segunda-feira, 7 de julho de 2014

Alberto Goldman: A Copa e as eleições de outubro.

• Não subestimar a capacidade de pensar do brasileiro

A grande maioria da população está ausente da discussão e da preocupação quanto à relação entre a Copa do Mundo de Futebol e as eleições deste ano. Mas alguns milhares de brasileiros que acompanham e vivem a vida política do país se digladiam em uma discussão acaciana: a vitória do Brasil ajudará a eleição de Dilma Rousseff? A derrota do Brasil aumenta as possibilidades da oposição?

É fato que a questão da Copa não se resume ao resultado futebolístico. Como o Brasil é a sede do evento, a discussão é sobre a sua organização. Se boa, ponto para governo. Se má, ponto contra. E por quê? Porque o Lula resolveu bancar que a sua realização fosse no Brasil, evidentemente com intenções políticas.

É incrível que com tanta experiência que já tivemos no Brasil muitos ainda acham que o futebol aliena. Vale dizer, que o povo é alienado. Não é, nem nunca foi. Pelo contrário, é muito pragmático, ainda que esse pragmatismo não signifique plena consciência do que deve ser feito a curto prazo para que não tenhamos de lamentar os resultados a longo prazo.

A FIFA, a real responsável pela Copa, é uma entidade privada. Ela é hábil em misturar as coisas, fazendo parecer que o evento esplendoroso é um inocente evento público. Mas não é. O poder público, diante de um espetáculo que atrai grande público tem a obrigação ( ou melhor, acaba tendo a obrigação) de dar as condições de estrutura da cidade e do país, no que respeita à mobilidade, à segurança, e à tudo que pode resultar em bem estar da população. 

 A FIFA ( assim como o COI – Comitê Olímpico Internacional ) como entidade privada, “dona” da marca Copa do Mundo de Futebol, tem como objetivo maior o seu negócio, que realiza possibilitando que centenas de empresas ampliem também os seus negócios, inclusive usufruindo da publicidade inerente para obterem mais lucros. E seus dirigentes, por diversas vias, legais ou não, se beneficiam deles. Essa Copa das Copas é uma fonte de riquezas para muitos.

Nenhuma objeção teríamos se a Copa não envolvesse bilhões de reais em recursos públicos. Quando Governador do Estado de São Paulo fiz questão de destacar esse fato e não autorizei nenhum gasto específico nos estádios, públicos ou pertencentes ao clubes de futebol, nem qualquer subsídio estatal. E o mesmo fez o governo do Estado na atual administração Mas o governo federal não se comportou da mesma forma. 

 Além das formas que ainda não contabilizamos – mas haveremos de conhecer – usou bancos estatais para financiar os gastos da Copa. Esses financiamentos são feitos a juros subsidiados, isto é, o poder público banca os custos de captação desse dinheiro e os investimentos deixam de ser dirigidos para áreas que são carentes dos recursos do poder público. Também o governo municipal de São Paulo, apesar das juras em contrário, possibilitou operações em que ele se responsabiliza por parte dos investimentos. O mesmo acontece em todos os Estados e Municípios em que os jogos se realizam.

Portanto o sucesso da Copa é o sucesso das disputas de organizações privadas, a FIFA e as Confederações de cada país, em cima de um esporte que é um dos mais populares do mundo, no qual o brasileiro, no caso, deposita seu amor e carinho e torce autenticamente sem saber o que está atrás de tudo isso.

Faço essa constatação independentemente do meu prazer em acompanhar esse esporte, desde tenra idade, desde que vivia no bairro em que nasceu o meu Corinthians, chegando a ser eu, até, um bravo “gavião” da Fiel. Porém nada disso me cega.

Mas se a Copa é um sucesso no entusiasmo dos confrontos nos campos e nos lucros das entidades internacionais de futebol – privadas, lembro mais uma vez – é um resultado tacanho, se não criminoso, no que se refere à herança a ser deixada pelo evento, mesmo que algumas obras que já deveriam ter sido feitas há muitos anos, como as dos aeroportos, que estavam em petição de miséria nas mãos da malfadada estatal Infraero, tenham saído do papel.

A questão é: o que será dos grandes estádios - que vão se transformar em enorme peso para os clubes e para o poder público – à medida que os empréstimos tenham de ser pagos e a manutenção, caríssima, tenha de ser feita?

Essa questão nunca foi olhada com a responsabilidade devida. Mas a conta virá. Assim como os clubes são grandes devedores de contribuições devidas à Previdência pública, aumentarão o seu passivo e sua inadimplência. De um jeito ou outro, o povo paga.

Hoje tudo é alegria. Mesmo ganhando ou perdendo, a seleção brasileira ( já estamos entre as 4 melhores seleções do mundo ) e os jogos em geral são um sucesso. Hoje é a carraspana. A ressaca vem em seguida e vai ser dolorosa, campeões ou não.

Voltando à inicial, se o Brasil ganhar, ou se o Brasil não for campeão, isso muda alguma coisa no resultado eleitoral que teremos em outubro? Creio que não. As competições anteriores são prova suficiente de que não há qualquer relação entre a Copa e as eleições. A alegria momentânea que teremos, ou a tristeza que vier, não altera a realidade da vida, do cotidiano, de cada cidadão. Não alterará, pois, o resultado eleitoral de outubro. Nessa disputa as questões que serão o motivo de decisão do eleitor são as que mexem com a sua realidade e com as suas expectativas de um futuro melhor.

Por favor, não subestimem a capacidade de pensar do brasileiro.

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