela qual era contemplado com elevados mimos.

A maior parte das mesadas anotadas por Costa representa 5% dos contratos, mas há casos de 15% e até de 50%, como acontece com a WSA. Na planilha, na linha referente a um contrato com a empresa de dois anos de duração, aparecem anotados os valores “50%/50%”.

O percentual de 50% aparece nas planilhas também em situações em que ele é cobrado para além da taxa de sucesso. É o caso da Astromarítima Navegação S.A., como revelado pelo “Fantástico” neste domingo. Segundo afirmou ao programa o advogado de Paulo Roberto Costa, Fernando Fernandes, neste caso, o valor adicional da taxa de sucesso seria de 50% aplicados sobre 5% que aparecem na planilha, o que daria um total de 7,5%. Mas o “Fantástico” mostrou documentos que revelam que o acordo entre a Astromarítima e a consultoria de Costa especificava que os 50% seriam cobrados sobre tudo que excedesse o valor de R$ 110 milhões. Também ao programa, Alcir Burbon, um dos sócios da Astromarítima, disse que o único contrato que a empresa teve com a Costa Global, do ex-diretor, foi na busca de novos investidores, mas não deu certo.

Ao GLOBO, o advogado disse que seu cliente não fez nada de irregular e que não estaria impedido de intermediar negócios com a Petrobras por já ter cumprido quarentena após ter saído da empresa em 2012. Sobre os 50% que constam no caso da WSA, ele afirmou que seriam 50% sobre um percentual de 5% (que não consta da planilha), totalizando, portanto, 2,5%.

Na última coluna da planilha consta o status da operação: se ela está em andamento ou não. Mas uma expressão chamou a atenção dos policiais. Costa registrou em algumas a frase “sem firma reconhecida”. Os policiais acreditam, portanto, que esses contratos nem registrados são e que Costa receberia as benesses “por fora”, alimentando seu caixa-dois.

Na agenda de Costa que foi apreendida pela PF em seu apartamento no Rio, consta ainda uma série de pagamentos feitos “por fora” e inclusive a partidos políticos, sobretudo PP, PMDB e PT. Só para o PP, que o manteve por oito anos no cargo de diretor de Abastecimento da Petrobras, ele pagou, em 2010, R$ 28,5 milhões, dos quais R$ 5,5 milhões foram para o deputado João Pizzolatti. Outros R$ 4 milhões foram para Nelson Meurer.

Costa era tão organizado que toda a movimentação financeira de suas empresas era anotada em planilhas e nos computadores que foram apreendidos em sua casa na Barra da Tijuca. Na planilha de entradas e saídas de valores de 30/11/12 a 3/6/13, Costa revela ter em caixa R$ 3,079 milhões, além de US$ 645 mil e € 279 mil. No dia em que a PF esteve no apartamento de Costa, seus parentes, inclusive filhas e genros, tentaram carregar documentos e pen-drives em sacolas e malas. Costa foi preso e conduzido a Curitiba, aliás, por ter tentando esconder provas.

Mas o que mais chamou a atenção da PF nas planilhas apreendidas é que há uma lacuna com o nome “Primo” (como o doleiro libanês Alberto Youssef é conhecido pela PF), fazendo repasses de grandes quantias de dinheiro a Costa. Os dois seriam sócios em vários negócios de intermediação com fornecedores da Petrobras. Entre 17/12/12 e 15/3/13, Youssef deu “entrada” na conta de Costa com totais de R$ 1,060 milhão, US$ 500 mil e outros € 35 mil. Com esses totais, em junho de 2013 Costa tinha um caixa geral de R$ 4,139 milhões, US$ 1,145 milhão e € 314 mil.

Fora dos padrões de mercado
O professor Fernando Zilveti, da FGV/SP, diz que “taxas de sucesso” de 50% do contrato estão totalmente fora dos padrões do mercado de consultoria para intermediação de contratação.

— Esse percentual não existe. É feito para camuflar o pagamento de um serviço não prestado. Os percentuais normalmente praticados são de 5% a 10%. Quando o contrato é muito alto, pode ser de 1%. Com valores muito baixos, a comissão por intermediação pode chegar a 15%. Um percentual desse (50%) não é compatível com padrão adequado de governança. Isso é totalmente obscuro.

O GLOBO entrou em contato com a Queiroz Galvão ontem à noite, mas a assessoria informou que não conseguiu localizar nenhum diretor. Os responsáveis pelas demais empresas não foram encontrados. (Colaborou Sérgio Roxo)

Aliado de Renan se reuniu com ex-diretor da Petrobrás

Documentos de Paulo Roberto Costa apreendidos pela Polícia Federal revelam contatos com o presidente da Transpetro, Sérgio Machado

Andreza Matais - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Homem forte do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), na Petrobrás, o presidente da Transpetro, Sérgio Machado, manteve encontros com o ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa, quando este já havia deixado a petroleira e operava negócios na iniciativa privada, indicam a agenda e cadernos de anotação do ex-executivo apreendidos pela Polícia Federal na Operação Lava Jato e que estão sendo periciados.

Machado é citado ao menos quatro vezes nas agendas de 2012, de 2013 e, também, em um caderno mantido por Paulo Roberto, quando este já atuava como consultor e empresário do setor petroleiro.

Paulo Roberto está preso na superintendência da PF em Curitiba acusado de integrar um esquema de lavagem de dinheiro que envolve fornecedores da Petrobrás e que seria usado para financiar políticos e campanhas eleitorais do PP, PMDB e PT.

A Transpetro é o braço da Petrobrás em processamento de gás natural e transporte e logística de combustível. Indicado para o cargo ainda no governo Lula, Sérgio Machado se mantém há dez anos e quatro meses no posto com o apoio de Renan.

Na agenda de Paulo Roberto há registros da anotação de celulares de Machado e de uma menção a "curso c/ Sérgio Machado, 5%", ao lado do valor R$ 5 mil e da inscrição "dois meses". A PF tenta decifrar a anotação.

Em julho de 2012, Paulo Roberto, já ex-servidor da estatal, chamou a atenção ao comparecer a uma cerimônia de entrega do navio petroleiro Sergio Buarque de Holanda para a Transpetro. Ao jornal Valor, na época, Machado disse que convidou Paulo Roberto para participar como "pessoa física" ao justificar que ele "teve um papel importante no Programa de Modernização e Expansão da Frota, que prevê investimentos de R$ 10,8 bilhões, na encomenda de 49 embarcações".

O Estado deixou recados, com detalhes sobre o tema da reportagem no celular de Machado, mas ele não respondeu às tentativas de contato.

Padrinho do presidente da Transpetro, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) tem atuado contra a instalação de uma CPI para investigar exclusivamente a Petrobrás proposta pela oposição no Senado. Na última semana, Renan deu parecer favorável a uma CPI ampla, com temas que vão desde contratos da Siemens nos metrôs de SP e do DF e o Porto de Suape, em Pernambuco, que teriam potencial para constranger a oposição.

Dornelles. A agenda de Paulo Roberto também registra um encontro com o senador Francisco Dornelles (RJ), presidente de honra do PP, no dia 25 de maio de 2012, um mês depois de o executivo ter deixado o cargo na Petrobrás.

O PP, ao lado do PMDB e PT, apoiou a indicação de Paulo Roberto na Petrobrás. Dornelles afirmou, pela assessoria, que conhece Paulo Roberto e "sempre o considerou um técnico da maior competência." Mas não informou se houve o encontro.

Conhecido no Congresso como "o homem que resolve", Paulo Roberto teve o apoio de PP, PMDB e PT nos oito anos em que esteve na Diretoria de Abastecimento da Petrobrás, até ser demitido em 2012. Frequentador de gabinetes no Congresso, Paulo Roberto interferia em disputas internas nos partidos pela vaga de líder e financiamentos de campanha.

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Oposição quer ouvir ministra do Planejamento sobre o IBGE

Miriam Belchior deverá prestar esclarecimentos sobre o pedido de governistas para revisar a metodologia do cálculo da renda per capita domiciliar

Gabriela Valente, Catarina Alencastro e Clarice Spitz – O Globo

BRASÍLIA e RIO - A oposição deve apresentar requerimento para convocar a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, a prestar esclarecimentos sobre o pedido de governistas para revisar a metodologia do IBGE do cálculo da renda per capita domiciliar, que culminou na interrupção da divulgação da Pnad Contínua até janeiro. A convocação dividirá os holofotes do Congresso com as negociações para tentar barrar a instalação da CPI da Petrobras.

Além da ministra, os parlamentares querem convocar a presidente do IBGE, Wasmália Bivar, e Marcia Quintslr, a diretora de pesquisa que pediu demissão. Outros 18 servidores ameaçam sair. Segundo Wasmália, Marcia não concordou com a decisão da diretoria de parar a pesquisa devido ao requerimento da base governista para reformular a metodologia e equalizar margens de erro entre as 27 unidades da federação. O objetivo seria não interferir na divisão dos recursos do Fundo de Participação dos Estados (FPE).

O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) deve apresentar a convocação da ministra.

— Iremos tomar uma providência, isso é um absurdo. A intervenção na divulgação de dados do IBGE para fins políticos é característica de ditadura.

— Isso cheira a coisas de Kirchner — criticou o líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP), que deve protocolar na Comissão de Fiscalização e Controle o convite.

Ferreira se referia ao fato de o Indec, o instituto de pesquisas argentino, ter sofrido intervenção branca do governo Cristina Kirchner. Ana Carla Magni, diretora da Assibge, que reúne representantes de servidores do IBGE, também fez um paralelo com a crise no Indec. E afirmou:

— Estamos detectando um problema de ingerência política no IBGE.

Representantes da Assibge passaram o fim de semana reunidos discutindo a crise. O sindicato prepara atos de protesto na quarta-feira no Rio e em outras capitais e deve enviar documento com orientações de conduta aos funcionários.

Líder do PSDB vê tentativa do governo de frear pesquisa do IBGE

Sindicato critica rapidez na decisão do instituto de parar divulgação

BRASÍLIA e RIO - Para o líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP), está claro que o governo quis frear a produção da Pnad Contínua, que vem apontando resultados que podem prejudicar a situação nas eleições. Por isso, afirmou ele, os senadores Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Armando Monteiro (PTB-PE) assinaram requerimento para revisar dados e inviabilizar a divulgação da pesquisa:

— É o jogo do vale-tudo para as eleições. O Gilberto Carvalho (ministro da Secretaria-Geral da Presidência) não disse que ia fazer o diabo para se manter no poder? É isso. Inclusive colocar o pé na garganta do IBGE.

Procurado pelo GLOBO ontem, o senador Armando Monteiro disse que não poderia falar e pediu para ser contatado uma hora depois. Na nova tentativa, o celular estava desligado.

Ana Carla Magni, diretora da Assibge, que reúne funcionários do instituto, criticou a rapidez com que a decisão de parar a pesquisa foi tomada:

— O corpo técnico está com um sentimento ruim. É uma pressa incompreensível.
A falta de respaldo técnico na decisão de interromper a pesquisa foi criticada por especialistas em estatística.

— O Senado não deve entrar na questão técnica. Para legislar sobre questões técnicas tem de ter uma base boa. Não sei o que está por trás. Tendo a achar que é incompetência de quem pediu — afirmou um especialista, que não quis se identificar.

Outro, que também pediu anonimato, criticou:

— Questionamentos sempre houve, sobretudo, com estatísticas que vão distribuir os recursos dos municípios. Outro cenário é alguém de Brasília dizer que não concorda e mudar, ainda não sabemos o que houve.

Futuro de CPI da Petrobras deverá ser definido na terça-feira

Plenário do Senado votará parecer de Romero Jucá (PMDB-RR)

Catarina Alencastro e Gabriela Valente – O Globo

BRASÍLIA - As diversas tentativas de começar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a Petrobras deverão ter um desfecho amanhã, quando o plenário do Senado votará o parecer do ex-líder do governo Romero Jucá (PMDB-RR) para a criação da chamada CPI-Combo.

Além de irregularidades na Petrobras, ela serviria para investigar também o caso de formação de cartel no metrô de São Paulo, que atinge tucanos, e atividades do Porto de Suape, em Pernambuco, que podem afetar Eduardo Campos (PSB).

A oposição defende a CPI exclusiva por entender que ampliar os fatos a serem investigados é uma forma de desviar o foco para, enfim, não apurar. As recentes revelações de que o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa teria montado um esquema de doações para políticos e partidos serão combustível extra para o cenário já inflamado.

- Os novos fatos mobilizam cada vez mais o governo para impedir as investigações de uma CPI. Governistas se dão conta de que esse Paulo Roberto Costa tem uma caixa de Pandora da qual ninguém sabe o que sairá. Seguramente tem muita gente com medo - diz o líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes (SP).

No Supremo Tribunal Federal (STF), a ministra Rosa Weber deu mais tempo ao governo e vai aguardar explicações do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), antes de decidir sobre o pedido de liminar em mandado de segurança da oposição para agilizar a instalação da CPI exclusiva. Numa tentativa de esvaziar a criação de uma CPI, a presidente da Petrobras, Graça Fosrter, foi convencida a depor no Senado, também amanhã.

- Os acontecimentos dos últimos dias mostram a inevitabilidade da CPI. É uma cena ridícula do governo tentar fazer uma CPI para investigar tudo. É só para não investigar nada - reclama o líder do PSOL, senador Randolfe Rodrigues (AP).

Alvo da Polícia Federal, Ecoglobal ganhou bônus de estatal

Contrato de 2009 com Petrobrás previa 'recuperação de efluentes' ao preço de R$ 9,499 milhões

Sabrina Valle - O Estado de S. Paulo

RIO - Investigada pela Polícia Federal (PF) por seus acordos com a Petrobrás, a empresa Ecoglobal Ambiental contou com um pagamento de bônus para um contrato fechado em 2009 com a estatal. Também teve apenas um concorrente na licitação por convite, embora as regras recomendassem um mínimo de três empresas no páreo.

Os serviços de R$ 9,499 milhões eram para "recuperação de efluentes", uma determinação ambiental que a Petrobrás precisou seguir a partir de 2002 após reclamações de reguladores sobre manchas de óleo causadas durante a limpeza de poços de exploração de petróleo.

O bônus relativo à recuperação de afluentes oscilaria de R$ 25 mil a R$ 475 mil, dependendo do prazo de entrega dos serviços. O estímulo para acelerar serviços é comum dentro da Petrobrás, embora o mesmo contrato ressalvasse ser impossível "se determinar previamente o tempo para execução de um serviço daquela natureza.

O sócio majoritário da empresa, Vladmir Magalhães da Silveira, levado sexta-feira pela PF para depor, participou de reunião para discussão do bônus na Petrobrás dia 12 de setembro de 2008. Nesta data, o bônus acordado com gerentes era de 5% do valor do contrato, R$ 475 mil.

Os documentos mostram que o bônus pode ter sido reduzido em 2009, ano em que o assunto chegou à diretoria executiva da empresa. O contrato foi dividido em três lotes e feito por licitação em modelo simplificado: só empresas convidadas pela Petrobrás poderiam participar. A simplificação é permitida por decreto de 1998.

A Ecoglobal venceu o terceiro lote com apenas mais um concorrente, Tetra, enquanto as regras da empresa determinam um mínimo de pelo menos três concorrentes.

Limitação.O jurídico da Petrobrás analisou o caso e decidiu permitir a licitação com apenas dois concorrentes "devido à limitação do mercado" e considerando que houve três convidados, mas o terceiro, Schlumberger, desistiu da disputa.

A Ecoglobal ofereceu preço 27% menor em relação à estimativa da Petrobrás e uma estrutura de preço que a companhia estranhou, convocando a empresa para prestar esclarecimentos em setembro de 2008.

Silveira justificou com a inclusão de gastos com mão de obra e transporte. O item "sistema de tratamento de água oleosa" representava sozinho 44% da planilha de preços por unidade. O preço do item estava 57% acima do projetado pela Petrobrás.

O contrato tinha prazo de dois anos, renováveis por mais dois. As tratativas foram feitas com a Petrobrás por executivos da área de serviços da diretoria de Exploração e Produção, comandada em 2009 por Guilherme Estrella. O contrato foi aprovado pela diretoria executiva em 12 de março de 2009.

PT tenta blindar Vargas e mantém segredo sobre local de depoimento

Objetivo é evitar que o parlamentar seja flagrado ao falar à comissão da legenda

O Globo

SÃO PAULO — O PT vai tentar evitar a exposição do deputado federal licenciado André Vargas (PR) no depoimento que ele prestará hoje à comissão do partido designada para ouvi-lo sobre as relações com o doleiro Alberto Youssef. O objetivo é impedir que o parlamentar seja fotografado ou questionado por jornalistas.

Por causa disso, o depoimento não acontecerá na sede da legenda, no Centro de São Paulo. O local está sendo mantido em segredo. Segundo Alberto Cantalice, um dos três integrantes da comissão, Vargas pode ser ouvido “num hotel, no escritório de alguém ou em um restaurante”.

— Ele está sendo pressionado. Queremos que tenha tranquilidade para falar — afirmou Cantalice.

Na noite de quinta-feira, o deputado foi flagrado em um restaurante da região da Avenida Paulista com o secretário de organização do PT, Florisvaldo Souza, outro integrante da comissão. Vargas usou um jatinho pago pelo doleiro para viajar de férias com a família em janeiro deste ano. Além disso, a Polícia Federal interceptou troca de mensagens de texto pelo celular entre ele e Youssef sobre a negociação de um contrato de um laboratório com o Ministério da Saúde.

A comissão, que é formada também por Carlos Árabe, vai produzir um relatório sobre o depoimento de Vargas para ser apresentado à Executiva do PT na próxima reunião, prevista para acontecer depois da Páscoa. A executiva decidirá, então, se leva o caso para a Comissão de Ética.

— Por enquanto, só tem o que saiu na imprensa. Por isso, ele vai poder explicar — disse Cantalice.

Caso seja levado à Comissão de Ética do PT e punido, Vargas poderá ser expulso do partido ou suspenso. Na reunião da semana passada para discutir a situação do parlamentar, algumas correntes petistas, como a Mensagem ao Partido, defenderam punição imediata. Integrantes da CNB, a corrente do deputado e que é majoritária no PT, conseguiram contornar e permitiram a formação da comissão.

Cantalice nega que o destino do deputado dentro do PT já tenha sido definido:

— Tudo o que tem se falado até agora é especulação.

O deputado também é alvo de um processo no Conselho de Ética da Câmara.

Marina dirá hoje que será candidata a vice na chapa de Eduardo Campos

Governador de PE espera obter parte dos 19,6 milhões de votos que a ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente conquistou nas eleições de 2010, quando ficou em terceiro lugar na disputa pela Presidência

João Domingos - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), vai formalizar hoje a escolha de Marina Silva como candidata a vice-presidente em sua chapa. A cerimônia, em Brasília, terá tom de noivado, com música erudita a cargo do pianista Arthur Moreira Lima.

Campos espera que a aliança lhe traga parte dos 19,6 milhões de votos que Marina teve na eleição de 2010, quando concorreu a presidente pelo PV. Até o momento, porém, não há sinal de transferência de votos – o candidato do PSB não subiu nas pesquisas desde que Marina lhe declarou apoio, em outubro de 2013, após fracassar na tentativa de criar um partido para voltar a concorrer à Presidência.

Segundo o Ibope, Eduardo Campos tinha 10% das intenções de votos em outubro e caiu para 7% em março deste ano. Ao avaliar as chances eleitorais da própria Marina, o instituto verificou um declínio ainda mais acentuado: 21% em outubro e 12% no mês passado.

Marina, porém, tem como trunfo o fato de se apresentar como proponente de uma "nova política", alinhada às expectativas de renovação demonstradas pelas manifestações de rua do ano passado. Ela também é forte no eleitorado evangélico, parcela cada vez mais influente no panorama político.

Ao não conseguir as assinaturas necessárias para criar seu próprio partido, a Rede Sustentabilidade, Marina surpreendeu o mundo político ao se filiar ao PSB, em outubro do ano passado. Outros organizadores da Rede seguiram seus passos, mas nem por isso há alinhamento total entre o grupo e o PSB.

Apesar de não estar formalizada como partido, a Rede lançará candidatos abrigados em outras legendas e apoiará aliados em disputas estaduais. Levantamento feito pelo Estado mostra que, por enquanto, PSB e Rede só estão juntos em 13 unidades da Federação.

Nas outras 14, estão indefinidos em nove e separados em cinco. É o caso, por exemplo, do Acre, onde o PSB apoia a reeleição do governador Tião Viana (PT) e a Rede atua contra a aliança. É um exemplo extremo na separação política entre as duas agremiações, pois Tião Viana e seu irmão, o ex-governador e senador Jorge Viana, sempre foram ligados a Marina Silva. O Acre, que tem 0,3% do eleitorado do País, será um dos primeiros Estados a serem visitados por Campos e Marina depois do lançamento da pré-candidatura. Marina pretende apresentá-lo a familiares e amigos.

"O importante é que nossa chapa é composta por dois candidatos, o que a diferencia das outras chapas em disputa. Cada um tem condição de fazer a campanha, independentemente da presença do outro", disse o líder do PSB na Câmara, Beto Albuquerque (RS). Para ele, onde houver possibilidade de PSB e Rede marcharem juntos nos Estados, ótimo; onde não houver, seguirão separados, sem maiores traumas. De qualquer forma, o palanque será sempre de Campos e Marina.

"Em muitos Estados temos acordo pela candidatura própria, mas ainda não fechamos um nome", disse Pedro Ivo Batista, integrante da Executiva Nacional da Rede e responsável pela montagem das chapas nos Estados. "Em São Paulo, por exemplo, a decisão é lançar um candidato ao governo. Mas ainda não chegamos a um acordo", afirmou. O PSB defende o nome do deputado Márcio França. A Rede tem outros candidatos, como o deputado Walter Feldman e o vereador Ricardo Young, que é filiado ao PPS.

PSB e Rede marcharão separados também no Paraná, onde o partido de Campos apoia a reeleição do tucano Beto Richa e a Rede ficará com a candidatura da deputada Rosane Ferreira, do PV. Em Santa Catarina, o PSB tende a ficar com a reeleição do governador Raimundo Colombo (PSD) e a Rede deverá lançar a ambientalista Miriam Prochnow. A vaga para o Senado será disputada pelo deputado Paulo Bornhausen, nome que a Rede não aceita.

Em pré- campanha, Dilma e Eduardo Campos viajam para território adversário

Enquanto o ex-governador estará em Brasília para a confirmação de Marina Silva como vice na chapa do PSB, a presidente segue até Pernambuco, onde participará do batismo e da viagem inaugural de um navio

Denise Rothenburg, Júlia Schiaffarino – Correio Braziliense

A presidente Dilma Rousseff, em Pernambuco. O ex-governador do estado Eduardo Campos, em Brasília. A troca de cenários para esta tarde entre dois pré-candidatos à eleição presidencial não se trata de mera coincidência. A ideia da presidente Dilma com essa viagem, justamente no dia em que Marina Silva se apresentará oficialmente como vice na chapa do PSB — é dar a entender ao eleitor pernambucano que, enquanto ela trabalha pela população, Eduardo e Marina apenas fazem política na cidade sede dessa atividade, a capital da República.

Eduardo e Marina estarão mesmo dedicados à política, nos próximos meses, em atos, palestras e fechamento de um programa de governo para apresentar ao país daqui a um mês e meio. A ideia, antes da largada oficial da campanha, em julho, é mostrar a união de ambos ao eleitor e, assim, tentar transferir para Eduardo uma maioria dos eleitores que, em 2010, optaram por Marina. A tese do PSB é a de que essa transferência ainda não ocorreu porque os eleitores não conhecem o ex-governador de Pernambuco. E ninguém vota em quem não sabe quem é. Daí, a necessidade não só de desfilar o pré-candidato pelo Brasil como mostrar que Marina está com ele.

Na sala de conferências do Hotel Nacional, estarão reunidos pelo menos mil militantes do PSB e da Rede. A ideia de fazer nos arredores de Brasília foi abortada exatamente para evitar acusações de afronta à lei eleitoral, que impede a realização de atos de campanha antes das convenções partidárias de escolha dos candidatos, que só podem ser feitas a partir de 10 de junho. A abertura será às 14h, com uma apresentação do pianista Arthur Moreira Lima.

Marina chegou a Brasília no sábado, enquanto Eduardo só desembarcou ontem. Para a reunião de hoje, Marina falará primeiro que o candidato. Dirá que aceita compor a chapa presidencial com o ex-governador. Aliás, se dependesse exclusivamente de Marina, ela teria dito isso em outubro, quando, no mesmo Hotel Nacional, anunciou que escolhera o PSB para abrigar a Rede até que a Justiça Eleitoral autorizasse a criação da legenda. Ela tentou formalizar o partido antes do prazo fatal para as candidaturas das eleições deste ano, mas a burocracia em torno da conferência das assinaturas impediu a formalização da Rede. Então, Marina procurou o PSB.

Marina oficializa nesta segunda posto de vice

Com formalização da chapa, PSB quer acelerar a transferência de votos da ex-senadora para Campos

O Tempo (MG)

RIO DE JANEIRO -  Ao formalizar que Marina Silva será candidata a vice-presidente, o PSB dará início nesta segunda a um esforço para tentar acelerar a transferência de votos da ex-senadora para Eduardo Campos.

O ato em Brasília abrirá uma nova etapa na trajetória da dupla, que agora lutará para se aproximar de Aécio Neves (PSDB) na disputa pelo segundo lugar na corrida ao Palácio do Planalto.

A prioridade é deixar claro que Campos será o cabeça de chapa e sinalizar aos financiadores de campanha que ele tem chance de ultrapassar o tucano e chegar ao segundo turno contra a presidente Dilma Rousseff (PT).

Se fosse candidata a presidente, Marina teria hoje quase o dobro dos votos do aliado. Ela chega a 27% no cenário com Dilma e Aécio. Quando Campos aparece como candidato, alcança apenas 10%, aponta o Datafolha.

A diferença mostra que a ex-senadora ainda é muito mais conhecida que o aliado. A união dos dois foi selada há seis meses, mas a migração de votos não ocorreu no ritmo esperado.

Com o anúncio desta segunda, Campos pretende sepultar de vez as especulações sobre a hipótese de uma inversão de chapa, com Marina à frente e o ex-governador assumindo a vice-presidência.

A ideia sempre foi rechaçada pelos dois, mas ainda acalentava esperanças de “marineiros” e empresários. Campos e Marina iniciam agora uma maratona de viagens pelo Brasil, com a meta de dar a maior visibilidade possível à chapa. Devem visitar 150 cidades até junho, mês das convenções partidárias.

“Vamos marcar o máximo de agendas com os dois juntos. A prioridade é mostrar ao país todo que eles estão unidos pelo mesmo programa de desenvolvimento sustentável”, diz Pedro Ivo Batista, da coordenação da Rede, o futuro partido de Marina. Após a Copa, os dois devem passar a fazer viagens separados.

Concessões
Estados. O grupo de Marina retardava o anúncio da chapa para tentar obter mais concessões do PSB na montagem dos palanques estaduais. Ainda há impasses em nove Estados, incluindo Minas.

Largada extra-oficial da disputa presidencial é dada nesta segunda-feira

Dilma Rousseff (PT), Eduardo Campos (PSB) e Aécio Neves (PSDB) disputam os holofotes em várias frentes país afora

Maria Lima – O Globo

BRASÍLIA. Está dada a larga extraoficial da disputa presidencial. Os três principais presidenciáveis, Dilma Rousseff (PT), Eduardo Campos (PSB) e Aécio Neves (PSDB), disputam os holofotes nessa segunda-feira em várias frentes País afora. Em Brasília Eduardo Campos finalmente anunciará formalmente sua chapa, com a ex-senadora Marina Silva (Rede) como sua candidata a vice-presidente. Os dois passaram o dia juntos ontem em Brasília definindo os últimos detalhes da festa. Embalado pelas pesquisas que lhe dão uma dianteira no quesito potencial de crescimento e menor rejeição, Campos dirá, em seu discurso, que o Brasil não precisa se acabar para a Oposição tirar do PT essa eleição.

- O PSDB torce para ter apagão de energia no País e o PT torce para o povo de São Paulo morrer de sede com falta de água. Não temos que torcer pela desgraça do povo para a gente ganhar a eleição. Nossa oposição tem que olhar para o futuro _ dirá Eduardo Campos em seu discurso de lançamento da pré-candidatura, ao lado de Marina, reforçando que seu foco será no programa, e não na troca de agressões.

O evento político- cultural, que terá a presença de figuras emblemáticas como Ariano Suassuna e representantes de movimentos sociais e empresariais, marcará o fim das especulações dos adversários sobre quem seria o cabeça de chapa: Eduardo ou Marina. Além dos dois - Marina discursará sobre a formação do novo campo político no Brasil - a palavra será aberta a lideranças de outros partidos, como os senadores Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e Cristovam Buarque (PDT-DF).

O escritor pernambucano Ariano Suassuna estreará, no evento, como o amuleto da campanha de Campos e Marina, como tem feito nas últimas campanhas do ex-governador. Amigo pessoal da família _ foi vizinho de Arraes e viu Eduardo crescer _ ele dará o tom leve e emocional do evento, junto com o pianista Artur Moreira Lima. O ator Marcos Palmeira fará uma participação em vídeo gravado, já que não poderá estar presente.

Aproveitando-se da ausência do ex-governador Eduardo Campos no estado, a presidente Dilma Rousseff pretende ocupar uma fatia do noticiário em Pernambuco, com um périplo por duas cidades _ Ipojuca e Serra talhada _ para inauguração da primeira etapa da Adutora do Pajeú e da viagem inaugural do navio Dragão do Mar.

Ex-aliado do governo, Eduardo Campos é considerado por setores do PT o adversário mais difícil na campanha da reeleição de Dilma. O governador João Lira Neto (PSB) que sucedeu Campos, decidiu abandonar a caravana de políticos pernambucanos que virá a Brasília prestigiar o ato de lançamento da chapa presidencial, para estar ao lado de Dilma e também faturar espaço nas inaugurações da presidente.

A data da agenda da presidente em Pernambuco mudou pelo menos três vezes. Inicialmente seria na segunda-feira, mas na noite da última quarta-feira, o Planalto informou que os compromissos seriam transferidos para a próxima quarta-feira, porque a Transpetro, proprietária do Dragão do Mar, havia adiado a viagem inaugural do navio. Na manhã de quinta-feira, a agenda voltou para segunda-feira, data do evento de Marina e Campos.

Correndo por fora, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves, dividirá sua agenda entre a Bahia e o Rio de Janeiro. Pela manhã ele participa, em Salvador, de uma grade festa para o lançamento das pré-candidaturas da chapa de oposição na Bahia. A chapa junta o ex-governador Paulo Souto (DEM) como candidato ao governo da Bahia, e o peemedebista Geddel Vieira Lima na vaga do Senado.

Na parte da tarde Aécio voa para o Rio de Janeiro, onde faz palestra na Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Ele participa do painel de debates Visões de Futuro, que abordará propostas para o Rio de Janeiro e para o Brasil.

Aliados querem posição de Dilma sobre economia

Objetivo seria sinalizar rumo da política de um eventual segundo mandato e acalmar mercado

Gabriela Valente e Martha Beck

BRASÍLIA — A presidente Dilma Rousseff precisa dar uma mensagem clara sobre a política econômica que pretende adotar em seu próximo mandato se quiser vencer a disputa nas urnas. Essa é a avaliação que ganha cada vez mais força no governo. Por isso, já há até quem patrocine a ideia de que ela coloque suas propostas numa nova Carta ao Povo Brasileiro, nos mesmos moldes da divulgada por Lula na campanha eleitoral de 2002, quando o PT firmou um compromisso com o combate à inflação e o equilíbrio das contas públicas.

A reedição do documento teria a mesma finalidade de 12 anos atrás: acalmar o mercado financeiro, que já não acredita numa equipe econômica que deixou a inflação se acomodar perto do teto da meta, de 6,5%, e ainda lançou mão da chamada contabilidade criativa para conseguir pagar parte dos juros da dívida pública. Alguns interlocutores do Palácio do Planalto chegam a defender que a presidente vá além e revele logo quem será o responsável pela condução da economia caso ela seja reeleita.

O argumento dos aliados é que, como a atual equipe já está bastante desgastada, uma indicação mais amigável para o mercado teria reflexos positivos nos investimentos. Algumas corretoras já deixaram de recomendar o Brasil para seus clientes após os dados mais recentes da economia de inflação persistente e generalizada e de crescimento baixo.

— Não precisava anunciar oficialmente quem seria ministro, mas pelo menos deixar vazar para a imprensa os nomes — disse uma fonte sob a condição de anonimato.

— Podia deixar, por exemplo, os fotógrafos dos jornais verem o Nelson Barbosa (ex-secretário-executivo da Fazenda, que tem mais simpatia do mercado) entrando no Planalto para uma reunião — brincou um economista, que também pediu que seu nome não fosse divulgado.

Interlocutores dão como certa a troca na equipe econômica se Dilma se reeleger, o que significa que Guido Mantega não pode ser o principal interlocutor com o mercado se o assunto é a economia no segundo mandato. Assim, o mais provável é que a própria Dilma acabe se tornando a porta-voz da futura política econômica quando a campanha esquentar. Até porque, brincam os técnicos, ela sempre achou que sabe mais do que seus subordinados quando o assunto é economia.

— Ela não acha que é a melhor economista deste país; ela tem certeza disso — afirma um interlocutor da presidente.

Analistas, no entanto, dividem-se quanto ao efeito que uma nova Carta ao Povo Brasileiro teria no mercado. O economista-chefe da corretora Gradual, André Perfeito, argumenta que Dilma deixou claro que seu maior desejo era deixar a taxa de juros real no Brasil em 2%. Tentou. Usou todas as armas para pressionar os bancos e não conseguiu. Por isso, o mercado quer saber o que vem agora.

Um documento poderia dirimir dúvidas. E afastar ruídos sobre a condução da política fiscal e do salário-mínimo.

Já Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro, acha que um documento não é necessário, porque o cenário é completamente diferente do conturbado ano de 2002. Dilma não é desconhecida da administração pública. Segundo ele, é muito mais importante cumprir promessas antigas do que fazer novas. E ainda diz que anunciar novo ministro da Fazenda não traria resultados.

— Seria deselegante com o ministro Mantega e ainda criaria dúvidas — alerta. — O que convenceria o mercado é dar sinais claros de mudança, como autorizar o reajuste da gasolina. Outro ponto é barrar a mudança do indexador da dívida dos estados.

— Do ponto de vista político, uma carta seria admitir que tudo o que fez está errado. O que importa não é fazer mais discurso — diz o ex-diretor do BC Alexandre Schwartsman. — Lembra-se de Davos (no Fórum Econômico Mundial, quando a fala de Dilma não convenceu o mercado)? Como dizem os americanos: “Talk is cheap!” (“Falar é fácil”).

A oposição sabe que a política econômica é a maior fragilidade do governo, mas não está disposta a explorá-la logo. No PSDB e no PSB, há a percepção de que, se todos os argumentos da má condução da economia forem explorados agora, haveria queda mais acentuada de Dilma nas pesquisas. E isso poderia engrossar o movimento “Volta, Lula”.

Mercado eleva previsão para inflação em 2014 para 6,47%

Nova projeção se aproxima do teto da meta do governo, de 6,5%

Victor Martins - Agência Estado

BRASÍLIA - O mercado elevou nesta semana as estimativas para a inflação em 2014. A projeção para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2014 saltou de 6,35% para 6,47% na pesquisa Focus divulgada nesta segunda-feira, 14, pelo Banco Central. Há quatro semanas, a estimativa era de 6,11%. Para 2015, a projeção subiu de 5,84% para 6%, sendo que há quatro semanas a expectativa era de 5,70%. A previsão de inflação para os próximos 12 meses à frente subiu de 6,07% para 6,12%, conforme a projeção suavizada para o IPCA. Há quatro semanas, estava em 6,12%.

Nas estimativas do grupo dos analistas consultados que mais acertam as projeções, o chamado Top 5 da pesquisa Focus, a previsão para o IPCA em 2014 no cenário de médio prazo recuou de 6,57% para 6,49%.

Para 2015, a previsão dos cinco analistas subiu de 6,00% para 6,27%. Há quatro semanas, o grupo apostava em altas de 5,99% para 2014 e 5,78% para 2015. Entre todos os analistas ouvidos pelo BC, a mediana das estimativas para o IPCA de abril aumentou de 0,61% para 0,69%. Há quatro semanas, estava em 0,56%. Para maio, a projeção ficou estável em 0,45%.

Juro. Os economistas consultados pelo Banco Central na pesquisa Focus mantiveram a previsão para a taxa Selic no fim de 2014 em 11,25% ao ano. Há quatro semanas era 11%. Para 2015, a mediana segue em 12% ao ano há nove semanas. A taxa básica de juros está em 11% ao ano desde a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que ocorreu em abril.

A previsão para a Selic média em 2014 ficou estável em 11,06%. Para 2015, passou de 11,92% para 12,01%. Há quatro semanas, estavam em 10,91% e 11,80% ao ano, respectivamente.

Nas estimativas do grupo dos analistas consultados que mais acertam as projeções, o chamado Top 5 da pesquisa Focus, a previsão para a Selic no fim de 2014 ficou estável em 11,88% ao e, para 2015, permaneceu em 13% pela segunda semana consecutiva. Há quatro semanas as projeções eram, respectivamente, 11,75% ao ano e 12%.

A pesquisa Focus mostra que a projeção do mercado para a taxa Selic segue em 11,25% ao ano para o mês de maio. Para janeiro de 2015, o mercado prevê alta da taxa básica de juros para 11,50% ao ano, e para 11,75% no mês seguinte. Em março do próximo ano, a previsão de alta continua em 12,00% ao ano. A próxima reunião do Comitê de Política Monetária está marcada para 27 e 28 de maio.

PIB. A previsão de crescimento da economia brasileira em 2014 subiu de 1,63% para 1,65%. Há quatro semanas, a expectativa era de 1,70%. Para 2015, a estimativa de expansão se manteve em 2,00%, mesmo valor há sete semanas.

A projeção para o crescimento do setor industrial em 2014, entretanto, caiu de 1,50% para 0,70%. Para 2015, os economistas reduziram a previsão de 3,00% para 2,95%. Quatro semanas antes, a Focus apontava estimativas de expansão de 1,44% para 2014 e de 3,00% em 2015 para o setor.

Os analistas mantiveram estável, em 34,80%, a previsão para o indicador que mede a relação entre a dívida líquida do setor público e o PIB em 2014. Há quatro semanas, estava em 34,60%. Para 2015, segue em 35,00% há 17 semanas.

Aécio Neves: Gol de mão

Instituto Teotônio Vilela

O intolerável grau de aparelhamento do Estado brasileiro pelo PT chegou às instituições de pesquisa, guardiãs do conhecimento e da informação que serve ao desenvolvimento do país. O Brasil corre o risco de entrar na mesma rota que levou a Argentina a perder credibilidade quanto às suas estatísticas oficiais.

O episódio recente em torno do IBGE passou a muitos a impressão de que o instituto estaria dando um perigoso passo na direção dos problemas que minaram o Instituto Nacional de Estadística y Censos (Indec), do nosso vizinho, cujos dados sobre inflação e PIB são considerados tão corretos quanto o célebre gol de mão feito por Maradona contra a Inglaterra.

Se a "mão de Deus", expressão usada pelo próprio atacante para descrever o lance, ajudou a Argentina a ganhar o jogo, seu uso nas estatísticas não melhora em nada a vida dos argentinos. Não saber o que de fato se passa na economia de um país afugenta novos investimentos, com impacto negativo sobre o desenvolvimento.

O IBGE entrou em convulsão depois que o PT colocou em dúvida a nova metodologia usada pelo órgão, que, ao ampliar a base de pesquisa, traz novos dados, por exemplo, sobre o desemprego no país. Era o que faltava: o partido querer atribuir à sua base aliada a tarefa de avaliar metodologia de pesquisa.

Apesar da contestação de vários profissionais, a Pnad Contínua teve sua divulgação adiada para depois das eleições. Assim, é preciso concordar com Simon Schwartzman, ex-presidente do IBGE: a suspensão em momento eleitoral levanta suspeitas sobre a falta de autonomia do órgão.

Dias antes, o sinal vermelho já havia sido acendido no Ipea. A informação de que o instituto abriu, em 2010, escritório na Venezuela, e que lá tem produzido textos em apoio ao chavismo, surpreendeu muita gente. Especialmente os que já lamentavam que, apesar da resistência profissional de tantos dos seus membros, o Ipea estivesse sendo usado para tentar dar sustentação a "verdades" petistas. Nos mesmos dias, a imprensa denunciou a crise na Embrapa com as nomeações políticas.

O assunto é grave. Instituições brasileiras, com credibilidade conquistada através do merecido reconhecimento do país ao trabalho de inúmeros pesquisadores e profissionais, não podem ter interrompida esta importante trajetória.
Precisamos defender a autonomia das nossas instituições, diante de qualquer pressão política. Elas pertencem ao país e não ao governo. Até porque, depois do Ipea, do IBGE e da Embrapa, alguém pode ter a ideia de interferir no Inep para controlar os dados de educação e no CNPq para patrulhar as pesquisas.

O Brasil não merece isso.

Aécio Neves, senador (MG) e presidente nacional do PSDB

Ricardo Noblat: Marina, o vice que faz diferença

"O Brasil rejeita a alternativa de mais quatro anos do que aí está" Eduardo Campos, ex-governador de Pernambuco

- O Globo

E assim se passaram seis meses desde que Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente do governo Lula, filiou-se ao PSB e anunciou seu apoio a Eduardo Campos, pré-candidato do partido à sucessão da presidente Dilma Rousseff. Naquela ocasião, em particular, Marina disse a Eduardo que seria sua vice caso isso o ajudasse a se eleger. Esta tarde, em Brasília, Marina dirá que é candidata a vice de Eduardo.

Na eleição de 2010, com pouquíssimo dinheiro para fazer campanha e apenas um minuto de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão, Marina teve um desempenho surpreendente. Em percentuais redondos, Dilma conseguiu 47% dos votos válidos no primeiro turno, José Serra 33% e ela, 19%.

Marina venceu no Distrito Federal. Derrotou Serra no Amapá, Amazonas, Pernambuco e Rio. E empatou com Serra no Ceará. Nos três maiores colégios eleitorais, colheu 20% dos votos (São Paulo), 44% (Rio) e 21% (Minas Gerais). Imaginou concorrer outra vez em outubro próximo. Mas não registrou seu partido, a REDE, em tempo hábil.

Foi por isso que procurou abrigo no PSB. A mais recente pesquisa do instituto Datafolha apontou Marina, no momento, como o único nome que seria capaz de levar a eleição presidencial para o segundo turno.
Contra Dilma (39%) e Aécio (16%), ela reúne 27% das intenções de voto. Está destinada a ser a maior eleitora de Campos.

A pedido de um partido, pesquisa feita por telefone no último dia 10 no Distrito Federal ouviu 2.329 eleitores. Respostas à pergunta sobre como evoluiu a situação do Brasil “nos últimos anos”: está cada vez pior (63%); cada vez melhor (15%), e igual (22%). Aprovam a administração Dilma, 25.6%. Desaprovam, 64.8%.

Intenção de voto para presidente: Dilma, 22%, Aécio, 22%, Eduardo, 15%, e nenhum, 35%. Intenção de voto com os prováveis vices: Dilma e Michel Temer, 22%; Aécio e Aloysio Nunes, 21%; Eduardo e  Marina, 40%. Votos brancos, nulos e “não sabem”, 17%. Marina e Eduardo planejam visitar até junho as 150 maiores cidades do país.

Em entrevista à VEJA, Mauro Paulino, diretor do Datafolha, disse que a alta rejeição à classe política, o desejo de mudança do eleitorado e a Copa do Mundo fazem desta eleição a mais imprevisível desde a primeira pelo voto direto depois dos 21 anos da ditadura militar. A aversão aos políticos elegeu Collor em 1989. Agora ela é maior.

O desejo de mudança é compartilhado por sete de cada 10 brasileiros. Seis em cada 10 acham que a inflação vai aumentar. Caiu de 87% para 78% o percentual dos que se orgulham de ser brasileiros. É a primeira vez que isso acontece nos últimos 13 anos. E o percentual dos que afirmam ter vergonha de ser brasileiros cresceu de 11% para 20%.

Só 60% dos brasileiros ouviram falar de Aécio Neves, pré-candidato do PSDB a presidente da República, mas não o conhecem. São 75% os que apenas ouviram falar de Campos. Os dois são bem avaliados onde são conhecidos. Campos é o candidato de oposição com mais chance de atrair os eleitores descontentes, observa Paulino.

A importância dos partidos foi nenhuma para eleger Collor. O PSDB era pequeno quando elegeu Fernando Henrique presidente. O PT também quando Lula se elegeu pela primeira vez. O PSB de Campos é um partido pequeno, embora tenha sido o que mais cresceu nas eleições municipais de há dois anos. A dupla Campos e Marina é de fato uma possibilidade real de poder.

José Roberto de Toledo: Eleito para perder

- O Estado de S. Paulo

A eleição presidencial de 2014 é boa de perder. Nada indica que o eleito este ano terá quatro anos fáceis pela frente. Muito ao contrário. A crise de energia ainda não chegou ao auge. Tampouco a crise de abastecimento de água. E há um El Niño nascendo no Oceano Pacífico, pronto para alterar o regime de chuvas no Brasil, com secas no Norte e Nordeste e mais calor no Sudeste.

Somem-se todos os desarranjos da economia: inflação mal resolvida, juros em alta, capital especulativo entrando e saindo de uma hora para outra, gastos públicos, mas investimento em baixa. A lista é grande, e sugere a necessidade de um freio de arrumação. Se a freada vier em 2015, quanto tempo será preciso para reacelerar?

Fernando Henrique Cardoso ganhou uma eleição assim em 1998. A freada, na forma de desvalorização do real, veio logo no começo do segundo mandato. Quatro anos não foram suficientes para a economia engatar nem uma terceira marcha, quanto mais deslanchar. O resultado foi 12 anos de governos do PT - alimentados pelo contraste econômico entre os últimos quatro anos de governo tucano com os primeiros oito do governo petista.

Essa mágica está perdendo a graça, porém. A comparação que o eleitor faz hoje é do PT com o PT, de Dilma Rousseff com Luiz Inácio Lula da Silva. Do presente com o passado imediato, não com o remoto. Lula é e continuará sendo a grande assombração da campanha pela reeleição da presidente. Cada aparição, cada entrevista do padrinho reforçará no eleitor dúvidas sobre a afilhada.

O "volta, Lula" prevalecerá, então? Não, se os instintos de sobrevivência política do ex-presidente estiverem intactos. O roque de Dilma por Lula implica admitir o fracasso de ambos - dela como gestora, dele como responsável por sua eleição. Mesmo que venha embrulhado em alguma razão de saúde, o risco de parecer uma manobra aos eleitores não é nada desprezível.

Mais arriscado ainda é se a chicana der certo. Lula estaria disposto a sacrificar o começo de um eventual novo governo com medidas impopulares na esperança de recobrar o crescimento econômico em tempo de buscar o quinto mandato seguido do PT? Arriscaria o status de mito político por quatro anos no poder sob condições bem menos favoráveis do que as que teve?

Uma aventura assim só se encara se a alternativa for pior. Será o caso? Todos os sinais detectáveis nas pesquisas indicam que 2014 é uma eleição mudancista em todos os níveis de governo. Dois em cada três eleitores querem mudanças profundas. Dilma lidera a corrida presidencial porque de 25% a 30% dos que querem mudança ainda acreditam que ela é a mais apta a fazê-las.

Essas estatísticas enchem a oposição de esperança, mas, ao mesmo tempo, mantêm Dilma como favorita. Se a presidente conseguir convencer os mudancistas simpáticos a ela de que pretende mudar, terá boas chances de se reeleger. Seria o quarto mandato seguido do PT - feito inédito no Brasil. Nada mal.

A outra opção é a oposição ganhar a eleição e herdar a crise energética, o desarranjo econômico e a necessidade de ser impopular - pelo menos no começo do mandato. O PT pularia para a oposição e faria tudo o que acusa os opositores de fazerem hoje - mas, provavelmente, com mais competência. Numa campanha em 2018 Lula teria 72 anos. FHC tinha 71 ao lhe passar o poder.

O mesmo vale para Eduardo Campos (PSB). Se perder e sobreviver ao relento político, o pernambucano poderá voltar em 2018 como alternativa ao dualismo PT-PSDB. Com a diferença de que terá só 53 anos.

Essas divagações vão além dos quatro anos, que é o horizonte da maioria dos cálculos políticos e eleitorais no Brasil. São, portanto, para o padrão nacional, de longo prazo. E, como disse John Maynard Keynes, no longo prazo estaremos todos mortos.

Luiz Carlos Azedo: Onde foi que Dilma errou?

Bem que a presidente Dilma tentou promover uma grande guinada na economia, até de forma audaciosa, quando resolveu baixar os juros a fórceps e estimular ainda mais a demanda por produtos e serviços de parte da população

Correio Braziliense

As coisas não vão muito bem para a presidente Dilma Rousseff, que luta para manter sua candidatura no PT e se reeleger ao cargo. O caminho para isso está sendo mais árduo e perigoso do que aquele que a levou ao Palácio do Planalto, em 2010, na onda de popularidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando era a todo-poderosa chefe da Casa Civil e o país crescia a 7,5%. Onde foi que Dilma errou? À primeira vista, seu maior problema era a condução política da relação com o Congresso e os aliados, porém, bem ou mal manteve a sua base de apoio e, até aqui, tem uma ampla coalizão política engajada na reeleição. Tudo indica que o seu maior erro foi de condução da política econômica.

Esse debate ganha força. Além do choque de interpretações entre os economistas neoliberais, social-liberais e desenvolvimentistas, que recrudesceu, instalou-se uma disputa política entre governo e oposição em torno do tema. Antes a discussão era pautada por forte viés ideológico, devido à maior intervenção do governo nos negócios, raiz do contencioso de Dilma com os grandes empresários do país. Agora, o debate é mais objetivo: a inflação continua alta e os juros estão na lua, atingem o bolso da população e repercutem nas pesquisas de opinião. A política econômica deixou de ser um tema do mundo acadêmico e dos meios empresariais e financeiros para ganhar centralidade política na disputa eleitoral.

Fracasso da mudança
Bem que a presidente Dilma tentou promover uma guinada na economia, até de forma audaciosa, quando resolveu baixar os juros a fórceps e estimular ainda mais a demanda por produtos e serviços. Por trás da decisão, estava a ideia de que era preciso não só ampliar o poder de consumo da população, mas consolidar em termos qualitativos a chamada nova classe média — ou seja, o contingente de eleitores com os quais, até as manifestações de junho do ano passado, o Palácio do Planalto contava para reeleger Dilma Rousseff de barbada.

São os 29 milhões de pessoas que entraram para a classe C entre 2003 e 2009, segundo estudos da Fundação Getulio Vargas (FGV), ampliando esse contingente da população para 94,9 milhões, ou seja, 50,5% da população brasileira, com renda média entre R$ 1.126 a R$ 4.854. Até que ponto o inexplicável adiamento do Pnad Contínua para 2015 e toda essa confusão no IBGE pode mascarar o que está acontecendo com essa parcela da população, diante do baixo crescimento e da alta da inflação? Como se sabe, a presidente da instituição, Wasmália Bivar, e mais cinco dos oito membros do conselho do IBGE consideraram que seria arriscado mobilizar o corpo técnico para as divulgações da Pnad Contínua até o fim do ano em vez de concentrar o foco na reformulação metodológica que permita gerar um resultado mais preciso sobre a renda domiciliar per capita nas unidades da Federação.

Mas voltemos ao tema original: Dilma obrigou o Banco Central (BC) a baixar os juros para 7,5%, mexeu no rendimento das cadernetas de poupança, congelou o preço dos combustíveis, reduziu as tarifas de energia, aumentou o controle sobre outras tarifas públicas, expandiu o crédito imobiliário, desonerou automóveis e eletrodomésticos e expandiu o gasto público, tudo para manter a economia crescendo. Algo deu errado, o cobertor ficou curto: o governo começou a mascarar as contas públicas e alguns indicadores; o mercado ficou inseguro e os investidores puxaram o freio de mão. A inflação saiu do controle e o Banco Central (BC), que havia apostado na estratégia, foi obrigado a elevar os juros novamente, que já estão em 11%, ou seja, acima do patamar que Dilma encontrou quando assumiu o cargo, que era de 10,75%. Pelo andar da carruagem, terá que pedir pelo amor de Deus para o BC aumentar os juros mais um pouquinho e segurar a inflação abaixo do teto da meta de 6,5%. Pura ironia!

E a Petrobras, hein?
Não dá pra não falar da Petrobras, que virou caso de polícia. Será que a presidente Dilma Rousseff sabia do que estava para acontecer quando escreveu aquela nota tirando o corpo fora da duvidosa decisão de comprar a refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, origem de toda essa crise na empresa? Governo e oposição se digladiam no Supremo Tribunal Federal para decidir se a CPI que vai investigar a empresa terá foco apenas na estatal ou investigará também o cartel dos metrôs e a construção do Porto de Suape. Nos bastidores, diz-se que há 42 parlamentares federais envolvidos no escândalo, que já pôs no pelourinho o deputado petista André Vargas (PR). Esse inquérito estaria em segredo de Justiça.

Renato Janine Ribeiro: A crise do circo

#naovaitercopa pegou fogo no país do futebol

- Valor Econômico

Pão e circo, diziam os romanos. Talvez esteja aí a essência da política, em todos os tempos. Por um lado, proporcionar ganhos materiais - pelo menos, a sobrevivência. Por outro, inventar fantasias, desejos, essa esfera da vida que não é objetiva, que não se mede, mas compete em importância com o interesse econômico. As pessoas não são loucas, não votarão sistematicamente contra suas vantagens. Por isso, quem quer arrochá-las sempre busca um pretexto, um tema nacionalista, religioso ou moralista. Aqui entra o circo, geralmente alegre, até exultante, mas às vezes sinistro. Quase tudo o que apela à imaginação humana pode dar em circo.

Lula pensou coroar três mandatos sucessivos do PT, marcados pela inclusão social em larga escala, inicialmente denominada "Fome Zero," com duas enormes festas, a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos. Sem maldade nenhuma: depois do pão, o circo. Depois da fome saciada, a festa.

Deu errado. Deu? Ninguém poderia imaginar, um ano atrás, que a hashtag #naovaitercopa pegasse fogo no país do futebol. OK, até penso que a maioria dos brasileiros prefira os jogos da Copa às manifestações. Pode ser que estas últimas estejam sendo superdimensionadas. Mas mesmo assim é triste a esquerda (ou centro-esquerda, como considero mais exato) reagir aos gritos nas ruas evocando os que falam mais em jogos do que em política - os que ficam em casa, os que não soltam a voz, os que veem TV, em vez dos que protestam. "Maioria silenciosa" sempre foi um termo de direita, convém mal à esquerda.

A expressão "pão e circo" costuma ter sentido pejorativo. Entende-se: numa certa altura da história de Roma, quando a grande cidade já dominava praticamente todo o Mediterrâneo, a cidade - ou melhor, seus ricos, os patrícios, os que mandavam - dispôs de recursos para aplacar uma plebe que, no passado, várias vezes ameaçara sua dominação. Isso se obtinha distribuindo-se comida (o "pão") e promovendo-se espetáculos, entre os quais lutas de gladiadores. Aqui está a essência do populismo, que seus atuais críticos conservadores esquecem: ele é uma forma de privar o povo, os pobres, do poder que desejaria ter. O populismo é conservador. Chavez, Lula ou mesmo Vargas não são populistas no sentido de dar pão e circo no lugar de uma coisa maior - porque eles efetivamente melhoraram a condição dos pobres. Já em Roma, distribuir pão e circo foi um meio de não fazer a reforma agrária e de preservar o poder em mãos das velhas classes dominantes.

A rigor, não há sociedade política sem pão e sem circo, sem a satisfação material e a midiática - que substituiu, faz tempo, a espiritual, a tal ponto que várias religiões hoje são tributárias da mídia. Em princípio, é positivo que se preste maior atenção ao pão, porque ele diz respeito ao real interesse das pessoas. Cinquenta ou cem anos atrás, teríamos pregadores dizendo que não, que deveríamos priorizar a alma; hoje, esse tipo de discurso, nas democracias, só tem sucesso nas regiões culturalmente atrasadas dos Estados Unidos. Bill Clinton falava de pão quando adotou o mote "É a economia, estúpido!" Já seu sucessor, o segundo Bush, fez das guerras com os muçulmanos o seu circo, rapidamente perdendo o capital de simpatia obtido com o 11 de setembro.

Não é fácil dizer onde está o interesse real das pessoas, onde estará o seu pão, com os "upgrades" que pode ter numa sociedade desenvolvida. Políticas sociais, que a esquerda aplaude, a direita contesta. O circo também nem sempre é fácil. Até porque em nossa sociedade ambos, pão e circo, foram privatizados. A renda da maioria hoje vem da economia privada - ainda que os governos, com suas políticas, cumpram o papel crucial de estimular ou travar a economia. Já o circo pertence à mídia. O Big Brother, que recém terminou sua 14ª edição anual, é o exemplo mais escarrado. Mas ele embota o sentido crítico das pessoas? Atende a interesses políticos? Favorece a dominação?

As pessoas cultas dirão sim à primeira pergunta, independentemente de sua preferência partidária, mas se dividirão nas outras. Para a esquerda, reduzir o senso crítico da maioria favorece o controle da sociedade pelas classes proprietárias. Já os liberais não verão assim. Mas provavelmente enxergarão a Copa do Mundo como o grande circo do PT e, por isso, só por isso, não porque torçam contra a seleção canarinho, não verterão lágrimas se o circo não for um sucesso de audiência.

Melhor não mentir a si próprio. Qualquer partido que dispute a hegemonia no País adoraria sediar aqui a Copa. Mas quem fez isso foi o PT. Só que esse episódio coincide com a crise dos circos, pelo menos os flagrantes, em nossa política. Essa queda do circo talvez seja sinal de um certo amadurecimento dos costumes. Lamento que o declínio do papel político positivo da festa prejudique um partido que promoveu a inclusão social em escala inédita, um trabalho inconcluso, não por demérito do PT, mas pela dificuldade de uma tarefa que é demandada no Brasil pelo menos desde 1580 (eu dato a luta pela justiça social dos inícios do quilombo dos Palmares). Mas isso aconteceria, cedo ou tarde. Cobrar padrão FIFA para a saúde, a educação, a segurança e o transporte públicos hoje é um slogan contra o PT - pondo-se de lado a culpa dos Estados e municípios em temas que, na maior parte, são de sua responsabilidade constitucional - mas é também uma mudança cultural de monta, que veio para ficar. Isso, só podemos saudar - mesmo aqueles que irão aos estádios e torcerão pelo Brasil e pela festa. O povo quer mais pão, com manteiga ou mesmo convertido em brioche, e menos circo.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

Leia mais na Folha de S. Paulo:

Marcus Pestana: Em xeque, o modelo de gestão da Petrobras

- O Tempo (MG)

O embate das últimas semanas tem se concentrado em torno das denúncias e da instalação de uma CPI sobre a Petrobras. A princípio, fica a impressão de que é simplesmente mais uma luta conjuntural entre governo e oposição, envolvendo picuinhas e interesses eleitorais. Mas não.

A Petrobras é a maior empresa brasileira. Estatal, mas com capital aberto e ações em bolsa.

Atuando num setor estratégico, como o energético. Como é possível achar normal que essa mesma empresa, que atua em condições de mercado extremamente favoráveis, durante o governo de Dilma Rousseff, tenha perdido metade de seu valor, triplicado seu endividamento e visto sua produção cair nos últimos dois anos? A propalada autossuficiência não veio, e os resultados do presidencialismo de cooptação, que loteia a máquina e distribui cargos em busca de uma governabilidade de baixa qualidade, começam a ficar claros aos olhos da opinião pública.

Para agravar os péssimos resultados da maior empresa brasileira, fruto de gestão temerária e incompetente, uma verdadeira tempestade de denúncias sobre desvios e corrupção assola a Petrobras. A compra da refinaria de Pasadena, no Texas, a construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e as relações incestuosas com uma fornecedora holandesa parecem ser apenas a ponta do iceberg de um padrão político e gerencial agressivo aos interesses nacionais.

A Petrobras é um ícone, marco da industrialização brasileira, fruto de ampla campanha de mobilização social que teve como lema “O petróleo é nosso”. No governo do PSDB, uma medida corajosa do presidente Fernando Henrique resultou na quebra do monopólio estatal na exploração do petróleo brasileiro. Nada a ver com um suposto neoliberalismo, mas com a necessidade de aumento dos investimentos e da produção e de se estabelecer parâmetros de eficiência e competitividade.

A quebra do monopólio estatal e as concessões feitas resultaram no aumento da produção em mais de 10% ao ano, na atração de capitais privados e no aumento da eficiência setorial. Foi esse movimento que possibilitou a descoberta do pré-sal. O governo Lula, no qual Dilma tinha uma presença marcante, particularmente nas questões energéticas, promoveu a mudança para o regime de partilha, um dos maiores erros da história da política econômica no Brasil, iludiu a população com a festa da autossuficiência, obrigou a Petrobras a investir 30% em cada poço descoberto e a comprar de forma ineficiente seus equipamentos. Não bastasse isso, comprimiu artificialmente os preços do diesel e da gasolina, apertando seu caixa, impulsionando o endividamento e alimentando as desconfianças do mercado.

A Petrobras talvez seja o maior exemplo vivo e acabado do modelo de gestão ineficiente e superado do governo Dilma e do PT que, partindo de um intervencionismo atabalhoado, ergue um monumento à ineficiência, ao patrimonialismo e à incompetência.

Ao Congresso Nacional não resta alternativa: CPI já, sem dispersão de foco!

Marcus Pestana, deputado federal e presidente do PSDB de Minas Gerais

José Roberto Mendonça de Barros: A economia brasileira ao final do primeiro trimestre


A "verdadeira" inflação já está bem acima do teto, e é o que a população percebe
 
- O Estado de S. Paulo

Quando a melhor defesa da política econômica é expressa em frases do tipo "Não estamos à beira do abismo", "A inflação não vai sair do controle" ou "Tem gente crescendo menos", é que as coisas não vão bem.

É o que parece estar acontecendo agora. Ao final do primeiro trimestre do ano, a conjuntura esta marcada pelos seguintes fatores:

1 - A inflação está em alta, puxada por alimentos e serviços. A seca do início do ano reduziu a produção de muitos itens, com efeitos evidentes nos índices de custo de vida. Café, cana, hortigranjeiros, carnes e frutas foram afetados. O leite sobe em plena safra e assim deverá continuar a ocorrer até o segundo semestre. Neste período, as quebras na produção irão também afetar o feijão e o etanol (a redução na produção de cana é hoje estimada em mais de 40 milhões de toneladas, resultando numa perda de 1 bilhão de litros de álcool e 2 milhões de toneladas de açúcar). A firmeza dos preços internacionais reforça o quadro: os estoques de soja nos EUA estão muito baixos, a demanda chinesa continua surpreendendo a muitos pela sua firmeza e o preço da carne suína explodiu, como resultado de um vírus que está afetando bastante a produção no hemisfério norte, entre outras coisas. Tudo isso está demonstrado no IPCA de março, que subiu 0.92%, com mais de 70% das categorias de preços, mostrando reajustes. Em 12 meses a inflação cheia cresceu 6.2%, com os núcleos se expandindo 6.3%. O IPCA de abril não deverá ser muito diferente do de março, uma vez que apenas nos hortícolas pode-se esperar alívio nos preços, dado o ciclo curto de produção. Entretanto, mesmo aí o ano tem se mostrado peculiar, pois em muito locais a escassez de água para irrigação está limitando a retomada da produção.

Além da alimentação, chama a atenção no IPCA de março a retomada do crescimento dos preços de serviços, que se expandiram notáveis 9.1% em 12 meses, o que fará que a inflação anual supere o teto da meta ainda no primeiro semestre, lá ficando até o final do ano, quando projetamos 6.6% para 2014. Tudo isso ainda com o represamento de preços de combustíveis, energia elétrica e transportes urbanos. A "verdadeira" inflação já está bem acima do teto, e é isso o que a população percebe, como mostrou de forma clara a última pesquisa do Datafolha. O Banco Central continuará a ter muito trabalho.

2 - O final do período chuvoso, que está sendo muito fraco, consolidou uma situação lamentável no setor elétrico, que vai afetar, e muito, a economia brasileira. Os níveis de água nos reservatórios estão muito baixos, no início de abril, o que só piorará no período de seca. Em consequência, todas as térmicas disponíveis estão ligadas e o custo da energia elétrica no mercado livre explodiu. Com isso, existem quatro problemas a serem enfrentados e nenhum deles é trivial. A questão do suprimento de energia - é quase certo que teremos que ter algum programa emergencial de redução da demanda ainda neste ano. A situação de destruição das finanças de boa parte das companhias do setor (geradoras e distribuidoras), como consequência da antecipação da renovação das concessões e pelos custos incorridos pelas distribuidoras obrigadas a comprar parte de sua energia no mercado livre, a preços elevadíssimos. O desequilíbrio financeiro detonado a partir da MP 579 do final de 2012 resultou na necessidade de um aporte grande de recursos do Tesouro para manter o setor em funcionamento, uma vez que a decisão populista de redução arbitrária das tarifas tem que ser financiada. Os custos dessa decisão, segundo estimativas da PSR de Mário Veiga, podem atingir mais de R$ 50 bilhões, dos quais R$ 18 bilhões foram aportados em 2013, afetando as contas do governo.
Para tentar reduzir o impacto remanescente, e este é o terceiro ponto mencionado, é que está sendo montado um consórcio de bancos para realizar um empréstimo de R$ 11 bilhões, a ser concedido para a CCEE - Câmara de Compensação de Energia Elétrica. Estou seguro que essa operação só sairá se de alguma forma existir garantia do Tesouro. Finalmente, o quarto problema é repassar para as tarifas todo esse rombo acumulado, uma vez que não é razoável imaginar que o Tesouro vá continuar financiando esse subsídio indefinidamente.

3 - A atividade econômica está, claramente, enfraquecendo. A maior dificuldade está localizada no setor automotivo, uma vez que a produção de veículos e comerciais leves caiu 8,4% no primeiro trimestre, em relação ao mesmo período de 2013. Os estoques no sistema se elevaram bastante e hoje são de 48 dias de vendas, quase o dobro do usual. Os emplacamentos de veículos no início de abril despencaram, apresentando uma queda de mais de 14% em relação ao mesmo período de 2013, segundo a Automotive Business. Com isso, todas as montadoras reprogramaram a produção. Algumas diminuíram turnos, outras deram longas férias coletivas e no mercado comenta-se que a força de trabalho será reduzida. No setor de caminhões, a parada foi ainda mais brusca, uma vez que o BNDES diminuiu fortemente a liberação de financiamentos do PSI. Como consequência dessa redução, a demanda de aço já está sendo afetada (assim como o restante da cadeia), o que se reforça com a lentidão dos investimentos e a consequente redução da demanda de máquinas.

Nesse sentido, pesquisa da FGV já mostra uma preocupante acumulação de estoques não planejados nos setores de bens de consumo duráveis e de capital. Ainda no setor intermediário, elevam-se as notícias de empresas que desligam seus equipamentos para vender energia no mercado livre. Não existem avaliações consolidadas, mas o movimento já tem certo significado em setores como alumínio, ferro-ligas e outros. Nesse caso, melhora o balanço da companhia, mas cai a produção. Outros segmentos, como a construção civil residencial, também reportam maior lentidão nas atividades.

Reafirmamos nossa projeção de 1.6% para o crescimento do PIB de 2014.

Adriana Calcanhotto - Já reparô?

Paulo Mendes Campos: Infância

Há muito, arquiteturas corrompidas,
Frustrados amarelos e o carmim
De altas flores à noite se inclinaram
Sobre o peixe cego de um jardim.
Velavam o luar da madrugada
Os panos do varal dependurados;
Usávamos mordaças de metal
Mas os lábios se abriam se beijados.
Coados em noturna claridade,
Na copa, os utensílios da cozinha
Falavam duas vidas diferentes,
Separando da vossa a vida minha.
Meu pai tinha um cavalo e um chicote;
No quintal dava pedra e tangerina;
A noite devolvia o caçador
Com a perna de pau, a carabina.
Doou-me a pedra um dia o seu suplício.
A carapaça dos besouros era dura
Como a vida — contradição poética —
Quando os assassinava por ternura.
Um homem é, primeiro, o pranto, o sal,
O mal, o fel, o sol, o mar — o homem.
Só depois surge a sua infância-texto,
Explicação das aves que o comem.
Só depois antes aparece ao homem.
A morte é antes, feroz lembrança
Do que aconteceu, e nada mais
Aconteceu; o resto é esperança.
O que comigo se passou e passa
É pena que ninguém nunca o explique:
Caminhos de mim para mim, silvados,
Sarçais em que se perde o verde Henrique.
Há comigo, sem dúvida, a aurora,
Alba sangüínea, menstruada aurora,
Marchetada de musgo umedecido,
Fauna e flora, flor e hora, passiflora,

Espaço afeito a meu cansaço, fonte,
Fonte, consoladora dos aflitos,
Rainha do céu, torre de marfim,
Vinho dos bêbados, altar do mito.
Certeza nenhuma tive muitos anos,
Nem mesmo a de ser sonho de uma cova,
Senão de que das trevas correria
O sangue fresco de uma aurora nova.
Reparte-nos o sol em fantasias
Mas à noite é a alma arrebatada.
A madrugada une corpo e alma
Como o amante unido à sua amada.

O melhor texto li naquele tempo,
Nas paredes, nas pedras, nas pastagens,
No azul do azul lavado pela chuva,
No grito das grutas, na luz do aquário,
No claro-azul desenho das ramagens,
Nas hortaliças do quintal molhado
(Onde também floria a rosa brava)
No topázio do gato, no be-bop
Do pato, na romã banal, na trava
Do caju, no batuque do gambá,
No sol-com-chuva, já quando a manhã
Ia lavar a boca no riacho.
Tudo é ritmo na infância, tudo é riso,
Quando pode ser onde, onde é quando.

A besta era serena e atendia
Pelo suave nome de Suzana.
Em nossa mão à tarde ela comia
O sal e a palha da ternura humana.
O cavalo Joaquim era vermelho
Com duas rosas brancas no abdômen;
À noite o vi comer um girassol;
Era um cavalo estranho feito um homem.
Tínhamos pombas que traziam tardes
Meigas quando voltavam aos pombais;
Voaram para a morte as pombas frágeis
E as tardes não voltaram nunca mais.
Sorria à toa quando o horizonte
Estrangulava o grito do socó
Que procurava a fêmea na campina.
Que vida a minha vida! E ria só.

Que âncora poderosa carregamos
Em nossa noite cega atribulada!
Que força do destino tem a carne
Feita de estrelas turvas e de nada!
Sou restos de um menino que passou.
Sou rastos erradios num caminho
Que não segue, nem volta, que circunda
A escuridão como os braços de um moinho.