quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Remédio amargo: Contra inflação, BC eleva juros pela 7ª vez seguida

Taxa sobe para 10,5% e se aproxima dos 10,75% de quando Dilma

Após dezembro registrar a maior alta de preços em dez anos, Banco Central aumenta a Selic em 0,50 ponto
Gabriela Valente, Roberta Scrivano

BRASÍLIA e SÃO PAULO - O Banco Central (BC) decidiu manter o ritmo de aperto nos juros depois do repique inflacionário do fim do ano passado - quando a taxa subiu 0,92% em dezembro, a maior alta mensal em dez anos. O comportamento dos preços em dezembro frustrou a promessa do governo de encerrar 2013 com uma inflação inferior à do ano anterior. Nesta quarta-feira, o Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a taxa básica de juros (Selic) em 0,5 ponto percentual para 10,5% ao ano, o maior patamar em dois anos. O aumento dos juros veio no topo das expectativas de analistas, que projetavam alta de 0,25 ponto percentual a 0,5 ponto percentual.

Com a sétima alta seguida da Selic, o BC ensaia uma tacada para recuperar a credibilidade, já que as projeções para a inflação não param de subir. Apesar de a autoridade monetária indicar que o ciclo de alta dos juros está perto do fim, com a decisão desta quarta, analistas avaliam que a presidente Dilma Rousseff pode encerrar 2014, ano eleitoral, com juros maiores que os 10,75% de quando assumiu o governo, em janeiro de 2011.

O novo aumento da Selic consolidou a posição do Brasil no topo do ranking mundial de juros reais. Agora, a taxa (descontada a inflação) do país é de 4,25% ao ano, seguido pela Argentina (3,7%), pela China (3,41%), Índia (1,65%), Hungria (1,08%) e Chile (1,06%), de acordo com levantamento do economista Jason Vieira, do portal Moneyou. Desde outubro, o país ocupa o primeiro lugar no ranking.

- O mercado trabalhava com a meta determinada pelo governo de redução do juro e manutenção em um dígito. Agora, essa meta não existe mais e os juros têm de subir para conter a inflação - disse Vieira.

Em 2012, o governo fez um movimento orquestrado para diminuir o custo financeiro para famílias e empresas. Enquanto o Banco Central cortava os juros básicos, a presidente Dilma usou o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal para forçar as instituições privadas a reduzir os juros cobrados dos clientes. A iniciativa deu certo, mas a inflação persistiu alta.

- O governo fez o correto ao cortar os altos juros no Brasil, mas exagerou na dose. Agora, tem uma baita janela de vidro que a oposição vai apedrejar - disse o economista-chefe da corretora Gradual, André Perfeito, que prevê uma taxa de juros de 11,25% no fim do ano.

Decisão do comitê foi unânime
No comunicado divulgado após a reunião do Copom, o BC indicou que a sequência de alta dos juros está perto de acabar. Os diretores praticamente copiaram a nota à imprensa divulgada no encontro anterior. Inseriram, entretanto, a expressão “neste momento” para passar o recado.

“Dando prosseguimento ao processo de ajuste da taxa básica de juros, iniciado na reunião de abril de 2013, o Copom decidiu por unanimidade, neste momento, elevar a taxa Selic em 0,5 ponto percentual para 10,5% ao ano sem viés”.

- A mudança é bastante relevante. Deixaram mais claro que está próximo do fim do ciclo. E que esse ritmo (de altas de 0,5 ponto percentual) não se mantém - avalia a economista do Santander Tatiana Pinheiro, que foi surpreendida pela decisão, pois apostava em uma elevação de 0,25 ponto percentual.

A maioria dos analistas esperava um aumento mais modesto da taxa. No entanto, alguns começaram a mudar suas projeções depois de serem surpreendidos pelo resultado do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2013, que ficou em 5,91% (acima dos 5,84% do ano anterior), divulgado na semana passada pelo IBGE.

Um deles foi o economista-chefe do Banco ABC Brasil, Luís Otávio Leal. Ele mudou sua aposta após a escalada da inflação no fim do ano, mas mesmo assim avalia que o ajuste da taxa de juros está perto do fim, embora não seja suficiente para trazer o IPCA para o centro da meta, de 4,5% ao ano em 2014.

- Na economia, todo mundo tem de olhar o custo-benefício, e o custo para a trazer a inflação para a meta só com o aumento dos juros é muito alto - disse o economista.

Leal lembrou, entretanto, que recuperar a credibilidade do Banco Central não é simples e que isso só deve ser alcançado com o tempo, caso consiga controlar a inflação. Ele ressaltou que o BC não conseguiu cumprir nem a sua meta informal no ano passado: fazer com que o IPCA fechasse abaixo do patamar de 2012.

Para Perfeito, o BC deixou claro que faz a sua parte. E joga no colo da Fazenda parte da responsabilidade pelo controle dos preços por causa dos altos gastos:

- Agora, o BC mostrou que fará o que pode, mas também lava as mãos: deixa o problema dos gastos públicos na mão do governo e também da sociedade, que num ano de eleição, terá de decidir como resolver essa questão.

As entidades que representam as indústrias - CNI, Firjan e Fiesp - reagiram com discurso parecido à alta da taxa e reforçaram a necessidade de haver redução dos gastos públicos e política fiscal ativa no combate à inflação com o intuito de evitar a elevação do juro, que desacelera o ritmo dos investimentos.

Fiesp e Firjan cobram redução do gasto público
Para a Firjan, se não houver essa melhoria fiscal, “dificilmente o País poderá conviver com a tão almejada combinação de crescimento econômico e inflação controlada.” A CNI destacou, em nota, que a inflação continuará “sendo foco de preocupação em 2014, não só pelo elevado patamar, mas, principalmente, porque o governo recorreu, no ano passado, ao controle dos preços administrados e à redução da cesta básica”.

Esses mecanismos, de acordo com a CNI, dificilmente poderão ser repetidos com a mesma intensidade nesse ano, o que exigiria, portanto, os controles fiscais e dos gastos públicos. A Fiesp completou dizendo que, “com este novo aumento, 2014 começa mal, indicando que a esperada retomada da indústria ficará para depois”. Até a Força Sindical adotou discurso similar ao dos patronais e disse, também por meio de nota, que “o governo persiste nos mesmos erros, tratando o crescimento econômico e a geração de empregos unicamente como retórica”.

Fonte: O Globo

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