segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

OPINIÃO DO DIA: José de Souza Martins

O ressentimento social começou a se tornar evidente já no regime militar e cresceu muito no imediato período pós-ditatorial. O claro uso eleitoral do ressentimento acumulado, na campanha de 2002, deu status político e legitimidade à concepção de que o Brasil é um país de opostos, dos que lesam e dos que são lesados. A retórica de um partido dos pobres contra a opressão e os privilégios de um partido dos ricos, que dominam e exploram há 500 anos, alcançou todos os temas possíveis: raça, cor, classe social, religião. Mesmo criminosos incorporaram essa linguagem e essa mentalidade como referência da legitimidade de seus crimes, vingança dos pobres contra os ricos, dos excluídos contra os incluídos, dos que não podem contra os que podem, dos que não têm liberdade contra os que a têm.

José de Souza Martins, “Ressentimentos oportunistas”. O Estado de S. Paulo / Aliás, 12 de janeiro de 2014

“Pintando o diabo”: Em ano eleitoral, Dilma dará R$ 1 bilhão a mais ao Minha Casa Minha Vida

Programa será trunfo na campanha; oposição denuncia oportunismo

Júnia Gama e Cristiane Jungblut

BRASÍLIA — Determinada a fazer do programa Minha Casa Minha Vida o grande trunfo da campanha pela reeleição, a presidente Dilma Rousseff acionou as equipes técnicas do governo para concluir com rapidez estudos que lhe permitam lançar, o mais depressa possível, a terceira fase do programa, com uma nova meta: contratar a construção de 3,5 milhões de casas entre 2015 e 2018, contra 2,7 milhões da fase 2, que termina este ano.

Em ano eleitoral, a verba prevista no Orçamento da União para o Minha Casa foi turbinada: será cerca de R$ 1 bilhão a mais que em 2013. Segundo o Ministério do Planejamento, em 2014 haverá R$ 15,77 bilhões previstos no Orçamento.

Quando anunciou a terceira fase do programa, em novembro, o governo estimava 3 milhões de casas. Agora, Dilma quer 3,5 milhões para sua nova bandeira eleitoral. O núcleo político do governo e a equipe da reeleição sabem, com base em pesquisas qualitativas, que o Bolsa Família, já no 10º ano de vigência, não tem mais o poder eleitoral do passado, pois já é considerado uma conquista sem volta.

O discurso pela manutenção do Bolsa Família não poderá, portanto, ser o único trunfo da campanha. Até porque o principal candidato de oposição, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), já adotou o discurso de que o Bolsa Família é irrevogável. No fim de outubro do ano passado, Aécio apresentou projeto no Senado que transforma o Bolsa Família em programa de Estado, ao incorporá-lo permanentemente à Lei Orgânica de Assistência Social (Loas). A justificativa do tucano foi acabar com o que chamou de terrorismo contra as famílias beneficiadas pelo programa em véspera de eleição.

O Minha Casa, segundo pesquisas encomendadas pelo governo, tem aprovação da população e grande potencial para render votos, mas problemas verificados em diversos conjuntos habitacionais — como rachaduras, infiltrações e panes elétricas — podem ser explorados pelos adversários. Por isso, além da pressão para que os estudos técnicos sobre a meta do eventual segundo mandato sejam logo concluídos, a presidente também orientou seus ministros a fazerem correções para evitar os erros mais comuns das etapas anteriores.

Para a oposição, turbinar os valores do MCMV em ano eleitoral configura oportunismo por parte do Planalto. O senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) afirma que o governo está se aproveitando das dificuldades socioeconômicas da população para conseguir mais votos.

— Há um grande oportunismo eleitoral em fazer um reforço de R$ 1 bilhão no programa em ano de eleições. O governo usa as fragilidades da população mais pobre para se perpetuar no poder. Mas essa conta será paga um dia pela sociedade, porque está se fabricando uma grande bolha, o grau de inadimplência é altíssimo.

O líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE), negou que haja uso eleitoral do programa e disse que o Minha Casa é importante para aquecer a economia e gerar empregos:

— Os que são contra ampliar os recursos do Minha Casa Minha Vida para 2014 são os mesmos que votaram contra a criação do programa lá atrás.

O potencial político do Minha Casa pode ser medido na própria execução financeira do MCMV, que não sofre cortes pela área econômica, diferentemente de outros programas que são ajustados ao longo do ano. Em 2013, o Minha Casa recebeu R$ 14,66 bilhões, teve despesas executadas no mesmo valor e pagamentos feitos de R$ 14,02 bilhões.

O Ministério das Cidades, responsável pelo programa habitacional, terá em 2014 uma verba total de R$ 26,6 bilhões. É por programas como o Minha Casa que o ministério está no centro das disputas políticas no âmbito da reforma ministerial que Dilma fará em breve. O ministro Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) deixará o cargo para concorrer ao governo da Paraíba. O PP tenta fazer um sucessor, mas a pasta é cobiçada por PT e PMDB.

Presidente contesta comparação de gastos
A presidente Dilma Rousseff usou as redes sociais para contestar informações de que o governo investiu menos em Educação que na construção de estádios nas 12 cidades que abrigarão partidas da Copa. Ela afirmou pelo Twitter que o governo transferiu, em 2013, um total de R$ 49,4 bilhões em Educação para Manaus, Cuiabá, Brasília, Fortaleza, Recife, Natal, Belo Horizonte, Salvador, Porto Alegre, São Paulo, Curitiba e Rio.

“No nosso governo, a prioridade à Educação é real. Nunca se investiu tanto em Educação, porque acredito que que este é o nosso passaporte para o futuro”, escreveu Dilma, no Twitter. Segundo ela, além dos R$ 49,4 bilhões, o governo repassou às cidades-sede da Copa um total de R$ 7,3 bilhões do Novo Fies e R$ 2,06 bilhões do Pronatec, dois programas de financiamento da Educação.

Os dados foram divulgados em reação a um dado da Agência Pública (organização que acompanha gastos dos governos) que mostrava que, em nove das 12 cidades da Copa, o financiamento federal para construção e reforma de estádios de 2010 a 2013 superou os repasses à Educação.

Fonte: O Globo

Lucro inflado da Caixa- Reação do Planalto

Após Dilma cobrar explicação do BC, governo garante direito de poupador da Caixa

Banco monta operação para informar correntistas e evitar corrida às agências

Martha Beck, Paulo Celso Pereira, Ramona Ordoñez

BRASÍLIA e RIO - O governo montou no fim de semana uma operação emergencial para esclarecer a população sobre o episódio da incorporação do saldo de cerca de 500 mil contas da caderneta de poupança ao lucro da Caixa em 2012. Preocupada com a repercussão do caso, a presidente Dilma Rousseff cobrou explicações do presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini. Dilma mandou que ficasse claro que nenhum poupador seria prejudicado. Segundo a Caixa, sem conseguir contatar 496.776 correntistas da caderneta de poupança com cadastros irregulares e que não movimentavam as contas, o banco registrou o total de depósitos, de R$ 719 milhões, como receitas em seu balanço. Após o desconto dos impostos, a operação representou um acréscimo de R$ 420 milhões ao lucro daquele ano. O banco afirma ter adotado uma série de iniciativas para localizar os clientes de 2005 a 2011.

Temendo uma corrida às agências bancárias - tal qual ocorreu em maio do ano passado após a explosão de boatos sobre o Bolsa Família - a Caixa já começou a informar os correntistas por SMS e por sua página na internet que os recursos depositados nessas contas estão garantidos e podem ser sacados após a regularização dos cadastros. Além disso, a partir das 8h de hoje, as agências do banco terão um plantão para esclarecer dúvidas dos correntistas. Líderes da oposição no Congresso criticaram a manobra contábil, que respondeu por 6,9% do lucro do banco em 2012, e pretendem convocar o presidente da Caixa, Jorge Hereda, para esclarecer a operação.

O caso foi descoberto numa auditoria da Controladoria Geral da União (CGU), que levou o assunto ao BC e foi revelado em reportagem da revista “Isto É”. A autoridade monetária entendeu que a forma de contabilização foi irregular e ordenou que a Caixa corrigisse seu balanço.

Segundo fontes do Palácio do Planalto, Dilma ficou incomodada com o tom adotado pela imprensa que, na avaliação da presidente, poderia levar a uma corrida de poupadores. No ano passado, o governo foi obrigado a vir a público dar explicações depois que se espalharam boatos de que o Bolsa Família seria encerrado. Na época, milhares de pessoas foram às agências do banco sacar benefícios, provocando confusão. Além disso, o governo se preocupa com a maquiagem do lucro, que também piora a já desgastada imagem das contas do governo - turbinadas no ano passado por receitas extraordinárias. A orientação no Planalto é tratar o assunto como uma questão interna do banco, já devidamente orientado pelo Banco Central.

Oposição quer esclarecimento de Hereda
Seguindo a determinação da presidente, o Banco Central divulgou nota ontem para deixar claro que a medida não se trata de um confisco da poupança. A autoridade monetária garante que os correntistas poderão requerer o depósito a qualquer momento e que, para isso, basta procurar a Caixa e apresentar documentos que comprovem que são os donos das contas.

“As regras asseguram que clientes que tiverem suas contas encerradas têm direito aos saldos existentes, após regularização da sua situação, a qualquer tempo. No caso específico da Caixa, não há qualquer prejuízo para correntistas e poupadores da instituição”, afirma a nota do BC. O texto destaca ainda que “a Caixa já está providenciando a regularização de alguns dos procedimentos internos utilizados no encerramento de contas irregulares, bem como ajustes contábeis no seu balanço”.

Líderes da oposição, como o presidente do DEM, senador José Agripino Maia (RN), no entanto, pretendem pedir que o presidente da Caixa, Jorge Hereda, compareça à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado para dar explicações.

- Eles encontraram um artifício para produzir lucro de forma que a Caixa tivesse condição de oferecer recursos ao Tesouro. Esse é mais um elemento do Orçamento maquiado da União. Como agora as contas do governo estão efetivamente deterioradas, estão precisando disso. Esse assunto seguramente será levado à CAE do Senado, que é o foro apropriado para ouvirmos Hereda - disse Agripino Maia.

O presidente do PSDB e presidenciável do partido, senador Aécio Neves (MG), emitiu nota qualificando a revelação como “estarrecedora”. Segundo ele, a operação demonstra “a falta de limites do governo do PT em sua prática de manipulação contábil, que vem minando a credibilidade das contas públicas do país”. O tucano afirma ainda que o PSDB pedirá esclarecimentos formais à Caixa ainda hoje e, a partir das respostas, “avaliará as medidas legais cabíveis para garantir os direitos dos poupadores brasileiros, assegurar o fiel cumprimento da legislação em vigor e responsabilizar judicialmente os responsáveis.”

A CGU diz que foram detectados três problemas nas contas do banco: a forma de encerramento das contas, as transferências dos saldos para a receita do banco e a transparência da operação nas Demonstrações Contábeis. Por isso, o relatório foi enviado ao BC e ao Tribunal de Contas da União (TCU).

Segundo o diretor jurídico do Procon-RJ, Carlos Eduardo Amorim, o correntista deve procurar a Caixa munido de identidade e CPF para provar que é o titular da conta. Caso encontre dificuldade, pode procurar o órgão para entrar com um processo administrativo contra a Caixa, mas Amorim avalia que este cenário é improvável.

- Se os clientes aparecerem do nada, isso coloca em xeque o sistema de busca da Caixa. A orientação é que o correntista deve procurar uma agência da Caixa para regularizar sua conta - disse.

Fonte: O Globo.

Para analistas, operação da Caixa foi tentativa de inflar ganhos

Legislação sobre o tema é ambígua, na avaliação de especialistas

Bruno Rosa, Ramona Ordoñez

RIO - Na avaliação de especialistas ouvidos pelo GLOBO, a contabilização de recursos de contas já encerradas como “outras receitas operacionais” foi uma tentativa da Caixa Econômica Federal (CEF) de mostrar um balanço melhor do que o efetivamente registrado no período. O banco fechou cerca de 500 mil contas de poupança que estavam com problemas cadastrais em 2012, o que resultou em acréscimo de de R$ 420 milhões no lucro líquido daquele ano.

Para o ex-diretor do BC e atual economista chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, a Caixa errou ao contabilizar os recursos das contas como receita, pois esse tipo de manobra contábil “infla” o balanço da instituição em bases irreais.

Carlos Thadeu explicou que os balanços das instituições financeiras são mais rígidos do que os das empresas justamente para evitar que os bancos não demonstrem uma posição financeira irreal, atraindo mais clientes, que poderão acabar sendo prejudicados no futuro.

Sem autorização do BC
Para o economista, a Caixa se apropriou dos recursos de forma irregular, pois tinha de ter pedido autorização do BC.

- A Caixa não poderia ter se apropriado dessa poupança de forma unilateral. A Caixa teria que ter pedido autorização ao BC e não fez. Isso já é um erro - disse Carlos Thadeu, ao destacar que as circulares do BC são ambíguas e suscitam dúvidas.

- Houve uma manobra contábil para a Caixa mostrar um balanço melhor do que foi. Na verdade, o dinheiro está disponível para os clientes, que têm supostamente irregularidades em sua contas - corroborou o especialista em direito tributário Marcelo Nogueira, do Instituto Brasileiro de Direito Tributário.

O ex-economista-chefe da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) Roberto Troster lembrou que hoje existe uma indefinição regulatória sobre o que os bancos devem fazer e onde alocar em seus balanços os recursos financeiros de contas inativas:

- A regulamentação não está escrita de uma forma clara. Então, fica uma indefinição. Esse episódio envolvendo a Caixa será como uma novela. Teremos de aguardar os próximos capítulos. Acho que haverá ainda uma discussão sobre o que os bancos fazem com o dinheiro que sobra nas contas.

Fonte: O Globo.

Auditoria aponta sobrepreço e atrasos na entrega de calendários dos Correios

Gasto público. Desde 2008, estatal já desembolsou quase R$ 3 milhões com a compra de brindes de ano-novo, mas análise da CGU apurou demora de até sete meses para produto chegar aos destinatários; em 2013, contrato de R$ 7 milhões foi revisto após constatação de fraude

Andreza Matais, Fábio Fabrini

Empresa estatal que promete agilidade em slogans ao estilo "Chega rapidinho" e "Mandou, chegou", os Correios gastaram nos últimos seis anos quase R$ 3 milhões com a compra de calendários de mesa distribuídos a funcionários e clientes com até sete meses de atraso.

Auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) descobriu que a demora recorrente na entrega está combinada ainda ao pagamento de valores mais altos por brindes de qualidade inferior. O contrato para os calendários ano 2013 previa a compra de 2 milhões de unidades por R$ 7,1 milhões. A média até então de unidades compradas era de 200 mil.

Trata-se da maior quantidade já contratada pela empresa, com valor 124,36% superior e material de pior qualidade na comparação com o ano anterior, segundo o relatório obtido pelo Estado. Para ter uma ideia, a Caixa Econômica Federal, que tradicionalmente presenteia com calendários, comprou 6 milhões de calendários 2013/2014 (três vezes mais que os Correios) a R$ 6,6 milhões (R$1,10 cada). De papel reciclado e com melhor qualidade.

A quantidade comprada pelos Correios, contudo, acabou revista após a CGU constatar que houve fraude na licitação da gráfica contratada para imprimir os calendários. Ap final, o valor pago pelos calendários 2013 foi de R$ 831,4 mil, ainda assim o maior desembolso da empresa pública para esse tipo de compra desde 2008.

A meta para 2014 é gastar ainda mais: quase R$ 1 milhão para enviar de presente 619,2 mil unidades, quantidade acima da média dos últimos seis anos. A empresa garante que desta vez o material vai ser encaminhado com celeridade e chegará às mãos dos destinatários pelo menos até o fim deste mês. "Já está sendo distribuído a todas as Diretorias Regionais e à Administração Central", informa a estatal.

A distribuição dos brindes a clientes, agências franqueadas, funcionários e aposentados se repete como estratégia de relacionamento. Mas, contrariando as juras de pontualidade, alma do negócio de entregas, análise da CGU apurou que a demora e o desperdício têm se incorporado à prática.

De 2009 para cá, os calendários nunca chegaram aos destinos antes do fim de janeiro. Em seis anos, os Correios entregaram 1,2 milhão de calendários.

Em 2013, as entregas só ocorreram em março, segundo a CGU.

Os 231 mil impressos em 2012 só foram enviados em julho, quando já se poderiam descartar as folhinhas de sete meses; em 2010, a remessa de 220 mil ocorreu em abril, passados o réveillon, o carnaval e a Semana Santa. Segundo a auditoria, só houve alguma pontualidade em 2008, quando 150 mil peças chegaram no meio de janeiro.

Para a CGU, em relatório concluído em setembro, não há justificativa para as licitações terem ocorrido tardiamente, "sem considerar o prazo que as empresas contratadas despenderiam para produzir os calendários". Isso porque não se trata de uma compra emergencial.

E notório que os anos recomeçam a cada 12 meses, no dia primeiro de janeiro.

Fraude. Vencedora do certame para os calendários de 2013, a A.R.Ribeiro, do Rio Grande do Sul, apresentou um atestado de capacidade técnica supostamente fraudado. A nota fiscal que comprovaria experiência nesse tipo de serviço foi emitida por uma gráfica ligada à A.R.Ribeiro, pois tinha o mesmo representante legal, e cancelada fogo em seguida.

"Observou-se que a quantidade (2.047.800) e o preço unitário (R$ 3,50) contratados no pregão de 2012 foram superiores... às quantidades e preços unitários contratados em licitações passadas, sendo que a quantidade contratada neste pregão foi 783,59% superior à de 2011 e o preço unitário aumentou 124,36% no mesmo período."

Os auditores registraram ainda que a fornecedora não funcionava no endereço cadastrado e não comprovou ter o maquinário necessário. Por causa das falhas, o contrato teve de ser suspenso quando 237,5 mil unidades haviam sido entregues, ao custo de R$831,4 mil. A CGU pediu a abertura de processo para eventual punição à fornecedora. Além disso, cobrou dos Correios explicações sobre a compra em quantidade oito vezes maior que a média de anos anteriores e com preço unitário 124% mais alto.

Cada calendário de 2012 custou R$ 1,56 por unidade; um ano depois, apesar da quantidade encomendada e do papel ser de qualidade inferior, os Correios pagaram à AR.Ribeiro R$ 3,50.

Para a CGU, a empresa pública deveria ter ampliado sua pesquisa de preços para obter "propostas mais vantajosas para a administração pública".

Fonte: O Estado de S. Paulo

Casa Civil na mira do MPF

Procuradores investigam se órgão da Presidência manipulou o processo sobre a conduta de Rosemary Noronha em esquema de corrupção

Amanda Almeida

O Ministério Público Federal (MPF) investiga a Casa Civil por suposta manipulação do processo que apurou o envolvimento de Rosemary Noronha, ex-chefe de gabinete da Presidência em São Paulo, indicada ao cargo pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em esquema de corrupção e tráfico de influência. A Procuradoria da República no Distrito Federal (PR-DF) também quer saber se a Secretaria-Geral da Presidência, comandada pelo ministro Gilberto Carvalho, fiel escudeiro de Lula, foi omissa em relação ao caso para blindar a petista.

Braço-direito de Lula durante os seus dois governos (2003-2010), Rose caiu em desgraça após a Polícia Federal apontar a participação dela em suposto esquema de venda de pareceres técnicos do governo a empresas privadas. Ela teria se aproveitado da relação íntima com o ex-presidente para indicar dois integrantes do grupo investigado, os irmãos Paulo e Rubens Vieira, a cargos de chefia em agências reguladoras. Conforme o inquérito da Operação Porto Seguro e denúncia do Ministério Público, que a acusam de falsidade ideológica, tráfico de influência, corrupção passiva e formação de quadrilha, a ex-chefe de gabinete recebia vantagens para facilitar pleitos da quadrilha.

O inquérito sobre as investigações do governo federal a respeito de Rose foi aberto em 18 de dezembro e tem prazo de um ano, prorrogável por mais outro, para ser concluído. A PR-DF dá início à apuração com denúncia — cuja autoria é mantida em sigilo pelo órgão — de que a Secretaria de Controle Interno da Presidência da República (Ciset), embora tenha a função de apurar administrativamente os ilícitos cometidos por funcionários da Presidência, não teria se movido em relação ao caso Rosemary.

A Ciset é vinculada à Secretaria-Geral da Presidência. As acusações que chegaram à Procuradoria sugerem ainda que a apuração da Casa Civil não teria sido “revisada” pela Ciset. Durante as apurações, teria havido um desgaste entre os dois órgãos do governo. Funcionários da Ciset teriam aberto uma investigação “paralela” à da Casa Civil, que não gostou da interferência. O desentendimento teria sido a causa da demissão do então secretário de Controle Interno, Jerri Coelho, e do então coordenador-geral de Correição do órgão, Torbi Abich Rech, em setembro passado.

Os dois, que não foram localizados pela reportagem, teriam insistido que não era atribuição da Casa Civil investigar o caso Rosemary. O papel seria da Ciset, que tem função de órgão seccional de correição, com área de atuação relacionada aos departamentos integrantes da Presidência da República.

A Casa Civil instaurou sindicância para apurar a conduta de Rose em novembro do ano passado. O relatório listou irregularidades administrativas cometidas pela ex-funcionária e pediu à Controladoria-Geral da União (CGU) a abertura de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD). A CGU concluiu pela demissão de Rose e ainda a proibiu de ocupar novos cargos no governo federal.

“As conclusões da CGU levaram em conta, segundo parecer jurídico da controladoria, que a ‘culpabilidade, considerada como índice de reprovação social da conduta, é elevada, tendo em vista que a sociedade brasileira tolera cada vez menos a atuação improba de servidores públicos’”, registra a decisão do órgão.

Em meio às investigações sobre o caso, o Ministério Público e a Casa Civil entraram em conflito. A pasta diretamente ligada ao Palácio do Planalto negou à Procuraria da República em São Paulo acesso às informações sobre o processo de sindicância feito pelo órgão. Para o MP, as informações auxiliariam nas apurações do caso e a recusa foi um obstáculo ao pleno conhecimento dos ilícitos praticados pela ex-funcionária.

A Casa Civil alegou que “o chefe do Gabinete Pessoal da Presidência da República não tem competência para prestar a informação requisitada”. Em nota, a pasta disse que o MPF “descumpriu a própria Lei Complementar do Ministério Público, que estabelece que requerimentos de informações desta natureza sejam previamente submetidos ao procurador-geral da República, procedimento que não foi obedecido neste caso”.

Fonte: Correio Braziliense

Governo elevou superávit com recursos de Estados

Ribamar Oliveira, Marta Watanabe e Tainara Machado

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Parte do superávit primário do governo federal em dezembro foi feito com receitas que deveriam ter sido repassadas a Estados e municípios. A parcela de dezembro do salário educação, de cerca de R$ 700 milhões, só foi transferida no dia 30 do mês passado. Com isso, a receita só saiu do caixa do Tesouro Nacional e entrou nos cofres estaduais no início de janeiro.

Também não foi transferida a esses entes da Federação parte do Imposto de Renda obtido com o parcelamento especial de débitos tributários de controladas e coligadas de empresas brasileiras no exterior. A Constituição determina que 45% do IR têm de ser repassados aos Estados e municípios. Essa receita ingressou nos cofres do Tesouro em novembro e não foi transferida.

Técnicos estimam que esses dois itens envolvem receita de R$ 2,5 bilhões a R$ 3 bilhões que ficou no caixa da União e ajudou a compor o superávit federal. A decisão de não transferir os recursos, segundo alguns secretários de Fazenda, melhorou o resultado primário da União e piorou o de Estados e municípios, que tiveram seu fluxo de caixa prejudicado.

O Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) pediu ao governo federal, em nome dos Estados, para contabilizar em 2013 dois valores de transferências que devem entrar no caixa dos governos estaduais apenas neste mês. O primeiro diz respeito à transferência de R$ 1,95 bilhão referente a um auxílio da Lei Kandir. O montante estava no Orçamento federal do ano passado, mas só em 18 de dezembro uma Medida Provisória (MP 629) liberou os recursos e estabeleceu prazo de 30 dias para que os governos regionais recebam os valores, que não foram transferidos em dezembro.

O outro valor reivindicado por Estados e municípios é a parcela que lhes pertence na arrecadação adicional no Refis que a Receita Federal obteve em novembro. Do total de R$ 20,4 bilhões em ingressos extraordinários registrados naquele mês, R$ 2,5 bilhões a R$ 3 bilhões deveriam ser destinados aos cofres dos governo locais.

Fonte: Valor Econômico

As metas e os truques

Como expõe a alta na inflação, o uso de artifícios contábeis não disfarça a dificuldade do governo para cumprir os objetivos centrais de uma política econômica estável

Ana Luiza Daltro

Em meio aos debates da edição de 2011 do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, uma jornalista perguntou a Larry Summers, ex-secretário do Tesouro dos Estados Unidos na gestão Bill Clinton e ex-reitor de Harvard, se ele achava que as conversas entre a Casa Branca e os empresários americanos estavam fluindo melhor do que no começo da crise financeira. Summers disparou: "O presidente (Barack Obama) está plenamente consciente de que a confiança é a forma mais barata de estímulo". Não é possível esperar que os empresários invistam de forma vigorosa quando eles não confiam na capacidade do governo de prover um ambiente econômico previsível e favorável aos negócios. A credibilidade decorre, antes de mais nada, do cumprimento de metas básicas, entre elas as de inflação e as estabelecidas para as contas públicas.

Quando um governo se desvia desses objetivos, ele colabora para ampliar o nível de incerteza sobre o comportamento futuro da economia — e inibe os investimentos. Consciente da necessidade de não ser derrotado pela chamada "guerra das expectativas", o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e outros integrantes graduados da equipe de Dilma Rousseff têm prometido dar novo ânimo ao combate à inflação e também ao rigor na execução do Orçamento. As palavras, entretanto, nem sempre encontram arrimo nas ações. Os resultados recentes de alguns dos principais indicadores econômicos foram mascarados por truques numéricos e contábeis que, observados com atenção, apenas serviram para lançar mais incertezas.

O resultado da inflação de 2013, divulgado na sexta-feira, é um exemplo. A alta do índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 5,91%. O centro da meta de inflação, que deveria ser o alvo do Banco Central, é de 4,5%. O governo trabalhava com a meta informal de obter um índice inferior aos 5,84% de 2012, mas nem esse objetivo mais frouxo foi alcançado. Além disso, o número oficial seria muito maior se o governo não controlasse a ferro e fogo os chamados preços administrados. Essa categoria, que inclui a gasolina e as tarifas de energia elétrica e transportes públicos, subiu apenas 0,95% no ano passado. Já a cesta básica, por exemplo, viu o seu preço crescer a mais de 10% em nove capitais brasileiras. Em outro ponto preocupante, houve uma aceleração dos reajustes nos últimos meses do ano. A inflação em dezembro, de 0,92%, foi a maior num único mês desde 2003. Como consequência, consultores já esperam que o BC aumente a taxa básica de juros para além do previsto originalmente — e isso em um momento de crescimento ainda tímido da economia.

O ponto considerado como o mais frágil da política econômica está nas contas públicas. Mantega antecipou, em 3 de janeiro, o anúncio dos números preliminares do superavit fiscal primário para 2013. A decisão de fazer o comunicado, nas palavras do ministro, foi tomada para acalmar os "nervosinhos" do mercado financeiro. Mas a divulgação de pouco serviu para distender os nervos. O ministro festejou o fato de o resultado obtido ter ficado em 75 bilhões de reais, acima dos 73 bilhões prometidos. Problema número 1: a meta original a ser cumprida, prevista em lei. era de 108 bilhões de reais. Os tais 73 bilhões, como explica o economista Felipe Salto, resultam dos descontos com obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Problema número 2: o resultado de 75 bilhões de reais só foi possível graças a receitas extraordinárias obtidas de última hora, como as do programa de renegociação de dívidas em atraso e as da concessão do campo de Libra. O governo também lançou para 2014 gastos programados para o ano passado. Sem esses expedientes, o resultado final seria próximo de zero.

Segundo cálculos do economista Alexandre Schwartsman, até novembro do ano passado as receitas oriundas de concessões de infraestrutura, de dividendos de estatais e de renegociações de dívidas tributárias alcançaram 59 bilhões de reais. O superávit federal oficial, que chegou a 1,9% do PIB nos doze meses terminados no citado mês, mal encostaria em 0,3% do PIB. Problema número 3: o ministro não se comprometeu com nenhuma meta para 2014, contribuindo apenas para dar mais razão aos "nervosinhos". "Não existe um planejamento, um ataque conjunto aos problemas que temos"", afirma o economista Sergio Valle, da MB Associados. "Essa ilusão permanente em que o governo vive, e que o mercado cada vez mais acredita que não vai mudar, certamente trará rescaldos perigosos para os próximos anos."

Até mesmo nas transações comerciais externas o Brasil passou a obter resultados frustrantes — prontamente mascarados por novos truques. O saldo na balança entre as exportações e as importações ficou positivo em 2,6 bilhões de dólares no ano passado, o pior resultado desde 2000, quando houve um déficit de 731 milhões de dólares. Mas o resultado teria sido ainda mais fraco não fosse o expediente, cada vez mais empregado, de contabilizar como exportação o deslocamento de plataformas de petróleo que na verdade nunca saíram do Brasil. Os fornecedores desses equipamentos os vendem no papel a subsidiárias de petroleiras no exterior, que os "trazem" para as suas operações aqui como se os estivessem alugando. A manobra, que faz com que as empresas consigam pagar menos impostos, está de acordo com as regras do comércio internacional e com a legislação brasileira. O valor total de operações comerciais do tipo atingiu 6 bilhões de dólares entre 2004 e 2012, enquanto que, só no ano passado, 7,7 bilhões de dólares em plataformas de petróleo que nunca deixaram o Brasil "viraram" exportação. Não fosse isso, o governo teria anunciado um déficit nas transações comerciais.

"O Brasil passou 2013 escorregando nas cascas de banana que plantou para si e fingindo que o problema estava em outro lugar", diz a economista Monica Baumgarten de Bolle, sócia-diretora da Galanto Consultoria. "O gorno fingiu que o problema era o quadro internacional, e adotou medidas mal concebidas e desorganizadoras. Enquanto isso, as contas públicas se esfacelaram, o déficit externo aumentou e a inflação se estabeleceu em um terreno pantanoso, cheio de artifícios e ingerência nos preços administrados." Resta torcer por um 2014 com uma dose menor de autoengano por parte do governo — e também com menos truques, que não enganam mais ninguém na plateia e servem apenas para minar a confiança na economia.

Fonte: Revista Veja

Cenas de um casamento

Marina Silva e Eduardo Campos enfrentam as primeiras agruras no relacionamento. Mas uma intriga do "ex-" de ambos – o PT – pode uni-los novamente

Alberto Bombig e Leopoldo Mateus

O casal fetiche da política brasileira - Marina Silva e Eduardo Campos - enfrentou, na semana passada, um fantasma que assombra qualquer relacionamento: as intrigas do "ex". O PT, ex-partido de Marina e ex-aliado de Campos, divulgou na internet uma nota amargurada, em que chamou o governador de Pernambuco de "tolo" e disse que Marina planeja trair Campos e tirar dele a condição de pré-candidato ao Planalto. A paulada foi desferida num momento em que os dois políticos enfrentam as primeiras agruras no relacionamento.

Quatro meses atrás, quando Marina Silva e Eduardo Campos anunciaram em Brasília a união de seus projetos políticos, o clima era de confraternização. Como nas mais tradicionais celebrações políticas desse tipo, os dois juraram fidelidade ao compromisso assumido pelo PSB dele e pela Rede Sustentabilidade dela: construir uma candidatura alternativa à polarização PT-PSDB, que desde 1994 domina as eleições presidenciais no Brasil. Marina, na frente de dezenas de testemunhas, assinou sua filiação ao PSB, pois a Rede não conseguiu o registro oficial na Justiça. Depois do foguetório na cerimônia e da lua de mel apaixonada, segue-se, agora, o longo período de ajustes que acontecem sempre que um casal vai morar junto. Apesar de unidos, os dois partidos iniciaram 2014 mostrando que estão distantes em vários aspectos e precisam discutir a relação.

"Nós casamos sem namorar e agora estamos nos conhecendo melhor. Não há guerra, mas ponderações dos dois lados que precisam ser discutidas", disse o deputado federal Beto Albuquerque (RS), da Executiva Nacional do PSB. Como em qualquer casamento, o principal problema são as diferenças de estilo. Em termos políticos, Campos é "sociável" e Marina "retraída". O PSB tenta a todo custo fazer alianças regionais, importantíssimas na política brasileira - e a Rede, em vários lugares, vem emperrando o processo. Desde que entrou no PSB, Marina tem dito que não quer apoiar candidaturas petistas ou tucanas nos Estados.

O principal problema está em São Paulo, decisivo em qualquer eleição presidencial. Emissários de Campos chegaram a fechar um acordo para que o PSB apoiasse a reeleição de Geraldo Alckmin (PSDB) ao governo do Estado. Em troca, o partido indicaria o vice da chapa. O grupo de Marina se insurgiu contra o arranjo. "Nós defendemos uma alternativa própria. O modelo do SDB para São Paulo existe há 20 anos e se esgotou. Não dá para falar em renovação da política e apoiar um modelo como esse", disse Célio Turino, um dos porta-vozes da Rede em São Paulo.

Diante dos protestos da Rede, o PSB rapidamente voltou atrás no acordo com Alckmin e anunciou que ainda discute uma alternativa para São Paulo. Reservadamente, no entanto, a cúpula do PSB ainda nutre esperanças de apoiar Alckmin e garantir um palanque forte para Campos no Estado. Segundo apurou ÉPOCA, Campos aceitou retroceder neste momento porque, antes de qualquer outro objetivo, quer amarrar Marina como sua candidata a vice-presidente. Uma vez consolidada a chapa nacional à Presidência, o PSB aposta que Marina teria de apontar também uma solução para São Paulo - e dificilmente encontraria um nome eleitoralmente viável. Dessa forma, a aliança com Alckmin voltaria a ser discutida, porque daria a Campos e a Marina um palanque forte no maior colégio eleitoral do país.

Outra possibilidade seria uma aliança entre o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD) e o presidente da Fiesp e pré-candidato ao governo paulista, Paulo Skaf (PMDB). Na hipotética composição, Kassab concorreria ao Senado, Skaf ao Palácio dos Bandeirantes, e a vaga de vice na chapa sobraria para o PSB, criando um palanque forte e exclusivo para Campos no Estado. Skaf e Kassab não são tucanos nem petistas, ou seja, não pertencem aos partidos que Marina rejeita. Mas a hipótese tampouco empolga os integrantes da Rede. "A ideia é uma terceira via em todos os lugares onde for possível", diz o deputado federal Walter Feldman, que acompanhou Marina na ida para o PSB. A preferência da Rede seria por uma candidatura própria em São Paulo, a partir de uma composição com PPS e PV.

"A opinião da Marina será respeitada, considerada, mas a opinião dos 230 mil filiados do PSB também será respeitada. Vamos tentar encontrar algo que contente a todos os lados, e, se não der, a gente vai respeitar como se fossem dois partidos", diz o deputado federal Márcio França, presidente do PSB paulista. Na prática, como diz França, PSB e Rede já funcionam como dois partidos. Inclusive moram em "casas separadas". Logo que a Rede ingressou no partido, o PSB propôs dividir a mesma sede, e a Rede chegou a cogitar a hipótese. Pouco tempo depois, o partido de Marina recusou o convite. "Onde não houver consenso, podemos andar separados. Mas com certeza estaremos unidos no compromisso nacional", afirma Beto Albuquerque. "Dificuldade do ponto de vista programático não tem acontecido", diz Feldman. "Os encontros em São Paulo, tanto municipal quanto estadual, foram muito interessantes e apareceram muitas semelhanças entre as visões dos partidos."

Nesse contexto, o ataque do PT na internet foi providencial. Nada como um inimigo externo para fortalecer um casal. "Campos foi levado a colocar dentro de seu ninho pernambucano o ovo da serpente chamado Marina Silva (...) Como até os tubarões de Boa Viagem sabem que o objetivo de Marina é se viabilizar como cabeça da chapa presidencial pretendida pelo PSB, é bem capaz que o governador esteja pensando com frequência na enrascada em que se meteu", diz um trecho do texto apócrifo publicado no site do PT. Em outro trecho, Campos é chamado de "playboy mimado".

A paulada petista não uniu apenas o casal, mas também suas respectivas "famílias". "Esse ataque só revela a intolerância dos petistas a qualquer tipo de crítica e de oposição", disse o senador Rodrigo Rollemberg (DF), líder do PSB no Senado. "O texto tem uma linguagem que nos espanta ao ser usada pelo PT", afirmou Célio Turino, da Rede. A cúpula da Rede dá como certo Marina ser vice de Campos - e a tendência é que, aparando arestas como a de São Paulo, o anúncio seja feito já no início do ano. Os próximos passos desse xadrez devem ser dados nesta semana. No dia 13, haverá uma reunião da Rede, em Brasília. Quatro dias depois, a previsão é de que Eduardo Campos promova um encontro para montar sua equipe. Até o fim do mês, as definições devem começar a acontecer. Socialistas e marineiros garantem que o relacionamento prospera. Na alegria e na tristeza.

Revista Época

A guerra só está no início

Ex-aliado do PT, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, experimenta a fúria da falconaria. A máquina de difamação do petismo começou a funcionar

Robson Bonin

Quando ainda era aliado do PT, o governador de Pernambuco. Eduardo Campos, costumava ser tratado como um predestinado. Em um de seus últimos discursos como presidente, em dezembro de 2010, Lula definiu Campos como "um companheiro, um diamante que não se encontra em qualquer lugar". O tempo passou, e o governador, prestes a se tomar adversário do partido nas eleições presidenciais deste ano, começou a ser visto pelos antigos companheiros com outros olhos, bem diferentes. 

Na semana passada, ele experimentou a fúria da falconaria petista. O "companheiro Eduardo", que para Lula era "gente boa que não se acha em qualquer lugar", virou para o PT um "tolo", um "playboy mimado" que "vendeu a alma à oposição". O ataque virulento veio na forma de um texto publicado na página oficial do partido no Facebook. Sob o título "A balada de Eduardo Campos", o artigo expõe o que há de mais íntimo no caráter do petismo, acostumado a caluniar, difamar e perseguir os inimigos. É só o começo da guerra eleitoral que se avizinha.

O texto foi avalizado por dirigentes do partido, embora tenha sido criticado por petistas menos estridentes, temerosos de que o ataque possa, em vez de g ajudar, causar prejuízo às pretensões t reeleitorais da presidente Dilma Rousseff. | A preocupação maior é com a possibilidade de Eduardo Campos aliar-se aos tucanos num eventual segundo turno entre o PT e o PSDB. 

O governador, conhecido por sua diplomacia política, reagiu ao ataque petista também pela internet: "Sigo firme no debate de alto nível sobre o Brasil. O resto a gente ignora. Porque, enquanto os cães ladram, nossa caravana passa". O jogo sujo contra os inimigos faz parte da história do PT. Não por acaso, alguns dos principais escândalos eleitorais recentes do partido envolvem ofensivas nada edificantes destinadas a torpedear adversários. Foi assim em 2006 com os aloprados, pilhados comprando um dossiê fajuto contra o tucano José Serra. E foi assim na última corrida presidencial, quando petistas montaram uma estrutura clandestina de arapongagem no coração da campanha de Dilma Rousseff. 

É sabido que o ataque a Eduardo Campos é obra de profissionais contratados pelo PT para fazer o jogo sujo da campanha na internet. No texto dos novos aloprados, nem a memória de Miguel Arraes, aliado histórico dos petistas e avô de Campos, é poupada. "O velho Miguel Arraes faz bem em já não estar entre nós, porque, ainda estivesse, morreria de desgosto", escreveram. Por ter sido aliado até recentemente. Eduardo ganhou o carimbo de traidor. Sem rodeios, o PT joga na cara o que fez pelo governador — diz que ele se construiu politicamente à custa do partido e de Lula. "Estão desesperados!", afirmou Campos a interlocutores.

Também na semana passada, ganhou um novo capítulo outra ofensiva petista contra o governador. Um dia após o PT ter publicado a nota da discórdia, o Ministério Público Federal em Pernambuco despachou um ofício ao Palácio do Planalto cobrando explicações do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência sobre a ação dos arapongas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) detidos enquanto espionavam o Porto de Suape. 

A procuradora Silvia Regina Lopes deu dez dias para que o general José Elito, ministro-chefe do GSI, explique a ação de seus agentes no porto. O mesmo ofício foi enviado ao comando de Suape, à Polícia Federal e à própria Abin. Em junho do ano passado, uma reportagem de VEJA revelou que quatro oficiais da agência foram detidos no Porto de Suape, na região metropolitana do Recife.

Eles tinham como missão investigar a suposta influência política do governador sobre uma greve de portuários que poderia causar embaraços ao governo federal. O GSI, na ocasião, negou o episódio. Chegou a dizer, em nota, que os agentes nem estiveram no porto e que tudo não passava de invencionice. A negativa acabou desmentida cabalmente por registros oficiais da missão dos arapongas. Agora, o caso vai ser esquadrinhado pelo Ministério Público. Os aloprados petistas desistem.

Fonte: Revista Veja

‘Não tenho medo de partido nenhum’, diz Campos

Provocado no Facebook por uma internauta que questionou se ele tinha temor do PT, governador afirma que o receio é de 'quem não quer que as coisas mudem'

Pedro Venceslau

Depois de ser chamado de "tolo" e "playboy" em um texto sem assinatura publicado na página oficial do PT no Facebook na semana passada, e responder que os "cães ladram e a caravana passa" em um post na mesma rede social, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), disse que "não tem medo de partido nenhum". Ele reagiu ao ser provocado por uma internauta.

"Meus comentários estão sendo censurados. É medo do PT?", escreveu Ana Maria Valente no sábado à noite. "Não temos medo de partido nenhum (...) Quem tem medo, Ana Maria, é quem não quer que as coisas mudem, porque vão mudar", rebateu Campos.

Segundo a assessoria do PSB, a página do governador no Facebook é atualizada diariamente por uma equipe formada por dois diretores de arte, dois redatores e três analistas de mídias sociais. Aliados de Campos revelam que ele não tem o hábito de navegar pelas redes sociais e que o grupo tem autonomia. Quando deseja enviar alguma mensagem específica, porém, encaminha o texto por email ou dita por telefone para assessores.

O bate-boca virtual entre petistas e aliados de Campos deverá ter reflexos até no Congresso Nacional, onde o PSB ameaça fazer oposição sistemática ao governo como resposta ao texto divulgado no Facebook. "Não podemos continuar apoiando quem nos desrespeita, quem nos agride", disse o deputado Beto Albuquerque, líder do PSB na Câmara.

Fake. Em outra frente, os "avatares" de Dilma Rousseff no Facebook, o "Dilma Bolada", e de Eduardo Campos, denominado "Eduardo Descolado", também bateram boca no ambiente virtual. Embora não sejam produzidos oficialmente pela equipe dos dois políticos, ambos são usados para fazer, em tom de humor, elogios a eles e críticas aos adversários.

Em uma montagem que imita a apresentação dos participantes do programa Big Brother Brasil, Campos foi chamado de "traíra" por Dilma Bolada.

"Traíra é nome de um peixe. Se cair na REDE é peixe!", respondeu "Eduardo Descolado", fazendo um trocadilho com o partido da ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Eduardo Campos reunirá PSB, sem Marina, dia 17

Líderes do partido querem formalizar candidatura, com ex-senadora de vice

Maria Lima

BRASÍLIA — O governador Eduardo Campos (PSB-PE) vai ter que exercitar a paciência à exaustão nas próximas semanas, para resolver pendências fundamentais à sua candidatura a presidente sem melindrar Marina Silva e líderes da Rede Sustentabilidade. Cansados de ouvir de adversários que Marina é maior que Campos, ou que ele é refém dela, integrantes da cúpula do PSB querem formalizar até fevereiro a chapa presidencial, com Marina como vice, além de agilizar os entendimentos para a renovação da coligação com o tucano Geraldo Alckmin, em São Paulo.

No dia 17, Campos vai reunir a direção do PSB em Recife, sem Marina, para avaliar os rumos da coligação com a Rede e das parcerias com o PSDB em SP e outros estados. Enquanto ampliam os entendimentos para manter a aliança com Alckmin, tendo um socialista como vice, os dirigentes do PSB querem convencer Marina a formalizar a chapa presidencial. Mas aliados da ex-senadora, sem admitir que há veto à aliança com os tucanos em SP, avisam que ela não tem prazo para dizer que é vice de Campos.

Alegam que só o fará depois de resolvidas as questões programáticas entre Rede e PSB e as coligações em estados importantes como São Paulo, Minas, Rio e Paraná — estados onde o grupo de Marina insiste em ter candidatos próprios.

Campos queria anunciar sua candidatura até o fim de janeiro, para criar um fato político forte e acabar com especulações sobre sua vice. Mas esse prazo ainda não é certo. A pressão de aliados por uma rápida definição é grande.

— Tem certas coisas que precisam ser resolvidas logo, para não ficarmos reféns da intriga. Marina veio para o PSB para ser vice — diz o líder do PSB na Câmara, Beto Albuquerque, revelando o incômodo no comando da campanha de Campos.

Um dos mais próximos aliados de Marina, o deputado Valter Feldman (PSB-SP), por outro lado, joga um balde de água fria nas pretensões do PSB de formalizar a chapa em fevereiro. Lembra que, antes disso, Rede e PSB têm programados quatro seminários regionais para discutir o programa comum.

— Não há dúvida de que Campos é o nosso candidato a presidente. Mas temos que encontrar ainda um modus vivendi sobre os palanques estaduais em São Paulo, Minas e Rio. Nas conversas de Marina com Eduardo, não há por parte dele rejeição em relação à tese de candidaturas próprias nesses estados. Só pediu que isso ficasse para 2014 — afirma Feldman.

Vice-presidente do PSB, o ex-ministro Roberto Amaral diz que a indefinição da chapa tem dado munição aos adversários:

— A chapa deve ser definida logo que possível, e logo que possível anunciada, para encerrar especulações — opina.

Fonte: O Globo

Por pressão de Marina, Campos vai abrir mão de aliança com Alckmin

Murillo Camarotto

RECIFE - Apesar das declarações dos comandantes do PSB em São Paulo, o partido não vai apoiar a reeleição do governador Geraldo Alckmin (PSDB). Interlocutores privilegiados do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), garantem que o grupo formado por PSB, PPS e Rede Sustentabilidade não vai participar do palanque tucano no maior colégio eleitoral do país e deverá lançar candidatura própria.

Irredutível na oposição à aliança, a ex-ministra Marina Silva (PSB-Rede) convenceu Campos a desistir do acordo com Alckmin. Ela deve anunciar em fevereiro sua candidatura à vice-presidente na chapa encabeçada pelo governador de Pernambuco. "É apenas questão de tempo, de seguirmos os protocolos, mas não há outro nome senão o de Marina", disse ao Valor um aliado da ex-ministra.

A mesma fonte rebateu com veemência as declarações do deputado federal Márcio França (PSB-SP), interessado na aliança com Alckmin, que alfinetou ontem o grupo de Marina, ao dizer que o Rede Sustentabilidade trouxe apenas 80 novos integrantes ao PSB, que conta com 232 mil filiados.

"É ruim fazer esse tipo de comparação. E se a gente disser que Marina tem 20 milhões e votos? Não se pode brincar com a Marina. Sua liderança extrapola os limites burocráticos do partido", desafiou o aliado da ex-ministra. Tanto França quanto o prefeito de Campinas, Jonas Donizette (PSB), têm dito que o apoio a Alckmin já estaria sacramentado.

A pressão pela aliança com o tucano cresceu após a adesão do PPS ao bloco que apoiará Campos na corrida ao Palácio do Planalto. O presidente do PPS, deputado federal Roberto Freire (SP), chegou ao grupo reforçando o coro em defesa da parceria com o governador tucano. Prevaleceu, no entanto, o discurso da "nova política", que Campos e Marina desejam personificar.

"São Paulo é uma referência nacional. Não adianta nada a gente ficar falando de nova política e fazer diferente em São Paulo, ficando de baixo da asa do PSDB", disse a fonte, segundo a qual o caminho do grupo em São Paulo será o da candidatura própria, cujos nomes ainda estão em processo de discussão.

Como liderança máxima do PSB, Campos tem sido cauteloso em relação às movimentações da ala pró-Alckmin. Uma pessoa influente no Palácio do Campo das Princesas, sede do governo de Pernambuco, lembrou que Campos não quer melindrar os correligionários paulistas, que são peças importantes na interlocução política no Sudeste. A fonte garante, porém, que é zero a possibilidade de aliança com tucanos em São Paulo.

Os defensores do acordo com Alckmin argumentam que a aliança seria benéfica para a votação de Campos em São Paulo. Partem do pressuposto de que, com o PSB na chapa, o governador paulista faria corpo mole na campanha presidencial do companheiro de partido Aécio Neves. O cenário, segundo a estratégia, pavimentaria a candidatura de Alckmin ao Planalto em 2018.

"Como pode a gente, que quer emplacar o discurso da nova política, fazer uma aliança baseada em puxada de tapete entre companheiros de partido? Isso não poderia dar certo nunca", finalizou o aliado de Marina, que participa diretamente das negociações dos palanques para as eleições de outubro.

Fonte: Valor Econômico

Oposição vê inflação como ameaça à reeleição de Dilma

Parlamentares de oposição criticam gestão econômica e petistas dizem que não há descontrole

Ricardo Brito, Daiene Cardoso, Ricardo Della Coletta

BRASÍLIA - Na avaliação de parlamentares da oposição, o resultado do IPCA de 2013 indica que o arsenal de medidas econômicas para debelar a inflação "se exauriu". Enquanto os presidenciáveis Eduardo Campos (PSB) e Aécio Neves (PSDB) não se pronunciaram sobre o indicador, líderes da oposição não pouparam críticas à gestão petista e disseram que o desempenho da economia pode pesar contra a reeleição de Dilma Rousseff.

Para o presidente do DEM, senador Agripino Maia (RN), a alta da inflação oficial ocorreu por razões de ordem estrutural, mesmo o governo tendo elevado a taxa básica de juros na tentativa de diminuir a pressão sobre o índice. "O arsenal de medidas do governo, de medidas que você possa tomar com efeito colateral suportável, já se exauriu", comentou.

Ele lembrou que a inflação gerou uma diminuição das vendas do Natal e inibiu investimentos no País. "O governo não está atuando nas estruturas, está fazendo apenas medidas tópicas. Não dá para curar a febre quebrando o termômetro."

O vice-líder do PSDB no Senado, Álvaro Dias (PR), afirmou que é inevitável que o impacto da inflação pese nas eleições. "É o que elege ou derrota os governos. Portanto, a menos que a oposição facilite muito, a reeleição da Dilma será colocada em dúvida", afirmou.

Escolhas. Para Agripino Maia, a inflação começa a "entrar na casa" dos brasileiros com a alta dos preços dos alimentos. "As pessoas estão fazendo as contas de quanto vão deixar de comprar, por exemplo, em óleo."

Já a oposição na Câmara dos Deputados classificou de "desequilibrada" e de "incompetente" a gestão econômica e criticou o governo por não atingir o centro da meta, de 4,5%. "O governo abriu mão do rigor do combate à inflação", criticou o deputado Marcus Pestana (PSDB-MG). "O sistema de metas inflacionárias se concentra no centro, e o governo Dilma se acomodou em conviver com a inflação batendo sempre na trave do limite superior."

"A sociedade começa a ver o desequilíbrio e a incompetência na gestão da economia do País", acrescentou o presidente do PPS, Roberto Freire (SP).

Bem-estar. Petistas refutaram a tese de que o governo tenha perdido o controle da inflação. "Não tem descontrole nenhum", afirmou o líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE). Segundo ele, a alta de preços no grupo alimentação e bebidas pode ser atribuída ao aumento do consumo e o importante é "a sensação de bem-estar" da população. "Picos de alta não fazem mal. Eu prefiro isso que contenção de consumo."

O petista prevê que o indicador não vai interferir na sucessão presidencial, já que "o eleitor de baixa renda está feliz da vida com os programas sociais e com o crédito em abundância".

"Não vejo nenhum tipo de impacto na eleição. O governo age em cima da responsabilidade fiscal, mas também na responsabilidade social. Para manter a régua que o governo trabalha não é só superávit ou metas de inflação, mas também tem a ver com emprego, indicadores sociais e investimentos", acrescentou o vice-presidente da Câmara, deputado André Vargas (PT-PR).

Fonte: O Estado

Inflação de 6% e PIB abaixo de 2%: a previsão do mercado para 2014

Está mais alta a previsão para a inflação deste ano. Após o IBGE ter divulgado que o IPCA de 2013 fechou em 5,91%, acima do que se esperava, e a inflação de dezembro ter sido a mais elevada para o mês desde 2002, o mercado revisou para 6% a sua projeção. Há uma semana, estava em 5,97%. É o que mostra a pesquisa do Banco Central, o Boletim Focus, divulgado hoje de manhã.

Aumentou um pouco a previsão para o crescimento do PIB, mas ela continua abaixo de 2%: os economistas revisaram de 1,95% para 1,99%.

É bom lembrar que o mercado tem errado bastante as previsões em relação ao PIB. Nos últimos três anos, apostou num número alto, mas o resultado final foi baixo. Desta vez, começa o ano prevendo um número menor.

A taxa básica de juros, atualmente em 10%, deve terminar o ano em 10,50%, segundo os analistas do mercado financeiro consultados pelo BC.

Para 2015, houve mudanças nas previsões para a Selic (de 11,25% para 11,50%) e para o PIB (de 2,50% para 2,48%). A projeção para a inflação do ano que vem continua em 5,50%.

Fonte: O Globo

Ex-chefe de gabinete de FHC vai comandar campanha de Aécio na internet

Como estratégia, equipe tucana deve montar um quartel-general 'virtual' em São Paulo

Pedro Venceslau

Diretor do Instituto FHC e um dos mais próximos interlocutores do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de quem foi chefe de gabinete, o engenheiro agrônomo Xico Graziano foi convidado pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG) para coordenar a estratégia digital de sua campanha presidencial.

A ideia do mineiro, que também é presidente nacional do PSDB, é montar o quartel-general "virtual" da campanha em São Paulo. Depois de assumir o comando da sigla, no ano passado, Aécio promoveu uma reforma nas estruturas online dos tucanos.

A equipe de operação digital foi ampliada e assessores de imprensa de todos os diretórios estaduais do PSDB foram chamados à Brasília e orientados a montar uma estrutura integrada de rede - antes, havia pouca comunicação entre os Estados. O mesmo aconteceu com os profissionais responsáveis pelas páginas virtuais das bancadas tucanas no Senado e na Câmara. O objetivo do senador é unificar nacionalmente o discurso do partido e difundir sua candidatura.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Aécio Neves - Improviso

A questão prisional no Brasil é um dos centros de gravidade de nossa crise na segurança pública.

Condições subumanas e a crônica má gestão transformaram as prisões em verdadeiras antecâmaras do inferno, espaço para organizações criminosas surgirem e prosperarem.

Trata-se de um problema nacional e a atual crise no Maranhão ilustra a forma improvisada e puramente reativa com o que o governo central age. Não existe visão estratégica ou um plano de ação mais amplo sendo implementado. Basta dizer que quando apresentei proposta proibindo o contingenciamento dos recursos do Fundo Nacional de Segurança e do Fundo Penitenciário Nacional, devidos aos Estados, o governo simplesmente virou as costas. A verdade é que esse tema merece um grande esforço nacional capaz de criar soluções para impasses que permanecem.

O que queremos de nosso sistema de punições? Trata-se de recuperar, ressocializar ou simplesmente punir? Existe uma grande distância entre a legislação penal, bastante dura em muitos aspectos, a Lei de Execução Penal, com um sem número de recursos que abrem brechas a impunidades, e o sistema prisional. O resultado é que para um grande número de presos a principal culpa é a de serem pobres e contarem com uma defesa adequada de seus direitos.

O Brasil prende muito e prende mal. São 550 mil detentos em um sistema penitenciário falido. O número de encarcerados sem julgamento supera os 35% da população carcerária total. O enfrentamento da questão da segurança talvez seja o que mais exige coragem e inovação por parte dos governantes. Nesse sentido, duas experiências de Minas Gerais podem contribuir para o debate.

As APACs (Associações de Proteção e Assistência aos Condenados), desenvolvidas em parceria com o Poder Judiciário, são experiência diferenciada. Nela, os detentos trabalham, estudam e cuidam da vigilância dos presídios. O índice de reincidência dos egressos desses presídios é de 10% contra 80% entre os presos que passam pelo sistema prisional convencional.

A experiência da primeira PPP penitenciária no Brasil também é exitosa. No modelo, o custo do investimento na construção e montagem é do parceiro privado, cabendo ao Estado remunerá-lo a partir do funcionamento, em função dos resultados de cerca de 300 itens monitorados.

Os presos estudam, trabalham, têm acomodações decentes. Criar condições para a ressocialização de detentos ultrapassa o respeito aos direitos humanos: é também medida eficaz de defesa da própria população, pois rompe o ciclo vicioso das prisões que devolvem à sociedade novos criminosos.

A segurança é uma das áreas em que gestão e planejamento fazem mais falta ao país.

Aécio Neves, senador e presidente nacional do PSDB

Fonte: Portal do PSDB e Folha de S. Paulo

José de Souza Martins: Ressentimentos oportunistas

O cemitério paulistano do Araçá, na Consolação, foi invadido na madrugada do domingo passado. 21 estátuas, dois carros elétricos e uma capela ficaram danificados. Algumas das estátuas tombadas eram de bronze e mármore de Carrara, trazidas por famílias da Itália.

As decapitações desses dias em São Paulo e no Maranhão nos levam de volta a graves problemas fundamentais da sociedade brasileira. Em São Paulo, 30 homens, entre 25 e 30 anos de idade, vestidos de preto, invadiram numa madrugada o Cemitério do Araçá e fizeram um estrago enorme. Destruíram esculturas, arrancaram a cabeça de algumas, profanaram a capela, violaram túmulos. Uma ação claramente dirigida contra o sagrado. Intolerância religiosa, descrença ativa e militante contra os que têm da morte uma concepção religiosa e de respeito. Mas também deboche pela morte e pelos mortos, valentia de quem só age no escuro e às ocultas. Como na pichação da escultura de Carlos Drummond de Andrade no Rio de Janeiro. Em São Luís do Maranhão, presos do presídio de Pedrinhas comandaram o que seu líder mesmo definiu como chacina, em alerta preventivo, por telefone, à própria mãe: que não saísse às ruas nos dois dias seguintes. Ônibus foram depredados e incendiados, num deles com feridos graves, incluída uma menina que veio a falecer em consequência. Seguiu-se a morte e decapitação de presos por parte dos próprios detentos. Violência contra coisas e pessoas, mas também contra identidades. Decapitar e mutilar na religiosidade popular condena a vítima ao limbo e à perdição.

A comparação desses dois episódios diferentes e extremos ajuda a compreender essas e outras ocorrências, seus motivos. De um lado, no vandalismo do cemitério os vândalos têm uma identidade grupal e querem mostrá-la. Querem dizer alguma coisa. São ativistas de uma causa. Atacam a sociedade ao atacar seus símbolos, aquilo que a representa. Estão em conflito com o que julgam representado pelo que destruíram.

No Maranhão, os autores intelectuais e materiais da chacina nas ruas e no cárcere dizem quem são, identificam o inimigo, identificando-se simbolicamente. Dirigem-se a quem possa vê-los. Os presos filmaram os decapitados, mostrando a cara dos mortos e ocultando a cara dos vivos. Os mortos aparecem com as cabeças decepadas; os vivos, como vozes, pernas e braços em movimento. Há aí um detalhe: os mortos mostrados são brancos, os participantes são predominantemente mulatos e pardos. A polícia prendeu uma dúzia de pessoas fortemente suspeitas. Há no grupo brancos e não brancos, todos jovens, mais não brancos do que brancos. Os autores das decapitações na cadeia e da chacina nas ruas de São Luís agem porque supostamente incomodados com a presença da Força Nacional de Segurança num presídio que já estava fora de controle. Os presos estavam à vontade. As várias fotos dos membros da Força Nacional de Segurança mostram que é ela praticamente uma tropa de brancos. Essa polarização pode ser acidental, mas pode ser indício de uma racialização do conflito social.

Já está claro que, onde ocorrem episódios de tensão, infiltram-se preconceitos oportunistas, um deles o racismo, que invadem as ocorrências e se alojam em protestos e conflitos originariamente de outra natureza. Na crescente ocorrência de linchamentos no Brasil, quase um por dia, é maior a proporção de negros em relação a brancos vitimados, embora a motivação do justiçamento popular não seja, em princípio, racial. Mas a violência da turba é maior em relação ao negro do que ao branco.

Já a ocorrência de São Paulo, a do Araçá, mostra que a sociedade brasileira está atravessada por tensões de ódio social no qual diferentes motivações podem se alojar. Um dos casos mais emblemáticos de vandalismo em cemitério ocorreu em 1998, no da Consolação, quando um belíssimo anjo de terracota e alumínio do artista plástico Fulvio Pennacchi foi decapitado e teve as mãos decepadas. A restauração da obra foi impossível. Não se trata apenas da destruição de uma obra de arte de um de nossos artistas mais respeitáveis, mas da forma como foi destruída. Os criminosos adotaram formas antigas de punição e castigo. Ainda no século 19, aqui no Brasil, os condenados à morte na forca eram depois decapitados e as cabeças levadas por capitães do mato, em caixotes cheios de sal, pelas vilas do interior para escarmento dos povos. O recado continua o mesmo: mostrar quem manda e, agora, que quem manda não é quem está no poder.

O ressentimento social começou a se tornar evidente já no regime militar e cresceu muito no imediato período pós-ditatorial. O claro uso eleitoral do ressentimento acumulado, na campanha de 2002, deu status político e legitimidade à concepção de que o Brasil é um país de opostos, dos que lesam e dos que são lesados. A retórica de um partido dos pobres contra a opressão e os privilégios de um partido dos ricos, que dominam e exploram há 500 anos, alcançou todos os temas possíveis: raça, cor, classe social, religião. Mesmo criminosos incorporaram essa linguagem e essa mentalidade como referência da legitimidade de seus crimes, vingança dos pobres contra os ricos, dos excluídos contra os incluídos, dos que não podem contra os que podem, dos que não têm liberdade contra os que a têm.

José de Souza Martins, sociólogo, é , professor emérito da Faculdade de , Filosofia da USP. autor de História, Arte no Cemitério da Consolação (2008)

Fonte: Aliás / O Estado de S. Paulo

Paulo Brossard - Voto obrigatório

Houve tempo em que o voto não era obrigatório, como em outros países. Quando passou a secreto, também passou a ser obrigatório, ou seja, quando, por instâncias de Assis Brasil, que se transformara no estrênuo defensor da Justiça Eleitoral com suas prévias e implícitas medidas, o voto secreto e obrigatório se tornou um dogma. Desde o Código Eleitoral de 1932 até ontem, ninguém se lembrou de bulir no voto obrigatório. Ocorre que, por último, uma alta autoridade, o presidente da Câmara dos Deputados, manifestou-se pela extinção do voto obrigatório, razão pela qual a questão ganhou outro relevo, e me pareceu útil alinhar algumas reflexões a respeito.

Começo por lembrar que, de 1932 ao advento da Constituição de 1988, o país passou por bons e maus momentos, quiçá mais maus do que bons; o longo período do Estado Novo e o ainda mais longo do império do AI-5, somados a outros menores, perfizeram mais de meio século e, a despeito de todas as anomalias consumadas, ninguém se lembrou de banir o voto obrigatório, ainda que o próprio voto tenha sido esquecido em um dos períodos.

Embora a Constituição fale em voto "obrigatório", enquanto o voto for secreto ele não será nem poderá ser obrigatório, uma vez que não há meio de ser materializada a hipotética obrigação. Obrigatório será o comparecimento do eleitor à mesa eleitoral no dia da eleição e então votar ou não votar, votar em um candidato e não votar em outros (em se tratando de mais de uma vaga a ser preenchida), votar em branco, que é uma maneira de não votar ou anular o voto, hoje de modo mais limitado.

De qualquer sorte, o denominado voto obrigatório não tem a virtude de obrigar o eleitor que não queira votar, qualquer que seja a motivação de sua recusa. De resto, a extinção do voto obrigatório não teria qualquer utilidade, em nada contribuiria para melhorar a eleição e se por comodismo ou desinteresse do eleitor, o número de abstenções ainda poderia prejudicar o significado do ato eleitoral.

Fora de dúvida, o voto é um direito constitucional, mas dele também decorrem deveres ao cidadão, os quais descumpridos geram encargos. Aliás, não é singularidade da espécie em causa, uma vez que outras se conhecem, assim, o cidadão está sujeito ao serviço militar, bem como à Justiça a que deve servir na qualidade de jurado, de modo que, não é impor muito exigir que a pessoa deva dedicar uma hora para comparecer a sua mesa eleitoral para votar ou não votar, segundo a sua discrição a cada um par de anos.

Enfim, a sabedoria secular aconselha a secrecidade em determinadas situações. Lembro um caso que me parece ilustrativo. O deputado Carlos Lacerda, com seus variados talentos e reservas de combatividade, tinha admiradores extremados e desafetos radicais. Visando a sua cassação, foi iniciado um processo e o governo usou de todos os recursos para obter a excomunhão parlamentar do deputado que fustigava com a lâmina de sua palavra. A despeito de todo o esforço, o governo não conseguiu seu intento notório e ninguém deixou de creditar o resultado à circunstância de a votação ser secreta por disposição legal. 

Generalizar o voto descoberto em casos de perda do mandato pode não ser o melhor pois, por espírito de facção de um lado e por tibieza de outro, por temor da repercussão pode justiçar um parlamentar digno. Em outras palavras, falhas ou abusos podem ocorrer, mas as soluções humanas são imperfeitas, o que me faz lembrar a sentença de um publicista segundo a qual "o possível abuso de poder não é objeção válida à existência do poder".

*Jurista, ministro aposentado do STF

Fonte: Zero Hora (RS)

Almir Pazzianotto Pinto* - Poder e partidos

O ano que se inicia não nos parece reservar surpresas. Como acontecimentos merecedores de referência teremos o carnaval, a Copa do Mundo, a eleição presidencial. Sobre o primeiro nada a ser dito, salvo o fato de que a vida, nas esferas públicas, se inicia com o encerramento do reinado de Momo. Quanto à Copa, o Brasil surge como favorito, mas não nos surpreenderemos se o resultado final, como em 1950, for outro. No tocante à eleição presidencial, entretanto, o inesperado acontecerá se Dilma Rousseff for derrotada.

Não se trata de ataque de pessimismo, mas de análise fria dos fatos, na medida do possível quando se trata de futurologia eleitoral.

Política deve ser encarada como coisa séria. Para tanto, porém, é necessário que o País também o seja. Pertence ao embaixador Carlos Alves de Souza Filho, representante do Brasil em Paris, junto ao governo De Gaulle, durante a falsa Guerra da Lagosta (1963), a declaração, enganosamente atribuída ao presidente francês, de que não somos um país sério. Os mais recentes fatos confirmam a frase, frequentemente repetida diante de algo insólito na administração pública.

Como decorrência da ausência de seriedade, os partidos políticos também não o são. A começar pelo número, 32, como se fosse possível a existência de tantas correntes de pensamento distintas e identificadas. Apesar de lhes faltar em seriedade o que lhes sobra em autoritarismo, fisiologismo e ganância, são indispensáveis ao Estado de Direito Democrático, circunstância que nos impõe, como eleitores obrigatórios, sair à procura dos melhores - ou menos piores -, de dois em dois anos, como representantes nos Poderes Legislativo e Executivo municipais, estaduais e federal.

Maurice Duverger, na obra clássica Os Partidos Políticos, adverte-nos: "Oficialmente, os dirigentes dos partidos são quase sempre eleitos pelos adeptos e investidos de um mandato assaz breve, segundo as regras democráticas". Praticamente, porém, afirma o autor, "o sistema democrático de eleição é substituído por técnicas de recrutamento autocrático, designação pelo centro, apresentação, etc. Estas são agravadas pelo fato de que os verdadeiros chefes do partido são diversos dos seus chefes aparentes" (Zahar, 1970, pág. 172). Para o cientista político, os princípios democráticos exigem dos partidos "a eleição de dirigentes em todos os escalões, sua renovação constante, seu caráter coletivo, sua fraca autoridade".

Não é isso, porém, o que se verifica. Se um deles se organiza "segundo um método autocrático e autoritário, os demais ficaram situados em posição de inferioridade". Talvez seja essa a justificativa para que os partidos, de maneira geral, proponham a democracia para o público externo, ao tempo em que agem de maneira ditatorial com o público interno.

Com efeito, o que menos se conhece entre nós é "mandato assaz breve, segundo as regras democráticas". Predomina antigo coronelismo, também conhecido como caciquismo ou caudilhismo. Como bens imóveis ou móveis, têm os partidos donos nacionais, estaduais, municipais e distritais, que se beneficiam da máquina azeitada com recursos do Fundo Partidário e de outros achegos, legais e ilegais, declarados e ocultos, para se manterem no domínio de legendas. Conservadas em situação de eternamente provisórias, direções municipais e estaduais sujeitam-se à intervenção do presidente do partido se ousarem contrariá-lo.

Ao receber título de doutor honoris causa outorgado por universidade de São Bernardo do Campo, o ex-presidente Lula admitiu que o PT pretende permanecer no poder até 2022. Isso significa vencer em 2014 com Dilma e com outro nome, que poderia ser o dele, em 2018.

A declaração não surpreende. Somente alguém indiferente à vida, e alheio aos fatos, poderia ignorar que a pretensão do PT atinge 2026, 2030, e assim sucessivamente. O êxito do projeto depende da força da oposição. A permanecer como hoje, carente de ousadia e firmeza, incapaz de atrair lideranças jovens, originárias de distintas camadas sociais, devemos temer pelo pior, com o Brasil caindo na órbita do atraso, liderados por Cuba, Bolívia, Venezuela.

O envelhecimento de dirigentes, resultado da falta de mecanismos de renovação, é fato tão conhecido na vida política como na sindical. Entre nós, porém, assume proporções assustadoras. É da ausência de renovação que nascem a estagnação e o retrocesso. Preocupa-me, ainda mais, a multiplicação de bolsões autoritários, com características neofascistas, entre pessoas que deveriam zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos constitucionais.

O papel da oposição, no Brasil, não tem sido fácil, desde a República Velha. Em períodos autoritários, como durante o Estado Novo de Vargas e o regime militar, encontrou enormes barreiras para ser exercido, vendo-se obrigada a recorrer, em alguns momentos, à clandestinidade.

Sob a Constituição de 1988, todavia, inexistem motivos para que ela seja tímida, retraída, vacilante, diante de governo que envereda por caminhos propícios à instabilidade econômica e multiplica o endividamento público. Após receber o País em ordem, das mãos de Fernando Henrique Cardoso, Pedro Malan, Armínio Fraga, o PT outra coisa não fez, nestes anos de poder, senão dilapidá-lo e desorganizá-lo.

Apesar de tudo, 2013 deixou saldo positivo. Graças ao ministro Joaquim Barbosa à frente do Supremo Tribunal Federal, pudemos conhecer o desfecho do processo do "mensalão", com aquilo que ninguém imaginava possível no país da impunidade: "mensaleiros" arrogantes e poderosos encerrados na Papuda. Quiçá sirva de lição a peculatários reincidentes e iniciantes.

*Almir Pazzianotto Pinto é advogado, foi ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Fonte: O Estado de S. Paulo

Renato Janine Ribeiro - O espírito de Bolonha

O futuro depende de uma mobilidade estudantil intensa

Todo empresário interessado em ter mão de obra de nível universitário deveria saber o que é o processo de Bolonha. Todo professor universitário, igualmente. Mas não é o caso: poucos brasileiros o conhecem.

A União Europeia nasceu, em 1957, como Mercado Comum Europeu, unindo seis países. Seu objetivo mínimo era ampliar o comércio entre os membros e, assim, a produção em cada um deles. Já seu objetivo maior era impedir guerras: se para fazer aço era preciso carvão alemão e ferro francês, então ou um país roubava do outro o insumo que lhe faltava, ou os dois se aliariam. Aliaram-se. Com o tempo, o Mercado Europeu foi muito além de sua cópia sul-americana, o Mercosul. Autorizou seus cidadãos a viver e a trabalhar em qualquer dos países-membros, padronizou produtos, criou um Parlamento comum, cresceu. E em 1999 seus ministros da Educação assinaram a declaração de Bolonha, que depois seria endossada por outros países, hoje totalizando 47 - incluindo dezenove que não estão na União Europeia.

Seu ponto talvez central é promover uma enorme mobilidade estudantil. Um universitário pode começar seu curso num país, fazer matérias em outra universidade (ou país) e usar os créditos assim obtidos com certa facilidade. É o que se chama portabilidade de créditos. Imaginem isso aqui. Se um brasileiro for trabalhar dois anos na Argentina e levar os filhos crianças ou adolescentes, terá muito trabalho para revalidar os cursos que fizeram na escola básica. O que é de um absurdo total! É óbvio que, se meu filho passar dois anos em Buenos Aires, ele até poderá voltar ao Brasil cometendo alguns erros de português - mas dominando a língua, os costumes, a cultura de nosso principal aliado e parceiro. Em poucos meses, alcançará os colegas brasileiros no que lhe ficou faltando, e poderá repassar a eles muito do que aprendeu. Mas não temos previsão, em nosso sistema escolar, para um "fast track" nessa direção. Ao contrário, burocratizamos tudo isso. E no ensino superior ou na pós-graduação, a desconfiança é ainda maior.

Mas atenção. Bolonha não é um liberou geral. Não basta cursar uma disciplina qualquer, onde quer que seja, para ela valer. Aliás, o Brasil sabe dos problemas disso. Na Argentina, uma instituição de ensino superior - que não é reconhecida nem mesmo lá - se especializou em dar títulos de doutor a brasileiros. Nossos cursos de doutorado a conhecem e, com o apoio da Capes e do Conselho Nacional de Educação, se negaram a acolher seus títulos, que por sinal eram emitidos com a anotação de não valerem sequer na Argentina... Então, a necessidade suplementar do processo de Bolonha é: cada país precisa ter uma agência poderosa de avaliação e reconhecimento dos cursos de ensino superior. Ela pode ser estatal ou privada, conforme a lei local, mas tem de ser rigorosa. É ela que vai garantir que um crédito da USP valha um da UFRJ, e vice-versa, e vai descartar os cursos de má qualidade.

É preciso detalhar as vantagens desse sistema numa cultura globalizada? Formaremos alunos que conhecerão seu mundo para além das fronteiras. Acabará a atual exigência, sempre que faço uma disciplina fora da faculdade, de pedir seu reconhecimento a uma comissão de três professores, cujo parecer subirá ainda a mais uma ou duas instâncias superiores. A condição para tanto é rigor. Mas uma agência avaliadora sai da apreciação no varejo, no balcão, de cada pedido individual, e vai examinar a qualidade dos cursos mesmos. Todos os que trabalham bem ganham com isso; perde quem trabalha mal. O efeito educacional é enorme.

Quem leu os últimos rankings das universidades do mundo notou que, entre as primeiras 500, são raras as que não dão cursos regulares em inglês - como as nossas USP, Unicamp, UFRJ. Esse assunto é delicado porque, não tendo cursos regulares em inglês, atraímos menos alunos estrangeiros e pontuamos mal no item "mobilidade" - mas, se os dermos, poderemos chegar à esquisitice de professores brasileiros lecionando em inglês para alunos brasileiros, só para termos mais alguns estudantes de fora da América Latina. Esse é um desafio difícil para nossa educação, que precisará ser tratado nos próximos anos. Mas a questão crucial é que precisamos ter uma mobilidade intensa dos estudantes, com os nossos indo para outras instituições e mesmo países, e com nossas universidades recebendo jovens estrangeiros. Isso terá de ser feito, sob pena de nos atrasarmos na cooperação internacional. (Poderia acrescentar a competição internacional, mas na verdade necessitamos de ambas). Como fazer isso? Ninguém sabe ainda resolver a questão da língua, mas podemos começar a discutir a questão central, que é a mobilidade.

Um bom começo seria no âmbito do Mercosul - até para dar-lhe mais ambição porque, seis décadas depois do Tratado de Roma, é pouco nossos quatro países se limitarem a trocar mercadorias, sem uma intensa mobilidade humana, que deve principiar pelos jovens. Agências de avaliação educacional, como a Capes brasileira e congêneres, poderiam assegurar a qualidade pelo menos das melhores instituições de ensino superior desses países, tornando portáteis os seus créditos. Não deveria ser ainda em todas as habilitações, mas poderia começar com cem ou duzentos cursos, em uma ou duas dezenas de universidades de alta qualidade. Está na hora de termos a Universidade sem Fronteiras. Podemos iniciá-la pelas melhores. Isso não é fácil: cada iniciativa dessas abre lugar a ações duvidosas. Mas o desafio existe, e tem de ser enfrentado. Para o bem de nossa cultura, nossa economia e nossa política, não devemos perder tempo.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

Fonte: Valor Econômico