sábado, 17 de maio de 2014

Luiz Carlos Azedo: O medo de uma campanha

• O PT, como diz a presidente Dilma, tem todo o direito de preparar um comercial do medo, veiculado esta semana em cadeia de rádio e tevê. Mas a presidente não pode dizer que não tem nada a ver com isso. Tem, sim, afinal a candidata é ela

- Correio Braziliense

Candidatos de cidades pequenas costumam dizer que até para campanhas eleitorais há limites. Por mais que adversários possam elevar o tom nos discursos, eles sabem que, mais cedo ou mais tarde — tempo depois das eleições —, vão encontrar o adversário na rua, em evento social ou mesmo na igreja. Assim, existe um acordo tácito nas estocadas para que alguma relação seja preservada para o futuro. A tal cartilha de políticos do interior está longe de ser seguida na disputa pelo Palácio do Planalto, é mais do que evidente.

Nas redes sociais, a selvageria corre solta, com ataques demarcados contra Dilma Rousseff, Aécio Neves e Eduardo Campos. Por mais que as ações sejam feitas por profissionais, elas são preparadas para a internet, sem autoria definida. Mas sempre repercutem nas estratégias oficiais dos partidos. É como se o lixo apócrifo tivesse alguma base na realidade, o que é falso. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi um dos políticos que mais sofreu com a canalhice pré-internet, montada para fortalecer preconceitos contra o petista.

Dito isso, o "discurso do medo" lançado pelo Partido dos Trabalhadores esta semana acentua e expõe de forma definitiva a falta de cordialidade na corrida presidencial, por mais que o PT não esteja sozinho na estratégia política de bombardear adversários. Mesmo que possa trazer dividendos eleitorais para Dilma, "a campanha do medo" assustou até mesmo parte dos ministros do PT, como mostrou este Correio na edição de quinta-feira.

Última cartada
Além de forçada — é pouco provável que o país se transforme num caos, com pedintes vagando pelas ruas, com ou sem a vitória de Aécio ou Eduardo —, o comercial expõe uma fragilidade cara a qualquer candidato: o receio da derrota. Tal recurso é usado por marqueteiros como última cartada, a desesperada, por isso o estranhamento. A eleição está apenas começando e, de mais a mais, daqui a menos de 30 dias uma Copa do Mundo deve ganhar o noticiário. Seguiremos envolvidos com dribles e gols. E também com manifestações, é verdade, mas elas não estavam na conta do marqueteiro João Santana na hora que decidiu montar a peça publicitária contra os "fantasmas do passado".

Mesmo com a perda de pontos, Dilma mantém a dianteira nas pesquisas de opinião e, assim, táticas agressivas são sempre arriscadas. O exemplo desse risco vem do próprio PSDB, que, em 2002, preparou um comercial estrelado por Regina Duarte, no qual ela dizia temer a vitória petista. O único resultado prático da ação tucana foi deixar a atriz global com a pecha de "musa do medo". Para os petistas que defendem a peça publicitária de João Santana, entretanto, a decisão foi tomada na hora certa, até porque, ainda haverá tempo de acertar o tom do discurso até 5 de julho, o primeiro dia oficial da campanha. Para divulgar a campanha tanto na quarta como na quinta-feira, Santana deve ter em mãos pesquisas que apresentam, de alguma forma, o receio da população em ficar desempregada — hoje, um índice positivo do governo Dilma Rousseff.

A campanha de jogar com o medo da população é uma decisão do comando da campanha, por mais questionável que possa ser. Nessa decisão, estão incluídos Lula e Dilma Rousseff. Na quinta-feira, durante conversa com cronistas esportivos, a presidente disse que a propaganda é do PT. "É deles, que têm todo o direito. Meu papel é mais amplo, não se trata de propaganda de governo." Epa! E quem é mesmo a candidata do partido? A propaganda não é apenas do partido. É dela também, pois.

Outra coisa
Por mais distantes que as manifestações de quinta-feira tenham ficado dos grandes picos de concentração de pessoas nas ruas das cidades brasileiras em junho do ano passado, o movimento assustou principalmente por causa da greve da polícia pernambucana, que parou o estado. Enquanto governistas tentam separar os protestos anti-Copa com as paralisações de categorias, é impossível não juntar os dois eventos. Afinal, até partidas de futebol foram canceladas no Recife. Nada mais simbólico.

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