domingo, 17 de agosto de 2014

Morte de Campos impões compromisso, diz Marina

A Marina o que era de Campos

• PSB prepara "testamento político" a ser seguido por candidata

Fernanda Krakovics, Mariana Sanches e Sérgio Roxo – O Globo

BRASÍLIA e RECIFE - O PSB prepara uma carta com os compromissos de Eduardo Campos, candidato do partido à Presidência da República morto em um acidente aéreo na última quarta-feira, a serem honrados pela ex-senadora Marina Silva, que era vice na chapa e assumirá seu lugar na disputa eleitoral. A ideia é divulgar essa espécie de testamento político na próxima quarta-feira, quando o PSB anunciará oficialmente a candidatura de Marina.

A ex-senadora desembarcou por volta das 15 horas de ontem no aeroporto de Recife para acompanhar o velório e enterro de Campos. Assim que pousou na capital pernambucana, em um voo comercial, Marina declarou ter senso de responsabilidade e afirmou que vai manter os compromissos definidos com seu ex-companheiro de chapa:

- Tenho senso de responsabilidade e compromisso com o que a perda de Eduardo nos impõe - disse, sem dar espaço para tratar das discussões com os socialistas.

O objetivo da carta é legitimar o nome da ex-senadora, assegurar que ela cumprirá os compromissos políticos firmados por Campos e que vai conciliar os interesses do PSB e os da Rede Sustentabilidade, grupo ao qual pertence. Para o público externo, seria um aceno, por exemplo, para o agronegócio. E, internamente, uma promessa de honrar os acordos políticos firmados pelo socialista nos estados.

- É uma carta de desejos e intenções do Eduardo para o Brasil que ela vai honrar - afirmou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).

Documento foi consenso
A elaboração do documento foi acertada em uma reunião de lideranças do PSB na noite de anteontem, em São Paulo. Mais cedo, o presidente do partido, Roberto Amaral, acompanhado de outros integrantes da sigla, havia se encontrado com Marina, que aceitou assumir a cabeça de chapa. Ligado ao PT, Amaral era uma das principais resistências a Marina no partido.

Os compromissos que Marina vai assumir são de mão dupla. Dirigentes do PSB afirmam, por exemplo, que mesmo que Marina seja eleita presidente da República, ela deixará o partido assim que conseguir fundar sua própria sigla, a Rede:

- É estranho, mas não tem nada de novidade. Não tem ninguém enganando ninguém. Esse é o acordo que ela tinha com o Eduardo - afirmou um integrante da Executiva Nacional do PSB.
O mais cotado, no momento, para assumir a vice na chapa é o líder do PSB na Câmara, deputado Beto Albuquerque (RS). Mas também está na mesa o nome do deputado Júlio Delgado e há quem defenda a indicação de um quadro de Pernambuco mais próximo a Campos.

"Ela precisa assumir compromissos"
O presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), afirmou, ontem ao chegar a Recife para o funeral de Campos, que Marina deve respeitar os compromissos já firmados nas eleições para governador e senador e nas coligações proporcionais.

O dirigente do segundo principal partido da aliança também afirmou que na coligação não há nenhum outro nome "com a presença de Marina". O partido já havia se posicionado em favor de que a ex-senadora assumisse o a candidatura presidencial:

- A Marina tem as características dela. O que ela não pode é deixar de assumir os compromissos que estão firmados nos estados - disse Freire.

O dirigente do PPS descartou qualquer possibilidade de um outro nome para a cabeça de chapa e afirmou que o seu partido poderia até se afastar da aliança em caso de mudança:

- Ela era vice do Eduardo. Acontece uma fatalidade e você vai inventar o que? Alguém do PSB de raiz? Se inventasse alguém do PSB, o PPS não estava lá.

Freire considera natural que, com a mudança de candidato, algumas características da chapa sejam alteradas, mas destaca que a única condição imprescindível é que seja mantida a postura de oposição ao governo federal:

- Você não pode esperar que a Marina vá ter do ponto de vista econômico a mesma postura contundentemente crítica que o Eduardo tinha

Problemas em São Paulo
A carta compromisso preparada pelo PSB tem o objetivo de tentar superar divergências em estados como São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Além disso, os conflitos de Marina com o agronegócio colocam em risco palanques costurados por Campos em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Em São Paulo, maior colégio eleitoral do país, Marina foi contra a aliança para a reeleição do governador Geraldo Alckmin (PSDB). Mesmo assim, o PSB indicou o deputado Márcio França para vice do tucano.

No Paraná e em Santa Catarina, Campos tinha apoio de candidatos a governador do PSDB - Beto Richa e Paulo Bauer, respectivamente. Marina respeitou a decisão, mas nunca aprovou.

Já no segundo maior colégio eleitoral do país, Minas Gerais, Marina deve herdar o apoio que já era dado a Campos. No processo de formação das alianças, parte do PSB queria apoiar o tucano Pimenta da Veiga para o governo do estado, mas a ex-senadora trabalhou para implodir essa possibilidade. No fim, prevaleceu a candidatura do socialista Tarcísio Delgado.

Apesar de a candidatura de Marina já ser dada como certa, a direção do PSB está consultando integrantes do partido sobre essa saída:

- Tudo indica que vai ser nesse sentido, mas as pessoas precisam ser ouvidas. Precisamos ouvir governadores, prefeitos, porque não somos os donos do partido - disse Carlos Siqueira, integrante da Executiva Nacional do PSB.

A expectativa de dirigentes socialistas é que a ex-senadora Marina Silva tenha um desempenho nas pesquisas de intenção de voto melhor do que Eduardo Campos, tanto pelo recall das eleições de 2010, quando ela teve quase 20% dos votos para presidente da República, quanto pela comoção nacional gerada pela tragédia. Ex-governador de Pernambuco por duas vezes, o principal desafio de Campos era se tornar conhecido nacionalmente.

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